Donizete Araujo, mais conhecido com o apelido de valete, teve na
vida uma grande paixão, mais do que isto, um verdadeiro vicio.
- A mulher dos outros, esposa ou filha, indiferente à cor ou à origem.
Cada conquista representava um caso especial e despertava nele
um entusiasmo diferente. Nascido e criado na região de Guaira-SP.
Lá onde tudo em se plantando dar. Soja, milho, feijão, horta, canavial
etc... Tinha um, quem sabe, o espirito responsável inconstante de
um fazendeiro trabalhador. Sabia lidar com a gente do campo, com
os trabalhadores rurais, e as mulheres que penetrava-lhes o coração,
deslundava-lhes a alma. Donizete dizia, sou do tempo em que era
líndo o serviço do campo : trabalho e festa com gritos de alegria, o
peao era amigo do patrão, não faltava serviço, e não faltava gente
no serviço, nem comida nas casas. Não se pensava em horário de
trabalho, e os lideres do campo só terminavam quando o sol já ia
baixo, a duas braças da terra. Donizete ( Valete ) , casara-se com
uma excelente moça, tolerante para com aquele temperamento de
homem atirado, divertido, petulante. Sorria faceira quando o marido,
falava piada maldosa., observava como bom entendedor. O nome dela
era Cecilia, nas festas em casa ou nos bailes, enquanto ele não se
cansava de dançar, com todas as mulheres e, mocas bonita que
houvesse, Cecilia não o perdia de vista, risonha, confidenciava às
amigas : - Donizete está se divertindo. Certa ocasião, numa roda
de conversa, ouviu o marido argumentando : - Depois que a gente
casa, parece que fica trancado a liberdade, tenho saudades dos
bailes, dos bares, das praias, das mulheres... Cecilia, maliciosamente,
aparteou : - Eu sei daquelas que tu bem gostavas ! - Isso é outro
assunto ! - resmugou ele. Um belo dia , Donizete decidiu arrendar
suas terras e ir com a mulher e os filhos " gozar as delícias da capital
e dos capitais...". E mudou, vestido com roupas claras, sapatos bem
lustrados, chapéu de abas largas, cigarro no canto da boca, passava
horas nas praças, bares e encontros. Entusiasmado, confessava aos
parentes e amigos : - Só me arrependo do tempo que perdi trabalhando...
Pôs-se a gastar largamente em diversões as mais variadas. Certa
vez fez uma viagem para Cancun , voltou impressionadíssimo : - Vi
centenas de metros de mulheres nuas !... - Donizete, você está abusando !.
Advertiu-o um dos cunhados. -E se a Cecilia souber ?... - Minha mulher
me conhece bem. Nunca foi dada a cenas de ciúmes ! Cecilia é a
mãe de meus filhos, é a minha mulher... Sabe que um homem, para
ser macho, divertir-se, amar, necessita da mulher dos outros... Conversa
sem fundamento. Desconhecia Donizete que, ultimamente, ela se
queixava ao irmão : - Se ele gastasse só a reputação ou o dinheiro,
eu não diria nada, mas anda consumindo a saúde, e é isso que
me preocupa. Certa noite, Donizete sofreu uma complicação
circulatória. teve um AVC. E do homem atirado, atrevido, petulante,
restou por muito tempo um paralítico esgotado, manhoso como
uma criança. No inicio de sua enfermidade, levava horas sem
proferir palavra. Depois, pouco a pouco, com língua arratada,
começou a contar suas façanhas, a lembrar certos dias, a recordar-se
dos momentos que passara com outras mulheres. Foi assim que
Cecilia inteirou-se da coleção de mulheres dos outros e de seu
marido.. Depois de cada caso, ele chorava, chorava de saudade
das mulheres dos outros. Cecilia, movida por profunda piedade,
indagou . - Queres que eu chame uma dessas tuas amigas para
conversar contigo ? Contudo a doença progredia e Donizete, magro,
já quase sem enxergar, não reclamava mais a falta de visitas.
Contentava-se em apalpar, de leve , as empregadas. Certa vez,
por engano, chegou a apalpar a própria nora. Cecilia religiosa
como só ela, entendeu ser necessário pedir a um padre que o
encaminhasse à salvação eterna. Com o intuito de auxiliar o doente
a cumprir o dever da confissão, o padre começou a argui-lo seguindo
a tabela dos mandamentos. Ao ouvir a pergunta :: - cobiçou a
mulher do proximo ? Donizete suspirou e, com voz quase sumida,
respondeu : - Todas... padre. Naquela noite Donizete ,foi a óbito.
-José Angelo Cardoso.- Poeta, contista, artista plástico-.
Presidente-fundador da Academia Guairense de Letras.
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