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Ensaios-->19. 11.o Relato -- 29/12/2003 - 11:15 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Cheguei até aqui e não pretendo ir avante. Pois bem, se for com ameaças de me fazer retornar para o escuro, aí prometo comportar-me.

Que querem que eu faça? Só pensar em tudo o que aconteceu comigo? Muito bem!

Sou um infeliz que viajou durante muito tempo sem ter parada. Comigo carreguei sempre pesado fardo, às vezes, imenso pacote, outras vezes, mala imensa, sempre, no entanto, embrulho muito grosso e terrivelmente pesado. Mas nunca consegui abri-lo para ver o que havia dentro. No início, pensava que fossem roupas e perfumarias para vender, lembrança de antiga profissão de caixeiro-viajante nos idos de muitas vidas atrás. Depois vi que não podia ser nada disso, porque não conseguia aproximar-me de ninguém para oferecer meus produtos. Outras vezes, imaginava que estivesse de mudança e que os trastes pesados representavam o que havia de utilidade para me instalar no próximo local. Ainda aqui parece que era lembrança de ter tido, um dia, necessidade de partir por força de alguma invasão inimiga. Certa feita, pensei estar carregando alguém dentro do fardo, pesado corpo de frágil mulher, que precisava esconder em algum lugar de difícil acesso. Esse fardo carreguei durante largos anos. De outra vez, via-me com duas malas grandes, uma em cada mão, à procura de estribo de composição férrea, para partir para outras paragens. Por esse tempo, grossas lágrimas rolavam-me dos olhos. Ainda carreguei cestos em que pensava levar frutas para o mercado. Foram, enfim, muitas as cargas que fiquei a carregar, como se fosse a minha própria cruz.

Hoje estou com as mãos livres, mas o pacote que tenho que conduzir está aqui, aos meus pés. Não se trata de caixa muito grande e está ainda bem leve. Desconfio que possa estar ali contido o meu coração, pois algo me assopra nos ouvidos uma esperança de que irei, finalmente, ter um paradeiro.

Por que, Deus meu, este interminável viajar, por tantos e tantos locais desconhecidos? Nunca acabava de ver uma pessoa que já não visse outra e outra, sem jamais repetir a mesma. Saudade? Muito pouca, pois não estabelecia ligações.

No começo, quando cheguei à escuridão, de volta do último encarne, recebi lanterna com que me orientar. À luz frouxa, ia caminhando, levando comigo o meu fardo. Encontrava uma ou outra alma penada com quem não conseguia estabelecer contacto: alguns fugiam espavoridos, outros ameaçavam-me com suas garras, a maioria passava indiferente, como se eu não existisse. Certa feita, tentaram arrancar-me das mãos a lanterna, mas não demorou para fugirem apavorados de algo que não sei o que possa ter sido. Outra vez, furtaram-me o fardo, mas abandonaram logo em seguida, correndo atropeladamente caverna adentro.

Hoje estou aqui para descansar. Sei que não consigo lembrar-me de tudo, mas o mais importante é que nunca tive sossego.

Pedem-me para falar a respeito das amizades no último encarne.

Bem. Da última vez, lembro-me que fui padeiro. Trabalhava no fundo de uma panificadora com várias pessoas. Não me lembro de muita coisa, mas estou certo de que, às vezes, carregava grandes cestos de um lado para outro e isso me deixava absolutamente revoltado, como se fosse algo com que não concordava, que repudiava. Agora sou capaz de perceber a razão dessa desarmonia.

Outra coisa que não gostava de fazer era voltar para casa de madrugada. Eu desconfiava de que, ao chegar, alguém saía. Um dia, não fui trabalhar e fiquei na espreita. Bem que havia desconfiado. Surpreendi minha mulher permitindo o acesso em casa a um desconhecido.

Gostaria de evitar a descrição da cena de ciúme e de paixão.

Em resumo, deixei os dois estirados em lago de sangue sobre o meu leito conjugal. Pouco mais me recordo. Sei que, um dia, me vi trabalhando em outra padaria, carregando cestos para detentos. De lá, mais velho, vejo-me vagando de um lado para outro, cheio de remorsos, mas não de perdão, pois achava que minha vida se tinha perdido por culpa deles.

Enfim, mendigo, vivi ainda algum tempo da comiseração dos outros, até que me vi, de repente, de novo, no fundo do poço, na escuridão úmida do catre.

Eis a minha história, sem poesia, sem força, sem brilho.

Será que poderia abrir o embrulho?

Finalmente, vou poder contemplar o que nele se contém!

Está vazio?! Que era, então, tudo aquilo que carregava? Seria só o meu sofrimento e a minha dor? Estou livre da penitência? Que fiz para merecer isso? Ainda não fiz? Por que essa primazia? Por que essa proteção maravilhosa?



Orientação

Deus é pai misericordioso. Ele é o princípio e o fim e toda a existência nele se contém. Por isso, para ele tudo é possível. Se Deus assim determinou, é porque acredita em que o seu filho irá superar as deficiências.

Você já poderá reconhecer alguns de seus antigos parceiros de jornada. Eis que aí estão filhos queridos, esposa amantíssima, mãe bondosa, pai severo, rigoroso, mas carinhoso e leal. Seus tios também comparecem para o abraço. Você, finalmente, não está mais sozinho.

Toda a impressão de viagem se deu há pouco tempo atrás. Sua imaginação é que fez com que acreditasse que a vilegiatura vinha de muitas encarnações. A sua aflição é mais recente. Agora terá de se reconciliar com alguém que não o perdoou e esse será o próximo trabalho. Antes, deverá deixar-se influenciar pelas forças do amor que o estão amparando, para restabelecer os liames com a verdade e para compreensão exata dos desvios de conduta.

O crime que você perpetrou foi hediondo, mas a penalidade “física” você já cumpriu. Restam para superar as dificuldades morais. Mas essa será história ainda a ser escrita. Supomos que deverá integrar-se carnalmente na família de seu desafeto, mas é cedo ainda para este tipo de cogitação. Estamos alertando-o para o fato, para que não suponha que tudo será “mar de rosas”. Mas, com o apoio de todas estas entidades amigas, acreditamos que terá todos os recursos para superar com méritos essa prova.

Vá, bom amigo, com Deus! Ore muito por seus guias, pois executaram maravilhoso trabalho socorrista, e agradeça a Deus a magnanimidade dessa assistência que bem poucos conseguem por força de intervenção. Alegre-se com a dor atual pois é compreensível e suportável. Quem sabe, um dia, você voltará para trazer notícias mais alvissareiras a respeito de futuras decisões.

Fique com o Senhor!



Comentário

Prezado leitor, sabemos que algumas perguntas estão a bailar-lhe no cérebro, principalmente a respeito da presença da esposa do companheiro sofredor, neste momento de sua volta. Evidentemente, trata-se de espírito muito sofrido e que aqui compareceu no temor de ser mal recebido. Entretanto, é preciso que fique bem claro que o relator de hoje deixou de mencionar inúmeros fatos concernentes aos seus relacionamentos íntimos, os quais não vale a pena recordar. O que podemos dizer é que suas lágrimas foram copiosas ao se reencontrar com todos, tendo até ajoelhado diante da figura da esposa, solicitando-lhe ternamente perdão pelo malfeito. De resto, todo o grupo estava estreitamente coeso em derredor do soerguimento moral do irmão sofredor, de sorte que era chegado o momento daquele que faltava, sem contar, naturalmente, com o desafeto, aquele a quem retirou a vida, jovem muito novo ainda.

O que a nós interessa reportar-nos não é à história das paixões do padeiro; o que nos importa é deixar o leitor prevenido quanto às manifestações deste teor, evitando-se dar crédito a todas as palavras. Como se trata de espíritos aguilhoados pelo sofrimento, têm o instinto de se livrar de tudo que possa parecer-lhes prejudicial, de modo que buscam refúgio nas inverdades, para não terem de sofrer o tormento das vibrações estéreis ou negativas. Quando percebem que, apesar de os relatos conterem facetas muito criminadoras, não estimulam reações contrárias dos ouvintes, aí se expõem com maior confiança e adquirem serenidade capaz de desbloquear as naturais reservas, momento em que diligenciamos vibrações fluídicas regeneradoras.

Mais uma vez pretendemos burlar a curiosidade do amigo, não esmiuçando as nossas atividades, pois o que nos trouxe até aqui (esperamos estar evidenciado) foi a necessidade de solicitar reação favorável ao desencarnado em vias de tratamento, impedindo que veja em cada um de nós inimigo em potencial, como aqueles seres com quem se encontrava nas peregrinações nebulosas da escuridão.

Se você, bom amigo, não consegue sofrear os impulsos de inferioridade material diante da criminalidade revelada e da maldade enfronhada nas mentes dos que se perderam nas sendas das degenerações e dos vícios, busque refúgio na prece, especialmente no tentâmen de se situar do outro lado da experiência, pondo-se na pele do pobre sofredor. Aja sempre assim, por amor de seus semelhantes infelizes, para obter alvará para participar dos trabalhos do socorrismo ativo.

Não se trata, veja bem, de mera compaixão, de comiseração ou de considerar o irmão simplesmente um coitado. Nada disso. O que se pede é que se veja, naqueles molambos sofredores, pessoas iguaizinhas a nós mesmos, com os mesmos direitos à cidadania divina. Neste ponto, é justo lembrar as lições de Jesus, pois todo o seu evangelho se resume na lei do amor e o amor deve ser incondicional.

Sabemos que nossa mensagem não é nova nem está florida em estilo próprio que justificasse reapresentação. Neste campo, o novo não existe nem no vestuário com que se adorna. Mas talvez o novo se encontre no espírito atento que nos segue os pensamentos e que, de repente, desperta para o socorrismo, com o coração confrangido, necessitado de luz e de compreensão. Se este tiver sido o seu caso, caríssimo irmão, queira perdoar-nos o atrevimento e, pedindo a presença de Jesus, recomponha-se emocional e intelectualmente e assuma a firme decisão de ocupar lugar, modesto embora, em alguma equipe socorrista.

Ajude-nos a carregar os fardos dos irmãozinhos sofredores, como Simão ajudou Jesus com a cruz, o qual ajudava a humanidade em sua desdita. Quem sabe essa ajuda despertará a atenção de algum irmão de maior luz, força e experiência, para aliviar-lhe a carga, em alguma circunstância especial da vida.

Eis aí a essência do socorrismo: não há quem não necessite ser socorrido, bem como a todos é facultado o dom de socorrer, pois todos somos igualmente filhos de Deus. Glorioso será o momento em que, como o nosso pequeno padeiro, à luz de nossos benfeitores, formos abrir nosso fardo e pudermos verificar que nada mais haverá para ser carregado. Nesse exato instante, poderemos compreender a magnificência divina em seu ato criador e poderemos exaltar a existência, cônscios de que mais perto estaremos da salvação.

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