Manhã de Domingo
Manhã de domingo...céu inquieto e indeciso. Sonhos ainda dormem no silêncio da cidade...nas ruas, sorrisos do Sábado, brindes de novos encontros; nas avenidas, olhares vagos que guardam incertezas, vultos dispersos que andaram em paralelas na noite que findou.
Da janela do meu quarto, a cidade parece nua, exposta, como a revelar reminiscências, saudades, confidências silenciosas de tantos momentos, amores, beijos guardados, abraços adiados...
Do sétimo andar, avisto um homem...fico a imaginar para onde irá, que crenças terá, que valores estará a cultivar...passos milimétricos, rosto contraído, olhar sombreado, como se conduzisse o ónus dos seus sonhos adormecidos...
Apesar da penumbra no olhar, do coração naufragado, parece suplicar por algo que mesmo à distància consigo identificar...um S.O.S. mudo de quem quer conhecer outras rotas que talvez o guiem para a felicidade, Parece ter velejado na solidão de seu mar, ancorado em portos nem sempre seguros...muitas vezes deve ter navegado sem bússola, velas em pandarecos, fora de todas as rotas...parece planar sobre sua própria melancolia,
Fico a pensar nos muros invisíveis onde nos guardamos da vida...parecemos, muitas vezes, verdadeiras fortalezas, convenientemente protegidos das intempéries, furacões, maremotos...como se pudéssemos abstrair da nossa evolução, os caminhos pedregosos, os terrenos inférteis, os pàntanos...é a nossa ousadia para abrir o coração para o sonho, para festejarmos nossa lua-de-mel com a vida que nos impulsiona para os abraços com a felicidade.
Volto-me para aquele homem...tenho ímpetos de falar-lhe, mas minha voz quase não mais o alcança., mesmo que gritasse...
Afasto-me da janela, retinas em nevoeiro...meu corpo de mar, segue navegando no desejo de ser feliz...meus braços precisam de outros braços, para que a ciranda da vida se consolide em alguma enseada.
© Nandinha Guimarães
Em 02.04.00
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