Certo dia, a Suzana foi visitar a horta comunitária do seu condomínio de luxo. Ela com mais duas madames caminham diariamente tentando reduzir a gordura adiposa na altura da cintura, das coxas, dos braços...
Admiravam o cuidado das crianças com as hortaliças. Teorizavam sobre o valor daquele trabalho para a dignidade infantil e enchiam de elogios o síndico do condomínio.
Era fim de tarde, sol já indo descansar.
De tanto ouvir tanto mimo com a horta, um inocente ratinho saiu do buraco do muro. Ali era o seu território. Aquela horta também era dele. Dali alimentavam-se ele, seus pais e uma ninhada de irmãos ratinhos. Todos rechuchudinhos, marronzinhos e inofensivos.
- Inofensivos? – Foi o grito da Suzana ao ler esse parágrafo.
Movido pela curiosidade, o bichinho se aproximou, por detrás das madames, e ficou ouvindo atentamente os elogios. Ele também gostava do trabalho das crianças. Sentia enorme gratidão de elas plantarem hortaliças bem gostosas e nutritivas. Elogiava-as por elas terem plantado aquele banquete justamente na porta da sua casa.
Embevecido com os comentários e confiante na bondade das madames, o ratinho resolveu adiantar uns passinhos e se enroscou no pé da Suzana. Aí lascou. Ela deu um pulão tão alto, mas tão alto, que o ratinho nunca imaginou que bicho tão grande e tão pesado pudesse pular tão alto. O pulo veio acompanhado de um grito ensurdecedor que quase matou de susto o ratinho e todas as madames.
Formada a confusão, cada qual correu para um lado. O ratinho para o buraco. As madames esbaforidas, chegaram a suas casas e relataram o fato aos seus maridos. Exigiram providências urgentes para matar aqueles ratos, limpar o lugar, jogar veneno brabo.
Enquanto isso, o ratinho, com o coraçãozinho saindo pela boca, contava a sua mãe, que uma mulher feia, grande quase da altura do muro, deu-lhe um susto danado. Assustada e preocupada com a integridade da sua família, a mãe ratazana prometeu saírem daquele lugar imediatamente. Reclamou com o ratão pai que precisavam se mudar para um lugar seguro livre de pessoas esnobes. Como podem se sentirem ameaçadas com seu filhinho inocente, bonitinho e cheirosinho? Além do mais, aquelas nojentas vêm roubar suas hortaliças, o alimento da família.
Tentando convencer o marido, ela relembrou que dias eles haviam roído o jornal com a notícia sobre o político corrupto da rua de baixo. A notícia dizia que o tal político era um “verdadeiro rato nos ministérios”. Ontem, na calada da noite, os ratos presenciaram o tal político enterrar um saco de dinheiro no jardim.
- Marido, se mexe, vamos lá roer o dinheiro dele e mostrar quem é o rato aqui. Já estou enojada de tanto ver aquele ladrão sendo paparicado por todos do condomínio, enquanto nós, que não roubamos nada deles somos constantemente ameaçados.
Abraçou o filhinho e pediu para ele nunca mais sair sozinho.
Após os gritos, pulos e a correria, as plantas sentiram-se aliviadas por ver todos aqueles devoradores herbívoros longe da horta.
- Ufa, teremos mais um dia de vida! - Suspirou uma couve-flor desabrochando-se e se enroscando num robusto pepino em riste.