Usina de Letras
Usina de Letras
128 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62161 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10449)

Cronicas (22530)

Discursos (3238)

Ensaios - (10347)

Erótico (13567)

Frases (50573)

Humor (20027)

Infantil (5422)

Infanto Juvenil (4752)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140790)

Redação (3302)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1959)

Textos Religiosos/Sermões (6182)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Ensaios-->A LÍRICA - QUESTÕES -- 23/12/2003 - 13:22 (PAULO FONTENELLE DE ARAUJO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A LÍRICA – QUESTÕES BÁSICAS


Para o leitor sem experiência, que pretende analisar e interpretar à contento uma obra literária, exige-se inicialmente o conhecimento de algumas noções básicas: a constatação de que a obra situa-se em determinado campo inventivo da sensibilidade humana, aquele que usa a linguagem verbal escrita como forma de expressão e o conhecimento de uma classificação quanto aos modos de emprego dessa linguagem - a estrutura dos gêneros (Épico, Lírico e Dramático) - identificados nessa primeira noção por aspectos gerais, ou seja, se algo nos é contado trata-se do gênero Épico; discursos de pessoas em um palco, gênero Dramático e a manifestação de um estado interior, a Lírica.

O leitor poderá até alcançar a utilidade relativa desta classificação e não será difícil defender a aplicação de um critério comparativo para qualificar o valor da obra que pretende analisar, percebida dentro do seu respectivo gênero.

Após essa primeira etapa, o leitor, com um mínimo esforço, poderá intuir que o problema da análise de uma obra literária é bem mais complexo do que a compreensão de noções básicas e a classificação dos gêneros algo diferente daquilo que o esquema pretendia sinalizar. De fato, todos os gêneros parecem transcender e atuar sempre conjuntamente, ou melhor, - pensará o leitor - aquela nomenclatura (Lírico,Épico, Dramática) mais do que classificar substantivamente, indica sim uma adjetivação de modos distintos e simultâneos de enfrentamento da realidade (uma briga de rua pode ser dramática, uma partida de futebol pode ser épica), modos estes que também podem ser observados em uma obra literária, sendo necessário então aprofundar o conhecimento da tri-partição acima, entender melhor os seus desdobramentos, as justificativas históricas, captando, após, a verdade, ainda que uma verdade técnica, de todos os gêneros e especialmente a Lírica, razão da presente resenha.

A regra de sistematizar os gêneros em Lírica, Épica e Dramática inicia-se na Grécia antiga e a justificativa para tal classificação era a crença de que os gêneros eram formas exigidas pela natureza, condição esta que os tornava modelos obrigatórios e sempre válidos. Naquela época havia a expectativa de pureza quando da realização de uma obra dentro do gênero pretendido.

No decorrer da história aquela divisão manteve apenas o seu caráter didático - mesmo porque não existe gêneros puros - mas se tentou justificar outra tri-partição que relaciona os três gêneros, apresentados adjetivamente, como maneiras de encarar o mundo, havendo então uma maneira épica, outra dramática, outra lírica, aplicando-os concomitantemente para uma obra literária. A “Estética” de Hegel e a “Estética” de F. Th. Vischer derivaram de uma organização sistêmica que admite as noções de tese, antítese e síntese; da relação sujeito-objeto um componente subjetivo que se vincula à lírica, um componente objetivo que diz respeito à épica e outro subjetivo-objetivo para o gênero dramático. Outros partiram das três potências anímicas do sentimento, pensamento, vontade; de três tipos humanos; da percepção do tempo (a epopéia representando o passado, o drama a ação que se dirige ao futuro e a lírica pela sensação que se encerra no presente) e, por fim a trindade ligando-se diretamente a resultados obtidos pela moderna filosofia da língua, em sua tríplice capacidade funcional; hipótese esta fundamentada nos trabalhos de Ernst Cassirer que designou como graus da língua as fases da expressão sensorial, da expressão contemplativa e da expressão do pensamento conceitual.

As teorias acima demonstradas necessariamente nos levam à essência de cada um dos gêneros ou o entendimento dos mesmos através de um conceito, demonstrado por Wolfgang Kayser em sua “Análise e Interpretação da Obra Literária”, em que o lírico, o épico e o dramático são “formas naturais” da literatura, e, no caso do lírico, chega-se a esquematização de certas atitudes que apreendem a adjetivação lírico, épica e dramática de três modos possíveis: a enunciação lírica, quando o eu defronta-se com alguma coisa, alguma coisa que existe, aprende-a e exprime-a em uma atitude épica; a apóstrofe lírica no ato de dirigir palavra ao mundo, atitude próxima ao drama e a linguagem de canção, o eu voltado sobre si mesmo em uma atitude mais autenticamente lírica. Assim, o que acaba importando na compreensão da linguagem lírica é o reconhecimento dessas atitudes básicas e a obra literária como estrutura por elas sustentada, tendo a sua forma interna íntima afinidade e a tal ponto que se as atitudes, a forma e outras manifestações como ritmo, musicalidade das palavras e versos não apresentarem uma noção de conjunto a obra em si será frágil.

O gênero lírico, portanto, é o mais subjetivo dos gêneros. Existe uma voz central que exprime um estado de alma e o traduz orações ou, como definiu Anatol Rosenfeld em sua “A teoria dos Gêneros”: “A lírica tende a ser a plasmação imediata das vivências intensas de um EU no encontro com o mundo, sem que se interponham eventos distendidos no tempo”. É a “manifestação verbal”, “imediata” de uma emoção ou de um sentimento que, através do imediatismo, explica a relativa brevidade do poema lírico, e sugere ainda a indeterminação de um personagem central e de outros personagens ( embora ocasionalmente possam ser evocados ou recordados por deuses ou seres humanos) sob o risco de implicar em certo traço descritivo e narrativo, o que turvaria a gênero, embora isso não seja algo condenável. O que importa é a fusão da alma que canta com o mundo não havendo distância entre sujeito e objeto.

Após tais explicações, aquele leitor, já mais atento, poderá avaliar a qualidade de uma obra com referências técnicas mais seguras do que a dúbia organização substantiva dos gêneros, podendo ainda sintetizar seu novo conhecimento da seguinte maneira:

- a necessidade de estabelecer os gêneros é importante para organizar em linhas gerais a multiplicidade dos fenômenos literários e comparar obras em um contexto de tradição e renovação

- não existe pureza de gêneros em sentido absoluto.

- os termos “lírico”, “épico” e “ dramático” são empregados em duas acepções diversas: a acepção substantiva de caráter didático e a acepção adjetiva que além de manifestar tipos diversos de imaginação e de atitudes em face do mundo, também se refere aos traços estilísticos do autor.

- há, portanto, uma aproximação entre gênero e traço estilístico.

- que na lírica uma voz central sente um estado de alma e o traduz por meio de um discurso mais ou menos rítmico.

- que esta aproximação entre todos os gêneros e o traço estilístico dentro de uma obra considerada lírica foi sistematizada com a introdução de certas atitudes como enunciação lírica, ligada a um entendimento épico do mundo; a apóstrofe lírica com o eu lírico dirigindo-se ao mundo, atitude de caráter dramático e a linguagem de canção quando o eu volta-se para si, em uma atitude verdadeiramente lírica.

- que o poema lírico, aquele mais voltado para o termo definidor do gênero é a expressão de um estado emocional, mas a expressão é considerada mais satisfatória se forem adequadas dentro da obra a intensidade, a concentração, o caráter imediato, o ritmo e a musicalidade.


Bibliografia:


- Kayser, Wolfgang Kayser - “Análise e Interpretação da Obra Literária. Coimbra
Armênio Amado – Ed. ,1976 – Cap. X - pág 367 à 431

- Rosenfeld, Anatol. “A teoria dos gêneros” In : O teatro Épico. São Paulo., 1965
pp. 15 a 36




Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui