É consenso entre os estudiosos que a dor reprimida da criança é a origem dos conflitos e dificuldades humanas.
Identificá-la torna-se então o primeiro passo de qualquer processo de desenvolvimento, muito embora essa necessidade não se esgote - por todo - nesse momento inicial.
Muito pelo contrário, a essas dores volta-se sempre, numa sugestão de ser mais do que somente a nascente, porém também uma fonte repleta e incessante – um manancial – de toda e qualquer potencialidade.
Duas alternativas apresentam-se a esse movimento: o círculo e a espiral.
O círculo é um giro em direção sempre ao mesmo ponto; a espiral é uma curva que roda em torno de um ponto, ao mesmo tempo em que dele afasta-se.
O primeiro traduz o padrão de comportamento de repetição de eventos e experiências e do próprio carma, quando a ele dá-se esse significado.
O outro compõe a proposta de doutrinas holísticas, que consideram o homem um todo indivisível, sem condições de ser explicado isoladamente por qualquer dos seus aspectos.
Círculo e espiral constituem-se, dessa maneira, duas perspectivas de vida, aparentemente semelhantes se analisadas a nível superficial, entretanto basicamente opostas em essência.
Prender-se ao círculo representa atribuir à relação filho-pais e ao momento infantil todo e qualquer problema do adulto, numa presunção de ser o indivíduo inicialmente um vaso vazio, preenchido pelas vozes e impressões do cotidiano da criança.
Tal abordagem confere à casualidade o poder de determinação de parâmetros e diretrizes de vida, haja vista estar fora do domínio do bebê a escolha tanto do seu habitat quanto da identidade dos pais, os maiores influenciadores da personalidade em formação.
A questão da responsabilidade adquire conotação diferenciada no panorama da espiral. Além de reconhecer a existência de famílias razoavelmente acolhedoras e pais amorosos e bem-intencionados, admite que esse contexto original, como qualquer outro, não oferece garantias futuras para a criança – estendendo-se além dos pais e do mero ambiente infantil que a roda aponta.
A abordagem da espiral divisa uma conjuntura ampla e profunda, no sentido em que entende os problemas humanos como uma situação nascida de um encontro de determinadas circunstâncias e que tem como ponto de partida a dor da criança.
Essa dor original é o ponto fixo que a espiral sempre procura – é o ponto nuclear psíquico - apesar de concomitantemente dele apartar-se e é exatamente esse distanciamento o diferencial entre a esfera e a espiral.
A linha de pensamento do movimento em espiral parte da premissa de que a pessoa nasce com uma bagagem oriunda de diversas vidas anteriores e exatamente no ambiente propício para o despertar de faculdades, tendências e potencialidades adormecidas, necessárias para o desenvolvimento final.
A observação desse mecanismo é facilmente detectável em pais e filhos com a mesma inclinação artística e/ou profissional. Mais difícil, não obstante, é essa constatação quando a hipótese é a potencialidade negativa: os defeitos, as limitações e a destrutividade dos pais e ambiente constituem-se exatamente a motivação imprescindível para despontar a mesma matriz- na maior parte secreta – dos filhos, a fim de ser confrontada, entendida, aceita e transcendida.
A focalização da espiral estimula a pessoa a procurar dentro de si o que quer que a incomode no outrem – principalmente os pais - seja uma simples mania inofensiva até os defeitos sérios de caráter.
As terapias presas ao movimento em círculo têm como meta o desvendar da infância e pretendem a cura através da descoberta dos traumas e percepções infantis.
As adeptas do movimento em espiral propõem-se revelar essa mesma dor, porém a considerando uma etapa do processo, vez tratar-se tão-somente da ponta de um grande iceberg – a re-experimentação das emoções e sentimentos infantis pode significar o emergir das potencialidades latentes, tanto positivas quanto negativas.
Nesse curso, a negatividade e o mal interiores ocultos denunciam-se primeiro – apesar de sobreporem-se mutuamente, com a prevalência de um aspecto sobre o outro, sucessivamente - para depois permitir o surgimento da beleza e poder humanos, numa sugestão de que a dor e a destrutividade impedem e embotam a luz e todo o seu esplendor – e é exatamente na transformação dessa porção negada que a cura é obtida.
À medida que camadas e mais camadas obscuras são desveladas e transcendidas, as curvas da configuração em espiral tornam-se, ao mesmo tempo, cada vez menores e percorrem movimentos para dentro do diagrama, até formarem um só foco e uma única linha – é quando o homem rompe e desfaz-se da dualidade e ressurge na sua própria unicidade divina – descoberta dentro de si mesmo.