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Contos-->COTIDIANO -- 11/12/2002 - 13:28 ( Alberto Amoêdo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Naquele dia o Dr. Artêmio, Advogado conhecido na praça, homem de poucas palavras, gênio forte, cabelos grisalhos, olhos castanhos e pele negra como a luminosidade do açaí espelhada pelo sol ainda na palmeira, chegou pela manhã bem cedo, entrou e surpreendeu Marcos a varrer a sala de visitas e o gabinete e D. Eulália, a secretária, na cozinha fazendo o café. Ambos não estavam acostumados com a visita do patrão tão cedo. Pois normalmente, ele trabalhava pela parte da tarde, e pela manhã como conselheiro do Tribunal Contas do Estado. O que teria ido fazer ali ? Era a pergunta mais curiosa daquele instante, que logo seria desvendada, quando D. Fernanda adentrasse a porta, toda espalhafatosa, sorrindo a beça, como se estivesse satisfeita, e que quando viu D. Eulália atreveu-se a pedir logo o seu café da manhã, dizendo também que com eles a partir dali iria trabalhar, matando assim a curiosidade sem excitação. Em seguida, conversou com o marido, que lhe passou certas orientações e avisou aos demais, que D. Fernanda seria sua Administradora e que ainda naquela manhã, viria a filha de sua amiga, recém formada em Direto, fazer o seu primeiro estágio.
A manhã estava meio cinzenta, não pelas notícias do jornal, que mancheteavam a morte de mais uma dona de casa; o arrombamento de um carro na porta da Universidade Federal do Amapá, a alta da inflação no Pais e os Deputados e Senadores em “ urra” no congresso, pôr salários mais dignos. Enquanto a “C.P.I” mambembe, fazia seu show a parte. Mas pelo inverno que segredava no colo do natal um novo ano a espreitar, uma nova oportunidade aos homens de fazer o mundo mudar.
No decorrer daquela manhã, apenas D. Fernanda falava de tudo, mas não escondia sua frustração de não ter conseguido exercer sua profissão, porém estava feliz pela oportunidade; era uma bela mulher, cabelos ruivos e compridos pareciam dançar sobre a janela, assim como o verde louro da flâmula, sua pele branca e macia, cheirava a loções diversas, até sua boca transmitia um bem estar, não era tão bonita, mas de uma paciência e tranqüilidade, que a sua paz tornara-se de imediato necessária aquele lugar, sem falar na sua perspicácia. Na verdade, não era só Administradora, entendia de Contabilidade e Psicologia, daí advinha a frustração de que falava e o qual o marido queria acabar dando-lhe aquela chance, pois parecia está cansado de ouvir tantas lamentações noturnas.
Quando a tarde veio, o máximo que o Dr. Artêmio perguntou a D. Eulália foi se a D.Fernanda fez alguma coisa além de falar, e a resposta, como se estivesse esperando aquela pergunta, foi imediatamente respondida, quando ele abriu o seu gabinete e viu tudo arrumadinho e despachado. Esboçou um riso de contentamento momentâneo, e não se deu por surpreso, em seguida perguntou pela estagiária, se ela tinha vindo, e logo D. Eulália respondeu-lhe que não. Ainda recebeu uns clientes e como o tempo também não suporta esperar, passageiro da agonia da noite que é, fez logo todos lembrarem de irem prá casa ao som de mais um dia que termina.
No dia seguinte, Marcos chegou primeiro, abriu a sala, estava limpando o gabinete, quando a campainha tocou e ao atender, ficou estupefato, sob o efeito de um olhar penetrante, como se a luz do sol entrasse em sua alma e aquecesse o seu mais íntimo frio; renovando, sob nervoso momento, o sentido de sua medíocre vida. Era uma moça alta e forte, de olhos graúdos ébanos, com seus cabelos castanhos mel e uns lábios meio que úmidos, como se o orvalho da noite ainda nem secasse em sua boca; de formosura pura, tão terna que inspiraria qualquer pessoa a loucuras. Mas, sem perder a pose o rapaz apresentou-se como o Contínuo, Faxineiro, Cozinheiro e Estudante. Ele que era um rapaz de meia idade, uns trinta anos, bem conservado, moreno alto, magro, de olhos calados castanhos claros, de índole humilde e família pobre, dividia um segredo com D. Eulália, era formado, mas precisava do trabalho e certamente não alcançaria se dissesse na agência de empregos a verdade, portanto ficava calado e nada dizia ao Dr. Artêmio, pois pensava que ele não o oportunisaria, além de que, só é valorizado quem já vem capitalizado ou é filho de algum burguês . A moça sob tensão do momento, respondeu, com a voz de um sabiá que fala ao vento do inicio ao fim da tarde, nas ruas da sagrada Macapá, que ela era só a estagiária e se podia entrar. No bem da verdade ela era de uma família bastante conceituada e prá quem quisesse almeja-la, não podia, pois tinha um mal, era casada e muito bem casada. Com o consentimento, a moça entrou e assentou-se no sofá da sala de estar, enquanto o rapaz terminava sua faxina com o coração já envenenado.
Amadurecendo o dia chegou D. Eulália, bastante simpática, não como a maioria das secretárias, era uma mulher jovial, de olhos da cor do imenso céu azul visto de cabeça para baixo num espelho, beirando os seus quarenta e três anos, de face branca e cabelos negros, como as crinas de um corcel, bastante falante, amiga e inocente, como o rio em seu curso secular na Serra do Navio, antes da chegada do progresso, eternamente romântica, frustrada por uma paixão não correspondida, solteira e sem filhos, morava só, mas em sua profissão não tinha melhor. Todos apresentados em meio a conversa, chegou D. Fernanda com todo o pique de trabalho, pegou Renata, a estagiária e ambas inventaram a manhã de grande labuta; outros dias; labuta e outros dias.
Aquela parceria deu certo e o sucesso aparecia com o número de clientes aumentando. Logo, tiveram que alugar outra sala do prédio. Mas, o sucesso não era o único que crescia, os olhares de uma certa estagiária e um mero faxineiro cruzavam-se quase que atropelando suas histórias, aquele local de trabalho já continha um mel, que os fazia vir trabalhar mesmo que doentes, eram tão amigos que D. Eulália já ficara com saudades dos tempos de outrora, onde ela e o Marcos residiam, confidenciavam e dividiam seus segredos. As vezes, quando ela começava a se sentir assim, era logo interrompida pela pandeguisse dos dois meninos, sim meninos, pois já estavam tão íntimos que viravam aquele escritório de cabeça para baixo. Até D. Fernanda não conseguia colocar ordem e o Dr. Artêmio estava num embalo, tão feliz com os novos rumos de seu investimento, que pouco ligava, vivia viajando, literalmente viajando a serviço do escritório, pensando já em sair do governo, nem se preocupava e o escritório por sua vez estava sendo bem dirigido.
No decorrer de uma manhã porém, o rapaz chegou atrasado, pois ao receber uma carta para apresentar-se numa entrevista naquele dia na Texaco S/A, onde provavelmente iria desempenhar sua função de Administrador e Advogado que era. E que só desenvolvia sob consultas grátis na comunidade em que morava, afim de contribuir com o seu lado social de ajudar a melhorar as condições de vida de seu povo e também de exercitar os seus conhecimentos. É que em entrevista perdeu –se no horário, tão pouco ligou prá avisar. E quando entrou no escritório foi chamado pela Dra. Renata a explicar aquele atraso, que mais que uma resposta, queria calar a sua agonia interna e o rapaz deu uma desculpa qualquer, embora os seus olhos denunciassem a felicidade que estava lá, pulsando com ele, querendo sair, partilhar com outro coração em sintonia. Quase a conter-se, mas tomado pelo ímpeto do momento, atreveu-se e deu um beijo na fronte da moça, que em seguida, o olhou na alma, como se houvesse despertado algo maior que o explicado pela lógica. O ar faltou, em cadencia o pulso dos corações gemeu e as mãos naquele instante não se largaram, acariciavam-se; em sintonia os olhos, feito de crianças, inventavam, segredavam aquele silencio da boca, silêncio de nós, que resenhava profundos desejos, e verba um sentimento puro, que nos faz diferençar dos animais. Esse momento interrompeu-se quando D. Fernanda empurrou a porta e num lépido disfarce o homem e a mulher, voltaram a se chamar pelas normas que a sociedade impõe aos previsíveis. Tudo aparentemente justificado, ainda assim, o jovem não escondia a sua alegria e seu espanto com o olhar da Dra. Renata. Retomou suas atividades e no fim do dia, já sem ninguém no escritório, contava com a fiel escudeira, D. Eulália, com quem dividiu o motivo real de seu atraso e sua satisfação, escondendo porém, o momento com a Dra. Renata.
No decorrer da semana, D. Fernanda precisou viajar afim de resolver a situação de uma nova parceria noutro Estado e, dessa forma, a responsabilidade ficou com a moça, que apressava-se sempre em chegar cedo, antes até mesmo do rapaz, que tomado de sobressalto no primeiro dia, quando chegou e encontrou as luzes acesas na preocupação de tê-las deixado sem apagar, entrou e quando abriu a porta bateu os olhos naquela sala, cor de musgo, com tom meio silencioso e segredo a vagar, uma voz o chamou, soou pedindo explicações de está atrasado sem na verdade estar. Com que em sintonia aproximou-se da moça, tão perto que seus lábios quase pousaram sobre os dela, e dentro dos olhos o doce e o fel misturavam-se, como a realidade e a fantasia. Por um segundo, uns verbos, aquele cheiro de boca, cheiro de homem e de mulher apaixonados, ar quente produzido inexplicavelmente pelo vulcão em sua sinuosa poesia queima, teima...Aquela vontade, sob resistências mínimas...o beijo, o beijo, o beijo num ato de liberdade ainda que tardia e, sob tutela dos conceitos sociais, a vontade profunda, profana...adultério para os que se dizem justos. Não tiveram mais tempo, pois todo tempo em tempo de amor escondido é pouco, e normalmente a porta ou a campainha toca; mas foi a chave quem interrompeu, D. Eulália tentava abrir a porta; sete e meia anunciava; o trabalho começava.
Religiosamente a bandeira era hasteada, o romance estava ali, o amor se desenvolvia, te queria, te queria, que logo tornaram-se amantes, fizeram planos, mas o mundo juiz moral estava sempre lá. Mesmo assim começaram a sair juntos, as escondidas, até que a tarde do sabiá nas mangueiras, os fez sentar a cabeça e tentar decidir os rumos, que jamais conseguiam, pois todas as vezes que D.Eulália saia do escritório. Começavam falando e depois, era beijos, beijos e as roupas no curso do chão adereçavam o ambiente. Sussurros, carinhos e risos eram os salgados daquela festa aparentemente sem final. E como a vida é a arte dos desencontros, embora haja tantos encontros, aquela manhã foi de céu aberto e o amor já estava lá, chamou-se outra vez prá decisão à mesa da razão, o homem e a mulher, frente a frente diziam, diziam e o enfoque decidido fora não, nunca mais deveriam ver-se outra vez. Marcos teve que ir, pois foi chamado a apresentar-se à Texaco, enquanto Renata em sua saudade solitária desabou nos ombros de D. Eulália que também chorava, pensando ser os mesmos motivos de sua tristeza. O mês ainda perdurou vazio, bem como os clientes, que pouco apareceram, pôr ser novo ano e um tempo de novidades e dividas.
Correram meses, Dr. Artêmio voltou junto com sua esposa e lamentaram a perda daquele rapaz tão aplicado, ser faxineiro numa multinacional deveria ser mais estimulante monetariamente esboçou o Dr. Artêmio e sua senhora, que por tempos foram enganados. E caíram para trás quando D. Eulália revelou a realidade do rapaz, até D. Renata, foi pega de surpresa, mas disfarçou bem sua indignação pôr não ter aquele segredo. Pensativo Dr. Artêmio chamou D. Eulália a sós e, perguntou o porquê da atitude do rapaz, confessou que precisava de alguém confiavel e que ele era a pessoa ideal. E realmente já era tempo de ter mais um Advogado, pois o escritório estava crescendo. Pediu então, que ela o localizasse imediatamente e que o mesmo viesse vê-lo. Em seguida perguntou a todos sobre o andamento das coisas. Tudo normal no conceito tanto dos funcionários, como dos clientes, que a cada dia aumentava. O desconcerto estava apenas na falta do rapaz, de alguém prá fazer a manutenção, não só das coisas, como da alegria, que há tempos por lá não se via. Atendendo ao chamado, Marcos voltou a casa de prata, nome dado ao escritório, por ter sido pintado naquela cor. O coração na mão andava no mesmo passo dos pés, aproximava-se de mansinho e ao entrar muitos o aguardavam, até com maior ansiedade, inclusive, naquela tarde, aqueles olhos ébanos e aquela mulher, tão bela, ali como se a noite do tempo que voa não mandasse embora a insanidade de amar naquelas circunstâncias. Abraços saudosos, cumprimentos e um beijo tímido no rosto, com gosto de amor. Reapresentações aparte e pela primeira vez diante do seu ex–chefe como adulto, esclareceu-se muitos pontos e as possibilidades iam se esgotando, como não chegando ao acordo, a saída do rapaz foi de pensar na proposta, e que o amor de seu coração decidisse. Embora o amor seja forte, as convenções sociais, a evolução humana não saem do chão e nos credenciam a julgar atos e pessoas, sem nos contentarmos em apenas guardar os exemplos. Dessa forma abalam as decisões. Entretanto Marcos, guerreiro que era, diante de todos aceitou o desafio de trabalhar no escritório e confessou à luz da noite, o seu sentimento profundo pela Dra. Renata. Sob admiração ficaram no gabinete, meio que sem saber o que fazer além de olhar a moça. Dr. Artêmio, ouviu, balançou a cabeça, olhou sério por um segundo ao rapaz e deu-lhe um grande abraço pela sinceridade. Quebrando o gelo D.Fernanda e D. Eulália ficaram eufóricas, espantando-se apenas com a reação da moça, que em disparada saio sem rumo porta afora, meio que envergonhada, meio que confusa. Apesar de partilhar daquele sentimento ou daquela loucura, que todos nós temos de vez enquando. O fato é que no dia seguinte a jovem moça, até por não se decidir, quem sabe também inibir o escândalo que seria, resolveu partir assim, sem mais nem menos, com seu marido para Florida.
Adiante o pobre rapaz se perdeu, entrou em depressão e realmente ninguém sabia explicar as razões daquela moça apaixonada ir-se assim, como a poeira no deserto.
O escritório, lá da rua São José, esquina com a Pe. Júlio e seus Advogados, e Administradores trabalham bastante e sua fama vai de vento a poupa em qualquer caso, só não conseguiu desvendar esse mistério.


Alberto Amoêdo
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