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Ensaios-->D. XICOTE, UM ENIGMA -- 25/01/2004 - 20:51 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
-=D. XICOTE, UM ENIGMA


Viajante, mestre-escola provisório, caixeiro, escritor, carregador de tijolos, tocador de bois em engenhos, mangalheiro, trabalhador nas vazantes da cultura do alho e da cebola – eis algumas das profissões do introspectivo e enigmático personagem principal do novo romance de FRANCISCO MIGUEL DE MOURA. Depois de Os estigmas (1984) e Laços de poder (1991), agora o poeta e ficcionista dá mais uma contribuição à literatura com D. Xicote, inspirado no Dom Quixote, de Cervantes.
Entretanto, não se trata de simples inspiração, e sim de criação, pois o autor ao desconstruir o título do romancista espanhol, interfere na estrutura do romance de cavalaria, atualizando a temática do combate do espírito contra a baixeza prosaica da vida quotidiana, luta que irradia sobre os adversários do herói o clarão da vida espiritual. Aqui, a firmeza interior do protagonista constitui a base de todas as ações, impulsionando o movimento da vida para a pureza da alma. Nas andanças de D. Xicote, que vão da Terra dos Condenados até além do rio Parnaíba, não existem castelos e dulcinéias, porém casas de alpendre, barracas abandonadas em beiras de rios, repúblicas de estudantes, empregadas domésticas, misses e filhas de fazendeiros valentões. Estamos diante de um romance que mistura criativamente elementos do diário íntimo, do romance autobiográfico e do romance de formação, aproveitando a cultura local: o léxico, provérbios, ditos populares, frases bíblicas, como diria Walter Benjamin, a experiência como fundamento da arte...
O autor utiliza a técnica moderna da colagem das consciências de um narrador de terceira pessoa e do herói D. Xicote, de modo que o mundo ficcional é passado para o leitor como se fosse da responsabilidade do personagem principal. Isto de um modo sutil que não deixa marcas visíveis na construção romanesca, além de aproximá-la do romance autobiográfico, e mesmo do diário íntimo, devido às constantes retomadas à vida interior do herói. Outro excelente aspecto deste romance é a sua linha metaficcional, com a reflexão em torno da escrita (D. Xicote realiza-se como escritor) e o encaixe de narrativas dentro da narrativa básica (contos, capítulos de romances), textos de ficção de personagens, na dosagem necessária à intervenção do imaginário nas cenas reais.
A singularidade de D. Xicote surge da sua existência como personagem de ficção, da substância interior que emana da luta contra as condições adversas numa região árida, tanto na sua topografia física quanto espiritual, do seu ponto de vista crítico sobre a realidade preponderante da vida quotidiana, na Terra dos Condenados e Curralinho, onde fazendeiros, comerciantes, mestres-escolas, trabalhadores em geral (os Sanchos Panzas do mundo do senso comum) levam a vida sem questioná-la. A narrativa da viagem aparece no romance em forma de memória, contada a outro personagem, Amanda, entremeada de recontos, onde se mesclam o real e o imaginário.
Além de autobiográfico, D. Xicote é, principalmente, um romance de formação, um Bildungsroman, onde as transformações emocionais e psicológicas resultam do embate do indivíduo com o mundo externo, quando o homem de espírito fica mais sábio no caminho percorrido, e, principalmente, com o seu trabalho de escrita. É na vida e na viagem que D. Xicote se torna homem, e sua formação se conclui no amor e na literatura.

Rio, janeiro de 2004.

Francisco Venceslau dos Santos
Prof. da UERJ e membro da Academia Brasileira de Filologia.
=D. XICOTE, UM ENIGMA


Viajante, mestre-escola provisório, caixeiro, escritor, carregador de tijolos, tocador de bois em engenhos, mangalheiro, trabalhador nas vazantes da cultura do alho e da cebola – eis algumas das profissões do introspectivo e enigmático personagem principal do novo romance de FRANCISCO MIGUEL DE MOURA. Depois de Os estigmas (1984) e Laços de poder (1991), agora o poeta e ficcionista dá mais uma contribuição à literatura com D. Xicote, inspirado no Dom Quixote, de Cervantes.
Entretanto, não se trata de simples inspiração, e sim de criação, pois o autor ao desconstruir o título do romancista espanhol, interfere na estrutura do romance de cavalaria, atualizando a temática do combate do espírito contra a baixeza prosaica da vida quotidiana, luta que irradia sobre os adversários do herói o clarão da vida espiritual. Aqui, a firmeza interior do protagonista constitui a base de todas as ações, impulsionando o movimento da vida para a pureza da alma. Nas andanças de D. Xicote, que vão da Terra dos Condenados até além do rio Parnaíba, não existem castelos e dulcinéias, porém casas de alpendre, barracas abandonadas em beiras de rios, repúblicas de estudantes, empregadas domésticas, misses e filhas de fazendeiros valentões. Estamos diante de um romance que mistura criativamente elementos do diário íntimo, do romance autobiográfico e do romance de formação, aproveitando a cultura local: o léxico, provérbios, ditos populares, frases bíblicas, como diria Walter Benjamin, a experiência como fundamento da arte...
O autor utiliza a técnica moderna da colagem das consciências de um narrador de terceira pessoa e do herói D. Xicote, de modo que o mundo ficcional é passado para o leitor como se fosse da responsabilidade do personagem principal. Isto de um modo sutil que não deixa marcas visíveis na construção romanesca, além de aproximá-la do romance autobiográfico, e mesmo do diário íntimo, devido às constantes retomadas à vida interior do herói. Outro excelente aspecto deste romance é a sua linha metaficcional, com a reflexão em torno da escrita (D. Xicote realiza-se como escritor) e o encaixe de narrativas dentro da narrativa básica (contos, capítulos de romances), textos de ficção de personagens, na dosagem necessária à intervenção do imaginário nas cenas reais.
A singularidade de D. Xicote surge da sua existência como personagem de ficção, da substância interior que emana da luta contra as condições adversas numa região árida, tanto na sua topografia física quanto espiritual, do seu ponto de vista crítico sobre a realidade preponderante da vida quotidiana, na Terra dos Condenados e Curralinho, onde fazendeiros, comerciantes, mestres-escolas, trabalhadores em geral (os Sanchos Panzas do mundo do senso comum) levam a vida sem questioná-la. A narrativa da viagem aparece no romance em forma de memória, contada a outro personagem, Amanda, entremeada de recontos, onde se mesclam o real e o imaginário.
Além de autobiográfico, D. Xicote é, principalmente, um romance de formação, um Bildungsroman, onde as transformações emocionais e psicológicas resultam do embate do indivíduo com o mundo externo, quando o homem de espírito fica mais sábio no caminho percorrido, e, principalmente, com o seu trabalho de escrita. É na vida e na viagem que D. Xicote se torna homem, e sua formação se conclui no amor e na literatura.

Rio, janeiro de 2004.

Francisco Venceslau dos Santos
Prof. da UERJ e membro da Academia Brasileira de Filologia.
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