AQUILO ESTÁ ATRÁS DAQUILO
Menos comedido, o verso é medido
Embora rimado, certo, por anáforas insistentes
Sempre repetido de estações sem amanhã
E ausente do hoje, nas interjetivas orações...
E para do passado se desincumbir
Não se prevalece da primeira pessoa
Que é pessoalmente desgastante
Para embarcar numa outra e nova canoa
Que aponta ao futuro a proa
A língua é que a palavra coçará
E tocará seus pontos fracos
E a silenciará, verbo infinitivo amar...
O maná dos pensamentos é o céu
Que alicia, pois tudo já estava escrito
Até o título que está aqui metido
Foi, nos caminhos do inconsciente fundido
Inútil, e, entretanto diferente do agora
Que conduz ao tempo e à verdade
Hora engastada numa coisa fria
Poesia das palavras exiladas
Canoa furada a naufragar
No mais profundo das interpretações...
Então livres de encantos e enigmas
É sangue correndo por erradas veias
A arquitetar fontes de represadas presunções
Da vida, dos astros, dos deuses
E de todos os prismas da eternidade...
E também do silêncio imorredouro
Nascido do ressentimento
Do poeta que converte
O mundo numa cela
Onde viverá
E poesia
Sumirá!
Miguel Eduardo Gonçalves |