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Ensaios-->Macartismo racial -- 01/08/2007 - 10:30 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Macartismo racial

http://opiniaoenoticia.com.br/interna.php?id=10167 - 06/07/2007

Em artigo publicado no jornal O Globo, a historiadora Isabel Lustosa escreve sobre a suspensão e o processo criminal contra o professor Paulo Roberto da Costa Kramer por racismo.

Saiu a sentença da Comissão da Universidade de Brasília contra um de seus professores, o doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, Paulo Roberto da Costa Kramer. Ele também está sendo processado criminalmente.

O professor foi condenado a trinta dias de suspensão por ter ofendido alguns alunos com o epíteto de 'crioulada' a um aluno chamando-o de 'negro racista' e ao movimento que este vem liderando contra ele e outros professores de ' Ku Klux Klan negra'.

Creio que a situação deve ter começado com algum comentário infeliz envolvendo a expressão crioulada dita pelo professor em sala de aula. No desenrolar dos subseqüentes enfrentamentos, vieram outros epítetos.

Estes últimos já foram o resultado do estado emocional do professor e de sua incredulidade diante do pesadelo que estava vivendo.

Paulo Kramer não percebeu que o episódio que lhe parecia inicialmente sem importância se tornara uma boa bandeira para ser agitada pelos chamados negros profissionais.

Aqueles que, caracterizados com trajes supostamente africanos e que nunca foram usados pelas populações negras brasileiras, se dedicam em tempo integral à militância.

Paulo Kramer estava apenas nos primeiros degraus do calvário e do processo para o qual fora escolhido como o alvo ideal. Pois nada melhor para essa caça às bruxas, para esse neomacartismo racial que estamos vivendo hoje no Brasil do que um intelectual branco, de origem judaica, bem-sucedido e com idéias políticas liberais.

O processo faz lembrar aquele filme 'Uliana', de David Mamet, em que uma aluna acusa o professor de assédio sexual. O professor trata a aluna com familiaridade, até mesmo com afeto, explicando por que não pode mudar a nota.

Essa atitude amável é utilizada pela jovem para acusá-lo de assédio sexual junto a um comitê acadêmico.

Perplexo com o absurdo da acusação, ele a interpela e, ao perceber que se trata de uma tentativa de chantagem, reage com indignação, pegando a garota pelo braço para expulsá-la de seu gabinete. O movimento brusco faz com que se rasgue a blusa da moça, que aproveita para acusar o professor de tentativa de estupro. Enfim, o filmepesadelo continua até à ruína total da carreira do mesmo professor.

Paulo Kramer e o professor de 'Uliana' se formaram em um tempo em que o clima nas universidades era absolutamente informal, e professores e alunos se relacionavam em pé de igualdade. Inclusive estabelecendo relações de amizade com as brincadeiras, brigas e ofensas que as relações de amizade às vezes implicam.

O Kramer pensou que, na UNB, ainda podia viver da maneira em que vivíamos quando fomos colegas e os melhores amigos no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ, naqueles anos felizes do final da década de 1970. Cursamos a faculdade em um ambiente onde preponderavam negros e mestiços, e o inimigo comum ainda era a ditadura militar.

Dentre todos os alunos, o que mais se destacava era o Paulo Kramer, não só por ser um intelectual brilhante e por seu tremendo talento para a caricatura, mas também por ser o cara mais engraçado do mundo. Ninguém como ele para fazer piadas sobre professores e colegas, imitando-os.

Aliás, fazia a melhor imitação de Luis Carlos Prestes que já vi.

Um dos melhores amigos do Kramer era um colega que chamávamos Paulinho, de Vila Kennedy. Paulinho, uma liderança daquela região pobre do Rio, era negro, muito escuro, um afro-descendente que não deixaria qualquer dúvida nos membros anônimos do comitê secreto da UNB que hoje decide quem é negro e quem não é. O Paulinho morria de rir das bobagens do Kramer que, referindo-se aos estudos teológicos do xará, dizia que ele era Tomista. Num trocadilho de gosto duvidoso com o nome que se dá aos estudiosos do pensamento de São Tomás de Aquino. Não me lembro se, entre as brincadeiras, havia alguma relacionada com à cor do Paulinho.

Certamente havia. As brincadeiras entre colegas de universidade, hoje consideradas politicamente incorretas, eram constantes e, nem por isso, instauravam um clima de terror nos corredores.

Ao contrário, o clima era de ampla confraternização e, a uma brincadeira provocativa, o outro lado reagia com outra de igual teor.

Perto do final do curso participei com alguns colegas da criação do primeiro núcleo do movimento negro do IFCS. O fato que ajudou a impulsionar o nosso pequeno grupo não foi muito diferente do que mobilizou os estudantes da UNB.

Nós também acusamos uma professora de racismo sem levar em conta as circunstâncias atenuantes. Pois, menos do que uma racista, tínhamos, no máximo, uma pessoa intolerante e impaciente com as dificuldades que os mais pobres — não necessariamente os mais escuros — têm para cursar uma faculdade pública. O marido da professora era negro mas, mesmo assim, ela serviu bem ao nosso propósito. Nosso movimento não resultou em um processo legal como o que agora envolve o Kramer, mas, diante do trauma provocado pela situação, a professora decidiu pedir aposentadoria antecipada.

Até hoje me pesa na consciência o fato de ter prejudicado a carreira de alguém com o meu radicalismo. Pois sei que pior do que a sentença da Justiça é o estigma de racista em uma terra onde praticamente não há ou havia racismo e, sim, preconceito racial, que é coisa bem diversa e muito comum entre nós.
O preconceito deve ser combatido em todas as camadas sociais, e o Brasil tem leis para isto. Mas um processo contra um professor com base em razões tão discutíveis quanto essas que resultaram na sentença do Kramer só serve para instaurar um clima de medo, repressão e desconfiança na Universidade.

É fator de divisão, pois abre uma cunha entre professores e alunos, liquidando a possibilidade de um diálogo franco. E vem aumentar o potencial desagredador da política de cotas, estimulando a divisão entre os alunos por questões raciais. Questões que, cedo ou tarde, evoluirão para um verdadeiro racismo.





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