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Artigos-->3. UM CRIMINOSO ARREPENDIDO -- 11/03/2002 - 07:02 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Então, o homem foi preso. E, na prisão, conheceu as agruras da consciência. Não que não tivesse passado antes por fases de profundo rancor contra tudo e contra todos. Mas estava constrangido a conviver com gente da pior espécie, naquele esfrega-esfrega físico da superpopulação carcerária. E precisava defender-se de todo tipo de assédio. Mas tinha a sua fama sanguinolenta e, sem desafiar, não teve muito que fazer para infiltrar-se em uma quadrilha que exigia muito, mas nada que não pudesse oferecer.



Em todo caso, a condenação previa mais de vinte anos de cárcere e as notícias que lhe chegavam de fora vinham com o claro-escuro das misérias e das raízes das pequeníssimas felicidades, que os filhos haveriam de crescer em harmonia com os ditames de uma crença religiosa que ele não tinha.



Foi assim que lhe caiu às mãos O Livro dos Espíritos, porque se atrevera a dizer que fora alfabetizado na cadeia. O sujeito chama-se Onofre e o que lhe forneceu a obra, Mário.



Apenas soletrava, de modo que era muito penosa a decifração de cada página. Mas havia o Mário, que o visitava a cada quinze dias e que lhe cobrava as lições em troca dos relatos, sempre ilustrados com fotos dos filhos e de outros membros da família.



Onofre tinha uma longa lista de crimes e maior seria se o aparato policial estivesse adequadamente preparado para o registro de todas as ocorrências. Quando despachou um honorável membro da sociedade, indivíduo eleito para a vereança no interior em vilegiatura pela capital, foi perseguido e preso. Torturado e alcagüetado, pôs os investigadores de alerta e logo se viu que o suspeito era ainda pior do que se imaginava.



Deu no que sabemos.



Mas os filhos cresciam e as fotos iam ficando cada vez mais distantes dos quadros que a memória conseguia pintar. Até certa idade, compareciam para as visitas. Depois, nem isso, de modo que, quando estava terminando a leitura do livro pela segunda vez, de forma bem mais corrente e proveitosa, principalmente pela competente assiduidade do Mário, já se despedia dos amigos carcereiros, alguns comprados com o sacrifício dos depósitos clandestinos do material furtado, para ir a outro tipo de reclusão, espécie de regalia diurna para quem demonstrava estar em dia com os padrões de comportamento considerados pela humana justiça para devolver o sentenciado ao convívio social.



Arrumada uma atividade remunerada, escapava no horário do almoço para visitar os filhos, que a esposa fazia muito tempo desaparecera.



Uma noite, convenceu um dos policiais de plantão a acompanhá-lo a um centro espírita e, pela primeira vez, esteve com uma multidão de crentes da existência da vida após a morte e doutras tantas idéias de que se impregnara através da leitura.



Em suma, matuta que matuta, chegou à conclusão de que ouvira uma voz misteriosa provinda do fundo da alma que lhe dizia o que fazer na hora dos crimes. Hesitava em atribuir o fato a espíritos obsessores, conforme Mário insistia em lhe declarar. Acabou achando que era a viva voz de sua própria ignorância, formulada e fundamentada em vidas pregressas de muitos crimes e de profundos horrores, a abafar, inclusive, a tímida infiltração dos mentores espirituais interessados em lhe passar a necessidade de se arrepender.



Hoje, muitos anos após haver desencarnado, luta consigo mesmo no Umbral, desejoso de desvendar os segredos de tanta maldade, atribuindo tudo ao mistério de sua constituição espiritual. Sofre hipocondriacamente de certos males psíquicos mas, em vislumbres de sanidade, chega a perceber que está em fase de melhoria.



Quando pode, vai visitar o amigo Mário no centro espírita em que este atua como doutrinador nas sessões de desobsessão, travando com ele alguns papos muito gostosos a respeito da responsabilidade das criaturas, tendo em vista o amor de Deus.



Ao receber de volta um dos filhos, vítima das drogas, rogou pela primeira vez o auxílio direto do Senhor, que não se sentia com forças para atenuar o desespero do outro.



Depois disso, tem refletido bastante a respeito de como tudo se apresenta tão insano quando se atribui ao egoísmo a condição de administrar a personalidade. Mas não se lastima senão por um fato que considera importantíssimo: o de que conta nos dedos de uma única mão as almas que poderia considerar no limiar da felicidade de sair da escuridão para a luz. Aliás, apenas tinha ciência da luz no mundo espiritual porque efetuava uma analogia com aquela que desfrutava estando vivo.



Isso lhe deu a idéia de requisitar um retorno à carne de muito sacrifício físico, qual seja, o de que deveria nascer cego. Mas como sabe que essas coisas não pode decidir sozinho, porque implica necessariamente em que outros seres estejam precisando de algum tipo de lição no campo cármico, pôs a inspiração no molho das conjecturas, no aguardo de que se deixe embrenhar pelo tempero da coragem.



Outros episódios nós poderíamos ter acrescentado a esta simples narrativa. Nada, porém, que pudesse constituir-se em notável exemplificação para a tese de Firmino, conforme exposição anterior. Se não conseguirmos aproximar o tópico extraído da realidade aos dados metafísicos do amigo redator, fique o exercício para as mentes atiladas dos leitores, que saberão dar um sábio destino a estes desenvolvimentos.



Mas que Onofre se arrependeu, isso consta nos anais de nossa Escolinha de Evangelização.



Um dia ou outro, Mário aparecerá por estas bandas para completar a tarefa em que se empenhou na esfera material, trazendo para a colônia espiritual aquela entidade carente de conhecimentos mas cujos sentimentos estão recebendo algum influxo arquitetônico, no sentido da percepção de que existe um passo premente a ser dado: o do alívio das forças deletérias emanadas dos seres por ele prejudicados e que necessitam também de receber ao menos a idéia da luz, como forma de saberem que algo existe realmente superior e que lhes está escapando de seu campo de visão. Aliás, durante alguns anos, perdemos contato com Onofre. Depois ficamos sabendo que vagava à deriva na escuridão, prenhe de fortes dores no baixo ventre, local em que atingira o tal vereador. Coisas da divina justiça difíceis de meter na mente obnubilada das criaturas que se deixam levar pelos instintos primitivos.



Firmino nos acompanhou o desenvolvimento sem participar. Agora no fim, pediu para que observássemos o fato de que o crime de Onofre talvez mereça de Deus certa...



Cortamos a sua frase para estímulo aos leitores a respeito de qual teria sido a contribuição dele dentro dos parâmetros da doutrina espírita, relativamente aos criminosos ignorantes e arrependidos.



Quem irá tirar de letra a pendência que não chegou a estabelecer-se?



Por favor, não menosprezem as lições de casa, nem que lhes exijam um sacrifício maior para a pesquisa bibliográfica. É assim que se aprende a parte teórica.



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