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Ensaios-->Com a Mão Na Massa - A Massificação do Ensino -- 01/05/2003 - 20:16 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


COM A MÃO NA MASSA
(por Domingos Oliveira Medeiros)


Deparei-me, por acaso, em meus “papéis”, com um recorte de jornal que trazia a notícia do padeiro analfabeto, que teria sido aprovado no vestibular para o Curso de Direto, na Universidade Estácio de Sá, na Cidade do Rio de Janeiro, conforme veiculada pelo 'Fantástico', programa da emissora Globo de Televisão, levado ao ar dia 09 de dezembro próximo passado. E resolvei reapresentar minhas impressões sobre o assunto, face à sua atualidade.

A notícia está, no mínimo, mal contada; e, no máximo, mal intencionada. Senão vejamos.

Primeiro Ponto. A necessidade do Vestibular

Sempre que o número de vagas oferecidas, por qualquer instituição de ensino superior, em países democráticos como o nosso, for inferior à demanda, vale dizer, ao número de candidatos interessados, há que se fazer um processo seletivo, de caráter classificatório e eliminatório, a fim de ordenar, com justiça, pela via do sistema mérito, a ordem de convocação para matrícula e preenchimento das vagas.

Segundo Ponto. A Pré-Seleção (ou os requisitos exigidos para participação no processo seletivo)

A fase de pré-seleção visa colocar todos os candidatos em igualdade de condições para participar do evento. No caso em tela, nossa ênfase se dará em relação ao aspecto de escolaridade, posto que foi este o requisito que motivou ampla crítica por parte da mídia em geral, justamente pelo fato de o aprovado ser padeiro e analfabeto.

Manda, a boa técnica de recrutamento e seleção, que a comprovação de conclusão do curso de ensino do segundo grau (ou equivalente) , para inscrição em qualquer processo seletivo, inclusive no vestibular, seja feita antes da realização das provas.

Entretanto, e com base em algumas especificidades ou exigências do momento, (que não é conveniente, neste momento, entrar em detalhes) pode-se estabelecer, no edital, a possibilidade de que tal comprovação - de conclusão do segundo grau ou equivalente - seja feita 'a posteriori', ou seja, no ato da efetivação da matrícula na Universidade, após a devida aprovação e classificação.

No caso em tela, pelo fato de o candidato ter sido considerado, pela mídia, analfabeto, tudo leva a crer que a instituição optou pela comprovação da escolaridade 'a posteriori', posto que, se fosse o contrário, o mesmo não teria sua inscrição aceita e, por conseguinte, não teria participado do concurso.

Terceiro Ponto. - Os Instrumentos de Avaliação. As Provas.

Há vários modelos e formas de avaliação em concursos de provas e de provas e títulos. Tudo irá depender, naturalmente, de uma série de fatores específicos, de peculiaridades e do objetivo; cada caso torna-se, portanto, um caso.

Entretanto, e em tese, podemos afirmar que os concursos de vestibulares para ingresso de candidatos aos cursos ministrados por instituições de ensino superior, geralmente, utilizam o modelo conjugado: PROVAS OBJETIVAS (com questões de múltipla escolha e utilização - opcional - de pesos que variam conforme a importância de cada disciplina para o curso objeto de seleção) conjugado com PROVA DE REDAÇÃO (geralmente versando sobre tema relacionado à área de interesse da futura profissão escolhida pelo candidato- ou tema atual de caráter geral).

As provas objetivas, com questões de múltipla escolha, geralmente são de caráter apenas classificatório. Isto permite, na verdade, que um maior número de candidatos participe da Segunda fase, digamos assim, do concurso, que é a Prova de Redação.

As Provas Objetivas podem (e devem) valer-se da aplicação de pesos, ponderando, com maior valor, as disciplinas mais afins às áreas de interesse do curso escolhido . Por exemplo: no vestibular para Engenharia, o peso para a prova de matemática deveria ser maior do que o peso estabelecido para a prova de biologia; ao contrário, na prova para Medicina, inverte-se os valores. A biologia, nesse caso, terá maior peso do que a matemática.

Com relação a Prova de Redação, vale dizer que esta prova afere, sem sombra de dúvidas, com maior probabilidade de acerto, as verdadeiras potencialidades de cada candidato em relação ao seu provável sucesso ou insucesso no decorrer do curso a que se propõe concluir.

Por esta razão, principalmente, é que a Prova de Redação deve ser, sempre, de caráter eminentemente eliminatório. Não é recomendável, portanto, que os pontos a ela atribuídos possa juntar-se aos obtidos nas provas objetivas.


Este fato, se levado a termo, implicará, na melhor das hipóteses, avaliar incorretamente os candidatos; tudo indica ter sido o este o caso do padeiro analfabeto, segundo a imprensa, fato que, particularmente, não acredito.

Em relação à Prova de Redação, vale as mesmas observações e os mesmos cuidados, anteriormente expostos sobre a elaboração da Prova Objetiva, guardadas as devidas proporções e peculiaridades.

A elaboração da Prova de Redação deve ser entregue à Banca Examinadora que deverá ser composta por profissionais que detenham comprovada competência e experiência profissional, seja no que tange aos aspectos de ordem linguística, seja no que tange aos aspectos relacionados ao tema, isto é, aos conhecimentos específicos que serão exigidos dos candidatos.

Deve-se ainda, sempre que possível, dar preferência aos profissionais ou professores que, de fato, estejam militando nas áreas do conhecimento específico e nas áreas afins aos conhecimentos linguísticos. Gramática, sintaxe, concordância, ortografia, clareza, compreensão, idéias, enfim.

Vale lembrar, ainda, que as questões a serem aplicadas nas provas objetivas devem ser objeto de reexame, por administrador afeto a área de Recursos Humanos, especializado em técnicas de elaboração de provas e avaliação de desempenho, de modo geral.

A finalidade é evitar questões com dubiedade de interpretação, que dificultam o seu entendimento. Ou, o que é pior, facilitar o acerto ao acaso, ou induzir o candidato ao ou ao acerto, fato que, naturalmente, não se coaduna com a boa técnica de avaliação.

Igual tratamento deve ser dispensado às alternativas de cada questão. Não se deve, por exemplo, além da alternativa correta, criar outras tão absurdas a ponto de induzir ao acerto. Ou que tenha os famosos 'pegas' que, a rigor, não medem conhecimento algum.

Importante neste ponto é concluir que, em qualquer prova objetiva, bem elaborada, contendo, geralmente, de 30 a 50 questões, com cinco alternativas cada, tornas-se praticamente impossível, do ponto de vista estatístico, o acerto ao acaso, mesmo que tais acertos reflitam, apenas, 50% da prova.

Basta lembrar, por exemplo, para melhor elucidação dos fatos, que a Loteria Esportiva, jogo ministrado pela Caixa Econômica Federal, na realidade, é uma prova do tipo objetiva, contendo, apenas, treze questões, com três alternativas cada (time vencedor, empate e time perdedor).

Bem inferior, portanto, ao número de questões e de alternativas que são aplicadas em concursos vestibulares. Portanto, se acertar na loteria esportiva, ainda que se acompanhe o futebol, e se conheça o perfil e o desempenhos das equipes, é tarefa por demais dificílima - geralmente o prêmio acumula por falta de ganhadores - imagine-se acertar - ao acaso - uma prova de vestibular, com número de questões e de alternativas bem superiores aos da loteria esportiva. .

Por essas e outras razões, acredito que as notícias sobre a aprovação de um padeiro analfabeto em concurso de vestibular deixam a desejar, ou, o que seria mais provável, teriam outras razões e interesses que desconheço. Em todo o caso, vale registrar os seguintes questionamentos:

O que teria motivado um padeiro, analfabeto, a participar do vestibular, numa universidade privada, e bastante cara, optando pelo Curso de Direito? Quem teria pago sua inscrição e com que objetivo? Seria uma notícia previamente plantada? Por quem? Com que interesse?

Como foi que o candidato assinou a sua Ficha de Inscrição para participar do concurso? Algum funcionário da universidade, por acaso, teria recolhido suas impressões digitais e ficou calado?

Qualquer faculdade, mesmo aquelas que vêm tratam a Educação apenas como um mero negócio para enriquecimento pela via dos lucros fáceis, não permitiria que a ausência do candidato na Prova de redação (supondo-a de caráter eliminatório) ensejasse sua aprovação. Até porque tem muito candidato no mercado. E não seria 'inteligente' deixar passar a oportunidade de fazer de conta que a coisa ali é séria.

E as provas objetivas? Se, comprovadamente, do ponto de vista estatístico, a impossibilidade, quase que total, de acerto ao acaso, numa prova com xcerca de trinta questões, em média, e contendo quatro ou cinco alternativas cada uma delas, como explicar que um candidato, ainda por cima analfabeto, e portanto sem condições de ler e entender as questões, pudesse lograr êxito? Ou alguém o teria ajudado? Como? E com que intenção?

E se fosse tudo isto for verdade? Vamos fazer de conta que sim. Será que o padeiro teria condições de efetuar suas matrícula, mesmo sem ter concluído o segundo grau? Será que o padeiro teria condições de concluir o curso? Quem pagaria suas mensalidades? Quem leria e faria as provas para ele?

Sem qualquer chance.

Algumas conclusões, acerca do até aqui exposto:

Que a situação do ensino em nosso país está ruim, todos sabemos. Mas, não vamos exagerar, a ponto de induzir que basta ser analfabeto e pedreiro para cursar Direito numa Faculdade, cá no Brasil.

Ainda que possamos ter razões para tanto, posto que foi de lá, da Universidade Estácio de Sá, que seu dono, o Sr. Uchôa Cavalcanti, em entrevista ao Jornal do Brasil de 16 de novembro próximo passado, em entrevista surpreendente, deixou para a história as seguintes pérolas:

''Não acho que seja uma pessoa muito interessada em educação. Sou interessado na Estácio de Sá, isso é que é importante. Estou interessado no Brasil? Não, não estou interessado no Brasil. Na cidadania ?Também não'.

Pelo visto, o negócio do 'empresário do ramo de educação' é, apenas, ganhar dinheiro. Muito dinheiro aliás. Lucrar, com o ensino, utilizando expressão da mestre em Linguística Aplicada da UFRJ, Dra. Tania Maria Mazzillo, equivale a prejuízo socializado. O ganho do 'negócio' em educação é só do seu proprietário. 'Por isso, no 'negócio' do ensino para ganhar dinheiro não existe pesquisa, porque pesquisa demanda investimento e tempo e o resultado da pesquisa reverte para a sociedade e não para o dono do negócio'.

Do mesmo modo, o professor e o pesquisador não têm utilidade para o negociante do ensino com fins lucrativos. São aplicações de, longo prazo, que se revertem em favor dos cidadãos, 'tudo para que a sociedade progrida, distribua suas riquezas e saiba eliminar os mercadores do lucro cínico'.

É triste, mas é verdade, saber que no Brasil existe elementos deste tipo administrando uma entidade de ensino. É triste saber que o Ministério da Educação, não tenha tomado qualquer providência a respeito. Ao contrário, não faz muito tempo, o MEC, a exemplo de tantas outras instituições, fez foi aumentar o número de vagas solicitadas pelo dito 'empresário'.

Conclusão Final

A reportagem conseguiu entre outras coisas:

Denegrir, sem necessidade, a imagem do Brasil, no exterior, já tão desgastada. Roupa suja se lava em casa!

Macular, injustamente, a imagem dos futuros profissionais que sairão formados pela Estácio de Sá. O aluno também faz a faculdade.

Ferir, de forma preconceituosa, a profissão de padeiro. Nem todo padeiro é analfabeto.

Desmotivar uma parcela da população que ainda sonha com melhores dias através da educação.

E, por fim, vale o registro que o trabalho de reportagem deixou a desejar no momento em que omitiu detalhes significativos para a compreensão dos fatos, o que, ao meu ver, deixou a população sem entender DIREITO o que teria, DE FATO, acontecido.

Já começo a desconfiar que algum jornalista envolvido com a reportagem, logo no seu início, possa ter sido aprovado no vestibular para a área de Comunicação, do mesmo modo que o padeiro para a área de Direito.

A diferença é que o jornalista conseguiu, depois de muito esforço, superar as barreiras e encontrar-se, hoje, bem empregado, num conceituado órgão de imprensa.

Domingos Oliveira Medeiros
Reapr. Em 01 de maio de 2003









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