O inverno já se foi deixando-nos nesta canícula que nem de longe lembra a primavera que todos sonhamos, principalmente diante de um quadro de Rembrandt. Os dias frios já estão longe e não tivemos nosso agendado encontro. Não desfrutei do prazer de sentar diante de você, com uma xícara fumegante de chocolate, e segurando em suas mãos, abrir meu coração. E relembrar as coisas boas e as alegrias de minha vida. Falar do dia em que conheci o meu amor e com ele construí uma vida pautada em ensinamentos que guardávamos de outras encarnações, pois éramos muito jovens para podermos julgar com exatidão, o que realmente, queríamos da vida. E devanear sobre os primeiros anos, duros porém felizes, em que dividíamos tudo, até as mamadeiras da madrugada.
Gostaria de pedir-lhe conselhos, poeta que és, de como externar meus sentimentos em palavras doces e carinhosas, pois em algum lugar do passado essa minha capacidade se perdeu. Queria lhe contar que quando olho meu amor dormindo, sinto uma ternura que não consigo demonstrar no dia-a-dia. Ou que a visão do corpo dele nu, respigando após o banho, deixa-me as pernas bambas, mas fujo e viro o rosto, com a espontaneidade acorrentada por forças invisíveis que não consigo explicar.
Para você, meu amigo e confidente, posso dizer que gostaria de correr para os braços dele cada vez que abre a porta e, no entanto, fico presa ao sofá com um sorriso sem graça no lábios, enquanto os olhos dizem coisas que ele não consegue entender.
Queria que me ensinasse como ser menos rebelde e ter coragem de acariciar sem medo de parecer piegas. E porque o tempo é de mudanças e embora a realidade me limite, gostaria que você me indicasse o caminho, para realizar as fantasias que os meus sonhos me permitem.
Tudo isso iria dizer-lhe diante de nosso chocolate e afagando minhas mãos, com sua voz tão doce,acalmarias meu coração.
