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Contos-->RELATOS DE UM MATRIMÔNIO E PATRIMÔNIO -- 21/12/2002 - 03:06 (COELHO DE MORAES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


RELATOS DE UM MATRIMÔNIO E PATRIMÔNIO
( uma novela indomável )


1) Era uma vez um mercador bastante pobre que tinha o dom de fazer maus negócios por vários motivos. Um deles era a honestidade, pois é sabido que uma pessoa para atingir os píncaros da riqueza tem que, necessáriamente, roubar. Não há rico que não tenha roubado, dizia o sábio Aricanduva de Freitas, enquanto bebia gole sobre gole de chá mate e, completava cuspilhando no chão do bar:- "Se pensa que não roubou...: está melindrado ou está de bestança. Basta oiá o seu lucro perto da infração e responder com cuidado de gente ciente se não aproveitô que a infração minava os borso enquanto o mercadô aumentava os preço das coisa." E, Aricanduva ainda dava exemplos de especulação, que no meio mercantil tinha o esquisito nome de "negócios" e era um comportamento aceito por todos.
Mas, dizia eu, o mercador da história era pobre e amicíssimo do tal Aricanduva, seu conselheiro em assuntos de moral comerciária, de modo que, Aricanduva, levou o amigo mercador à bancarrota em pouquíssimo tempo, o que deixou aquele mercador bastante feliz, uma vez que não precisou roubar nada, apesar de sofrer constantes atentados dos outros mercadores e do próprio governo do seu país, que era, aliás, o principal condutor dos tais "negócios". Aquelas coisas de ricos empresários,que também eram políticos, que também defendiam seus interesses particulares, que também enganavam a população besta com chavões e palavreado mentiroso e viviam impunes, com garbo e chapa fria nos automóveis.
Tinha, o mercador honesto, duas filhas: Canarita e Chiamba ( lê-se Quiamba, por favor ), óbviamente, completamente diferentes uma da outra pois se tal não fosse, as duas se chamariam Canarita, ou quem sabe (?), Chiamba, sendo que as duas seriam uma só, o que a Física não permite, uma vez que não ocupavam o mesmo lugar no espaço.

2) Chiamba era bonita, inteligente, prendada, obediente, só falava palavrão escondida no quarto, mesmo assim, com a cabeça enfiada num saco, com vergonha de si mesma, por descer tanto na escala da civilização e parecer com as mulheres chulas e inescrupulosas do burgo. Das quais ela invejava um poucochinho só.
Por outro lado, Canarita, que também era bonita, tinha a propriedade de, quando quisesse, ficar feia, só de brincadeira e, isso acontecia muitas vezes, pois tinha mau gênio -- não o da garrafa, mas, o da personalidade individual -- repetidas faltas de educação que muitos relegaram a uma falta de memória e, era muito desobediente, aproveitando o ensejo para xingar todo mundo e contar as mais cabeludas das piadas de salão de prostíbulo, de tal forma que nunca tinha a amizade de ninguém, exceto a de um papagaio que adorava suas piadas obcenas. Ele aprendia todas e as repetia para o padre.
Por isso, Chiamba possuía inúmeros admiradores tarados para se casarem com ela, levarem-na para casa, dormirem com ela, fazerem filhos nela, fazerem com que ela limpasse suas casas, suas roupas, limpasse o chão, desde que desse de comer para seus inúmeros filhos e ainda sentisse o cheiro de cerveja e cigarro no mais afundado de suas camas de crina de cavalo, os quais cavalos, mesmo não tendo entrado diretamente para a história, saíram perdendo porque ficaram sem as crinas. Rá, rá, rá...
Mas, o pobre besta do pai, só consentiria que Chiamba casasse após o matrimônio da mais velha, que era Canarita que, diga-se de passagem, nem pensava em tamanho disparate.

3) Havia três sujeitos que estavam afinzões ( se o distinto leitor me permite a invencionice ) de Chiamba e ficaram paus-da-vida quando souberam da arcaica lei, enfrentando a modernidade de Canarita e, enquanto o pobre mercador se transformava em pobretão, os três possíveis noivos articulavam mumunhas e traquinagens para, um dia, surrupiar a Chiamba e casarem com ela, uma vez que era difícil encontrar empregada igual na praça.
O mais esperto era um tal de Luzivaldo; um sujeito magro que quando tinha quinze anos era muito mais baixo do que quando tinha vinte e um, o que lhe valeu a alcunha de Lulu-Rabicho, já que ele andava atrás das saias de mulheres e de padres, sem deixar nada no olvido. Rabicho, fazendo-se de professor de línguas, foi levado à casa do pobretão mercador, que não tendo como pagar, dava-lhe quilos de batatas e peixe salgado, enquanto o professor ensinava as funções da língua para as moças.
Havia um segundo, chamado Crébio, ou Calébio, sei lá, que se oferecera como jardineiro, trabalhando gratuitamente, apenas com o intuito de se aproximar da bela Chiamba. Levav-lhe flores e poupadas de terra cheia de estrume de boi com que cuidava das plantas.
O terceiro era Mortêncio, professor de música que se propôs a transformar as donzelas ( assim todos acreditavam ), em primas-donas, o que seria muito interessante se as duas irmãs fossem as primeiras, caso a Física não aparecesse novamente para impedir que o absurdo acontecesse. Este Mortêncio era o mais apaixonado.
Várias e várias vezes eram pegos fazendo serenata sob a janela das garotas e não poucas vezes tomaram banhos de urina que o mercador pobretão ( já entrando em campos de pauperismos ), os presenteava nos confins da madrugada. Não por cantarem para as filhas, mas, por não permitirem que ele dormisse, esquecendo-se das dívidas que se avolumavam.
A essa altura da estória, Chiamba não tem preferência. Qualquer um serve, o que já nos dá uma idéia profunda da mentalidade desta menina. A primeira impressão é a da garota fútil que só quer casar, ter filhos, engordar e ver televisão se queixando de varizes. A Segunda impressão, também. Saberia ela que a mutação em monstro -- fenômeno que ocorre com a maioria das mulheres ao passar do tempo, se dá por causa do relaxamento e, não por sua consequência natural do envelhecimento?
Canarita a aconselha a dormir com os três, não ao mesmo tempo, mas, se possível na mesma noite, de modo a ter uma maneira de se decidir. Chiamba corre para o quarto, enfia o saco na cabeça e xinga a irmã.

4) Então, chega um tal de Perúquio ao burgo, que é um andarilho e vendedor de elásticos, presilhas, alfinetes, lixas para calo, xampus, fivelas, pedras pomes, não sendo careca nem tendo parentesco com o legendário Pinóquio.
Perúquio era amigo de Mortêncio, um tanto ingênuo - adjetivo causado pela sua beleza e lassidão - tendo já cantado juntos na grande cidade, fazendo a dupla Saltimbancos das Estrelas, sempre vestidos de jardineira e chapéu de três bicos, Mas, Perúquio, um tanto simplório, queria encontrar uma moça rica para se casar, por isso, Mortêncio - decididamente o mais esperto dos três - mancomunado com Crebio ou Quelébre, sei lá, e Luzivaldo, tenta fazer com que o viajante e caixeiro, se decida a se casar com a vulgar Canarita, que apesar de tudo era pobre.
--- Vocês não escutaram direito. Quero mulher rica, meus chapas!
--- Você é que é cego, meu chapa --- Mortêncio completava o diálogo edificante --- Já a viu de costas?
--- Realmente é coisa que não me interessa.
--- Ô! --- Gritaram os três possíveis noivos --- Nem parece o velho Perúquio. Não se interessa mais por mulher, chapa?
--- Vocês me entenderam --- afirmou categórico.
--- Vamos lá --- falavam ao mesmo tempo os três neos-patetas. --- Conversemos com o pai mercador e alabardeiro de última geração.
A palavra soou bem aos ouvidos de Perúchio.
--- Pai...mercador?
"Exatamente", teriam dito os três, caso não baixassem e levantassem a cabeça, munidos de sorriso abobalhado e olhar de tatu com doença de Chagas.
Perúquio, então concluiu: --- Precisamos conhecer tal donzela. Olé!!
Os três riram às costas do ludibriado contentão, ao mesmo tempo que davam umas castanholadas frívolas de felicidade.

5) Combinaram uma visita de Perúquio ao velho-quase-indigente mercador que pôs, então, suas barbas de molho, sua melhor roupa, brilhando com uma cusparada e tanto os seus sapatos negros de asfalto.
Perúquio apareceu, sobraçando fitas, dedais, grampos e placas de gumex, doando tudo como presente para a possível noiva. Os possíveis noivos de Chiamba estavam, no aupicioso momento, sob a janela. Ela ouve as melodias que lhe cantam, piscando os olhos para todos ao mesmo tempo, e sentindo umidades em partes mucosas muito bem enterradas na roupa de mulher pudica e virginal.
Canarita, por sua vez, não recebeu bem o possível noivo e muitas vezes deixou, segundo ela, sem querer, que um vaso caísse sobre os pés andarilhos do tal Perúquio O pai mercador e pobretão percebe ser, o tal jovem, exemplar espécime que tomará conta da moça, já que ele mesmo, com toda a sua devoção paterna não aguenta mais o amor filial e pretende vende-la ao primeiro circo que aparecer no burgo. Na falta de circo, o caixeiro-viajante servirá a contento.
Perúquio adivinhou no velho um usurário, sovina e malandrão que guarda tudo e não gasta, deixando a família a passar fome, se bem que as formas bojudas e protuberantes de Canarita desmintam a inanição. E de olho nos almofadados - da moça - e na bolsa alhures escondida - do pai - resolve que se casará na semana que entra, mesmo que Canarita não queira, afinal, nada ela é para dar palpites alí.
Os amigos exultam. Mortêncio, Crebio ou Mamédio, sei lá, e Luzivaldo pulam de alegria e cantam "Última canção" para Chiamba, enquanto a noite chega e o sereno desce devagar.

6) Todo mundo é convidado para o casamento, e, mesmo que não fosse, pelo menos a rapaziada apareceria para ver qual o trouxa levará para casa a vassourinha da Canarita.
Nessa festa encontramos de tudo. Toda a fauna de uma sociedade bem instituída: as galinhas das senhoras que ditam a moral mutável de acordo com o mancebo que lhe aparece. Os advogados e juízes marmotas que vomitam leis incumpríveis. Os engenheiros civis que constroem ruínas e fazem peritagem de escombros.
Os ratazanas industriais e empresários que consomem a vida de seus operários. Os abutres médicos que adoram entranhas, tomando bebidinhas com os papagaios, araras, periquitos, psitacídios e outras alegorias, de modo que se julgam professores e ensinam modos e desmodos, maneiras de bem copiar sem raciocínio e dizer Eureka em fá maior. Além desses, uma cambada de bichos profissionais que valorizavam a festa com suas opniões lidas em revistas ou repetidas de livros lidos como quem vai ao banheiro depositar subprodutos no vaso privado de belo branco porcelâmico.
No entanto, Canarita apareceu toda desmazelada, falando enrolado como alguém que bebeu, mas, que na verdade era porque o cachimbo atrapalhava a parlatória; cabelos desajeitados, roupas rotas e rosto pintado de qualquer jeito.
Perúquio ficou louco da vida e disse que aquilo era um ultraje.
--- Isto é um ultraje!
--- E, você queria o quê? Os três neos-patetas me atacaram lá no quarto enquanto eu me vestia --- Disse ela.
--- Que patetas?
--- Os possíveis noivos da minha irmãzinha, que neste momento está com a cabeça dentro de um saco.
--- E, porque não gritou, sua megera?
--- Porque eles ainda não tinham terminado, meu caro. Você acha que eu vou perder a chance das apertações e rosnados, a trôco de nada?
Perúquio estrilou: --- Como, a trôco de nada? Por acaso eu sou nada?
E, a resposta veio rápida: --- Veremos... após o casamento.
O pai pobretão-miserável estava perplexo com o desenrolar dos acontecimentos, mas feliz, pois aquilo não era coisa que desse prejuízo. A festa fôra paga pelas pessoas da vizinhança que vendiam até lugar na festa, para tudo, tudinho ver: o grande casamento da réles Canarita, abandalhada dos cinco costados e a primeira besta que apareceu. E, gostaram, pois o espetáculo estava dos bons.
Neste momento desceram as escadas os três-neos-patetas e possíveis noivos dizendo que não queriam mais o casamento com a menina Chiamba, uma vez que ela não retirava o saco da cabeça, limitando-se a dizer palavrões de todos os tipos e variedades.
Contudo, o pai, paupérrimo, explica que terão de casar com a mais moça de qualquer jeito, já que ele aguentou noites e noites de uma cantoria chata pra cachorro e não iria, por mais nem por menos, permitir que a pequena filha também ficasse frustrada por ouvir todas aquelas baboseiras em forma musical e, daquele momento em diante ficasse a ver navios a saír e entrar na baía.
Os três amigos tiraram par, ímpar ou trimpar - já que ram três - e a vitória acabou recaindo sobre Luzivaldo que, imediatamente, começa a chorar.
Perúquio também está chorando e consola o amigo. Caíram em arapuca e não há maneira de escapar. Todos da cidade são testemunha e, o pior, são do tipo idôneo, pelo menos lá entre eles.
Crebio ou Lédio, sei lá, e Mortêncio saem de fininho, pela janela, levando alfenins, biscoitinhos de gengibre, pedaços de bolo Xanxerê, pecan pies, gugelhupf, brioches, savarin, churros, mufins, trufas de chocolate, ravioli doce, petit carré, rocamboles, pudim Molotoff - come e explode - mechinkof, bavarois, e pedaços furtivos de torta Klamotte, nos bolsos e no bojo do alaúde.

7) Dá-se o duplo casamento e os convidados começam desesperadamente a rir, sem parar, das caras respectivas dos noivos que herdaram, sem mais o que reclamar, um culatrão daqueles, no que tangesse à popular Canarita e uma donzela-de-candeeiro que, enquanto encabeçava sacos para não ver, armava das suas com as velas da casa, não vendo.
E, assim, meus amigos leitores, todos foram insatisfeitos para suas núpcias. Não o pai, misérrimo-mercador-falido que lucrou, enfim, não mais tendo que alimentar duas bocas. A vizinhança lucrou também, pois conseguiu o seu quinhão de fococas e motivos para comentários amplos e irrestritos, como convém a um povo civilizado.

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