Faze de conta que este verso existe
Tão-só para deixar-te muito triste,
Porque não és capaz de copiá-lo.
É como o santo que se vê na igreja,
Que me sugere que no Céu esteja,
Perante o qual eu me envergonho e calo.
Quem se sentir mui pobre dentro d’alma
Há de rogar ao Pai com fé, que acalma
O seu desejo intenso de progresso.
Se a alta escada sobe ao infinito,
Querer chegar ao topo, enquanto aflito,
É estar fadado, sim, ao insucesso.
É passo a passo que se vai adiante,
Sendo o primeiro dar ao semelhante
O mesmo amor que a gente dá p’ra si.
Aí, na Terra, esparramei rancor,
Mas, cá no etéreo, tenho de compor
Outra canção e não a que vivi.
A penitência é dura e é gostosa:
Enquanto se compõe a tosca glosa,
A turma sua sangue em cada rima.
Mas, ao chegar ao fim, deste poema,
A gente quer sentir a dor suprema,
Para sentir também a tua estima.
— “Poeta, por que sofres tanto agora,
Se sabes qual a lei que aí vigora,
Para levar-te ao Pai, sem atropelo?”
É que essa lei exige permanente
Estudo e que o trabalho dê à gente
Claríssima noção para fazê-lo.
O mestre é responsável pelo aluno
E diz a ele ser inoportuno
Fugir da prática do bem agora.
O aluno, malicioso, quer saber
Em que momento irá espairecer,
E o mestre lhe responde: — “À mesma hora.”
Não é difícil pressupor que, um dia,
Iremos decifrar esta poesia,
Para que se descubra a realidade.
Assim, na vida, tudo é compromisso,
Seja o bom poetar, seja o serviço
Que se presta ao irmão, caso se agrade.
Menosprezar a hora em que viceja
A inspiração, por pobre quanto seja,
É o mesmo que falhar na pontaria.
Se a nossa meta é vir fazer um verso,
Por que ficar em sombras muito imerso.
A refulgir o Sol, em alegria?!
Façamos o melhor que for possível,
De modo a refletir o nosso nível,
Na busca do evangelho de Jesus.
Um titubeio aqui logo se cura,
Pois não só no deserto é que há secura.
E, mesmo havendo, há um resplendor de luz.
É sempre grato vir dizer ao povo
Que a graça do Senhor temos de novo,
Pois é eterno o seu amor por nós.
O povo simples sabe bem que é isso
Que me mantém atento ao compromisso
E silencia, p’ra me ouvir a voz.
Sou responsável, pois, por esta trova,
O que, de resto, a rima bem comprova,
Pois desempenho com amor à lida.
Da mesma forma, o verso que contemplo
Também o meu labor sirvam de exemplo,
A incentivar a luta pela vida.
Esta é a medida com que dou meu passo.
Estou contente e o meu amigo abraço,
Para firmar a fé em teu futuro.
Do mesmo modo que me leste agora,
Confrange o coração, medita e ora,
Que o Pai há de fazer-te bem mais puro.
Caso prossigas com desconfiança,
Por teres casos tristes na lembrança,
Imita o pensamento de Jesus.
Verás que a tua sina é tão pequena
Que há de parecer simples, amena,
Perante o sofrimento lá da cruz.
Eu sei que queres te encontrar comigo,
Porquanto, em alguns pontos, eu te intrigo,
Às vezes a sorrir, outras, bradando.
É que os meus versos têm todas as rimas,
Assim como, na Terra, existem climas
Nos quais o vento sopra, forte ou brando.
A estrela que me guia, neste ensejo,
A pairar, lá no alto, esconde o pejo,
Ao perceber que o orgulho me domina.
E manda me dizer que é mais perverso
Quem é muito raposa, neste verso,
Colhendo o fruto verde da doutrina.
Por isso, eu me despeço, envergonhado,
E rogo que me deixem deste lado,
A meditar sobre a malícia minha.
E mais eu vou pedir a todo o mundo:
Que olhem bem na alma, lá no fundo,
A ver se alguma dúvida se aninha.
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