Não tenho outro interesse, em minha vida,
Do que mostrar ao mundo a dura lida
De quem não compreendeu o que é virtude.
Os compromissos devem ser saldados,
Com coração e mente serenados,
No aguardo de que Amor a alma mude.
Não devo prosseguir na rude linha,
Tornando a minha rima comezinha,
A ponto de espantar o bom leitor,
Que os versos têm de vir sempre formosos,
P’ra produzirem n’alma fortes gozos,
Ao sentirem-se afeitas ao Amor.
Estava preparado p’ra poesia
E vim mostrar ao povo esta alegria
De organizar a estrofe e o estribilho.
Aqui chegando, examinei a trova
E o meu “cavalo” deu forte corcova
E eu caí sem forças e sem brilho.
Estou brincando, pois, naturalmente,
As coisas chegam juntas p’ra quem sente
O mesmo ardor divino no trabalho.
O contratempo não me pôs alerta,
Pois o compadre aí capricha e acerta,
Disposto sempre a me “quebrar o galho”.
Vim solidariamente versejar,
A revirar as rimas do bazar
Que a mente deste médium me ofereça.
Aí, compreendo a norma da poesia,
Que qualquer um aqui melhor faria,
Se já trouxesse as rimas na cabeça.
Os “pontos-chaves” do poema todo
Vêm à lembrança a jato ou vêm a rodo,
Porquanto é muito fácil de ditar:
Basta um pouquinho só de imantação,
Que os versos vão passando de roldão,
Embora a gente queira ir devagar.
O médium desaprova o nosso tema,
Porque falar dos versos no poema
O pôs cansado e triste, tantas vezes,
Embora reconheça que são novas
As emoções que nutrem estas trovas,
Que se repetem sempre, há tantos meses.
A inspiração divina nos falece,
Por isso, repetimos sempre a prece
Que o Mestre, certa vez, nos ensinou.
E, mesmo assim, o povo não compreende
E a oração tão bela nunca rende
Os fluidos de um amor que não murchou.
Vamos mostrando, pois, que a nossa estima
Há de montar-se sempre em doce rima,
Conquanto repetida e cansativa.
Quem sabe alguém, aproveitando o ensejo,
Venha trazer virtudes de sobejo,
Para tornar a estrofe bem mais viva...
— “É obsessão, é fúria demoníaca.
Há de causar uma lesão cardíaca,
Que o pobre médium, por sofrer estresse,
Vai enfrentar um mal psicossomático,
Pois já começa a estar bem sorumbático:
Pronto-socorro a vítima carece.”
Eu demonstrei que a rima vai variar.
É que a paciência vem mais devagar,
Quando se conta o tempo por minutos.
A vida, assim, se esgota, seja aos poucos,
E os nossos cantos vão ficando roucos,
Enquanto amadurecem os tais frutos.
Não há de suspeitar de invigilância,
Que as trovas não demonstram que há ganância
De se alcançar o belo, a qualquer custo.
O verso vem rasteiro e linear
E, se alguma expressão cá rebrilhar,
Há de causar, no autor, o maior susto.
Outra virtude inata da poesia
É a obediência às normas, que faria
Um mal danado, caso desprezada:
O decassílabo teria fim,
Se a sexta sílaba não fosse, assim,
Na quarta e na oitava assinalada.
Como fazer a trova mais depressa?
Somente se se achasse bom à beça
Representar a dor, em rude prosa,
Deixando o amor, o bem, a paz, a prece,
Como roteiro que emoção carece
Dos compassos gentis de alegre glosa.
No encerramento de mais este dia,
É bom que se confirme que a poesia
Descai do etéreo para a mente humana.;
Que o caro médium sofre muito pouco,
Caso contrário, ficaria louco,
Que a pobre rima nunca se engalana.
Agradecer ao Pai é de rigor,
Pois me dá tempo até para compor,
Embora o sofrimento não se esqueça.
Quem sabe, um dia, a prece do “pai-nosso”
Vá permitir dizer que eu também posso
Apaziguar as dores da cabeça.
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