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Artigos-->PERFIL: ARMANDO C. SOUSA -- 03/06/2012 - 20:42 (Paccelli José Maracci Zahler) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Por Paccelli José Maracci Zahler



Neste mês de junho de 2012, o escritor português, radicado em Toronto, Ontário, Canadá, vai nos contar um pouco de sua história, de sua experiência de vida.

Ele frequentou a escola dos 7 aos 10 anos. A partir daí foi alfaiate, tecelão, jornaleiro, eletricista, pedreiro, chefe cofrador na construção civil, mineiro, chofer de caminhão e escritor.

A entrevista foi concedida por correio eletrônico. Devido às diferenças entre o português de Portugal e o do Brasil, tomamos a liberdade de colocar algumas observações entre colchetes.A ele o nosso agradecimento pela gentileza em nos receber virtualmente.





RCC. O senhor nasceu em Ruivães, Vila Nova de Famalicão, Portugal, uma cidade surgida na Idade Média. Que imagens guarda de lá?



ACS. De minha Freguesia, as recordações são de gente rude, que eram conhecidas quase em geral por apelidos e bem feios.Por exemplo Maria Mentideira, a Pega, a Burra Branca, a Maria Isca, assim como a falta de todos os comestíveis , distribuídos com senhas. No seio da família, a falta de dinheiro desde que meu pai morreu com antraz [Bacillus anthracis]; tinha eu 6 anos. A vila vagar recordações…filas de gente para ver se tinham a sorte de comprar 2 kg de pão; ou meio litro de azeite…recorda-me da fabrica de relógios Boa Reguladora, e da estação do comboio; o campo de jogos do Freião e a inauguração do estádio de futebol na década dos 50… ler meus primeiros livros na casa museu de Camilo Castelo Branco, o embrião que ficou em mim.



RCC. O auge de sua infância coincidiu com a Segunda Guerra Mundial. Como era a vida nesse período?

ACS. A vida foi terrível onde eu principiei a aprender as primeiras letras na areia… não existiam meios para ardósias ou lápis; menos ainda para cadernos; calças remendos sobre remendos ou muitas vezes arames para tapar um rasgão, escondido da mãe.



RCC. Em sua autobiografia, o senhor relata ter estudado apenas dos 7 aos 10 anos de idade. Por que o senhor teve que abandonar a escola?



ACS. Nesse período, minha irmã já trabalhava,mas com a morte de meu pai e meu tio, minha mãe teve de pedir dinheiro emprestado e era imperial [imperioso] pagar os juros a 8%. Entrei para a escola a 7 de setembro de 1940 e fiz exame de terceira a 21 de junho de 1943. Poderia ter feito de quarta nesse período, mas minha mãe não tinha 5$00 [escudos] para meu cartão de identidade, e minha mãe pensava que eu não passaria nesse curto espaço de tempo que frequentei a escola…a essa idade era preciso ir ganhar meu pão… então puseram-me a guardar bois e ovelhas numa quinta…. Desse tempo existe um feito que me marcou para a vida e pode ser lido nas minhas memórias.



RCC. Que profissões o senhor exerceu até emigrar para a França, em 1963, para trabalhar na construção civil?



ACS. Como já disse, aos dez anos e meio puseram-me a guardar bois e ovelhas, como me queriam dar com a soga (correia de couro de boi) nas duas primeiras semanas, eu até mijei na cama com medo. De manhã, peguei nos animais, meti-os no campo que me mandaram, fechei o portão e corri para casa cerca de 8 km e disse à minha mãe que não serviria mais. Então, fui aprender a alfaiate. Em principio nada ganhava,mas aprendia o oficio.Dois anos depois, o patrão dava-me 10$00 [escudos] por semana… eu amava…Minha irmã e mãe puseram-me a tecelão aos 14 anos, numa fábrica que veio a falir; tinha eu 19 anos… tive um período que andei vindimando na quinta do Senhor Engenheiro. Este me deu trabalho nas máquinas de fiação; ali trabalhei até me casar, onde mudei para uma outra fábrica de um primo. O encarregado era rede e estúpido dava duas chapas [fichas] para cada secção para poder ir ao quarto de banho… um dia eu estava apertado e tive de ir mesmo sem meu colega ter voltado. Este bruto deu-me ordem de despedida…fui trabalhar para outra fabrica que estava a construir … fui ajudar o montador de eletricidade que, em contrapartida pediu para que eu ficasse a ajudar o eletricista…recebi carta de chamada enviada por meu cunhado. Tive de deixar esposa e três filhas e ir para a França como ajudante mação [pedreiro]…um ano depois era chefe cofrour [chefe cofrador] …



RCC. A saída de Portugal ocorreu por motivos políticos, já que Portugal vivia sob o regime salazarista?



ACS. Minha saída de Portugal ocorreu porque ouvia os filhos todos os dias a chorar por pão. Essa seria oportunidade de poder realizar um sonho,viver entre gente honesta, onde quem trabalhasse poderia viver feliz, com muita mais igualdade, com gente que sabia o que era ser oprimido e se estava a reconstruir da Segunda Guerra Mundial.



RCC. Como o senhor foi recebido na França?



ACS. Em França, todos os que demonstravam vontade de trabalhar eram aceites sem discriminação.



RCC. Como foi a sua vida na França de 1963 a 1967?



ACS. Foi realmente uma vida de trabalho duro, mas cheia da companheirismo, de aprendizagem e crescimento. Ajudei os que pude,aprendi a guiar carro, comprei o primeiro carro usado no espaço de um ano. Um ano depois de sair de Portugal, levei minha família para junto de mim.



RCC. Como foi o seu recrutamento para trabalhar em uma mina de urânio no Canadá?



ACS. O mesmo cunhado que me enviou carta para França, enviou-me carta do Canadá,ao mesmo tempo que eu tratava a recensear-me para ir para Austrália…espírito de aventura que se infiltrou no sangue português.



RCC. Como sua família recebeu a notícia de partir para a América do Norte?



ACS. Minha Esposa seguia meu espírito de aventura… as crianças eram pequeninas, seguiam tudo com curiosidade, esperando fazer novos amigos e aprender.



RCC. Nessas suas andanças, o senhor pensou em voltar para Portugal?



ACS. Sim, em principio, até atravessar as maiores dificuldades da língua.Logo depois reconheci que em Portugal nunca haveria oportunidade de igualdade…a gente que ficava para trás era piegas e oportunista seria preciso muitos fundos para o imigrante se impor em Portugal… alem disso era feliz com minha família. Mas ia e ainda vou visitar os familiares.Família é sangue! Importa mais viver com um sorriso que com dinheiro



RCC.O senhor não teve receio de trabalhar em uma mina de material radioativo?



ACS. Nós, os portugueses, não tínhamos educação para reconhecer o perigo e esse nos era escondido debaixo dos interesses das companhias e do estado. A segurança do trabalho de uma mina de urânio foi elaborado, em 1978, com uma greve… isto salvo erro na data… mas tinha medo dos rebentamentos de ar na pedra e dos canos… onde tive de atar deus e diabos que me vinham a cabeça esmagando os dois para ficar livre… e poder trabalhar o pão de meus filhos e esposa; depois principiei a compreender que furava a montanha, que deveria evoluir o mundo e talvez destruir a humanidade… tudo quando se refinou o ytrium [ítrio] o motivo da cor da tinta invisível.



RCC. Como eram as condições de trabalho e segurança na mina?



ACS. Ultimamente eram regulares e com boa educados…[sic] mas o interesse de bônus era o grande mal… os bônus [hora extra,gratificação] eram o chicote da escravatura imposta a si próprio pelo mineiro; estes eram o grande mal…espírito de aventura estava nos bônus.



RCC. Entre 1985 e 1993, o senhor iniciou um programa de televisão chamado “Sol da Nossa Terra”. Poderia nos falar sobre ele?



ACS. Sim! Como onde vivíamos não existia nada em português, tive oportunidade de falar com o cônsul português que veio de visita à Vila onde vivia. Foi o início dos contactos com a RTP [Rádio e Televisão Portuguesa] que enviava o material para o consulado com uma câmera de filmagem de amadora e a colaboração do Cabo Local, dois VCR s [videocassete recorders, gravadores de videocassete], muita boa vontade minha e algum dinheiro meu… desse tempo ainda guardo cerca de 700 fitas… as mais diversas noticias de então, fados e danças folclóricas



RCC. Embora tendo estudado dos 7 aos 10 anos, sua verve poética floresceu 40 anos mais tarde. O senhor teria alguma explicação para isso ou sempre se dedicou à poesia e esta foi a oportunidade de expor seu talento?



ACS. .Sempre tive vontade de saber alguma coisa… mas na verdade no meio do lago quando pescava expandia-me [encantava-me] com os peixinhos… depois que me reformei, ai sim… escolhi escrever enquanto minha esposa guardava os netos… escrever era melhor que ir para o café ou cervejaria passar o tempo… depois, encontrei na internet uma musa que me tornou poeta e contista.



RCC. O amor pelas letras sempre o acompanhou?



ACS. Sim, desde a minha adolescência que me sentava nas escadas do museu de Camilo Castelo Branco e li Alexandre Dumas. Almeida Garret e tantos outros… como “Os Miseráveis” de Victor Hugo.



RCC. A sua experiência de vida é muito rica. Que lições o senhor tirou de toda a sua existência e que costuma passar para seus filhos e netos?



ACS. Existem coisas muito básicas que devem ser seguidas: nada existe sem trabalho;nunca comprar sem ter com que pagar; comprar fiado leva-te a ser corrupto; a verdade defende-te de todos os males mesmo que leve tempo vira ao de cima; um sorriso aproxima amizades; amigos verdadeiros ou virtuais são anjos que nos mantém enterrados em viver; nunca faças mal que esperes o bem; sê sempre honesto mesmo que sejas traído; o calado diz tudo, mas não diz a verdade; a hipocrisia defende-te nesse dia, mas morres de remorso se fores verdadeiro; deixa de fumar em quanto é tempo, eu deixei e ainda vivo;se ensinares teus filhos a voar, eles vão e voltam. Este ano planeamos irmos todos a Portugal e viver juntos em família na mesma quinta com sete quartos, duas salas e duas cozinhas… somos uma família formada em dois continentes e cinco países.



(Publicado na Revista Cerrado Cultural, edição de junho/2012 - leia mais em www.revistacerradocultural.blogspot.com)
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