As cândidas vertigens dos poetas
Transformam-se em terríveis e completas
Vinditas, pelas rimas doloridas,
Apenas nossas trovas, cá no etéreo,
Começam a partir do cemitério,
Que é onde terminaram nossas vidas.
Assim, quando o mortal fica furioso,
Demonstra, na poesia, um certo gozo,
Que a arte dá a ele plenitude.
Nós outros, cá no etéreo, simplesmente,
Devemos dar idéia transparente
De como aquele mal gera virtude.
Por isso, o poetar só é poesia,
Ao transformar a dor em harmonia,
Levando o transeunte a meditar.
Quiséramos que a trova fosse bela,
Mas se só for assim o bem cancela:
Melhor é versejar mais devagar.
Falamos tantas vezes só dos versos.;
Dissemos que se fazem vis, perversos,
Porque nosso trabalho é esta rima.
Quem vive é porque seu ar respira:
Faça com que a poesia aí se insira
E sinta que não muda o nosso clima.
Formosas, as palavras se aglomeram
E as almas dos mortais se desesperam,
No aguardo de uma rima benfazeja.
Então, o nosso tema desilude,
Pois sempre se requer que o mundo mude,
Pelas virtudes que o trabalho enseja.
Quando pedimos aos mortais uns versos,
Queremos na moral vê-los imersos,
Pensando como a vida se faz grande.
Não é para rimar, numa poesia,
Que isso, com traquejo, se faria:
É para que o progresso não desande.
Corremos grandes riscos na viagem:
Os versos só garantem a passagem
De um pouco deste amor aos companheiros.
A estima que se quer comprometida
Exige que se dê, por toda a vida,
Os bens que estipulamos por primeiros.
Assim, a fama está desarvorada,
Que o preço desta trova é quase nada:
Conceitos desconjuntos, rudes rimas.
Porém, o sentimento se reforça,
Que o bem não se perdeu, preso na morsa,
Que é como o coração demonstra estimas.
Serenamente, vamos trabalhando,
Dispondo as rimas fáceis até quando
Esteja um escrevente à nossa mão.
Promessa de trabalho ao infinito,
Pois sempre há quem ouça o débil grito
De quem quer expressar sua emoção.
Esteja disponível o leitor,
Pois não nos cansaremos de compor,
Que é como vemos tudo deste prisma.
Caso deixe a leitura aí de lado,
Será por ter deveras trabalhado,
Que o verso, nesse caso, não se abisma.
Aquele que verseja põe um fim
A todo sentimento vil, ruim,
Pois pensa em cada rima, em cada verso.
Aí, transfere tudo para a vida
E busca, para o mal, uma saída,
Pois, do contrário, sim, é ser perverso.
Se alguma estrofe lhe soou mais falsa,
É que nem sempre a rima se realça,
Adornada pelo amor e pelo bem.
Que fique o sentimento do perdão,
A coroar o lindo coração
De quem não viu o feio e triste trem.
Também Jesus passou por esta plaga,
Porém, quem viu os versos dessa saga,
Que se inscreveram lá nos Evangelhos?
É pena, porque são tão generosos,
Tão nobres os prazeres e os gozos,
Que os jovens que os lêem se tornam velhos.
Não sinta só prazer com a leitura:
Torne a meditação melhor e pura,
Buscando compreender cada lição.
Quisera este poeta dar de si,
Para anotar a rima bem aqui,
Dizendo a cada um: — “Eis seu irmão!”
Fizemos estes versos na surdina
E pouco cá falamos da Doutrina,
Interessados mais em ter sucesso.
Não é o melhor conceito de poesia
E a nossa turma recomendaria
Que se buscasse ler sobre o decesso.
Existem tantos versos consagrados,
Tantos autores mais prestigiados,
Que se prender a nós é vitupério.
Sabemos que a virtude está no meio,
Então, por que ficar no que é tão feio,
Que não chega a servir p’ra refrigério?!
É claro que a modéstia é uma arte,
Mas não foi ela que ficou à parte,
No versejar paupérrimo da gente:
Foi a beleza, como bem supremo,
Porque, p’ra carregar o nosso remo,
Há que fazer esforço consciente.
Chegamos ao final que presumimos
Nem bom nem mau, pois tudo o que sentimos
Vamos passando da melhor maneira.
Quem reconhece que não tem talento
Não voltará, para ocupar o assento,
A menos que o leitor a nós requeira.
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