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Artigos-->TRANSFORMAÇÕES -- 21/11/2012 - 13:53 (Roberto Stavale) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Neste artigo tentarei descrever como surgiu a nossa Avenida São João, um dos ícones da cidade de São Paulo, cantada em prosa e verso, cartão postal da terceira cidade do Planeta.

A antiga Igreja da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, construída em 1711 no Largo do Rosário, hoje Praça Antonio Prado, foi o embrião da referida avenida.

Por volta de meados dos anos setecentos, a São João já tinha o seu traçado até as proximidades da atual Avenida Ipiranga. Daquele ponto em diante iniciava-se a estrada que seguia para a Freguesia do Ó.

Na época, quem vinha do lado norte dos arrabaldes do povoado tinha de atravessar a Ponte do Acu sobre o córrego Anhangabaú, e seguir a viela chamada Beco do Acu até a igreja. Mais tarde o beco passou a se chamar Caminho de São João Batista, nome escolhido para homenagear o protetor das águas, pois diversas vezes a rude ponte de madeira foi levada pelas enchentes ocorridas no vale.

A uma centena de metros da Igreja do Rosário, ficava a Igreja de São Bento.

Devido ao grande número de pessoas que se dirigiam às duas igrejas, principalmente aos domingos, a Câmara Municipal de então decidiu abrir uma rua, desde a Ponte do Acu até a Rua São Bento. Na ocasião ficou conhecida como a Ladeira do Acu, primórdios da Rua São João.

Uma planta pitoresca de 1810 mostra em detalhes o trajeto, que dois colonos, Henrique de Cunha Gago e Cristovão da Cunha, solicitaram para a abertura da futura avenida, desde o Largo do Rosário, atravessando a ponte, terminando na antiga Rua Dona Tereza, atual Avenida Duque de Caxias.

Anos mais tarde, a Ladeira do Acu ganhou o nome de Ladeira São João.

Com a chegada da fotografia, em 1860, a Ladeira São João já era mostrada em todo o seu resplendor.

Aquele pedaço de solo representava muito para a antiga cidade e sua sociedade. Além de comércio, bancos, bares e redações de jornais, o local abrigou o primeiro cinema de São Paulo.

Em novembro de 1907, o Theatre Bijou abria as suas portas para o glamour da sociedade paulistana. Afinal, tratava-se do nosso primeiro cinema com endereço fixo. Pois desde a sua chegada, em 1895, as apresentações eram feitas em lojas ou barracões de zinco armados às pressas, e sem data nem horário para a exibição de filmes.

O Bijou ficava na ladeira da Rua São João, onde hoje está o Edifício Martinelli, com capacidade para quatrocentas pessoas.

O endereço já era conhecido pelos entretenimentos, já que lá funcionava um boliche, que depois transformou-se em um pequeno teatro.

O local tornou-se ponto de encontro, inclusive da alta sociedade, que a imprensa chamava de "mundo smart".

Dispunha, inclusive, de uma chapelaria onde os clientes guardavam bengalas, chapéus e casacos. Um botequim com charutaria. E camarins para os músicos – a trilha sonora dos filmes, mudos à época, era ao vivo, tocada por um conjunto musical.

O cinema falado chegou ao Brasil em 1929.

Durante a semana, as sessões aconteciam às 18h30. E aos domingos, às 13h30 e às 19h30.

Como cada película não passava de quinze minutos, as sessões exibiam de quatro a cinco filmes.

O projetor, atrás da tela, produzia calor intenso que esquentava o tecido. Assim, nos intervalos era necessário molhar a tela para evitar incêndio.

Os proprietários do Bijou, os empresários Francisco Serrador e António Gadotti, estavam havia anos no mesmo ramo, com seus teatros e cinemas ambulantes.

Em 1910, o Theatre Bijou anexou um salão, dobrando a capacidade para oitocentas pessoas.

Filmes como A dama das camélias, Raio de luz, O fim do mundo, entre outros, lá foram exibidos.

Mas o Bijou teve vida curta.

Com a reforma do Vale do Anhangabaú e da já Avenida São João, em 1914 o cinema foi demolido, assim como a Igreja do Rosário, posteriormente reconstruída no Largo Paissandu.

Até o final de 1960, a Avenida São João e suas travessas, a chamada Cinelândia, foram palco da vida noturna e boemia da grande cidade.

Dois fatos trágicos marcaram a Avenida São João.

O primeiro foi o crime do castelinho da Rua Apa, 236.

Construído em 1912, esquina com a Avenida São João, lá morou uma das mais tradicionais e ricas famílias da pauliceia.

No dia 13 de maio de 1937, os proprietários Maria Cândida Reis e seus filhos Armando e Álvaro foram encontrados mortos, assassinados a tiros no interior da mansão. Quem matou a família Guimarães dos Reis? Todos queriam saber. A imprensa, a população e principalmente a polícia.

Segundo o inquérito, o boêmio Álvaro queria transformar o Cine Broadway, também na Avenida São João, propriedade da família, em ringue de patinação. Seu irmão, o advogado Armando, era contra. Teria havido uma discussão. Um dos irmãos saca uma arma e dispara contra o outro. A mãe, ao ver a briga, corre para se interpor entre os dois, mas também é atingida. O atirador, desesperado, resolve dar fim à própria vida.

Os policiais nunca descobriram a verdadeira razão nem qual dos irmãos seria o assassino. A única possível testemunha, a empregada, correu para a rua ao ouvir os tiros, pensando que fosse um assalto, e pediu ajuda. A população nunca se convenceu da história dos policiais.

O castelinho hoje está em ruínas. Nem moradores de rua gostam do local, pois dizem que é mal assombrado.

O segundo foi o incêndio do Edifício Andraus com trinta e dois andares, situado na Avenida São João, esquina com a Rua Pedro Américo.

No dia 24 de fevereiro de 1972 ele foi completamente tomado pelo fogo, provavelmente devido à sobrecarga elétrica.

Na tragédia morreram dezesseis pessoas, e trezentas e trinta ficaram feridas.

Foi o primeiro grande infortúnio da cidade, filmado ao vivo pela televisão. Dias depois, as cenas impressionantes das pessoas caindo em chamas do edifício continuavam a aterrorizar o mundo.

Assim, a Avenida São João é uma grande referência, principalmente para os turistas.

Quem não conhece a música e a letra de Ronda de Paulo Vanzolini: "E nesse dia então, vai dar na primeira edição, cena de sangue num bar da Avenida São João". Ou então Sampa, de Caetano Veloso: "Alguma coisa acontece no meu coração, que só quando cruza a Ipiranga e Avenida São João".

Hoje, em toda a sua extensão, o Beco do Acu, o velho Caminho de São João Batista, a Rua São João e, finalmente, a Avenida São João pertencem ao passado, pois fazem parte do Centro Antigo, completamente desfigurado da agitação de outrora.





Roberto Stavale

São Paulo, novembro de 2012

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