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Ensaios-->Heurística & Literatura No Limiar da 2ª Década Do 3° Milênio -- 21/06/2010 - 08:32 (Sereno Hopefaith) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Schenberg, Planck, Pauli, Heisenberg, Lattes e Einstein resolviam problemas de invenção e Física trabalhando neles e esquecendo-os deliberadamente, quando já haviam tentado, sem êxito, todas as possíveis soluções. Passavam então a ignorar o problema anterior e a dedicarem-se a novas tarefas. Esqueciam-se dele, e não mais que de repente, surgia a solução, parcial ou total, através de um “insight”.

Esta é uma dica de como funcionam os mecanismos de criação e solução de problemas. Realizar um ato de criação nem sempre é possível, por mais adequadas que sejam as técnicas e os conhecimentos disponíveis do pensamento criador, desde Arquimedes.

As operações de aprendizagem e desenvolvimento da atividade mental têm solucionado problemas específicos em todas as áreas, dos domésticos de culinária e jurisprudência, aos de ciências exatas. Os heurísticos possuem uma especificidade especial.

Poincaré escreveu “Memórias sobre as Funções de Fuchs”, após intermináveis meses tentando resolver um sem número de séries de combinações. Idéias disputavam, na mente do matemático, predominância. Certa noite ingeriu, contra seus hábitos, pequena porção de café. Não conseguiu dormir, mas pela manhã parte do problema estava solucionado.

Selecionou duas idéias que resultaram numa combinação aceitável. “As conclusões ficaram prontas em meia dúzia de horas de trabalho”. O problema estava longe de ser completamente resolvido, mas o alicerce, no dizer do matemático, da fundação da teoria exposta no livro “A Criação Matemática”, estava construído. Muita água passaria por baixo da ponte até a conclusão da mesma.

Para fugir da saturação e do estresse, Poincaré partiu de Cannes, onde residia, para uma excursão pela Escola de Minas. Viajou de ônibus para Contes, depois seguiu para Mont-Valérian onde prestou serviço militar. Após o serviço militar voltou aos estudos de problemas matemáticos que, aparentemente nada tinham com estudos anteriores.

Toda vez que voltava a estes, as tentativas de solução conduziam à verificação do grande grau de complexidade dos mesmos. Certa vez ao caminhar por uma avenida da cidade natal, surgiu (“insight”) a solução para mais uma etapa do problema. Em outra ocasião, ao sair de um ônibus e pisar na calçada, uma nova idéia permitiu que solucionasse outras questões que permaneciam pendentes na solução parcial.

Aos poucos, gradativamente, em ocasiões distantes da concentração na mesa de trabalho, conseguiu apoderar-se de todos os elementos e ordená-los na redação do “Memórias”.

No estudo da Heurística interessa saber quais as constantes desse processo criativo. Leibnitz, Descartes e Spinosa, filósofos racionalistas do século XVII, revelaram em suas obras que a intuição específica da percepção criativa, não tem base lógica no raciocínio, mas numa peculiar e súbita (“insight”) visão intelectual.

Para Descartes, ciência é verdade intuída, visão direta da inteligência sem intermediação dedutiva da razão ou da reflexão pautada em regras. Em “Regras para a Orientação do Espírito”, lemos que a intuição difere das provas, definições e silogismos do conhecimento lógico.

Descartes convida a uma entrega total à intuição, desde que todas as teses traduzidas de forma direta ou de outra qualquer forma, reduzem-se à intuição. Os filósofos racionalistas consideravam a concepção intuitiva do real, uma forma superior de criação. Nela, a mente raciocina e, simultaneamente, medita nas três dimensões conhecidas do conhecimento: profundidade, abrangência e atualidade.

O processo heurístico, é sensorial e intelectual ao mesmo tempo. Para Einstein os processos intuitivos são os criadores da pesquisa na Física teórica. Ele afirmava que o raciocínio acontece, em princípio, através de símbolos (alfabéticos e matemáticos), se desdobra e soluciona no inconsciente, instância intuitiva limite, que não deve ser interpretada como fenômeno de natureza lógica.

São suas as frases: “O supremo dever do cientista é a pesquisa das leis elementares. Por simples dedução pode-se obter um quadro geral do mundo. Não é o caminho lógico que nos conduz a essas leis, mas tão-só uma intuição disfarçada na compreensão do conteúdo da experiência.”

No raciocínio analítico (dedutivo/indutivo), há a reflexão do geral para o particular e vice-versa. Na intuição não existem etapas intermediárias pré-determinadas, mas percepção (“insigth”) global. Intuição é salto qualitativo, mutação sem esquemas lógicos pré-concebidos.

A pergunta agora é: Como processos heurísticos e raciocínio intuitivo motivam-se? A vontade consciente de fazer uso da heurística no processo criativo, por cientistas e escritores, inibe o processo intuitivo de raciocínio analítico. O estudo da ação através da qual são ou não solucionados, é muito mais complexo.

A Heurística estuda métodos que conduzem às descobertas e às invenções. É um segmento à parte entre os conceitos das teorias do conhecimento. Campo de pesquisa indefinido, ora situa-se no estudo da Lógica, da Filosofia, da Cibernética, da Bioquímica, Biofísica, Eletrônica, Psicologia, ora no da Parapsicologia.

No livro “Como Resolver Problemas”, D. Poia, matemático americano, descreve a atividade Heurística na ciência e na prática pedagógicas. Nele menciona um outro precursor da Heurística, o matemático grego Pappus que no século III escreveu “O Tesouro da Análise” (“A Arte de Resolver Problemas”).

Para ele a experiência pessoal e a observação do modo como outras pessoas solucionam problemas, é a base do método para a solução. Poia apresenta regras de trabalho que podem conduzir à descobertas, mas não analisa a atividade mental, em relação à qual, tais regras devem ser observadas.

Suas dicas têm caráter genérico. A primeira delas: “É preciso que a competência seja aliada da sorte”. A segunda: “Manter-se ativo, não desistir, até que surja uma idéia ideal”.

No processo literário de criação que é, presumo, o que mais interessa aos membros do Clube de Leitores de Ficção Científica, os que estão empenhados em escrever ficção, tudo bem com a dica número 1. A 2 em Literatura também funciona. Por quê?

Rimbaud, poeta simbolista francês, inovou a poesia com “Uma Estação no Inferno” e “Iluminações”, proclamou a República da Rosa dos Ventos da cultura literária da época, sugeriu que o criador literário precisa tornar-se vidente. Tornar-se vidente através de um longo, imenso e racional desregramento de todos os sentidos.

“MANTER-SE ATIVO, NÃO DESISTIR,
ATÉ QUE SURJA UMA IDÉIA IDEAL”

Rimbaud, presumo, estava certo. Não adianta o criador literário se tornar uma espécie de burocrata da criatividade. Seria um paradoxo, um contrasenso, uma pessoa aspirante ao texto literário, achar que se programar para escrever duas ou três horas por dia, fará dela um bom escritor. Nessas condições de passividade, a idéia ideal pode até surgir, mas não terá experiência emocional pertinente para desenvolver-se a contento.

Os textos literários que valem este nome não foram escritos por funcionários públicos das Musas da literatura. As Musas, creio, não cobram do criador literário cartão de ponto no treino dessa atividade. A regra número 2 de Poia não é, também, uma atitude pertinente ao exercício heurístico literário.

Soa bonito mas poderá não funcionar. Uma idéia pode ser perfeitamente lógica e estar errada. Se membros de um grupo aspirante ao favorecimento das Musas, reunirem-se num bar ou em um evento festivo e começarem a beber e trocar idéias, elas surgirão às centenas, claras, raras, magníficas.

Passados os momentos da etílica excitação, o aspirante literário posicionado à mesa em frente ao papel em branco, à máquina de escrever ou ao monitor do micro, o que vai redigir, 99% das vezes, será plágio, texto inconsistente ou manifestações de tendências neuróticas sublimadas. Literatura não é clausura, e longe está de ser carnaval.

“Condenados pelo vício” (Barfly), do romancista norte-americano Bukovsky, conta a história de um escritor que busca contato mais íntimo com as Musas da inspiração em caráter “full-time”, na perene boêmia. Para ele era sempre noite, a regra única da convivência estava na ausência de convenções. Esse sortilégio literário à Rimbaud, é uma fórmula um tanto quanto mais auto-destrutiva que outras, mas em termos heurísticos funcionou para o escritor em pauta.

Os agentes literários solicitavam mais textos. Uma mulher rica e bonita dispunha-se a financiar a noctividade de seu sistema de gerar tensões heurísticas, ofereceu-lhe uma senhora infra de mordomias, mas ele saiu dela alegando que a generosidade da oferta, a proteção dourada de uma gaiola cinco estrelas, tiraria dele o ímpeto criativo.

O escritor do filme e do livro de Bukowsky é o antípoda do que as empresas querem de seus burocratas. Seu marketing pessoal está longe de identificar-se com a aparência solícita, elogiosa e beija-mãos de pessoas que se travestem de autores, ao buscar acontecer no mercado editorial, exercitando atitudes de burocratas da criação literária.

É um contra-senso, um paradoxo. Inexistem e inexistirão executivos de empresa da criação literária. Em outras ciências e artes sim, não na Literatura. É possível que, no mundo editorial, esteja mais próximo de acontecer um autor modelo bukovskiano do que um tipo beija-mãos fantasiado de escritor. Literatura não é carnaval.

No final do livro “Como Resolver Problemas” (matemáticos), o autor receita a seguinte série de procedimentos para que se tenha êxito numa tarefa na área de exatas: Compreensão conceitual do problema. 2) Elaboração do plano de solução. 3) Execução do plano. 4) Estudo da solução obtida.

Em Heurística a experiência anterior é vital ao procedimento criativo, mas não pode nem deve ser considerada única na estrutura de criação do raciocínio. Problemas no estudo de ciências exatas são diferentes dos que envolvem atividade criativa no campo experimental da literatura. A base pensante, psicológica, da Heurística: o raciocínio criador seletivo.

Ashby, estudioso inglês de Cibernética, define máquina inteligente por sistema que usa e transforma uma informação de modo a lograr alto grau de seleção adequada. Segundo ele, inteligência é escolha de uma forma de ação em meio a um conjunto de atuação pertencente a determinado sistema.

Como seletivar os meios de ação para se proceder a escolha? O sistema psi do indivíduo deve poder estar apto a fazer a escolha. É esse mecanismo íntimo, interior, que caracteriza a ação heurística.
A seletividade ideal do raciocínio estrutura o método de formulação de um novo sistema perceptivo de adaptação, convivência e atuação. Esse novo sistema perceptivo e de relacionamento interpessoal, não apenas aproveita-se das facilidades e da seleção dos esquemas previamente em uso, vai mais longe, cria um novo esquema. Busca exercitar uma interação nova. O que é muito difícil, desde que, num mundo de percepção burocratizada, qualquer modelo não-burocrático é considerado inconveniente.

No campo da literatura, uma pessoa que deseja sobressair-se usando os meios conhecidos e aceitos de paparicagem e reverência a escritores consagrados por premiações e, por extensão, a editores, visando obter apoio institucional para suas obras, está simplesmente usando a inteligência institucionalizada dos esquemas anteriormente selecionados. Não está criando nada novo. Se a obra de tal suposto escritor fosse, de alguma forma, uma inovação literária, não precisaria usar de artifícios burocráticos.

O suposto autor que esteja exercitando desta forma um projeto pessoal de escrever, compreenderá, mais cedo ou mais tarde, que está faltando um certo grau subjetivo de seletividade pertinente. A partir de tal grau, estaria apto à criação de uma obra literária que fosse produto de uma nova afirmação, sem precisar recorrer à metodologia anterior.

Na pesquisa cibernética, a idéia de seleção se fundamenta na estatística da interpretação do raciocínio. Raciocínio = escolha seletiva da ação nova, fora dos padrões conhecidos e divulgados pelas soluções anteriores.

Qual o mecanismo que poderá ajudar o homem e a máquina a encontrar soluções inusitadas? No homem, um grau mais alto de intimidade com a estrutura ainda desconhecida do cérebro, que tantas vezes, por mais que a pessoa seja reverenciada dentro de grupelhos do aplauso e da premiação fácil e mútua, pouca utilidade a mais possui do que a de separar as orelhas.

De que estímulo e reações precisa o escritor para criar pensamentos novos, que solucionem problemas complexos de criação literária? Como fazer surgir novos processo de solução, desde que o conhecimento dos já existentes, prova, inclusive do ponto de vista da gerência política e econômica da sociedade, que os processos vigentes não funcionam a contento?

COMO SURGIU O INTERESSE PELA HEURÍSTICA
(Problemas do intelecto, da criatividade, do pensamento)

A central única de processamento do intelecto da máquina, trabalha à imagem e semelhança da mente do homem, ou vice-versa? No livro “O Caminho para o Raciocínio Artificial”, Minski salienta que questões insolúveis referentes ao intelecto cibernético “pensante” da máquina, capaz de solucionar complexos problemas científicos, são conseqüência da falta de uma teoria geral do intelecto humano.

Existem regras exatas de jogo e cálculo no jogo de xadrez. Os movimentos podem ser selecionados e comparados entre si em todas as variantes de solução, ficando, lance a lance, sem sentido empregá-las na totalidade. Conseqüência desse problema surge a Heurística, método seletivo de solução de problemas, sem que se precise rever todas as variantes de solução.
No livro “Planos e Estruturas do Comportamento”, Müller, Galante e Pribran lidam com duas variantes: as sistemáticas e as heurísticas. As heurísticas são mais utilizadas para a solução de problemas atípicos, onde as associações aleatórias entre fenômenos psíquicos e objetos fazem uma ponte entre esses e a intuição.

Os meios heurísticos podem ser descritos através da linguagem matemática, mas a atividade heurística, na atual fase de desenvolvimento científico, não possui expressão matemática. Entre meio e atividade, segundo opinião de Puchkin, autor do livro “Heurística: A Ciência do Pensamento Criador”, há uma relação semelhante à que existia, no tempo de Descartes e Spinoza, entre silogismo e intuição.

Os atuais e avançados métodos matemáticos estão longe de descrever e analisar as mais complexas formas da atividade mental sapiens. Ainda não se nomeou a definição de muitas categorias e noções do problema do componente inconsciente do raciocínio criador. A Heurística, desta forma, está situada enquanto ciência do futuro.

Setores da Biofísica e da Bioquímica que pesquisam o funcionamento das células cerebrais em nível molecular, podem vir a criar métodos de estudo do enigma do raciocínio criador, usando os meios de pesquisa da Psicologia experimental e da Parapsicologia.

Ebbinhaus, psicólogo alemão, definiu a atividade intelectual na solução de problemas, enquanto tendência intermediária entre uma idéia fixa e uma mutação de idéias. Ambos estes componentes constituem estados patológicos conhecidos em Psiquiatria.

Em toda mente sapiens há uma idéia central que exerce influência sobre as demais. É uma potencialidade voluntária do raciocínio, determina e comanda os fluxos associativos, impedindo que tal idéia central seja diluída. Ainda não se descobriu porque uma idéia comanda as demais. Acredita-se que isto só acontece com uma idéia objetiva, que dirige a atividade psi de uma pessoa.

O “labirinto de Torndike” fornece uma pista. Após posicionado dentro de uma jaula, um felino doméstico sente-se inquieto, busca a todo custo sair. O comportamento desordenado de tentativa e erro substituiu por uma série de movimento seletivos que conduziam à saída. Depois de descobertos um cordão e um nó, com uma pata o animalzinho pressionou o nó e com a boca puxou o cordão, a porta se abriu e ele alimentou-se. Após algumas tentativas, a seleção conduziu ao êxito.

A solução pode ser simples em Literatura? Os amadores platônicos das Musas que estão enjaulados no labirinto da observação do processo criativo de outros autores, trabalhando seus textos com o objetivo de vê-los, um dia, publicados. . . Convenhamos: para um deles esse dia chegou. O livro está nas livrarias.

Para surpresa do autor, um ano depois a editora informa que o livro que ele imaginava ser uma jóia rara de ficção, encontrou uma “meia dúzia” de quinhentos leitores. Ele que pensava sair do labirinto autoral e editorial, agora fica sabendo que o buraco da urna de leitores é mais embaixo.

O QUE FAZ ELE, AUTOR?

Vamos considerar uma resposta simples, seletiva: Se não é sustentado por alguém, vai ter de ir à luta para buscar outro ganha-pão. Se é dependente da mulher, da família ou de alguma aposentadoria precoce, é possível que tenha gás para tentar outra vez. Se tem ou não talento, a patota de conhecidos e curiosos que comprou os quinhentos exemplares vai fazer média pelo telefone. Se seu desconfiômetro não funciona a contento, vai acreditar nas loas. Se a vontade for forte acreditará que, da próxima vez, se escrever outro livro, deverá considerar a possibilidade de atingir um mercado mais amplo.

Se for realista, vai logo pensar em outro editor. Se for alienado, vai acreditar naquele vizinho, que acha ele um autor muito promissor. Se fizer uma autocrítica, vai aprender com os erros e talvez escreva algo melhor e/ou mais popular. Se se considera o bom do pedaço, o pavão da zona, vai prosseguir satisfeito com o aplauso da patota. Se tiver ímpetos criativos, poderá crer em vir a alcançar maior intimidade com as Musas.

O jogo literário heurístico é uma espécie de xadrez. O autor pode chegar a manter-se numa situação mental, interior e externa, na qual não encontra motivações para criar e divulgar textos. Nada refresca. A conjuntura de dificuldades fortalece a paranóia. Com raras exceções, todos parecem estar interessados apenas em futilidades, ou em autopromoção. Nas patotas, um romance de um autor que não tem carteirinha, vale pouco, por mais méritos literários que tenha.

Pessoalmente, conheço um “autor” em São Paulo, que escreveu uma rápida resenha sobre um livro de ficção de um Autor, e, tempos depois, escreveu um livro sobre autores de ficção científica, ignorando completamente o Autor em questão, simplesmente porque este havia criticado comportamentos pouco éticos do mesmo (sua patota), em um evento de ficção científica. A falta de ética do mesmo, “autor” se confirmou outra vez, quando ele “esqueceu” completamente um livro de FC do Autor que havia elogiado, em seu livro sobre autores.

Felizmente nelas, patotas, de quando em vez, para temperar a mediocridade ambiente, há alguém que mostra sinais de vida e reage aos mecanismos paralisantes, autofágicos e pouco éticos. A patota faz questão de permanecer imune ao reconhecimento do talento literário de quem não estiver fazendo parte da corrente pra frente do tititi tatibitate que promove. Entre seus membros.

Todas estas variantes de informações fazem parte da dinâmica do jogo. O jogo literário, da mesma forma que o de xadrez, possui muitas variantes de lances. Ambos são jogados, ao mesmo tempo, num tabuleiro objetivo e subjetivo. Falemos do tabuleiro de 64 casas, 32 peças, com certo número de combinações possíveis: 10 elevado à 120ª potência. Este jogo, considerado pedra de toque da modelação do raciocínio, foi estudado por Binet, psicólogo francês autor do livro “Psicologia dos Grandes Calculadores e Jogadores de Xadrez”. O parágrafo a seguir é dele:

“Se possível fosse observar o interior do cérebro de um jogador de xadrez, estaríamos a observar um completo universo de sensações, imagens, idéias, emoções e paixões. Bem como o infinito turbilhonar de estados de consciência, em comparação com os quais, nossas mais pormenorizadas descrições não passam de grosseiros esquemas.”

Substitua-se os termos “jogador de xadrez” por “autor de romances” e teremos uma boa definição do que pode estar acontecendo no interior do cérebro de um escritor, com a dinâmica mental das personagens, com o enredo e as paisagens, naturais e emocionais, turbilhonando, com estados de consciências sendo alterados de acordo com a dinâmica da narrativa, a flutuação de ânimo dos e das personagens.

Não estou sugerindo que pessoas ligadas ao fazer literário sejam também bons jogadores de xadrez, mas a tese de Binet, de que é possível elucidar-se correlações entre memória e raciocínio lógico na atividade perceptiva desconexa (heurística), é aceita ainda hoje por cientistas de todas as áreas. O livro mencionado é de 1894.

Em ambos os jogos, no da literatura e no do xadrez, há a formulação do que se costuma chamar de “idéias práticas”. Elas vêm auxiliar o jogador ou o escritor, quando as disposições das peças, as variantes, num determinado momento do jogo, modificam-se de certa maneira, não de outra. Todo enxadrista conta com uma quantidade mínima dessas idéias. Elas são formuladas a partir de formações subjetivas da experiência, onde estão simultaneamente presentes a lógica e a intuição.

Antes de movimentar a peça no próximo lance, ele pratica uma série subjetiva de contralances, prevendo as melhores e mais seletivas respostas do adversário. Tais operações intuitivas e lógicas efetuadas mentalmente, prevêem os processamentos posteriores, antecipando, por vezes, 10 a 15 possíveis lances do opositor, para o qual também é indispensável o cálculo das variantes.
Por vezes é preciso abandonar-se uma idéia (não a “visão”), substituindo-a por uma nova seqüência, em pleno desenvolvimento do jogo. As alternativas, não raras vezes, são complexas. A idéia fixa, que coordena as demais idéias nos estados limites, psicopatológicos, onde, por vezes, aflora a criatividade, é denominada “visão”.

O que em literatura costuma-se denominar de Musa ou inspiração, é a percepção (“insight”), a visão, a intuição de um romance, drama, conto ou poema. É possível que, para acontecer no papel ou no monitor, ela tenha de vir carregada de emoção, de vida, da força do estilo, da vontade, do ímpeto narrativo. Para Pound “bons escritores são os que sabem manter a linguagem eficiente”. Mantê-la eficiente também do ponto de vista dos leitores.

Cada autor que tenha tais qualidades presentes no texto (as de manter a linguagem eficiente) as páginas vão revelar beleza e verdade. O momento maior da atividade literária, é o romance, quando lido ou visto (através de outra linguagem, cinema ou teatro) por leitores e/ou espectadores espiritualmente gratificados pela ficção: para eles se escreve, presumo. Escrever um romance não é, definitivamente, uma atividade de banheiro. Os descascadores de banana (bajuladores de patota, intelectuais de coquetel, organizadores de “port-folios”, colaboradores contumazes de fanzines) mais cedo ou mais tarde, vão tirar o cavalo da chuva quando, finalmente, descobrirem isto.

Em xadrez e em literatura, posições idênticas, na memória heurística do jogador, podem ou não conduzir à vitória, ou à redação de um bom romance. Isto não quer dizer que a visão inicial, a percepção das variantes não estava correta, mas que, em certa seqüência de lances, não pôde ser idealmente desenvolvida. O êxito é a meta que nem sempre pode ser alcançada no xadrez e na literatura.

Em ambos existem segmentos variacionais. Não é um jogo fácil a obra literária ideal, mesmo com relação a padrões pouco exigentes, de autores fixados em determinado modelo fechado de personagem e ação narrativa. O estudo da ação heurística permite o conhecimento de algumas constantes da atividade intelectual sapiens. E da criativa.

A Cibernética nasceu e cresceu a partir dos estudos da teoria dos processos heurísticos, base dos processos informativos de solução dos problemas de programação. A mente sapiens e a CPU do computador usam a mesma estrutura simbólica na resolução de problemas.

A teoria da atividade mental sapiens é, simultaneamente, a teoria de funcionamento dos computadores. É uma teoria do comportamento. Na mente sapiens há a possibilidade de criação, de transformação heurística interna da informação (criatividade).

Em 2001, Uma Odisséia no Espaço, o computador de bordo, Hall, “sente”, pensa, conversa, é paranóico, e quase chora ao ser desligado, ocasião em que implora ao astronauta que não o desligue. Alega que andou realmente meio trôpego, mas que agora está tudo bem, voltou ao normal. À proporção que vai sendo desativado, regride, como qualquer ser humano pode regredir, à fases mais anteriores do “psiquismo”, chegando a cantar uma canção infantil que havia “aprendido” do programador.

VÁ À LUTA: A BELEZA E A VERDADE DO TALENTO
NÃO VIRÃO PELAS VIAS INDIRETAS DO CONHECIMENTO

Em literatura, a memória emocional do autor, parece ter grande influência no processo de criação. A diferença entre autor criativo e autor de plágios literários, está em que o primeiro escreve a partir do exercício da experiência social e emocional, enquanto o segundo escreve apenas a partir de uma fonte indireta de sensações, provenientes das obras de terceiros. Talvez tenha sido sobre isto que Da Vince quis referir-se quando afirmou: “Quem pode ir à Fonte não vai à água”. Ou Parker quando disse que “o escritor tem de estar consciente da vida à sua volta”.

Um autor original, presumo, constrói uma seqüência de situações, de modo a fazer com que suas personagens percorram a travessia do labirinto das histórias a partir da iniciativa de uma vivência pessoal fora dos padrões “frios” (indiretos) de obter informações. Padrões “frios” são leitura e visualização de livros e filmes. Em outras palavras: gozar com a banana dos outros.

Talvez seja isto que queira dizer o personagem Mulder da série Arquivo X, quando fala a Scully a frase que serve de slogan da série: “A verdade está lá fora”. A verdade e a beleza da experiência, sem a proteção das estruturas culturais (tipo patota) que fazem da maioria das pessoas, burocratas dos currículos, familiar e escolar, padronizados. Tais pessoas, até quando viajam, obedecem a um roteiro turístico com horários estabelecidos à cartão de ponto.

De onde poderão surgir histórias inéditas e novas estratégias de narração? De uma (falta de) imaginação viciada nas sensações indiretas, através da leitura de terceiros e da contemplação visual de imagens cinematográficas e tvvisivas? Nietzsche advertia que a leitura é essencial à formação, mas que chega um certo momento em que ela se torna prejudicial à imaginação do leitor, enquanto mero receptáculo, incapaz de ser ou ter, uma idéia que seja, sua, original.

Céline dizia ter uma certa superioridade sobre as pessoas com quem convivia que eram, no final das contas, após caído o véu da aparência, podres, já que estavam sempre fazendo, domesticadamente, as coisas que qualquer animal de estimação faz: beber, comer, arrotar, fazer amor, ir ao banheiro, apenas um monte de coisas que deixam um cara vazio e tolerante. Um pai de família. Um batedor de cartão de ponto.

O cérebro sapiens é um substrato material do processo heurístico, criador. Precisa de experiência ampla, direta (“A verdade está lá fora”), não-convencional. Não fosse desta forma, todo projeto de autor que tivesse tempo disponível para ficar lendo, espairecendo, escrevendo e reproduzindo os estilos narrativos de terceiros, poderia chegar a criar obra inédita a partir do nada emocional, ou a partir de “emoções” domésticas, esse arquivo vazio da inexperiência e do narcisismo.

Ora, se a matéria prima do escritor é a vida emocional profunda, ampla, atual, de suas e de seus personagens, ele deve se habilitar a pagar um preço por ela. O preço de sair debaixo da saia do esquema protetor, qualquer que seja, que lhe paga as contas, para arriscar-se fora do contato do cobertor quentinho e convidativo, mas inapropriado ao criador. Ele deve ter, presumo, a coragem de escolher entre ser um criador ou um burocrata existencial que escreve estórias “déjà-vu”.
Inexiste nas universidades, inclusive nas do 1º Mundo, Faculdade de Heurística, um currículum que habilite um aluno à tarefa de escrever boa ficção. Há a de Letras, mas essa, segundo opinião de algumas pessoas de meu conhecimento, esmaga os possíveis talentos literários, submergindo-os no estudo burocratizado da narrativa ficcional.

O componente inconsciente da ficção, do raciocínio criador, não surge, acredito, do vazio emocional, das estruturas de aprendizado fechadas (“Obra Aberta” Umberto Eco). Pode alguém ser um escritor, ainda que menor, se não possui nenhuma vida própria fora do esquema curricular da família, da escola, da igrejinha da patota?

Sem trabalho emocional pertinente, presumo que seja impossível que surjam, nuas, belas, dadivosas, voluptuosas, pornôs, recatadas ou viçosas, as Musas da inspiração. Como a parte do trabalho heurístico, criativo, inconsciente, pode acontecer, se o projeto de vida do escritor não confirmar sua veracidade?

Podem, beleza e verdade ficcionais, surgir de um leitor compulsivo de obras de terceiros, sem a presença da paixão pelas pessoas e personagens enquanto experiência da realidade? Antônio Cândido, em “A Personagem do Romance”, citando Forster, estabelece que a personagem fictícia deve lembrar um ser vivo, manter certas relações com a realidade do mundo, participar da ação e da sensibilidade da vida. Deve expor os motivos da ação dos seres, estabelecer e ilustrar o jogo das causas, descendo às profundidades reveladoras do espírito.

Conheço projetos de autores identificados com a quantidade, não criam, copiam, de debaixo da guarita aquecida e confortável de seus cobertores, personagens verossímeis, dentro de uma estrutura organizada e coerente, mas plasmada no plágio de um gênero literário fechado, com personagens caricatos, aproveitando-se da realidade ficcional de autores terceiros. E querem ser tidos e havidos por originais.

AS MÔNADAS, AS MUSAS E AS OUTRAS “MENINGES”

Pode haver emoção sem vida emocional? Pode uma árvore nascer e crescer no jardim de sua mente, casualmente, sem que você se tenha dedicado ao seu plantio e desenvolvimento? A emoção de ter vida e luz próprias, e poder doá-las a personagens da obra ficcional, deve e pode ser, presumo, o princípio interno de realidade que motiva a criação e o interesse de um amplo segmento de leitores. Este mistério ficcional, vida e luz próprias, beleza e verdade, é a essência de que é feita a arte e a ciência da ficção. Não apenas da ficção realista. Da científica também.

Kant denominava “obscuras” as idéias inconscientes, ao resumir em sua “Antropologia” a interpretação de Locke (não o Locke, personagem de “Lost”) da atividade inconsciente. As idéias conscientes ele as denominava “claras”. Fechner, ao estudar a Filosofia de Leibnitz, interpretava as idéias inconscientes enquanto produto das “mônadas”, microscópicas entidades espirituais, responsáveis pela atividade inconsciente da alma do homem e do mundo. Evidente que elas, mônadas, saíram logo de moda. E argumentação. Não tinham base científica.

As opiniões e pesquisas de Pierre Janet são consideradas ultrapassadas. Ele explicava a atividade inconsciente da mente sapiens pelo metabolismo de emanações fosfóricas entre determinados centros do córtex e das meninges cerebrais. No livro “Automatismo Psíquico” publicou os resultados de uma pesquisa com pacientes hipnotizados que, simultaneamente, faziam um relato verbal de suas vidas, enquanto multiplicavam com as mãos, números de três por dois dígitos, sem olhar para o papel e sem concentração aparente.

Ao confirmarem os resultados dessa experiência, cientistas definiram a mente enquanto atividade psíquica informatizada e informativa, mais do que apenas centro de atividade fisiológica consciente. A atitude heurística inconsciente é uma qualidade superior da mente, ao contrário do que sugere o subtítulo do livro de Janet: “Formas Inferiores da Atividade Psíquica do Homem”.

“Tio” Freud explicava o surgimento dessa atividade inconsciente através da repressão dos instintos, devido à necessidade do Homo sapiens, na aurora da civilização, ter de viver em grupo visando a mútua proteção contra o ataque de animais ferozes e/ou de outros grupos de seus semelhantes. As manifestações agressivas de natureza instintiva, sexual, tornariam impossível uma convivência gregária. Civilizada. Sentimentos, pensamentos, emoções característicos do comportamento criativo sapiens, ainda agora, no limiar do 3º Milênio, seriam produtos dessa força reprimida. Agressiva.

A teoria da História afirma que o homem originou-se de mutações do animal gregário de rebanho, o macaco, sendo, desde a aurora da espécie, um ser social que vivia em grupos para satisfazer necessidades de alimentação, habitação, reprodução e vestuário. A mim parece claro que ambas as teorias não se excluem. O animal de rebanho convive com instintos reprimidos, mas raros membros do grupo os transformam em arte.

A afirmação de “tio” Sigmund de que qualquer atividade de criação, científica ou artística, é resultado da sublimação do impulso sexual da libido, não revela a mecânica da ação heurística inconsciente, mas refresca as tentativas de se compreender a força que motiva a capacidade do cérebro a criar modelos interpretativos, ficcionais, até então inexistentes na realidade.

Esse modelo de intervenção criativa da mente sapiens na transformação da realidade, na criação de teorias e na prática das invenções científicas e literárias, pode ser produto de, em certas épocas, e através de certos métodos, interferência extraterrena. Um dos segmentos desta teoria está desenvolvido no texto do romance Adão & Eva Na Nova Era (PsycheCity).

Acredito que ninguém, que tenha um mínimo de cultura literária negue, em sã consciência, que tais intervenções existiram realmente, desde que, os livros ditos sagrados, tais como os pergaminhos do Pentateuco, O Livro de Mórmon, O Mahabharata, O Novo Testamento, O Livro dos Mortos, O Athrawon (Os Mestres dos Celtas), O Rigveda, O Atharvaveda, O Popol Vuh, O Corão, O Torah, A Epopéia de Gilgamesh, para não mencionar os habitantes do Monte Olimpo e os do Panteão grego, fornecem pistas sobre a origem sapiens.

“POR MAIS QUE TUDO MUDE
TUDO CONTINUA IGUAL”

Digamos que no limiar do novo milênio a atividade heurística literária, estará ligada a uma nova modelação mental, à condições seletivas neo-elaboradas à partir da necessidade de incluir no processo reflexivo, neo-informatizado (globalizado) da mente, um modelo de criação heurístico que, em literatura, possa ajudar às novas gerações, a se adaptar aos novos padrões perceptivos que mal são compreendidos e ordenados por seus genitores.

Os novos autores (por favor, não estou reportando-me à idade cronológica), devem e podem inovar a narrativa formal, ou a invenção dos textos literários, a partir de um componente essencial: a experiência de vida não burocrática, informal.

Quando uma criança freqüenta o pré-primário, ela está abrindo nichos propícios, no espaço neural da mente, que são as chaves para a entrada de conhecimentos posteriores: primário, secundário, a níveis acadêmico e autodidático, superiores.

Como pode um autor criar nichos mentais/emocionais propícios à seletividade da criação literária, se esta exige mais, muito mais, para ser exercitada, do que é capaz de ensinar a academia do ensino burocratizado?

A vida das e dos personagens sugere conhecimento autoral enquanto motivação de suas existências. Em não sendo desta forma, o autor, apenas reproduzirá modelos humanos, de paisagens emocionais e narrativas, anteriormente presentes na literatura.

Um autor, no limiar da segunda década do 3º Milênio, precisa, presumo, sentir do fundo do coração, a necessidade de ter uma experiência de vida informal, fora do pré-primário existencial das academias, dos assentos das carteiras das faculdades, dos discursos semiológicos apatéticos. O romance Adão & Eva Na Nova Era (PsycheCity) sugere um caminho para se sair deste impasse acadêmico e exercitar-se no aprendizado da emoção da experiência do conhecimento: da Fonte e da água, simultaneamente.

O autor precisa aprender a redigir páginas ainda não redigidas. O que não falta atualmente, inclusive no mundo literário da ficção científica, são autores prolíficos em redundância literária, a reivindicarem uma estética narrativa com personagens de segunda e terceira mãos.

VINTE DÉCADAS EM NOVE

Algum ouvinte ou leitor mais atento poderá pensar, de maneira pertinente, indagando de si para consigo, que estou defendendo uma utopia. Conseguir um distanciamento da realidade apto a gerar obras literárias inéditas, com personagens que orientem um posicionamento mental mais adequado às leis subjetivas mal percebidas pelo nível consciente da realidade mental atual das pessoas, é uma tarefa messiânica. Precisariam tais autores, de uma vida de cento e cinqüenta a duzentas primaveras, quando se sabe que uma vida sapiens/demens ativa, longa, dura 90 anos, se tanto.

Que modelo de realidade pode agenciar um autor para obter a credencial impossível de, para escrever literatura pertinente, numa existência de 90 anos, gerenciar heuristicamente conhecimentos adquiríveis apenas em um século e meio a dois séculos? Uma primeira resposta para esta pergunta: Viver uma existência sapiens adquirindo conhecimentos, simultaneamente, nos universos paralelos da formal e da informalidade (da Fonte e da Água).

A coragem de vivenciar este paradoxo, presumo, pode habilitar uma pessoa que adquiriu conhecimentos formais, a questioná-los, simultaneamente, a uma experiência de vida não identificada com os modelos burocráticos do aprendizado acadêmico. Você é capaz de viver ao mesmo tempo sua vidinha e a vida paralela, virtual, que há em você? Você acha fácil ser você, ao mesmo tempo em que partilha consigo mesmo, e com outras pessoas, as existências virtuais que normalmente não são sequer subjetivadas, e muito menos existencializadas?

Um projeto de autor pode até compreender a diversidade de personagens que existem em seu universo mental, mas isto não basta. Ele terá de ter a coragem de enfrentar a situação problemática de ter de migrar para fora dos limites das cobertas quentinhas da caminha dentro do quartinho, de sair do mundinho multimídia, do convíviozinho domesticado com a mulherzinha, o filhinho, o multicanal, o vídeo e a tvvisão. Ou seja: saltar fora das mordomias da sala de jantar... Mas as pessoas da sala de jantar/São as pessoas da sala de jantar/Mas as pessoas...

Um Autor, presumo, deve saber transmitir emoções autênticas: alegria, tristeza, dor, beleza, regozijo, inteligência, apatia, burrice, sagacidade, cretinice, caráter dele, reais, não sentimentos de segunda e terceira mãos. A vida de suas e de seus personagens deve poder sugerir modelos verdadeiros, de gente de carne, osso, sangue, mergulhando fundo não na teoria apenas, mas também e principalmente, na prática da sensibilidade, dos sentidos, dos problemas, das soluções possíveis.

A fórmula de Faulkner para uma pessoa interessada em literatura vir a se tornar romancista é simples de enunciar mas não tão simples de praticar: 99% de talento, 99% de disciplina e 99% de trabalho. Para ele, a única responsabilidade do escritor é escrever. “O resto, vai de água abaixo: honra, orgulho, decência, segurança, felicidade, tudo, para que o livro seja escrito.”

São suas as frases: “Se um escritor tiver de roubar a mãe, não hesitará. Ode a uma urna grega, de Keats, vale mais do que qualquer punhado de velhas. A arte do romance não tem nada a ver com paz e alegria.”

Um Autor deve ser, presumo, um pouco messiânico, correr o risco de ser visto e havido por louco, pirado, bêbado, talvez drogado, trabalhador e vagabundo, certinho e fora dos padrões, ignorante, formal e informal, vivenciar suas próprias personagens de ficção, sua própria criação emocional, os desdobramentos, caricaturais ou não, de sua vida.

Se ousar ser desta forma, verá que o distanciamento da bitola que outras pessoas representam, com maneiras de ser, por vezes, acadêmicas e burocráticas, à cartão de ponto, são apenas alternativas de vida, cômodas, mas inapropriadas para um autor de autênticos textos literários.

Um autor que queira escrever para novas gerações, não deve temer os questionamentos e as críticas dos que precisam se sentir sempre iguais. Se temer ser diferente, como poderá ter uma visão, senão padronizada, de si mesmo, do sapiens rebanho? Um autor que vale este nome não será mais uma cabeça domesticada da horda, fiel ao pastor ou ao bispo da igrejinha. Da patota.

A coragem de ser diferente, estigmatizado e alvo de críticas, fará com que fique sabendo o que significa manter-se firme no propósito alquímico de realizar a grande obra: espiritualizar-se em níveis adequados de percepção é, talvez, uma exigência do talento. Nem só de loas vive o homem, nem da proteção quentinha do cobertor listrado. Sobre o sofá aquecido da sala de jantar. Ou da caminha.

A meta do escritor atual de criar um romance nos dias de agora, onde as pessoas são transformadas em meras extensões de interesses consumistas, é um desafio, uma quase impossibilidade, um Santo Gral de difícil conquista. Vejo a literatura como obra heurística, subjetiva, objetiva e mágica, que supera os efeitos paralisantes de uma vida média sapiens. E de suas rotinas.

Conseguir a virtual e impossível experiência mental de dois séculos, no período mediano de vida, manterá o escritor tão jovem quanto os que, cronologicamente, atingiram a puberdade. A coragem de navegar pelos mundos da subjetividade inconsciente e neles não se perder, selecionar o que interessa enquanto material criativo, é um privilégio considerável. Você, projeto de autor, vai correr os riscos? Então saia da saia justa dos esquemas “criativos” da patotinha.

A tarefa de entrosar conflitos, interesses e necessidades, reais e virtuais, de pessoas ou grupos, em conjunturas narrativas as mais diversas, não pode ser realizada por autor que se contenta em vivenciar apenas indiretamente tais realidades.

O truque de Forster para transformar uma pessoa real numa personagem de ficção é lembrar-se dela enquanto descreve por completo suas características. “Fico então com 2/3 de um ser humano e me ponho a trabalhar”.

Simenon acreditava que o artista não poderia jamais ser feliz. “Se um escritor tem um ímpeto de se tornar autor, é porque necessita encontrar a si mesmo através de seus escritos. Qualquer pessoa que pode fazer outra coisa, deve fazer outra coisa. Escrever não é uma profissão, é uma vocação de infelicidade.” Esta afirmação é um tanto quanto radical. Mas possui um quê inquestionável de verdade. Ou, pelo menos, de advertência. Criar não é uma tarefa para expoentes de patotas. Em busca de reconhecimento e paluso.

Não apenas olhar para dentro de si mesmo, mas também para dentro dos outros com a experiência que tem de si mesmo. O romancista tem de mostrar o homem como ele é, e não o homem da propaganda. Não me refiro apenas à propaganda política. Refiro-me ao homem estudado (acadêmico) da sala de jantar, um homem que não tem nada a ver com que o homem realmente é.
Repete-se a dica de Rimbaud: “O Poeta Torna-se Vidente Através De Um Longo, Imenso E Racional Desregramento De Todos Os Sentidos”. Os sentidos do intelectual de debaixo do cobertor, com vidinha regrada, revista e medida, é insuficiente para despertar a existência dinâmica dos “órgãos fisiológicos” do sistema nervoso central, responsáveis pelo processo criativo de descoberta heurística, multidisciplinar, multiinterativo, da mente.

Para quem quer uma dica de romance onde o rompimento com os modelos existenciais de rotina poderá provocar uma mudança propícia nos esquemas fechados de mundividência (visão do mundo), A MOCHILEIRA (Thundra), pode ser lido também enquanto um romance e ao mesmo tempo uma homenagem ao poeta simbolista autor de “Uma Estação no Inferno” e “Iluminações”. Para bom leitor, meia palavra basta.

“ELETRÔNICA CÓSMICA A NÍVEL QUÂNTICO”

Os fisiologistas Lieontiev e Urhtomsky chamaram a atenção para a existência de peculiares “órgãos fisiológicos do sistema nervoso”. Eles são um fator central dominante que possui a propriedade de catalisar todos os estímulos que atuam nos órgãos sensórios. Através deles a mente sapiens vive e convive com todos os acontecimentos e fenômenos perceptivos. Quem deseja aprender com, e sobre, os processos criativos, precisa se adaptar à uma vidência desses processos criativos fora do jargão estritamente “científico” e aceito pelas teorias acadêmicas.

Esses “órgãos fisiológicos” são centros nervosos de alto estímulo, que só podem ser usados em condições especiais de sobrevivência. Eles estão localizados em todas as áreas cerebrais, ligados entre si, disponíveis para a solução de problemas científicos e/ou literários. Estes centros nervosos formam um único centro dinâmico, diferente dos demais estáticos órgãos anatômicos. A nova ciência fisiológica denomina órgão, não apenas a algo morfológico, com propriedades estáticas, mas a um conjunto de forças que conduz a idênticos resultados.

No livro “Problemas do Desenvolvimento da Psique”, Lieontiev mostra que o centro nervoso do cérebro sapiens e de outros animais, é um ímã que atrai para si e seleciona, estímulos não diretamente ligados a determinado problema de criação (heurístico). Este modo aleatório de seleção no mundo científico é conhecido pelo nome de “maçã de Newton”.

É algo semelhante ao que acontece na mente de cães farejadores que prevêem a localização futura do animal perseguido, e correm para ela numa direção e velocidade tais, que permite encontrá-lo e interceptá-lo em sua trajetória. O faro é apenas um dos elementos dessa propriedade explicada pela noção fisiológica do reflexo condicionado. Sabe-se que, para a formação deste, é indispensável certa quantidade mínima de reflexos incondicionados.

Quando o animal perseguido conta com propriedades mentais instintivas superiores aos perseguidores, ele cria o que em pesquisa científica denomina-se “ilusão de orientação”. Os perseguidores dirigem-se a locais onde o animal deveria certamente estar, mas nada encontram. A patota que persegue desorienta-se. O modelo dinâmico, heurístico, informativo, do animal vítima do instinto persecutório de seus perseguidores, prevê toda a rancorosa, covarde e gratuita sanha da matilha (da patota). E ela fica a ver navios. Como diria Mário Quintana em seu poeminha: 'Todos os que aí estão/Atravancando o meu caminho/Eles passarão.../Eu passarinho!' A patota, enquanto busca um cão, não vê a águia. Que não é, exatamente, um passarinho.

Por vezes os fenômenos heurísticos acontecem para além das possibilidades e limites da consciência, simplesmente porque não correspondem aos fatos conhecidos pela Psicologia e pela Neuropatologia. Há uma complexa atividade mental que não se relaciona com a fala. Há um murmurar psi do qual a mente sapiens/demens desconhece a Fonte. A locução por hipnose e os fenômenos da escrita automática são exemplos. A exemplos de personagens do livro mencionado Adão & Eva Na Nova Era (PsycheCity).

Os anatomistas afirmam que cada sentido está ligado aos respectivos campos. Perturbações e ausência de funções, devido a lesões, atestam isso. A atual pesquisa demonstra que é igualmente verdadeiro que estes campos não são delimitados, que a modelação cerebral não difere do esquema cibernético, funciona como um processo intracortical de regulação.

A atividade consciente é conseqüência da ação recíproca do regulador do córtex e dos modelos informativos do cérebro. Esse modelo regulador, estruturado para a solução de problemas domésticos, conscientes, burocráticos, pode funcionar de forma autônoma, fora do controle do regulador consciente. Quando isto acontece, está a atuar a atividade heurística inconsciente. E o processo de criação literário precisa usar o subconsciente enquanto mediador entre percepção da existência e criação alternativa dela. Existência.

Inexistem dados experimentais que expliquem completamente como funciona a estrutura desta linguagem especial, incomum, heurística, inconsciente, intra e, possivelmente, paranormal, extracortical. Não existem métodos para treinamento da capacidade de apreensão das mais essenciais correlações que constituem, no jogo de xadrez, e na criação de um romance, a característica dos grandes mestres da técnica do jogo, da técnica e da arte de escrever.

O cérebro é um órgão de auto-regulação, segundo a opinião do cientista Nobel em Física, Pauli, que descobriu o “princípio quântico de exclusão”, o inconsciente expande-se para além da terapêutica, como se fosse um “universo em expansão”: um complexo sistema cibernético ao modo de uma “eletrônica cósmica a nível quântico”. A que níveis de excelência poderia atingir uma mente, pessoal e coletiva, que não estivesse motivada a ser exclusivamente dedicada à galera de torcedores de jogos de futebol. E tocadores de vuvuzelas.

Segundo as mais atuais teorias, algum princípio universal desconhecido das pesquisas sobre o cérebro, motiva a mente inconsciente a buscar e encontrar num algures indeterminado, soluções para complexos problemas científicos e literários. O romance A MOCHILEIRA (Thundra) detém-se no uso quotidiano de algumas destas teorias, mostrando como funcionam, na prática, em ocasiões de reuniões de grupos.

As pesquisas mais atuais indicam a inexistência de força específica que, de fora da mente, contribui para o raciocínio heurístico. Tais pesquisas confirmam a auto-regulação da atividade do córtex que indica ser o raciocínio uma fusão da intenção do regulador da reflexão, ou modelação, com as condições de solução do problema: no tabuleiro do xadrez, no papel ou no monitor em branco da literatura.

O dirigido e o dirigente são inseparáveis. O processo heurístico de raciocínio e criação não teria solução através da contribuição de um hipotético agente externo, mas num modelo mental, de nível elevado, que gerencia a atividade heurística na direção lógica certa. O enigma do componente inconsciente neste processo prossegue sem solução “burocrática”, de pesquisa laboratorial.

São diferentes as atividades mentais do ser humano e as atividades de uma CPU de computador. O homem pode ver-se diante de situações nas quais não possui nenhuma experiência anterior. Quando isso acontece só resta tatear, mais ou menos às cegas, em busca de experiências que conduzam à solução. Por vezes soluções holísticas. O homem é um ser indivisível (inclusive de seus mistérios). Não pode ser compreendido a partir de uma análise compartimentada de suas diversas partes. De seu processo. A integração globalizada (povos, culturas, métodos) exige a aplicação da teoria sistêmica, sem a qual se torna impossível ordenar a sociedade. Desenvolver a dominação sistêmica da mesma. Cada vez mais indomável e caótica.

O desenvolvimento social estruturou mecanismos de modelação e de reflexão do mundo. Não pode o homem surpreender-se numa situação em que não possa planejar, mais ou menos corretamente, a atividade. É como se pudesse contar com “algoritmos gerais de solução” de problemas.

BUTIQUE DOS SONHOS E DO TEMPO

O objetivo deste ensaio é saber como se desenvolve a atividade mental na ausência de algoritmos: o enxadrista estrutura a solução do problema durante o conhecimento das peculiaridades dos elementos de certa situação. O romancista, assim como o enxadrista, para ter êxito precisa conseguir estabelecer as principais ligações pertinentes a cada posicionamento enxadrístico/literário, dentro de um conjunto discreto de eventos.

Os elementos do evento criativo, associados de determinado modo, não mais constituem um conjunto discreto, mas um conjunto de operações que conduz à variante da solução. Quer obtenha sucesso ou insucesso, a variante escolhida é agora um conjunto de elementos para estudo. É elementar dizer que o modelo operacional-informativo, na atividade heurística que se compõe do conjunto discreto de elementos, precede o aparecimento de cada variante de solução.

O conteúdo da atividade heurística é a elaboração sucessiva de modelos operacionais informativos. A solução do problema se encontra num certo conjunto de circunstâncias que pode ou não chegar a um resultado ideal. Quanto ao enxadrista, ganhar o jogo, quanto ao escritor, o reconhecimento de que objetivos criativos foram atingidos. Na fase de elaboração do modelo, geram-se outros, a partir dos indícios úteis das noções abstratas. Nesta fase a mente sapiens e a CPU são semelhantes.

As dificuldades são elaboradas a partir de reconhecimentos interativos que conduzem à descoberta de soluções e da solução. Alguém que resolve um complexo problema, num indefinido campo de busca, reconhece, por acaso, o princípio de solução. Em ciência este princípio é denominado, tal como afirmado anteriormente, “maçã de Newton”: a queda da maçã se constitui num modelo da lei da gravidade universal. Molde de intuição, “insight”.

Em literatura há um evento semelhante, denomina-se, segundo Pound, “Parêntese Jamesiano”: A luta que se trava quando se encontra outro autor com muita experiência, para conseguir o ponto onde as duas experiências convergem sem conflito, de modo que ambos realmente saibam do que estão falando. A obscuridade não é da linguagem, mas do fato de que a outra pessoa pode não ser capaz de compreender porque se está afirmando alguma coisa. Esta é a “maçã da Newton” da literatura. A descoberta da pólvora, da gravidade universal, da solução afirmativa do “porquê” alguém está afirmando alguma coisa. Encontrando uma solução criativa (heurística) para um problema de criação literária.

Na atividade heurística das Letras, o reconhecimento não pode ser dessassociado da experiência da memória emocional do escritor. A memória não é um simples banco de dados de imagens, um nicho isolado dos demais na atividade psi. Uma prova disso: bastam um ou dois segundos para que reconheçamos a face de alguém num rosto conhecido. A imagem e reflexão fixam-se instantaneamente no nicho propício exato da memória.

O sistema nervoso sapiens funciona muitíssimo mais lentamente do que a CPU de computadores que realizam, num segundo, milhões de operações. O mecanismo de ressonância pode revelar por que e como acontece este reconhecimento instantâneo que permite a orientação do Homo sapiens/demens no mundo exterior (e no interior).

No cérebro sapiens existem milhares de modelos pertinentes do mundo exterior. No córtex deve existir um nicho que anuncia a entrada de um novo, a todos os outros modelos anteriormente armazenados. Desta forma o modelo de reconhecimento adequado ressoa. Esta instância intermediária são os “tubérculos visuais” denominados “depósitos da sensibilidade”: sinapses, dendritos, axônios, neurônios, mitocôndrios, filamentos contendo enzimas, ácido cítrico, sistemas de transporte de elétrons, garantem certos efeitos no processo metabólico. Seus centros estão em diversas partes do córtex, mas todos os componentes perceptivos alojam-se numa única unidade.

O homem é um autômato finito com uma memória finita, reage a um número finito de estímulos limitados ao volume da memória fixa e flutuante, exata e emocional. Em cibernética é considerada autômata toda instalação destinada a transformar informações entre componentes de entrada e saída de dados.

O autor é um sistema deste tipo, com o poder de criar novas formas de comportamento. Conseqüência da auto-aprendizagem, situações problemáticas são inventadas. As entradas do computador, autor, são as constantes da percepção. A CPU do autor inclui raciocínio criativo e operacional. Um princípio desconhecido, componente do raciocínio criador, presente entre as reações químicas que o constituem, permanece sem explicação lógica.

Tentar solucionar este mistério é uma tarefa científica semelhante à romântica busca do Santo Graal. Na tradução e tradição da mecânica experimental das pesquisas, estas não são consideradas como tendo um caráter realmente científico.

Ciberneticamente este problema não pode ser solucionado. A base dos atuais métodos cibernéticos pode modelar um processo de solução apenas se seu campo de busca estiver definido.

Que programa de computador vai descobrir porque Schiller punha maçãs podres na gaveta de sua mesa de trabalho para com isso favorecer a criação poética? Helmholtz subia montanhas ao entardecer. Fisher ouvia sinfonias. Proust escrevia em silêncio num quarto forrado de cortiça. Shelley brincava com barquinhos de papel na banheira; Dante sonhava, elaborou, talvez, nos sonhos, a motivação subliminar da estrutura do poema Divina Comédia; Kant deitava-se na cama sobre lençóis que ele mesmo arrumava, de um jeito especial, e ficava horas olhando a torre de Königsberg. Brahms engraxava as botas; Alex Osborn, fazia a barba para manter as idéias fluindo por mais tempo, usava uma navalha velha.

Stevenson dizia que as “Brownies” trabalhavam para ele enquanto dormia; Barrie confiava muito em “McConnachie”, dizia ser “sua metade desgovernada que escreve”; Milton apelidava de “secos”os períodos de incubação. Por vezes de madrugada despertava as filhas para ditar poesias, era cego; Henry James valorizava o “poço profundo da celebração inconsciente; Emerson meditava diante de riachos; Shakespeare denominava a incubação 'magia da imaginação que ordena as coisas desconhecidas”; Donizetti encharcava-se de café; Baudelaire fumava haxixe; Coleridge ingeria láudano; De Quincey fumava ópio; Freud injetava (e/ou cheirava?) coca; Alfred Jarry bebia éter. Sherlock Holmes parava tudo e levava Watson para um concerto, ou se dedicava a horas de violino. Einstein tocava violino ou lia Dostoievsky; Gandi tecia; Beethoven caminhava muito, com paradinhas para anotações de “insights”. Huxley, Ginsberg, Kerouack, faziam viagens lisérgicas.

Becket e Becker acreditavam ser impossível uma obra de arte vir de motivações oníricas. Para eles escrever é um ato reflexivo consciente. Deliberado. Göethe no primeiro Fausto, autor consciente, deliberado, no segundo, visionário, atemporal. O Hugo de “Os Miseráveis” flutua entre estes extremos se considerarmos a fase visionária. As antecipações de Júlio Verne, como querem alguns críticos, são produtos freudianos da sublimação de suposta homossexualidade.

A estrutura narrativa do poema sumeriano Epopéia de Gilgamés é claramente onírica, inconsciente. A mãe interpreta os sonhos dele e os do amigo Enkidu. A personagem interpreta seus sonhos e os de outra personagem. Nos poemas épicos de Homero (séc. X a.C.), há já a presença do ceticismo tão característico em autores do século XX. Na Odisséia, as possibilidades destrutivas do inconsciente se manifestam através dos sonhos de Agamenon, burlado pelo mensageiro de Júpiter.

Na Ilíada, Atena, deusa-serpente creto-minóica, epíteto Glaukopis: “Olhos de Coruja”, personifica-se nos sonhos de Nausicaa e Penélope. Em Sófocles, Ésquilo e Eurípedes, os sonhos são os signos, presságios da vida heróica e trágica, das personagens. Na dramaturgia de Shakespeare, a epopéia e a tragédia estão presentes, através da ambigüidade do mundo real, das flutuações de ânimo entre os estados de espírito das personagens. A epopéia e a tragédia são a marca registrada de sua dramaturgia.

Os sonhos, espectros e vaticínios, marcam a presença do inconsciente: Em Henrique VI, a morte do duque de Gloucester é precedida por uma visão onírica do cardeal de Winchester. Baltazar, em Romeu e Julieta sonha com a morte de seu amo após embate com outro nobre. Romeu sonha-se morto, quando os beijos da amada fazem-no voltar à vida. Em Ricardo III o personagem título tem sonhos que revelam a tenebrosa seqüência de intentos funestos.

Calpúrnia berra, por três vezes, num pesadelo: “Socorro, estão matando César”. Em Sonhos de Uma Noite de Verão, a intervenção de personagens mágicas, faz a mediação entre sonho e realidade. Em Hamlet, Macbeth e Lear, os vaticínios, as profecias, os agouros, os espectros, as visões terríficas e apavorantes, convivem com a rotina das personagens.

Novamente o inconsciente, elemento improgramável nos engenhos cibernéticos dos computadores, marca presença no engenho cibernético sapiens: a mente. O componente heurístico, a 3ª margem do rio da criatividade, ronda, misteriosa e invisível onipresença, o processo de criação dos autores. Literários.

“PERGUNTE AO PÓ”, AGAIN

Se é preciso uma experiência de vida equivalente a dois séculos para que um escritor possa estabelecer o distanciamento necessário para pensar seu tempo e suas personagens, criá-las através do convívio e das teorias acadêmicas, então estamos frente a um paradoxo: o tempo necessário e o tempo cronológico disponível para escrever textos pertinentes, visionários, e não plágios.

Nietzsche dizia que a realidade é uma ficção. No século XIX os pensadores costumavam ser otimistas. Ele era a exceção niilista. Para Baudrillard, um dos expoentes do pensamento contemporâneo, o real inexiste, a história e o tempo são um simulacro.

Os leitores de ficção científica por certo não se surpreendem com tais opiniões. Alguns estão inaptos a viver, simultaneamente, em dois segmentos da realidade que seriam, normalmente, antagônicos. Estes, nunca conseguirão atingir o objetivo de, no período de uma vida sapiens atual, exercer uma experiência subjetiva de dois séculos.

As ideologias revolucionárias faliram, o capitalismo cibernético está em expansão, por que os mecanismos da subjetividade sapiens não estariam a um passo de um salto qualitativo no limitar deste Terceiro Milênio? Por que não acreditar que as novas gerações têm uma formação neuro emocional em simbiose com os circuitos elétricos e eletrônicos da tv, da internet, da multimídia?

O mundo atual precisa pensar-se em profundidade, abrangência e atualidade (nas três dimensões do conhecimento). Necessita de novos pensadores, novos escritores, novos cientistas que sejam capazes de diminuir a distância estelar existente entre os novos meios tecnológicos de informação e comunicação, e a carência de caráter da humanidade sapiens, de suas lideranças atuais. Pessoal e coletiva.

A civilização sapiens está em crise e alguém precisa fazer alguma coisa. Este alguém é o interessado em que a humanidade sobreviva a este caos político, econômico, social, científico, emocional, ético, global: este alguém são as novas gerações que estarão no mercado de trabalho no amanhã do Terceiro Milênio, respirando o ar do 3° Milênio, criando, se possível, um mundo emocionalmente habitável no Terceiro Milênio. Mas essas gerações nem de longe são educadas neste sentido. Ao contrário: são educadas para ser escravas do consumismo. Do senhor Mercado.

Os filmes da série Matrix revelam uma sociedade padronizada e altamente repressiva. Que persegue violenta e sadicamente aqueles que não obedecem cegamente seus padrões. E patrões.

Filmes tais como os da saga “Crepúsculo” têm personagens que são claramente demenciais. Quer pela aparência, quer pela intencionalidade.

O autor de romances talvez tenha algo a ver com tudo isto.

E para ganhar aquela experiência de tempo necessária, para viver dois séculos em 70 ou 90 anos... Desejando atingir aquele distanciamento vital entre seus contemporâneos e seus filhos e os filhos destes, há que ousar viver dois segmentos que até hoje pareciam ser antagônicos e inconciliáveis: a obtenção de conhecimento acadêmico, através de livros, e a vivência emocional, de liberdade, na paisagem aberta da cultura solar dos sítios históricos e das praias. Ou seja: ao mesmo tempo que se diverte, adquire cultura literária sem as limitações das contingências acadêmicas.

O livro A Mochileira (Thundra) defende esta possibilidade de fazer sair do casulo supostamente protetor das estruturas burocráticas, acadêmicas, uma geração que precisa ter um espaço de liberdade para repensar a si mesma e às culturas das gerações que as precederam. Que precisa ser tutora do mundo do próprio destino. Abrir caminhos, sair da dependência de um status pseudo-respeitável, no qual a criminalidade, a compulsão cromagnon, ameaçam crianças e jovens que dormem debaixo da suposta proteção policiada dos cobertores familiar, acadêmico, profissional. Precisam sair, urgentes, do “status” deletério de tvespectadores da sala de jantar.

O saber acadêmico da filosofia das ciências sociais, precisa de novos referenciais. O mundo mudou, “a verdade está lá fora”. As teorias das academias estão defasadas, sem respostas à evidência de novas interrogações. O planeta precisa ser gerido por outros e novos paradigmas. Não se deve gerenciar uma sociedade totalmente motivada por inusitadas sugestões de comunicação e informação cibernéticas, como se essa sociedade ainda fosse motivada por uma cultura da idade da pedra.

O mundo, no 3º Milênio, poderá não vir a ser uma espécie de multinacional multinterativa da incerteza, do arbítrio, da criminalidade, da poluição. O mundo poderá pertencer à certeza de que as novas gerações que o estarão habitando neste 3º Milênio, precisam de novas estruturas de educação, de auto-aprendizado. E precisam exercitá-las, ontem, hoje, aqui, agora.

O novo Milênio poderá ser início de uma nova política, uma outra ciência, uma outra arte, agenciará, talvez, uma outra história, uma outra cultura. E ninguém poderá fazer isto pelas novas gerações: educá-las para compreendê-lo e administrá-lo. Os pais devem ter o desprendimento de incentivar os filhos a sair de debaixo do cobertor aconchegante da sala de jantar, para a busca de soluções para um mundo novo, com novos habitantes, descendentes da raça sapiens/demens atual.

Os aprendizados acadêmico e emocional acredito, precisam ser dinamizados num mesmo campus, aonde a dinâmica das iniciativas de livre aprendizado não esteja subliminarmente policiada. Aonde não existam corpos docente e discente hierarquizados. Aonde a didática burocrática dos mestres não seja capaz de fazer mais vítimas (“Teme os mestres/Que coabitam conosco/Os mestres estão entre nós/Feitos de covardia e preguiça/O homem novo/Candidato a soldado/Escolheu seu pobre destino”).

O filme, “Sociedade dos Poetas Mortos” é também sobre os poderosos mentores dessa didática de cabresto, já denunciada por Raul Pompéia no romance sincretista “O Ateneu”. Estudantes não são gado, não precisam de vaqueiros, alguns cheios de empáfia e de conhecimento defasado. Estudantes não são soldados, não precisam estar sendo vigiados por um curriculum de burocratas de caserna, por uma “educação” para a insegurança cercada de seguranças por todos os lados.

DÊEM UMA CHANCE À GERAÇÃO EMERGENTE
DE IR À FONTE E NÃO APENAS À ÁGUA

O que um escritor pode fazer neste início de milênio para que isto aconteça? Cada um encontre seu caminho. No romance A MOCHILEIRA (Thundra), estou fazendo a minha parte. Mostrando que o aprendizado lúdico, no campus livre e solar nos acampamentos das praias, onde as pessoas não têm obrigação de preservar máscaras nem prestar homenagens a hierarquias do cartão de ponto, é um lugar onde todos podem aprender com todos todo tempo, enquanto vivenciam a emoção das paisagens ao mesmo tempo que podem viver instintivamente.

Para depois desse aprendizado, pessoal, coletivo, livre, uma geração ter condições morais de escolher um caminho que não seja ditado pelas necessidades do interesse dirigido dos governos a serviço dos conglomerados da propaganda TVvisiva de produtos e serviços que não têm compromisso com a preservação das condições mínimas de qualidade de vida e educação do planeta. Ou seja, sem responsabilidade com a sobrevivência das espécies.

A ideologia da “liberdade” criou o slogan: cada um por si e o inconsciente contra todos. O 3º Milênio talvez possa mudar de slogan: cada um por si e o inconsciente em favor de todos. Uma luta sem quartel está se travando pela posse da alma humana das novas gerações. Uma luta ideológica. O fim das ideologia maniqueístas não é o fim da história, mas pode ser o começo de uma nova História.

Há a terrível força da propaganda TVvisiva, de produtos industrializados e programas de entretenimento, que são aparentemente inofensivos. Mas tal avalanche de imagens condiciona o TVespectador em direção a uma uniformidade subjetiva avassaladora. É uma lavagem cerebral diária de luxúria e violência. Que incentiva a compulsão cromagnon pela sobrivivência a qualquer custo. Essa compulsão tende a gerar uma sociedade com uma patologia coletiva cromagnon de destruição de qualquer valor moral, ético, que não sirva às imposições do ter. Do consumo.

Que direitos individuais podem ser preservados na cultura pós-moderna, se as novas gerações não forem chamadas a brigar pela busca e conquista de seus próprios valores, de sua própria alma? Se as pessoas não têm mecanismos reais e eficientes de protesto contra esse modelo de possessividade, em breve podem perder todas as suas liberdades. Toda noção moral de sobrivivência. Se é que já não perderam.

É preciso que o indivíduo seja orientado pela educação escolar, no sentido de conseguir obter uma verdade, trabalhar para fazer parte de uma força, de um espírito coletivo essencial. Mas como fazê-lo, se está preso, dentro de um redemoinho ilegítimo, pseudolegal e arbitrário que o cativa subliminarmente dentro de sua própria casa, nas profundezas sua própria alma? Como denunciar os horrores presenciados se é parte, segmento e extensão desses horrores? Se ele, indivíduo, os admite, convive passivamente com eles na realidade da “modernidade” da telinha na sala de jantar? Como são globalizadas as pessoas da sala de jantar. Mas as pessoas da sala de jantar...

MODERNO, MODERNISMO, MODERNIDADE, PÓS-MODERNIDADE

A palavra moderno vem do século XVIII, a origem latina e o significado estão associados à imitação do antigo. Habermas, crítico do pós-modernismo, escreveu que “o fascínio exercido pelos clássicos do mundo antigo sobre o espírito dos tempos posteriores, dissolveu-se, pela primeira vez, com o ideal do iluminismo francês. Para ser preciso, a idéia de que ser moderno implica voltar aos antigos, mudou com a crença no infinito progresso do conhecimento, no avanço em direção ao aperfeiçoamento social e moral.”

Dêem uma chance a esse aperfeiçoamento acontecer. Não é encarcerada no conforto da caverna moderna, que a nova geração vai descobrir que possui uma alma individual que deve e pode ser preservada. Permitam que possa criar seu próprio aperfeiçoamento, sua própria moral, se for capaz. A descoberta do inconsciente, no qual tempo e espaço inexistem, o tempo se estabelece enquanto referencial cronológico e espacial em um mesmo momento. Isto significa segurança, apoio, sólida estrutura psicológica para o indivíduo. Que pai mais protetor pode zelar por sua integridade?

Lacan afirma que as temporalidades de nossa experiência individual (passado, presente, futuro) estabelecemos através da linguagem. Que campus existe mais livre para exercitá-la do que as praias desse Pindorama continental?

Exercitar todas as linguagens pertinentes, todas as estruturas latentes, todas as vidas reais e virtuais de uma geração que necessita sair do esqueminha de terreiro, de patota, de igrejinha, de turma da esquina, de torcedores de times de futebol, e ampliar os horizontes reais e virtuais de uma cultura universal. Não encarcerem o futuro do planeta num quartinho multimídia, numa sala de jantar pseudo-interativa. Sem desenvolvimento emocional pertinente ao progresso moral do indivíduo e da sociedade.

Não transformem em esquizofrenia o potencial mental de uma geração, de uma nação, de um planeta. Por não saber promover a continuidade temporal da vida, o esquizofrênico está condenado a sobreviver num eterno presente. A linguagem multitempo, multiinterativa, a troca de informações de mente a mente, de micro em micro experiência, de jovem a jovem, pessoa a pessoa, sob o luar de um acampamento numa praia de Pindorama. . . Os riscos de acontecer algo de ruim a um membro da confraria das mochilas, é menor do que os perigos a que está exposto um jovem habitante da cidade, urbanizado, sujeito à violência subliminar e real numa metrópole fritzlangueana.

As aquisições da mente presente são parâmetros para se navegar subjetivamente entre o passado e o futuro. Dizer que o tempo é irreversível equivale afirmar que a terra é plana e centro do universo. Wells, Clarke, Llosa, Rosa, Joyce, Goodnews, Proust, Woolf, Eliot, a Física experimental, fornecem dicas instigantes de que somos todos viajeiros do tempo (“Eterno viajor de eterna senda”, escreveu o poeta). A máquina do tempo não é apenas um projeto irrealizado da Física, é o imaginário em ação.

O romance A MOCHILEIRA (Thundra), começa com um jovem estudante de história da USP que se concede a chance de viajar interna e exteriormente, reagindo desta forma à inegável perda da liberdade, à exacerbação da eficiência dos fatores históricos tiranizantes, agindo dentro da universidade. Travava-se uma guerra interna que, como todas as guerras, era feita para criar fantásticos débitos institucionais. Débitos baseados no princípio de capitalização de “elites”, políticas e econômicas, com a finalidade de exercer comando, comunicação e controle a partir de uma tirania social de dominação comportamental da sociedade globalizada pela ignorância, pela mediocridade, pelo entretenimento de chutadores de “bola”.

O personagem central do romance A MOCHILEIRA Trancou matrícula na faculdade, e “Pé na Estrada”, desde que não se adaptava à idéia de obediência e subserviência a uma tirania política e econômica. Uma tirania que lançou este país numa espiral de corrupção que vai terminar apenas quando o Saci cruzar as pernas: nunca.

Acredito que a literatura deve encontrar uma forma de desmascarar a obscuridade da intenção dos que desejam ver esquecidos os períodos de tirania política que deram origem à cultura do horror e da luxúria, à baixa racionalidade do tráfico, da repressão e da criminalidade. Só os tolos, os analfabetos anímicos ainda não descobriram que a luta entre ideologias foi apenas uma máscara para encobrir os processos de como se estabelece o controle dos indivíduos numa sociedade. Um funcionário de empresa estatal ou privada, ser denominado camarada ou executivo, em nada vai mudar o comportamento burocratizado que dele se espera.

Nova Express de Bourroughs é uma ficção na qual organismos parasitários ocupam hospedeiros humanos e os controlam por controle remoto, tornando impossível que tenham certos tipos de pensamentos, sentimentos e percepções. Os gnomos da morte são armas da quadrilha Nova, que usa tais conflitos para fazer explodir o planeta. Era o que EUA X URSS estavam fazendo com a Terra, segundo Bourroughs. No tempo obscuro da Guerra-Fria. Globalizada.

A quadrilha Nova se compunha para motivar as ações dos habitantes de uma e de outra área de influência, no sentido de armarem-nos para lutarem entre si, enquanto faturavam bilhões de dólares e rublos, se capitalizavam, para fazer novos investimentos e abrir novas áreas de influência e atuação. Tirânicas. A tirania do consumo pelo consumo, da vida pela vida, da arte pela arte gera uma gratuidade amoral de sobrivivência baseada na virulência dos esquemas de subserviência que gerem atualmente (e perigosamente) a sociedade. Sociedade globalizada pelo nazismo autoritário exercido pela pirâmide sistêmica do poder pelo poder. Quem mais possui ativos financeiros tem todo o direito de corromper e degenerar quem não possui tanto poder quanto.

Miller, por sua vez, afirmava admirar escritores que tinham uma misteriosa qualidade metafísica, oculta, que ultrapassava as fronteiras da literatura. “As pessoas lêem para se entreter, para parar o tempo e se instruir. Eu nunca leio para parar o tempo ou me instruir. Leio para sair de mim mesmo, ficar absorto. Estou sempre buscando um livro que me ajude a sair de mim mesmo.”

Para Hemingway, um escritor sem senso de justiça e injustiça ganharia mais editando anuários de uma escola para crianças excepcionais. Dizia que o dom mais importante de um escritor é um detector interno de baboseiras à prova de choque. “Este é o radar do escritor e todos os que mereceram este nome tiveram um”. Têm.

Cocteau se dizia habitado por uma força ou ser do qual pouco conhecia. Disse ter escrito “Les enfants terribles” a partir da observação de uma família isolada da vida em sociedade. “O ser em mim não queria escrever sobre isto, bloqueio total. Havia na história real alguma ligação com os Estados Unidos. Um mês inteiro só olhando o papel feito bobo, incapaz de escrever o que quer que fosse. Então, um dia, ele começou à sua própria maneira. Comecei a escrever 17 páginas por dia. Fluía bem, eu estava gostando. A arte é o casamento do consciente com o inconsciente.”

Picasso dizia ser preciso muita coragem para ser original. “A primeira vez que uma coisa aparece desconcerta todo mundo. O mau é lógico, precisa ser canonizado, porque o bom é o familiar. O novo é uma falta. É sacrificando as faltas que criamos.”

Garcia Marquez achava engraçado que os maiores elogios para seu trabalho fossem dirigidos à imaginação. “Na verdade não há uma única linha sobre meu trabalho que não tenha sua base na realidade. O problema é que a realidade do Caribe parece ser a imaginação mais desvairada.”

Vonnegut Jr. acredita que “o trabalho do escritor é apresentar confrontos, para que os personagens digam coisas surpreendentes, façam revelações, eduquem e divirtam seus leitores. Se o escritor não sabe ou não quer fazer isso, deve retirar-se do negócio.”

A opinião de Burgess: “Somente através da exploração da linguagem pode a personalidade ser induzida a admitir alguns de seus segredos, pela extensão do vocabulário, pela cuidadosa distorção da sintaxe, pela exploração de vários mecanismos prosódicos tradicionalmente monopolizados pela poesia, determinadas áreas indefinitas ou complexas da mente, podem ser apresentadas com mais competência do que no estilo de, digamos, Irving Stone ou Wallace.”

Todos somos, fomos ou seremos jovens um dia. Todos os que um dia foram jovens sabem que a juventude é conformista, que, com freqüência, como diria Burguess, eleva a ignorância à condição de virtude. É pouco preocupada com valores dissidentes. Tão orgulhosa de ser, tão segura de que somente ela sabe das coisas. Na realidade a juventude desperdiça-se ao assumir facilmente as solicitações de uma cultura comprometida com a tirania estalinista do senhor Mercado. E ainda existe quem acredite que vivemos sob as influências de um regime democrático. É muita ingenuidade globalizada.

Para que a juventude possa aprender a aprender, é preciso que lhe seja fornecida a oportunidade de sair dos esquemas de aprendizado burocráticos. Isto não quer dizer ignorá-los, mas usufruir a oportunidade de vê-los com um certo e providencial distanciamento crítico.

O campus continental de Pindorama os espera de sol, mar e luar abertos.
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