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Ensaios-->Último Sol, não leia! -- 18/09/2009 - 14:18 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Esta obra concorreu em 2009 a uma bolsa oferecida pela biblioteca pública nacional(Brasil), não ganhou sequer um prêmio-consolação do tipo: 'sua obra não foi contemplada com a bolsa para autores.
Continue, quem sabe, um dia ela será lida...

SE VOCÊ QUISER PARTICIPAR DO CONCURSO, VEJA NO FINAL DESTA PÁGINA O EDITAL DE CONVOCAÇÃO DA BIBLIOTECA NACIONAL OU ACESSE AS INFORMAÇÕES DIRETAMENTE ATRAVÉS DO SITE www.bn.br.



Ú L T I M O S O L

- P o e s i a -







A BANDEIRA DO POETA



O poeta transforma a fantasia em realidade
E a dura realidade em lúdica fantasia
Traça ponto a ponto
As linhas da dor e da alegria
E o que está inacabado
É tão perfeito que parece pronto

Do alto de uma torre de marfim
O poeta levanta sua bandeira, critica , satiriza
E apresenta a verdade seminua
É fogo que arde na esteira da rua
Um espinho no coração da sociedade
Tumulto no trânsito, na feira, na cidade
Como um bêbado caído no final da tarde

Com arte descreve recortes do cotidiano
E põe neles seu arranjo
Com a mão de um anjo
Traça na periferia da mente
O caminho divino com dedo humano
De repente, apenas um verso
visto isoladamente
Parece uma peça inteira
Do grande artesão do universo.




FOLHA DE PAPEL



A caneta é a bússola do poeta, o papel seu mapa.
Num barco de papel a poesia realiza viagem astral. Navegando entre estrelas no espaço sideral faz chover luz e melodia.
Bela imagem visual o poeta cria numa folha de papel...
A caneta dança como varinha de condão em mãos de fada. E, num passe mágico, surge um príncipe encantado beijando a princesa. Com certeza, a vida, o amor, tudo que há na terra, no céu e no mar, está na poesia que o poeta pinta, com a tinta a escorrer, numa folha de papel.







SONHADOR




O poeta sempre tem
Um vaga-lume como estrela
E antes de poder vê-la
Há muito já lhe quer bem.

Para o sonhador tudo é poesia
A vida, a melodia das flores
A natureza, a beleza das cores
Tudo é canção de ninar.

Um momento de sonhar
Ter um fio de esperança
Saudade, lembranças....

Neste balanço, prefiro acreditar
Que meu sol de amanhã é hoje
E pego os primeiros raios que alcanço.







BARQUINHO A VELA


Alegres ou tristes lembranças
Povoam a mente e trazem imagens daquela
Mulher inocente como barquinho a vela
Ferindo as águas do mar com seu acervo:
Carinho, farpas e beijos
Melodia a tocar como harpa
Acordes ressonantes em meus nervos.






O TEMPO...



O tempo voa...
Eu corro nessa lida à toa,
à procura de tudo que existe
do amor, do tempo, da sorte,
da vida que repreende a morte...
Enfim de tudo que insiste
Em fugir de mim
Ainda assim, valeu a espera.
Soltei meu barquinho a vela
Venci o cansaço e o medo
Agora meu segredo se revela.









ENGENHO POÉTICO



O poeta procurava na praia
Seus segredos, anseios e medos
Com as conchas, misturados.
Numa luta vã, o dia inteiro
Procurava o amor arrastado
Pela ressaca do mar bravio.
Mas foi no rio, na pororoca
do delta com o mar que veio
A encontrar a fonte dos anseios
Numa garrafa boiando
E dentro dela, um gênio gritando
Para alguém o libertar.
O poeta destampou o frasco
O gênio era seu medo de amar
Seu segredo querendo voar
Pois o poder estava trancado
Há muitos anos guardado
Em seu poetar...
Então, libertou o gênio contido
E entre sorrisos e gemidos
Fez do livro seu lazer, seu lar
Porque escrever é massagear
A lâmpada poderosa e liberar
O engenho poético retido.




GARIMPEIRO



Como lavras as palavras
Como semeia tua seara?
Com que ferramenta cavas
O som das letras, a melodia


Como compões poesia
Sem medo, sem pejo
Com amor e desejos
Carinho e harmonia?

Como fazes a sonoridade
Com liberdade nas frases
E melodia poética?

Foge , pois, da métrica!
Cuida do amor, saudade e fantasia
É disso que nasce a poesia.










O POETA, O PROFETA



Não se pode por um freio na boca de um profeta
Nem algemas nas mãos de um poeta.
O poeta é a luz da ciência que penetra no escuro as profundezas da terra e alumia todos que dormem.
É o curso de água imensa de um rio, um canal que deságua na ribeira, aqueduto saindo do paraíso.
É um semeador e sabe que é preciso
Regar a planta para colher fruto maduro.

Deixem o poeta cantar sua dor
E o profeta clamar alto no deserto
Não lhes obstruam a voz nem o canto
Que sejam libertos da cruz. E, portanto,
Possam oferecer sem censuras
Tanto vinho quanto pão e luz às criaturas.




BRINCANDO COM AS LETRAS


Eu estava brincando.
Eu brincava de esconder com as letras.
Eu brincava de esconder as letras.
Eu estava trabalhando com as letras.
Eu estava trabalhando as letras.

Eu punha um agá na linha
A linha vinha e retirava a letra.
Eu punha uma linha na letra
A letra vinha e retirava a linha
Eu retirava, ela punha.

Nessa peleja cai a linha
A ortho (-) grafia anoitece
Vem a noite
Tece um novo dia.
Pede uma trégua...

A manhã chega cedo,
ditando nova regra.
Não cedo...
O sono insiste
Pesar sobre meus olhos

Cansada, a velha dorme
Eu fiquei acordado
E mesmo sem concordar
Com a sonolência dela
Tento entendê-la

Ela dorme...
Eu a envolvo
Com o lençol de minha insistência
Tiro o chapéu, ponho o chapéu (^)
Tiro o espinho (´) da letra.

Insisto em querê-la
Velha, acordada
Mas não houve acordo
Fiquei acordado
Em desacordo com ela.





PINGOS DE LETRAS



Eu vi as letras pingando
A poesia dançando
Em matizes multicores

Vi o arco-íris pintando
Eu vi as letras dançando
Em poemas de amores

Eu vi a chuva molhando
Eu vi as letras dançando
Em linda chuva de flores.







TROCANDO AS LETRAS



Luiza luzia e ainda reluz
E com certeza, não fui o primeiro
A trocar a sílaba, colocando mais peso
Em sua cruz. Luzia ou Luiza
Escreve-se com as mesmas letras
É só trocar as sílabas...
Uma fica branca e a outra preta.







TRAVA LÍNGUA



Fogo nos versos,
Versos no fogo

Fogo no tacho
Tacho no fogo,

Troco o facho pela tocha
Ponho o facho no tacho

Abaixo o facho da tocha
Taco a tocha no tacho

Troco as letras
Troco a tocha

Troco o tacho
Taco o facho

Toco a tocha
E queimo a língua
no tacho.







PECADO GRAMATICAL


Como tropeço na língua!
Arranho o badalo palatino
Escorrego no código latino
Peco contra a Gramática
Fujo da matemática
E desde menino
Em sua armadilha caio.

Ensaio a dança nupcial
Tento tocar letras no piano
Mas não se faz acorde com uma só nota
Sonata em dó se (re) faz em mi(m)
Bate o sol uma réstia de si mesmo
Sem liberdade, não sou capaz de tocar
A sonoridade das letras.

Começa a valsa: as letras dançam
Passeiam rolam e se cansam
Deitam na passarela
Eu erro o passo...
Pisoteio e me embaraço
Mas em vez de doer nelas
Em mim é que vem doer.





PASSA, PASSA, PASSA...


O mágico das letras sonolentas
Em versos lentos passeava
Na lentidão de cada passo
Parado, em pé, feito compasso
Traça círculos na mente
De repente, em versículos,
Velozmente, a vida passa.
Passa a vida, passa o tempo
Passa boi, passa boiada
Passa o vaqueiro na estrada
Só a poesia não passa.

Passa o sol, passa a lua
Passa o caminheiro na rua
Passa o vaqueiro na estrada
Passa boi, passa boiada
Passa o tempo, passa o vento
Passa rápido, passa lento
Passa o velho, passa o novo
Passa o vaqueiro de novo
Passa tocando a boiada
Passa a noite, passa o dia
Só a poesia não passa.

Passa uma geração e vem outra
Passa a saudade, a alegria
Passa a noite, passa o dia
Passa o sol e se levanta
Passa a chuva, enche os rios
Passa o rio, enche o mar
Passa boi, passa boiada
Passa rápido, passa lento
Passa a poeira com o vento
Passa o calor, passa o frio
Só a poesia não passa.







CANÇÃO DE NINAR


Quero ouvir uma canção
Que me faça sonhar
E voltar a ser menino
Para você me ninar

Quero ouvir uma canção
Que me faça ninar
E voltar a ser menino
Para com você meninar.

Quando o sol cansado
Se deitar para repousar
Quero ouvir sua canção
Para me fazer ninar.

E quando o céu for escuro
Sem estrelas nem luar
Que você seja meu sol
Com seu brilho a me acordar






O TEMPO E O VENTO


A vida é feita de retalhos
Pequenos recordes da história
Alguns tocados pelo vento voam
Outros povoam os anéis da memória.

Quantos mistérios trazem o tempo...
E o vento que sopra a folha seca no chão!
Quantos segredos, quantas histórias chegam
E se vão na memória do tempo...

Na folha seca soprada pelo vento.
Quantos mistérios...
a folha, o tempo e o vento.






SEMENTE GUARDADA


A flor se abre, depois fecha em si mesma
Latente, ela guarda uma semente
Dela mesma, para depois brotar
E novamente, no pêndulo do galho
Eis a flor outra vez, lavada de orvalho.










MEMÓRIA GENÉTICA


O mundo é um novelo achatado nos polos
Uma tela, um vídeo-teipe
Memória genética herdada dos pais.

Vem uma geração após outra
Reescreve a história.
Torna-nos imortais.

Enfim, é o filme da vida reescrito
E repetido em ciclos
E séculos sem fim.

Como aves migratórias voam
Voltam, repovoam a imaginação
E novamente se vão.





A JANELA


Estive em teu mundo.
Longe muitas léguas no tempo...

Vi minha história em poucas linhas
E em muitas letras de boas tintas

O mundo, o ser imortal, o animal
Uma tela pintada com letras.

Casa aberta, ostra exposta
O mundo com as portas escancaradas

Para a vida ou para a morte!
Morre a ostra para que linda pérola se revele.

Indago já sabendo a resposta.

Que vê teus olhos através do cristalino
Da vidraça de teus olhos?

Uma tela, uma galha seca, uma mortalha
Uma linda imagem traçada na imaginação

Paixão pela natureza, pela vida, pelo amor?
Na verdade, a imagem reflete
O sentimento guardado no coração.


A visão é outra, a paisagem, a mesma
O que muda são os olhos, de quem vê.

Duas pessoas olham ao mesmo tempo
Pela mesma janela e cada uma pinta sua tela
Com a tinta que existe dentro dela.






OURO DE TOLO


Não foram somente os bandeirantes que se enganaram
Ali, nas proximidades de Itacambira – um bom pedaço de terra dos Gerais, há uma serra reluzente: brilha como ouro e escorre entre os dedos. Na vida de um pensador, acontece coisa semelhante. Tenho um tesouro guardado! Ouro de tolo ou diamante, nada jogo na lixeira. Guardo qualquer asneira de minha produção. Às vezes aquilo que concebo como pirita, para outras pessoas pode ser uma valiosa pepita de ouro.





CAJU MADURO




Cai a tarde, cai a chuva
Só o caju madurinho não cai
E o menino diz: volto amanhã
E cedinho ao cajueiro vai.

O dia é quase sem luz
Pois o sol palidamente sai
Alegre o menino bate com uma vara
E o caju amarelinho cai.




CACTO


Velho amigo como estátua, postado
na beira do caminho, comigo falava
seu galho balançando com o vento
Acena “um não” às travessuras do menino
protege o ninho como a um filho amado
O velho mandacaru feito espantalho
de braços abertos vigiando milho.

No alto do tronco esgalhado,
anu depositara entre os espinhos
ovos branco-esverdeado, no ninho.
Dali, filhote nenhum eclodia
Numa luta vã de pássaro contra visgo
o menino vencia cada espinho
e vitorioso levava os ovos consigo.




MINHA JÓIA, MINHA LUA


Sou um menino travesso
Deixo tudo pelo avesso
Dobro esquinas, dobro a rua
Esses dias, peguei a lua
E com arte magistral
Enfiei num alfinete
E pendurei no varal

Mas a gangorra do tempo
Fez a minha mãe voltar
Ao seu tempo de criança
Vendo a lua balançar
E quando o vento tocava
A lua quase arrastava
Na grama do meu quintal

A mamãe não teve medo
De revelar seu segredo
Da criança que há nela
E sem sequer ficar vermelha
Arrancou do varal a lua
E como uma jóia sua
Pendurou-a na orelha





LEMBRANÇAS


Pálidos raios do ocaso
Tocam suavemente as brancas asas
De uma garça, no crepúsculo das lembranças
Das Aves Cheias de graça que rezávamos
No entardecer, quando crianças.

E no colo da mãe, quando a noite vinha
Rezavam-se o terço e a ladainha
À Nossa senhora, mãe das criaturas
Agora, pois, a outra mãe sorridente
Coberta pelo véu da bem-aventurança
Intercede por nós lá nas alturas...
Derramando bênçãos sobre bênçãos





O TRONCO DO UMBUZEIRO


Lendo letreiros que os amantes gravam
Talham corações com seus canivetes
E com as mentes encenam emoções
Sementes de amor, gestos de meiguice
Trouxeram-me lembranças da infância
Juventude e meninice. É a vida passando
É o tempo correndo, voando ligeiro
É a chuva de meio século
Escorrendo de janeiro a janeiro
E molhando os corações entrelaçados de outrora
Agora recordações entalhadas na velhice
Indelevelmente gravadas no tronco do umbuzeiro





PARDÁRIO


Pela primeira vez na história
Permiti que meu neto criasse
Semissolto na gaiola
Apenas, e unicamente, um canário.
Desde que a porta ficasse
Aberta e o passarinho pudesse
Sair e voltar quando quisesse.

Pus no cocho arroz cozido e alpiste
No cantinho do aviário, um ninho
Sorrateiramente, pardoca entrou,
Comeu sementes de amor
Em troca, deixou um ovinho
Donde nasceu pardário
Filho de pardal com canário.

Pássaros canoros preferem a mata
Só meu pardário sempre que vai, volta
As cores pardas do pardal
Ocupam apenas metade do dorso
Meu pardário peito amarelo e cântico- canário
Na porta aberta do aviário
Canta o pardal, canta o canário.





BICHINHO DE ESTIMAÇÃO



Ninguém comprava meia dúzia de lagartixas
Que eu criava no muro, porque não venderia
Por dinheiro nenhum, mas um anum
Foi catando uma a uma, sem se apiedar
Levou quase todo meu gado
Deixando apenas um par.

Como afugentar anuns?
Então, feito espantalho, postei-me vigilante
Mas ele levava uma a todo instante e novamente, voltava.
Pousava num galho de amora, depois no muro
e voava mundo afora com uma lagartixa no bico.
Balanço os braços, grito, mas ele não se assustava

O equilíbrio ecológico parecia ameaçado
Por outro lado, um par de lagartixas se salvava
Escondido na calha.
Não perdi a batalha, pois a espécie se refez.
E, em meu plantel, em vez de meia dúzia,
tenho agora seis.






LUA ARGENTINA



Numa praia grande em Mar Del Plata,
A lua argentina reluz
E revela uma única sombra de dois vultos
Envoltos, abraçados em açoites de carinho e beijos
Mas a lua enciumada finge não ver e se esconde
A natureza tinge com o negrume da noite
A bela condessa quase louca de desejo
O conde sedento por seu beijo, suplica:
Não me xingue, deixe que eu pingue
Uma gota do meu orvalho...
na boca da noite.




CICLO DAS ÁGUAS


O sol brinca de se esconder atrás das nuvens
Elas pedem um pouco de seu calor para aliviar o frio
Sem apego, a estrela-maior libera raios calientes
As nuvens sorriem no aconchego e de contentes
Choram e derramam lágrimas no rio.

Gotas correm, escorrem, e novamente se levantam
caem no rio e vão morar no mar. Outra vez sobem,
caem, escorrem, misturam-se ao mar bravio.
E de lá, outra vez se levantam, sobem, escorregam,
escorrem e caem no rio.





A JOANINHA



Itabira, Itabira!
O Homem de ferro deixou cravada
Uma pérola drummondiana na colina
Onde o frágil vento se esconde
Com medo da joaninha guardada
Na palma da mão de Celina.






BOITEMPO


Mineiro vai comendo devagar
O mingau quente pelas beiradas
Pelas estradas da vida, tudo devagar...
O trem, a cidade, a multidão de mineiros
A paciência de manter o mesmo passo
E quando chega a plenitude do tempo
O vaqueiro das letras pega o boitempo a laço
Voltei o mourão, amarra e dá um nó
Vence o cansaço e se torna o poeta-maior.






PERCALINA VERDE-DRUMMOND


O trem de ferro sai do Rio de Janeiro levando a encomenda do Coronel: doze volumes encadernados com percalina verde-drummond. Verde a mata, longes horizontes, sonhos embalados na caixa de pinho. Passa a mata, passa o tempo, passa o vento na janela. O vagão sacode a caixa revestida de alumínio. Se a coleção não chegar incólume ao destino, o coronel não paga a conta.

O menino franzino espera ansioso. O burrinho pega a caixa na estação e rompe mata adentro gerais a fora, levando um universo no lombo - um assombro: ninguém por ali tinha uma biblioteca tão grande. Burrinho não sabe ler, ainda assim, dissemina a cultura na cidade de ferro. Foi ele o responsável pela formação acadêmica do menino franzino que me ensinou a escrever.

Verde a mata, longes horizontes, sonhos encadernados em percalina verde, embalados numa caixa de pinho. Mata verde, percalina verde, burrico alazão leva esperança para o menino. Tudo trancado, inviolável. Só que tem a chave do saber abre as janelas do mundo: o olho mágico de Osíris e a beleza nua de Vênus abraçada pelos tentáculos da Medusa. Tudo isso numa caixa de pinho.

Numa caixa de pinho vêm os sonhos e se vão. Pela janela do último trem, vê-se um rosto pálido no esquife. Finda a saúde, as lembranças são guardadas em ataúde. Plantado no campo santo, o poeta espera tanto a ressurreição dos mortos, quanto a consagração da poesia. Passa a vida, passa o tempo, passa o vento. Passa o trem da morte todo dia, mas as palavras não passarão.






PRIMAVERA


Toca o vento e vai varrendo
As folhas secas no chão
É a primavera trazendo
As saudades que vêm de molho
E não cabendo nos olhos
Derrama no coração.





SAUDADE



Pingos de saudade batem
E escorregam como gotas de água fria
Fogem, deslizam, desembocam nos rios. Misturam-se ao sal do mar
Depois sobem, caem e formam rios.





ÚLTIMO SOL


No cais o pensamento voa
A onda bate na proa
E o barco quase náufrago se lança em alto mar
É a vida viajando no tempo...
Ancorado o navio, desembarca gente de muitas raças
Línguas de traças zombeteiras assobiam
A moça disfarça
Apenas sente o navio de seus sonhos ancorar
Agora, a lembrança de um passado distante
Por um instante, faz derramar lágrimas aos molhos
Seus olhos - a ponta da bengala
Não alcança o navio, só vê a negritude
Nem escuta assobios, apenas sente a brisa fria
Batendo no último sol de suas lembranças.
Quando a juventude lhe sorria.





AMOR EM PEDAÇOS



Luto profundo de corpo e de mente
A alma temente, não quer revidar
As infâmias sofridas, a luta perdida
A queda de braço é mais um fracasso
O amor em pedaços nunca se refaz
É vidro quebrado que não emenda mais.





AMOR E ÓDIO



O amor é moderado, calmo, paciente – imortal
O ódio é soberbo, arrogante, possessivo – fatal

O amor é a tolerância, o antídoto, o perdão.
O ódio é a vingança, a intolerância, o veneno.

O amor é paciente, é bondoso. Não tem inveja
O ódio é orgulhoso, irritante, rancoroso

O amor é alegria, paz, paciência, bondade
O ódio é a inimizade, brigas, ciúmes, ambição, discórdia

O amor é afabilidade, fidelidade, brandura, temperança
O ódio é infiel, agitado, desregrado, impulsivo

O amor tudo desculpa, tudo espera, tudo suporta
O ódio tudo rejeita.






CÂNTARO PARTIDO



Ontem eu vi tuas lágrimas
Escorrerem aos quatro cantos
Como chafariz ou cântaro partido
Antes fosse apenas o pranto inocente
Do querer-me novamente como já houvera tido
De corpo, mente, alma e coração
No entanto a distância separar-nos veio
Da criança que mesmo adultos fomos
A brincar de esconde-esconde
E guardar meu bastão entre teus seios.







TRILOGIA DO AMOR



Não importa quanto pesa a massa
Nem se pesam sentimentos em balança
A trilogia do amor da fé e da esperança
É uma virtude que pouca gente alcança

Perdidos no amor se acham os amantes
Perdidos os poetas amantes se acham no amor
Por um momento os amantes são poetas
Por toda vida os poetas são amantes

O amor é moderado, calmo, paciente – imortal
O ódio é soberbo, arrogante, possessivo - fatal
O amor tudo perdoa, tudo suporta

Não importa, a mão bate ou afaga
Se recebe amor, também com amor paga
Mas perdoar é fundamental.






PEPITAS DE SESMARIA



Quando visito tua tenda
Trago comigo escondidas
Pepitas em forma de letras
Garimpadas lá na fenda

Confesso: me pego chorando
Vivendo cada emoção
Ou sorrindo de alegria
Ouvindo teu coração

Que coisa linda, menina!
Eu queria ser a mina
Que tu garimpas agora

Prometo que te daria
Duas pepitas por dia
E um diamante por hora.





SIMPLESMENTE UMA MULHER



Aquele que vê Maria
Maria, do jeito que ela é
Logo entenderá o que significa
Ser simplesmente uma mulher.

Que seja ela então,
Do modo como Deus
Sabiamente a desenhou
E a entregou a Adão

A carne de minha carne
Seja o colo acolhedor
Meu repouso e aconchego

Meu refúgio à noite quando chego
Seja o abraço carinhoso do amor que arde
E o beijo gostoso no final da tarde.






UM PÔR-DO-SOL COM VOCÊ


Meu pôr-do-sol
Fica mais lindo quando
O sol a se esconder
Mostra as asas de uma garça
De alma branca como você

É no crepúsculo que se repete
A graça de acordar e viver
Faz renascer a alegria,
Nos raios do alvorecer

Assim, em cada lamento
Suplantado, vem o alento
De novos sonhos refeitos
Que voltam a povoar o peito
Renovando o desejo de viver!...








PEDÁGIO




A vida cobra pedágio
Para uns, sem juros
Para outros, com ágio.

E, por mais caro que seja o ingresso
A cada um é dado o direito de regresso
Ao lar paterno do Senhor da messe.

Este é o preço da vida e da morte,
Do azar e da sorte, do amor
Que com amor se paga:

“A mão que bate é mesma que afaga'
“A boca que cospe é a mesma que beija'
Ao Cyro e aos Anjos, minha alma se queixa:

Cadê a mão que à minha afaga?
A boca que à minha beija?
Cadê minha gueixa?









O CASEIRO




Casado, viúvo, solteiro ou aposentado
a casa do caseiro abriga ração do gado
bagaço de cana triturada na moenda
com ele moram galinhas, peru e bode
humildemente, na fazenda, vive o caseiro
E feliz convive com merda no (b) mosteiro.

A mulher do caseiro entra mês e sai ano
trabalhando de graça para sinhazinha.
E em sua casa pequeninha, pode,
longe da sede do fazendeiro
ficar o poleiro das galinhas
e o chiqueiro de bodes

Poleiro de galinhas e chiqueiro
tudo fica na casinha do caseiro
trabalhador e bom cidadão
Mas é na casa do patrão
que a galinha do caseiro
É servida à cabidela








A PEDRA E O PEDREIRO




Um pedreiro construiu minha casa
Recebeu seu dinheiro e foi embora
Quando voltou já não pôde entrar na sala
Nos quartos e cozinha, nem se fala
A fossa rasa que cavou já não comporta
Dejetos de pensamentos maus a seu respeito
Mau sujeito, já não lhe abro mais a porta
Conversar com ele!?
Só lá fora.






FOI DEUS




Quem pôs a luz nas estrelas
E deu olhos para vê-las
E te ensinou a amar?

Quem mandou o sol brilhar,
A águia alçar vôo e pousar
E alimentar o rebento?

Quem impôs limite aos mares,
Deu compreensão e voz ao falares
E velocidade ao vento?

Quem deu vida aos planetas,
Matizes às borboletas
E aos pensamentos teus?

Foi Deus que na noite escura,
Deu vida e luz às criaturas
Quando tudo era treva!...

Quem pôs nos campos a erva,
E a semente na terra
Para a planta germinar?

Quem ordenou à nascente
A procurar o regato
E desembocar no mar?

Quem pôs o néctar nas flores,
As asas no passarinho
E sal nas águas do mar?

Quem deu luz aos olhos teus
Fez surgir Tudo do Nada...
Foi Deus.







FILHO DO CARPINTEIRO




Era Ana era Joaquim
Era Maria era José
Era José era Maria
Era o anjo Gabriel
Era José era Maria
Era o anjo Rafael
Era Jesus era José

Era o carpinteiro
Era o pregoeiro da fé
Era a cruz era o calvário
Era Maria era João
Era a casa de João
Era o santuário de Maria
Era Maria o santuário de João.









SENHOR DOS PASSOS




Um homem arrasta o madeiro
Em via pública até o morte.

Passo a passo, o Senhor dos Passos
Caminha para a monte.

Carrascos com pregos e martelo
Erguem uma cruz apontando para o céu

E ouve-se do justo o último brado:
“Pai, porque me abandonaste!?”






A LIRA DE DEZ CORDAS




O sino toca
Anunciando Deus
Na Trindade
De três notas
Teo-Deo-Céu.

A lira de dez cordas
Recorda o acorde
Dos Dez mandamentos
Como eco gravado, ado
em seu coração, ão.





SINO DO CORAÇÃO


Bate o sino no campanário:
dim... dão... dim ...dão
Toca o coração do menino
Badalando igual sino:
dim...dão, dim...dão.

Bate o badalo, toca o sino
Bate o coração do menino
Na festa do padroeiro
O sacristão toca o sino
Dim. dão... dim...dão

Desce o sacristão do campanário
O vigário começa a pregação
O coração do menino
Bate igual ao sino:
Dim...dão...dindão.

Na festa do padroeiro
O santo casamenteiro
Promete para o solteiro
Um par para seu coração
Dindãodindãodindão.

Mas é preciso esperar
E até voltar o vigário
Rezar mais um novenário
Com o coração a tocar:
Dim. dão... dindão,dindçai...




RENASCE UMA FLOR



Não se põe o último sol sobre a esperança
Daquele que confia no Senhor,
Sem que ele veja as maravilhas
As benesses do amor.

Eis que renasce a Margarida,
Há tanto tempo no jardim esquecida!
Apenas lavada de lágrimas,
Com a sentença de morte recebida...

Mas parece que o bom jardineiro,
Vendo sua flor ressequida,
Regou-lhe com o orvalho do amor
E ressuscitou a Margarida.





PLANETA AZUL



Mundo, um belo novelo
Uma novela achatada
Nos polos da tela de tevê
Reflexo no espelho.

Abóbada celeste amarelada
Dia maduro, tempo quase escuro,
Saudosas recordações
Um tesouro guardado

Laranja arredondada
Planeta azul. Céu mar e terra
Véu de areia na serra.
Sereia, praia. Mar e Terra.




BANHISTA



Praia, areia na pele, pele na areia
Pés na areia, areia entre os dedos, no chinelo,
Nos pelos, na cama, na fronha e nos cabelos
Sem verbo, só vermes e medo.





ABUNDÂNCIA


Casa, emprego, carro, trabalho, comida à vontade,
férias, passeio, praia, sol, mar, amizades, família, diversão, sossego, paz e alegria
em abundância no coração.




FELICIDADE CLANDESTINA



Casamento perfeito, mulher parideira:
culta, inteligente, carinhosa, trabalhadeira,
feia ou bonita, filha única de pai rico,
viúvo, proprietário de muitos bens,
empresário, fazendeiro, dono de cartório,
amigo da família, principalmente da filha,
do genro e do neto, ainda criança,
esperança de breve herança.
Muito gado no pasto, bode na crista da serra
felicidade clandestina, ganância doentia
por terras, bens e riqueza alheia





VIOLÊNCIA


Homem sem nome, sem emprego, sem dinheiro, sem sorte, medo da fome, crimes, delinqüência, violência, marginalização social – morte certa. Dinheiro, pra que dinheiro, sem saúde, sem liberdade, sem paz e sem harmonia? Pra que harmonia, sem saúde, sem liberdade, sem paz e sem dinheiro?






PRESIDIÁRIO


Sonho em preto e branco, vida obscura, paredes escuras,
homem atrás das grades, sol quadrado, sofrimento, dor, medo desilusão, liberdade nenhuma, constante estado de temível alerta, muita pobreza, esperança-zero,
nenhum amigo sincero sucesso lá fora quase impossível,
apenas a certeza de uma morte certa.




PONTO FINAL


Um pingo de tinta
Um pingo pronto
Um pingo de sorte
Um ponto final.

Um ponto de ônibus
Um ponto de partida
Um ponto de chegada
Um ponto final.

Um pingo de chuva,
Um pingo de canto
Um pingo de pranto
Um ponto final.

Um pingo de amor
Um pingo de doce
Um pingo de sal
Um ponto final.

Um pingo de dor
Um pingo de lágrimas
Um pingo de sal
Um ponto final.

Um ponto de referência
Um canto de amor
Um encanto de paciência
Um ponto final.

Um pingo de gente
Um pingo de vida
Um pingo de sangue
Um ponto final.





SAUDADE DA CHUVA


Chove, pinga e escorregam
gotas miúdas de orvalho frio.
Escorrem, molham, regam
E correm em direção ao rio!...

Cheiro de terra molhada!
Ao que responde o exuberante solo
Com flores, frutos e legumes,
Carinhosamente gerados em seu colo

Caindo água em abundância se via.
Milho verde, coalhada e melancia.
E embalada com o cântico dos pingos no telhado
Feliz e serena a criança dormia.

Árvores pela natureza criadas
Abrigavam pássaros cantores
E, em linda e sinfônica alvorada,
Saudavam a aurora com louvores

E assim, dezenas e centenas
De pássaros canoros
Nos mais diversos galhos
Despertavam o camponês para o trabalho

À noite, a lua enamorada
Corre da nuvem ao regato
Beija lascivamente as águas
E, envergonhada, esconde-se no mato.
MAPA DA VIDA




Pisar descalço na terra, fazer terra e descarregar o excesso de energia que forma uma corrente, no corpo, no sangue e na mente é saudável. Mas, na verdade, pessoas são árvores ambulantes. Umas vão para o Sul, outras para o Norte, e todas seguem o ponteiro da bússola e caminham em direção à morte.




ÍNDIA AROAZ


O sertanista no trem
Levava os teréns
Que podia levar:
Uma rede, um facão
E uma pá.
Ajudava a sapar
Alguma trincheira
Que fosse cavar.

E, no meio da noite,
Na mata Mafrense,
Muitas léguas distantes
Da civilização,
A lenha acabou,
E o trem parou,
Porque a caldeira
Não tinha pressão.

Ribeiro desceu
Sem sol, nem luar.
Deixou logo o trilho
Pegou uma senda
Sem luz e sem brilho
Sem nada enxergar,
Sobre os olhos a venda
Da noite escura
E sobre abrolhos
Começa a pisar.
É aqui o lugar;
Vou cavar uma fossa.
Preciso abrigar-me
Esperar a aurora
Que não tarda a chegar.
Sem temer o perigo
De bicho selvagem,
O bom sertanejo,
Com muita coragem,
Fez ali seu abrigo
Para descansar.

E, assim, na trincheira
Por ele cavada,
A noite inteira
Ficou a pensar...
Até que um raio solar
A incidir sobre os olhos
Da fossa gelada
O fez levantar.

O dia amanhece
No topo da serra,
E o trem parece
Querer galopar
Como corcel arisco
Nas rédeas do trilho.
Mas, filho mineiro
Não pode escutar
Senão o clangor,
Naquela manhã
Do triste acauã,
Solitário a cantar.
Veloz sobre os trilhos,
Na curva dos montes
Mais claros que via,
A semana inteira
O trem desafia
O tempo e o espaço,
Quão rápido se sente
E, a cada dormente
Que vê passar,
Apita e fumega
Mandando avisar:
Cumpri a missão;
É o ponto final,
A última estação.

Mas, em longo percurso,
Ninguém se dá conta
De que o companheiro
Do norte mineiro
Abandonara o trem
E seus passageiros
Além, muito além.
E, por outro caminho
Andando sozinho,
Ribeiro está.

Na sombra da mata,
Sem sol poder ver,
Não podia saber,
Nem onde estava
E rompia a trilha
Que convergia
Para as fendas do outeiro.
Lá no fim da senda
De longe ele via
Guerreiros tenazes,
Nativos da terra,
Bem no pé da serra,
A tribo Aroazes.

Mas o sertanista
Sequer teve medo
Daquele arvoredo,
Que tanto queria
Guardar o segredo
Da tribo que, um dia,
Em suas entranhas,
A mata escondia.

Seu corpo cansado
De tanto andar
Por horas a fio,
De sede aflito
Procurava um rio
Pra sede saciar.
E, por sua sorte,
Águas Aroazes
Do rio Sambito
O salvaram da morte!

Quando recobrou
O vigor e a força,
No espelho das águas
Viu sombra de moça.
Doze anos, não mais,
Curtida de sol, a pele tenaz,
Os cabelos negros,
Seios rosa - romã,
O corpo esculpido pelo vento
Da cor do pecado de Tizo
E cheiro de maçã do paraíso.

Mamilos rosados,
Ralos pêlos pubianos,
Nudez de corpo e alma cunhatã tinha.
Ribeiro desejou tê-la em seus braços,
Mas subir frondosa árvore não podia.
Na copa mais alta do jequitibá,
Jovem índia aroaz se escondia.

Então resolveu, na mente, inventar,
Uma língua possível que pudesse levar
Alguma mensagem qualquer àquela
Menina selvagem, tão perfeita e bela,
Mais linda e bela que as de Alencar.
- Jequiriti, jequitá!
Gritou Ribeiro
Em seu linguajar
E, como por encanto,
Tomado de espanto e palpitação,
Viu cunhatã descer
Do mais alto galho
Do frondoso jequitibá!

Porque, ao nascer,
Pajé lhe dissera:
Tu és a deusa Jequiriti-Jequitá,
Palmeira frondosa, trepada no galho.
Quisera o espírito bom te mandar
Em cento e quarenta e quatro luas
Um deus de longe, que pra perto vem
Teu nome chamar.
- Jequiriti-Jequitá.
Sem nada falar,
Jequiriti-Jequitá
Acenou para o deus
Que há doze anos esperava.
Precisava fazer
O que pajé lhe ensinara.
E, pelo aceno, Ribeiro sabia,
Naquele momento:
Jequitá queria
Instrumento de branco
Para o chão escavar.

E ela, num salto felino,
Numa mão tomou a pá;
Na outra, o facão.
Passou a cortar
A rala caatinga
E, depois, a cavar;
Desenterrou a cuiapitinga.

Cuiapitinga bem guardada,
Há tanto tempo enterrada
No tronco do jequitibá
Que cunhatã virou sobre si.
Derramando o líquido precioso,
Escuro e cheiroso, daquela cuité
Que pelo corpo a escorrer
Fazia nascer a deusa-mulher.
E logo que seu corpo nu
Se viu embebido
Pela poção mágica do pajé,
Atrelou-se em insaciável libido
Ao sertanista em longo abraço
E entregou-se todinha
Ao deus que ela tinha
Por tanto tempo esperado.
E, em gozo medonho, caíram
No sono pós-coito,
E abraçados dormiram.

Longas horas se passaram
E quando acordaram,
Valentes guerreiros dançavam.
E aos deuses cantavam,
Sem nenhuma maldade,
A poderosa dança
Da fertilidade
Enquanto mulheres jogavam,
Nos corpos despidos,
Após os gemidos.
Para consagrá-los
Aos deuses Aroazes.
Lançavam as águas
Sobre os corpos vorazes
De amor saciados
Dos deuses Jequitibá
E Jequiriti-Jequitá.

O sol já pendia quando
O valente cacique Cuiarana,
Na rede, deitado,
Mandou chamar o pajé
Para invocar os espíritos
Sobre marido e mulher:
Os deuses Jequitibá
E Jequiriti-Jequitá.
Feita a pajelança,
Em silêncio todos ficaram,
Esperando a voz da selva falar
Cuiú-cuiú a cantar.
Anuncia, por fim,
A vinda da criança.
O tempo será de nove luas
Para curumim chegar.

Mas, enquanto dormia,
Ribeiro a sonhar
Intrigado ficou,
Porque parecia ouvir
Carimbamba cantar:
“Amanhã eu vou”
“Amanhã eu vou”

Sem demorar veio
A noite de um novo dia...
Cuiarana e toda tribo bebia
Aluá de milho e fumava diamba.
A carimbamba calou-se;
Ribeiro aproveitou-se
da alucinação da tribo
para empreender sua fuga
antes que nascesse o herdeiro
do cacique, seu filho, o deus
Cuiarana Jequiriti-Jequitibá.
Precisava fugir,
Porque curumim,
Uma vez nascido,
O pai seria oferecido
Com a deusa Jequiriti
Em sacrifício a Tupã,
Na primeira aurora da manhã.
E só havia um jeito de salvar
Da morte a deusa Jequiriti:
Se o espírito de Jequitá
Levasse em suas asas
O deus Jequitibá.

No centro da ocara,
Frondosa palmeira
O vento torcia,
Enquanto por ela
Ribeiro subia.
Por sorte,
Soprou vento forte
Feito tufão,
Derribando ocas,
Levando ao chão
Quase toda taba.
E, na copa altaneira
Da grande palmeira,
Ribeiro cortou
Uma enorme palha.
E, como uma gralha,
Ribeiro voou...
Passada a tormenta,
Cuiarana juntara
O que sobrara dos seus
Pra reconstruir a ocara.
Como presente do deus,
No alto da palmeira.
A vinte metros do chão,
Ribeiro deixara
O grande facão.

Cravado na palmeira,
O presente do deus
Que trouxe a sorte
Livrando da morte
Jequiriti-Jequitá.
Agora sozinha
Podia esperar
Nascer curumim,
Sem ter que morrer
Com Jequitibá.

Meninos!
Não minto;
Eu canto o que sinto.
Meninos, eu vi
O corpo inteiro
Bonito e faceiro
De Jequiriti-Jequitá!
Eu vi Ribeiro abraçar
E depois desmaiar.
Eu vi Jequiriti
Trepada no Jequitibá.

Meninos, eu vi
Ribeiro por lá!...
TAPUIA




Tapuia, tapuia!
Por que és tão bela assim?
Se tu não fosses selvagem
E apenas uma miragem
Eu te levaria pra mim!

Venham todos, venham já
Ver a índia tapuia dançar
Com um colar no pescoço
E na mão um maracá
A sacudir e a cantar

Como é lindo teu rosto!
Nariz bem feito, afilado
Nudez de corpo e mente
Por que, por que de repente
Eu tive que acordar?

Índia morena tapuia,
Vem meu sonho povoar
Do nascer ao sol poente
À sombra da tabebuia
Vem, Tapuia, vem morar!





MORTE TAUPUIA



Tapuia, tapuia
Nas águas do Solimões
Rio Negro e Madeira
Vi a árvore inteira
De teus sonhos, do teu lar,
Tua casa, teu pomar,
Descendo na correnteza.
Também no Urucuia
Com certeza vi boiar
Nas toras da tabebuia
Teu sonho, tua vida, teu lar.
Vi o homem matando
A tua raça tapuia.
Com a moto-serra cortando
Sucupira, jatobá e imbuia.
Cedro, angelim e candeia
Fazendo móvel e carvão
Com teu pulmão,
Coração e veia.






VERDE-AMAELO



Tinha uma borboleta amarela assentada
Tinha uma borboleta verde na flor amarelada

Tinha uma borboleta amarela na folha verde
Tinha um beija-flor verde na flor amarela

Tinha um canário amarelo no cajueiro verde
Tinha um olho verde me olhando

Tinha uma criança correndo
Tinha uma criança brincando

Tinha um velho gemendo
Tinha um velho amarelo chorando

Tinha um homem verde sonhando
Tinha um homem amarelo gritando

Tinha um sonho verde na mente
Tinha um sorriso amarelo no rosto

Tinha uma pessoa doente
Tinha outra sorridente

Tinha um operário trabalhando
Tinha trabalho aos montes


Tinha um ofício trabalhoso
Tinha um ocioso reclamando

Tinha uma velha caminhando
Tinha uma velha brigando

Tinha um velho sentado
Tinha um velho correndo

Tinha um velho batendo
Tinha um velho apanhando

Tinha uma porta trancada
Tinha uma porta fechada

Tinha um cidadão preso nela
Tinha uma moça na janela

Tinha um ladrão na rua
Tinha uma mulher vestida

Tinha outra seminua
Tem tudo isso na rua







ATÉ QUANDO




Uma lista enorme de até quando
Surge de maneira assustadora,
Machucando nosso coração.
Até quando, meu Deus?!
Até quando?

Até quando o mundo das drogas
Continuará derramando sangue inocente
Até quando?

Até quando a ganância do homem
O levará a cometer crimes insanos,
Desumanos, com objetivos escusos,
Confusos, destruindo a natureza?
Até quando?...




FOBIAS


Quem não tem saudade do tempo em que
se podia ir e vir. Andar sem medo pelas ruas de qualquer cidade.Dormir com janelas abertas sem fechar a mente
e o coração ao semelhante. Quem não sente falta dos tempos em que somente o dono podia tanger os bens tangíveis.

Quantos medos aportam o coração humano!
Quantas síndromes, quanta fobia...
Quando os cães andavam soltos
Temia-se apenas a hidrofobia que causavam
Mas a carrocinha recolhe os que ladram
Enquanto o ladro continua a assustar
Provocando as mais diversas síndromes:
medo de assalto, de seqüestro, de bala perdida
Enfim, fobia social. Não apenas medo de sair de casa
Mas medo de tudo – pantofobia.




ROTINA DO MEDO



Era janeiro, chovia forte no Rio
Água cristalina lavava a rua, a praça...
Pingava aos molhos na janela
E pintava na vidraça uma tela
Como lágrimas a escorrer nos olhos.

Um impacto na retina
Cai a vidraça quebrada
A menina dos olhos chora
E uma lágrima avermelhada
Escorre no soalho

Um corpo perfurado de bala
Cai na sala, sem vida
Tudo vai para a vala:
A água poluída, a vidraça quebrada
E a vítima de bala perdida.





RIO NEGRO E SOLIMÕES



Vi o rio negro espremendo
Vi o limão espremido
Vi o limão espremendo
Vi o negro espremido
Vi o limão dissolvendo
Nas águas negras do rio

Quanto mais os rios lutavam
E como aranhas, brigavam
Cada um corra em seu fio.
Vi o limão espremendo
Vi o limão espremido
Nas águas negras do rio





VELHO CHICO




O Velho Chico, antes tão rico
Agora pede esmola.
Com uma sacola implora:
Uma xícara de chá para o Chico!

Fuxico nas margens e nascentes
Essa gente está brincando
Enquanto uns estão se afogando
De sede, morre o rio.

Em seu leito de morte, sem água
O Velho Chico deságua em pranto
Uma lágrima corre no rio.
Por favor! um copo d’água.




ECO ESCATOLÓGICO



Meninos, eu vi!
Eu vi a lua caindo
E vi o sol pendurado
Eu vi o céu prateado
E vi o sol pranteando

Eu vi a lua chorando
Eu vi o sol abraçando
A montanha no ocaso
Eu vi o mar navegando
O rio se afogando

Meninos eu vi!
Eu vi o fogo queimando
A mata agonizando
Vi o arco-íris tentando
Beber água na miragem

Meninos eu vi!
Eu vi o mar mendigando
Pedindo uma gota d`água
Eu vi o mundo selvagem.
Meninos, eu vi!





ÚLTIMO DIA



Antigamente, o alimento saudável e perfeito
Era produzido de forma artesanal
Hoje, industrializado, geneticamente modificado
É um mal embalado que se compra feito:

Gordura saturada, comida enlatada
Adubo químico nos legumes de comer
Água sanitária, cloro, mercúrio, zinco
E resíduo fecal na água de beber

Assim, a vida aos poucos se consome
E ninguém conseguirá sobreviver
Ou se morre de sede e de fome
Ou come e bebe para morrer.





TSUNAMI
& 27941;& 27874;



A bola gira e sobre ela a formiga não tonteia
Nem sabe que a bola cheia de gás venenoso rola.
Tectônicas se deslocam e se chocam
O mar se agita e cambaleia.

Abalada a terra treme forte
Vesúvio chora lava incandescente
Inconscientemente, traz morte infame
Como as águas do dilúvio tsunami.

O mar se agita, vomita águas revoltas
Arrastada pela correnteza em total distúrbio
A formiga mortal grita indefesa.
E se afoga aflita no dilúvio.






CATRINA




Não importa qual a classe social da dama
Se todos nascem para a vida
Que se expande até à morte
Onde está enterrado o chapéu de dândi?
Nenhum vendaval revela sua sorte
Sonhos soterrados nas encostas Catarina
Não apagam a mexa de amor que ainda fumega
No coração da menina.








AGULHA IMANTADA




As linhas podem ser tortas, mas apontam para a mesma direção. Indo para o Sul ou para o Norte, o Oeste da vida é caminhar para a morte. O crepúsculo do sol, é igual ao Leste onde ele nasce.Caminhamos para a mesma direção, o Norte, para onde a agulha imantada sempre aponta - a morte.





ECO (LÓGICO)




Floresta, pássaros, festa
Chuva, sol, fotossíntese, oxigênio
Em síntese: vida.
Moto-serra mata a mata
Chaminés, carvoeiras – buraco na camada de ozônio
Casa sem porta, exposta ao calor excessivo ou frio
Serra Pelada derrete como manteiga
A terra desliza, cai na nascente do rio
De repente a natureza meiga - morta
A alma descrente julga a si mesma:
Um grito de dor e sofrimento abafado
Mente eco-lógico distante, passado errante
E por um momento, quase infinito, gritos de medo
Saem da tenda sem teto, sem afeto
Abóbada celeste, como no princípio:
Noite sem dia... E as trevas cobrem a Terra informe e vazia.





LITEROFOBIA




Pacientemente um livro espera na estante às vezes,
um pouco mais distante, na prateleira da livraria. Sobre o criado-mudo, o livro de cabeceira espera ser aberto. Por certo, ainda fechada, também está a Bíblia Sagrada. Mil páginas de sabedoria à espera de uma visita...
Gira a esfera, o sol declina. Vai-se um dia, depois outro. E assim, dezenas de dias se vão como aves migratórias, que em bando e revoada repetem a trajetória no céu.
E no fim da lida, no crepúsculo da vida, o homem descobre que não leu. Nem escreveu sua história de vida.







PALAVRAS MÁGICAS




Trabalhar, sonhar, pensar, voar, criar, escrever,
acreditar, grafar, gravar no coração, passar
para o papel a arte, o sonho, a alegria, a
nostalgia e a dor. Esvaziar a alma,
encher o coração, caneta,
papel na mão, registrar
sonhos, realizações
e ilusão.
Sorver a
taça do
inevitável
fel, beber o
mel que a
vida oferecer
Sonhar, viver e morrer

...


NOTA DO AUTOR

Para quem ainda acredita nessas coisas vão aqui algumas informações:

Decisão Executiva nº 09, de 08 de maio de 2009.
O Presidente da Fundação Biblioteca Nacional (FBN), no uso das atribuições legais que lhe confere o Estatuto aprovado pelo Decreto nº 5.038, de 07 de abril de 2004,

Resolve:

Estabelecer as normas gerais que seguem, para concessão de Bolsas para Autores com Obras em fase de Conclusão por meio do Programa Nacional de Apoio à Pesquisa da Fundação Biblioteca Nacional.

FINALIDADE
Com o objetivo de incentivar a criação literária nacional, a Fundação Biblioteca Nacional concede Bolsas para Autores com Obras em Fase de Conclusão. Em reconhecimento à qualidade literária e técnica de seus textos, esta concessão de bolsas visa a estimular o escritor a concluir obra de sua autoria.

1. INSCRIÇÃO
1.1. A inscrição é permitida a autores que já venham trabalhando nos textos, com no mínimo & 8531; (um terço) dos originais digitados.

1.2. Para se inscrever, o candidato deverá preencher o formulário de inscrição (disponível no final deste edital) e encaminhá-lo, junto com o material detalhado no item 1.4, à Coordenadoria Geral do Livro e da Leitura (CGLL), no prazo estabelecido.
[...]
1.6. As inscrições devem ser feitas por SEDEX com AR (aviso de recebimento) endereçadas à:
Fundação Biblioteca Nacional
Coordenadoria Geral do Livro e da Leitura (CGLL)
Programa de Bolsa para Autores com Obras em Fase de Conclusão
Rua da Imprensa nº. 16/sala 1110 – Centro
Rio de Janeiro – RJ - Brasil
CEP: 20 030-120

[...]

4. PAGAMENTO DAS BOLSAS
4.1 Serão concedidas bolsas no valor total de R$7.500,00 (sete mil e quinhentos reais) cada, integralizadas em 06 (seis) parcelas iguais e subseqüentes, no valor de R$ 1.250,00 (hum mil duzentos e cinqüenta reais).
4.2. O bolsista contemplado não pode apresentar débitos relativos aos tributos federais e à dívida ativa da união
4.3 O número de bolsas concedidas dependerá da disponibilidade orçamentária da Fundação Biblioteca Nacional e da qualidade técnica e literária dos trabalhos inscritos.
4.4 O pagamento aos bolsistas contemplados será processado mensalmente, diretamente ao bolsista, mediante depósito em conta bancária a ser fornecida pelo bolsista quando da assinatura do contrato.
[...]
4.7. A formalização da bolsa acontecerá após a assinatura do Contrato de Concessão de Bolsa pelo bolsista agraciado e pelo Presidente da Fundação Biblioteca Nacional.
4.8. O início do pagamento da bolsa fica vinculado à assinatura do Contrato de Concessão de Bolsa entre o bolsista e a Fundação Biblioteca Nacional.

PRESIDENTE

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