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Ensaios-->Félix Pacheco, poeta e político -- 17/10/2002 - 23:47 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
FÉLIX PACHECO – UMA BIOGRAFIA DE POETA

FRANCISCO MIGUEL DE MOURA*


1. Introdução

A fundação da Academia Piauiense de Letras, em 1917, foi um feito importante para a época. Os seus fundadores e outros poetas e escritores que lhes seguiram os passos representam uma evolução estética no Piauí, tendo em vista que, em sua maioria, estudaram em Recife e trouxeram a influência dos grandes mestres daquele cenário renovador da arte e do pensamento brasileiros.
Lucídio Freitas, Da Costa e Silva e Celso Pinheiro merecem toda a nossa atenção. Os poetas Félix Pacheco, Jonas da Silva, Antônio Chaves, Zito Batista, Jônatas Batista, Baurélio Mangabeira, Fenelon Castelo Branco e Nogueira Tapety também. Atenção acompanhada de leitura e estudo constantes. Além dos prosadores Clodoaldo Freitas, Abdias Neves e Higino Cunha.
Félix Pacheco nascido em Teresina, em 2 de agosto de 1879, jornalista, político, parlamentar e poeta parnasiano-simbolista, como o classificou João Pinheiro, é um dos nomes mais celebrados fora dos limites do Piauí. Mas, como se sabe, não fez parte do grupo de intelectuais que fundou a Academia Piauiense de Letras, em 1917, fosse porque estudava no Rio, fosse porque de lá não voltou em definitivo como outros. Mas foi chamado para ser o primeiro ocupante da cadeira nº 18, cujo patrono é o Marquês de Paranaguá.
Não obstante tenha escrito e publicado cedo, e muitas obras, dois acontecimentos extraliterários contribuíram para que se fizesse nome nacional e assim se sustentasse: primeiro, sua eleição e posse na Academia Brasileira de Letras, 1913; segundo, sua atuação como Ministro das Relações Exteriores, de 1922 a 1926. Importante também foi ter introduzido o sistema datiloscópico, durante os anos em que dirigiu o Gabinete de Identificação e Estatística da Polícia da Capital Federal.
Publicou seu primeiro livro, Chicotadas, em 1897, mais tarde rejeitando-o, tanto assim que não consta na relação de suas obras colocada por João Pinheiro. Lançou, em seguida, O Publicista da Regência, uma monografia histórica sobre Evaristo da Veiga e a Aurora Fluminense, em 1899, e Homilias de piedade, tradução de Bossuet. Como poeta, estreou com Chicotadas, é certo, e continuou escrevendo e publicando poesias e obras intelectuais, principalmente discursos e ensaios jornalísticos e historiográficos.
A poesia de Félix Pacheco, não resta dúvida, em boa parte aos poucos vai-se intelectualizando. Há um trabalho intenso por trás de seus versos. Mas sobram sempre uns restos da impetuosidade e da fúria de Chicotadas, dos seus primeiros anos, aquilo que não conseguiu domar. Assim é que, salvo em alguns poemas mais antigos, pratica um lirismo meio ríspido, sem aquela naturalidade que o leitor de hoje espera, pelo menos o leitor mais crítico, mais interessado em sutilezas. Mesmo em seu mais famoso poema, Estranhas Lágrimas, objeto de algumas versões e muitas polêmicas, conforme comentários de A.Tito Filho, esses aspectos podem ser detectados:

Lágrimas... noutras épocas verti-as.
Não tinha o olhar enxuto como agora.
- Alma, dizia então comigo, chora!
Que assim minorarás as agonias!

Ah! Quantas vezes pelas faces frias,
Umas, outras após, a toda hora,
Gota a gota rolando elas, outrora,
Marcaram noites e marcaram dias!

Vinham do oceano d’alma, imenso e fundo,
De espuma as ondas salpicando o flanco,
Numa fremência amargurada e louca.

Nos olhos hoje as lágrimas estanco...
Rolam, porém, sem que as descubra o mundo
Sob a forma de risos pela boca.

Carlos Evandro Martins Eulálio, professor e crítico literário, em artigo na revista Presença, nº 12, de julho/setembro de 1984, enumera quatro versões dos primeiros versos do soneto acima:

Alma, dizia então comigo, chora,
Que o pranto diminui as agonias...

Alma, dizia então comigo, chora,
Que assim minorarás as agonias...

Alma, dizia então comigo, chora,
Que o pranto afoga e anula as agonias...

Eu próprio então me aconselhava: Chora,
Que o pranto é um refrigério às agonias.

Mas o poeta volta a fixar-se na segunda opção acima, quando organizou a edição de Poesias, em 1932, como vimos na nossa transcrição justamente daquela edição, como sua forma definitiva.
Não resta dúvida que é um soneto clássico, pelo menos entre os piauienses, que sabem da luta do poeta até sua versão final. Mas deveria constar nas principais coletâneas da poesia nacional.
Outro poema, também soneto, “uma das mais impressionantes páginas do seu último livro”, conforme disse João Pinheiro em Literatura Piauiense, Escorço Histórico, é A Visita Infalível, que vamos mostrar aqui em comprovação do que dissemos há pouco:

Ouço-lhe o surdo passo e lhe pressinto o vulto
Na meia sombra ambiente. Invisível se esgueira
De manso, a foice às mãos, calada, sorrateira,
E já pronta a oficiar na lágrima o seu culto...

Nunca avisa a quem busca e chega sem tumulto,
E passeia indecisa e incerta, a casa inteira,
Parando em cada quarto, a espreitar, agoireira...
É cedo! Exclama. E ri com o seu riso oculto...

E vai-se... E torna a vir... Parte outra vez... Regressa...
Espera um pouco e volta... E repete, freqüente,
Mas sempre silenciosa, a obrigação sem pressa...

Ninguém suspeita nada, ou receia da sorte...
Desfila e corre o tempo indiferentemente...
Mas um dia, ai de nós! Entra a visita, é a morte!


Esses dois sonetos valem como uma antologia. Mas nosso desejo seria de mostrar muito mais. Infelizmente o espaço deste trabalho não permite, daí porque escolhemos parte de um poema bem ilustrativo de sua não fixação como poeta parnasiano ou simbolista e, muito mais, das recorrências românticas. Trata-se do longo poema Karnak

Sempre que o meu passado recomponho,
De ti me lembro, e do recinto belo
Em que tive o meu lar, e abri meu sonho.

Nenhum brasão no pórtico singelo,
Mas, lá dentro, quimeras e alegria,
Indo e vindo num brando ritornelo.

Onde hoje te ergues, noutro tempo havia
Um matagal cercando humilde choça,
Cheio de agreste e singular poesia.

Deitou-se abaixo a rústica palhoça
E, desbravado o solo, eis já começa
O novo ninho no lugar da roça.

O emaranhado primitivo cessa,
E o roseiral bravio e doidivanas
De outras galas melhores se adereça.

Na pérola das pérolas urbanas
Levantam-se, alinhadas,as palmeiras
Nobres, altas, nostálgicas, ufanas.

Tudo mãos femininas feiticeiras
Vão dispondo com arte e com carinho,
Para inveja das outras jardineiras.

Coitada! Ai não pensara em tanto espinho,
Em tanta escuridão, em tanto frio,
Nem que tão cedo abandonasse o ninho!

(...)

Nunca nas ânsias viverá suspenso.
Na evocação que faço de seu vulto,
Tudo se me restaura, e eu me convenço

Que é dela que me vem e de seu culto
O clarão que o meu verso enfeixa e encerra,
E faz de mim, no meio do tumulto,
O mais feliz dos homens que há na terra!

2. Obras


Além de Chicotadas, livro já mencionado, publicou os seguintes, de poemas:
Via Crucis, 1900;
Mors-Amor, 1906;
Poesias, 1914;
Inezita, 1915;
Martha, 1917;
Tu, só tu.... 1917;
No Limiar do Outono, 1918;
Lírios Brancos, 1919;
O Pendão da Taba Verde, 1919;
Estos e Pausas, 1920;
Em Louvor de Paulo Barreto, 1922; e
Poesias, edição definitiva, 1932.
Seria por demais extensa a lista de todas as suas obras políticas, jornalísticas e de ocasião, portanto, ociosa para o nosso trabalho. Faço questão de citar, além das já mencionas – a estréia, um ensaio e uma tradução – apenas as seguintes, porque tratam de assunto de sua predileção e ao que parece no qual foi um expert – a identificação, a datiloscopia:
O problema da identificação, 1901;
A identificação pelas impressões digitais, do Dr. Edmond Locar (tradução), 1903;
A excelência do sistema datiloscópico Vucetich e a necessidade de criação dos gabinetes intercontinentais, tese apresentada ao C.S.L. Americano do Rio de Janeiro;
O serviço de identificação no Brasil, tese apresentada ao 2º Congresso Médico de Montevidéu, 1906;
Regulamento do serviço de identificação, 1907.


3. Títulos e condecorações


Félix Pacheco era doutor de “rite” pelo College of Journalism, Political, Sciences & Languages, de West Virgínia, e possuía e as seguintes condecorações:
- Oficial da Ordem Militar São Tiago da Espada (Portugal);
- Grande Oficial da Ordem de Leopoldo II (Bélgica);
- Grã Cruz da Ordem de Cristo (Portugal);
- Grão Cordão da Ordem de Simon Bolívar (Venezuela);
- Grã Cruz da Real Ordem de Isabel, a Católica (Espanha);
- Grande Oficial da Ordem Nacional do Condor do Andes (Bolívia);
- Grã Cruz da Ordem de Dannenbrog (Dinamarca);
- Grã Cruz da Ordem da Coroa da Itália;
- Grande Cruz da Ordem do Sol (Peru);
- Condecoração de lª Classe Al Merito (Chile);
- Grã Cruz da Ordem Nacional do Mérito (Equador);
- Cruz de Benemerência do Vaticano;
- Sócio honorário da Associação Comercial, da Associação dos Empregados do Comércio do Rio de Janeiro, da Federação das Sociedades do Remo;
- Membro do Conselho da Fundação Osvaldo Cruz e sócio benemérito e efetivo do Jockey Club;
- Membro benemérito e tinha a Cruz de Honra da Sociedade de Amigos do Brasil (Dinamarca);
- Sócio do Instituto Histórico, e, desde 1910, Sócio Correspondente do Instituto Arqueológico de Pernambuco, do Instituto Histórico do Piauí, Sócio Honorário do Instituto Histórico da Bahia e de associações congêneres em outros Estados;
- Foi Presidente do Tiro Brasileiro de Imprensa e sócio da Sociedade de Geografia;
- Foi 2º Vice-Presidente da Câmara dos Deputados na última legislatura em que serviu nessa Casa do Congresso, antes de passar ao Senado;
- Exerceu na Academia Brasileira de Letras os cargos de Bibliotecário, 2º Secretário e Secretário Geral.

(Dados copiados do livro Poesias, 2aª edição, Teresina, Piauí, 1985, editado pelo Projeto Petrônio Portella, em comemoração ao cinqüentenário de sua morte).


4. Traços Biográficos


A biografia de um homem não se encerra entre suas datas de nascimento e morte, flui para os dois lados, o de antes e o de depois. Muito especialmente se se trata de um poeta. E se esse poeta é Félix Pacheco, muito mais ainda. Se dele não podemos dizer o que disse Benedito Nunes sobre Mario de Andrade – que “ser e poesia sempre andaram de braços dados em seus poemas” – não pecaria muito quem afirmasse que, ao contrário, teve Félix Pacheco uma vida que de todo negava a poesia, e mesmo assim era poeta. Foi poeta romântico em Chicotadas, depois segue as pegadas do tempo, vivendo como viveu o final do século XIX e começo do século XX com todas as letras, amando e lutando, muito embora não necessitasse de lutar tanto, pois era de família burguesa, filho de Gabriel Luís Ferreira e Maria Benedita Cândida da Conceição Pacheco. O pai, Gabriel Ferreira, de estirpe política, chega até a Governador do Piauí, entre 28-5-1891 e 21-12-1891, quando o menino José Félix Alves Pacheco contava ainda 12 anos. Jornalista, magistrado e político, fora várias vezes deputado provincial e terminaria se elegendo Deputado Federal, legislatura de 1894-1896.
Herculano Moraes, historiador literário e acadêmico, que ocupa hoje a cadeira que foi de José Félix Alves Pacheco na APL, assim vê a infância do futuro poeta e político, na sua terra natal:
“Passou uma importante parte de sua infância entre as árvores e o gorjeio dos pássaros do Karnak, e as lições de humanidade e conhecimentos gerais do Prof. Artur Pedreira. Ali ouvia os conchavos políticos e absorvia as lições de austeridade e lealdade do pai, que governava o Piauí na época. A política, portanto, chegando a atraí-lo já na mocidade, foi apenas uma conseqüência étnica e, certamente, a explosão do que ficou gravado na memória do menino.
Iniciando-se nos jornais em Teresina, ao lado de Antônio Ribeiro Gonçalves, Eurípedes de Aguiar, Pires Rebelo, Antônio Martins de Área Leão, Galileu e João Luís Ferreira, o menino Felix Pacheco adotava de início o pseudônimo de ONCINHA, desenvolvendo artigos em defesa do pai, rudemente criticado pelos opositores.”
Como registrou Wilson Carvalho Gonçalves em seu Grande Dicionário Histórico-Biográfico Piauiense (1549-1997), o governador Gabriel Luís Ferreira foi deposto no dia 21 de dezembro de 1891, mas João da Cruz e Santos, o vice-governador, recusou-se a assumir o governo, alegando que só o faria no caso de o governador eleito renunciar ao cargo. Diante do impasse, tomou posse uma junta governativa composta pelo militar João Domingos Ramos e pelos civis Higino Cunha, Clodoaldo Freitas, José Euzébio de Carvalho Oliveira, Elias Firmino de Sousa Martins e José Pereira Lopes.
Como às vezes acontece, era “a gangorra da política funcionando em sentido contrário”, acrescenta Herculano Moraes.
Aquele fato ocasionaria a ida do filho para o Colégio Militar do Rio de Janeiro, levado pela mão do tio do poeta, Teodoro Alves Pacheco – lugar propício ao desenvolvimento do jovem, aperfeiçoando o sentido de disciplina, ordem e amor à pátria, uma constante em toda a sua vida pública. Lá, durante o seus estudos secundários, de fato faria grande figura, desenvolvendo seu espírito de liderança, sua vocação para o jornalismo e para a oratória. Já então começa a escrever para a revista Aspiração, recém-fundada, desenvolvendo temas novos como a situação da mulher, o movimento luterano, e, dentro dos estudos literários, analisa a arte e a vida de Basílio da Gama, de Gregório de Matos Guerra e a política de Deodoro da Fonseca, nos anos de 1895 e 1896.
Aos 18 anos, quando publicou O Publicista da Regência, em que dissecava a vida e obra do patriarca e fundador da imprensa no Brasil, Evaristo da Veiga, arrancou de Coelho Rodrigues elogios e prognósticos para seu futuro, um futuro brilhante que a história comprovaria.
Herculano Moraes transcreve, na revista Cirandinha, de maio de 1980, o seguinte trecho:
“Li seu artigo e, se não o conhecesse, não acreditaria que fosse seu; não faça versos quando não estiver de veia; não cometa alguma criançada de adulto; e se, dentro de alguns anos, o redator-chefe do primeiro jornal da América do Sul não for um piauiense, não espere desculpas do admirador e patrício.”
Começou em O Debate, passando-se a seguir para o Jornal do Comércio, onde fez brilhante carreira jornalística, ingressando como repórter, e com pouco tempo, em 1906, já era seu Secretário. Mais tarde, em virtude do seu talento, assumiu outras funções, inclusive o cargo de Diretor-Proprietário. Embora tenha-se matriculado na Faculdade de Direito, não seguiu nenhum curso superior de ensino, atraído que foi para o jornalismo, sua grande paixão profissional.
Casou-se em 1908, com Dora Rodrigues Pacheco, construiu seu lar dentro dos padrões da época, com toda a felicidade proporcionada por uma esposa e companheira ideal, que lhe dava estímulo para a luta, deixando duas filhas: Inez e Marta.
Félix Pacheco faleceu no Rio de Janeiro, aos 56 anos, morreu como um crente, atestam seus familiares e contemporâneos, com o pensamento voltado para Deus e para a pátria, tal como fora sua vida. Uma vida mais de homem voltado para a prática que para a poesia. A prática da política: deputado federal em quatro legislaturas, e, em 1921, eleito senador, tendo em seguida exercido as funções de Ministro das Relações Exteriores, no Governo Artur Bernardes; a prática do jornalista policial, fundando e dirigindo, no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, o Gabinete de Identificação e Estatística, hoje chamado de Instituto Félix Pacheco.

4. A estética

Em apresentação ao livro Poesias, 2ª edição, 1985, de Félix Pacheco, editado pelo Governo do Estado, na comemoração ao cinquentenário de sua morte, a Profª Maria Gomes Figueiredo dos Reis tenta resolver a questão de seu estilo, se parnasiano ou simbolista, que já sabemos começou satírico, evoluiu para o romantismo de uma lírica amorosa que de vez em quando desponta e deságua no parnasiano-simbolismo, leito largo daquelas gerações do final do séc. XIX e começo do séc. XX.
“Percorreu Félix Pacheco um itinerário poético bastante indefinido, marcado pela reação parnasianista ao simbolismo e pela luta futurista contra as duas correntes passadistas. Vivendo intensamente suas carreiras política e diplomática, Félix Pacheco não participou das investidas de uma corrente contra as outras, encerrando seu caminho poético entre os anos de 1919/1920, quando se voltou mais, no campo da palavra, ao jornalismo, à oratória e à crítica literária.
Não ter participado do movimento modernista de 22, em nada diminui o valor da poesia de F. P. que preferiu ser fiel aos cânones da sua geração, procurando aproximar-se de Olavo Bilac, estrela mais brilhante da Via Láctea parnasiana. É no POETA DAS ESTRELAS que o autor de Estranhas Lágrimas vai buscar o motivo para o soneto A VOZ DAS ESTRELAS QUE AMARAM. Se em Bilac as estrelas são “virgens mortas”, no poeta piauiense são estrelas as mulheres inspiradoras de grandes amores, cantadas por Dante e Petrarca, Poe, Shakespeare e Camões; ou amadas por Júlio César e Marco Antônio.
Enquanto, pela preciosidade vocabular e pela evocação de alguns mitos, Félix Pacheco não consegue desvencilhar-se do parnasianismo, e na busca das saídas românticas e simbolistas tenta escapar dele pela tangente, conclui a Profª Maria Gomes Figueiredo dos Reis, ele alcança a particularidade de poetizar sobre a poesia, traballhando a palavra sobre a palavra, numa metalinguagem poética, digna dos tempos modernos, acrescento agora. Em louvor do soneto é um dos mais perfeitos sonetos do poeta, muito bem apontado pelo estudo da Profª Figueiredo Reis:

Outros se percam no marulho intenso,
E a lira afinem pelo canto vasto.
Eu, no meu lindo cárcere, me basto,
E não o julgo estreito, mas imenso.

Nestes curtos grilhões nunca me gasto.
Digo tudo o que quero e quanto penso,
Satisfeito das perfídias que venço,
E orgulhoso dos óbices que afasto.

Há quem prefira os poemas dilatados,
Amplas visões em versos numerosos,
Onde a rima extravase em grandes brados.

Eu, porém, a outros moldes me remeto,
E nunca tive um gozo entre os meus gozos
Que não coubesse dentro de um soneto!

Já é possível indicar aqui uma característica da poesia felixpachequiana no terreno lingüístico e portanto no seu estilo – a preferência pelas palavras proparoxítonas e por isto mesmo a tendência a um ritmo que acompanha essa acentuação, dentro de todo o discurso poético. Dessa forma, o lirismo se esvai e quando o conteúdo não é propriamente amoroso, tudo passa a ser considerado da Escola Parnasiana. Neste particular é um poeta muito singular dentro do Parnasianismo, inclusive pela incorporação de algumas aquisições que são próprias do modernismo, como pudemos sentir.

6. A crítica


Nome nacional no jornalismo, na política e na diplomacia, também porque deu seu nome ao Instituto Nacional de Identificação, Félix Pacheco hoje parece restringir-se apenas ao seu Estado, o que, de todo não é justo. A crítica nacional nada fez para colocá-lo em antologias escolares ou não. Refletindo em termos do momento, creio até que os críticos se omitiram, em virtude de sua identificação com os governos a que serviu. Prolífico e polígrafo, este o destino de quem escreve muito e muito faz. Mas sua poesia, embora me pareça não bem compreendida na época, merece ser lida, relida e reestudada. Em alguns momentos ele foi tão simples e agrada tanto que o leitor nem acredita que aquele é o Félix Pacheco dos sonetos duros, cheios de paroxítonos e de ritmos largos, palavras inesperadas e súbitas mudanças de ritmo – tudo isto nada comum aos parnasianos e simbolistas.
Damos, a seguir, algumas apreciações dos críticos de ontem e de hoje:

Multívago da poesia e de variados ramos da literatura, por possuir talento multifário, José Félix Alves Pacheco representou muito bem, no sul do país, sua pequenina terra natal.
É ele, sem nenhum favor, uma das glórias mais graníticas das letras do Piauí.
J. Miguel de Matos

Sobre a poesia de Félix Pacheco bastaria que se repetisse aqui aquela frase de Júlio Porto Carreiro: “Toda pessoa que lê por este Brasil recorda ou sabe de cor aquele lindo soneto Estranhas Lágrimas.”

Herculano Moraes

O vate satírico, o juiz literário, o grande homem de imprensa que absorveu e viveu três longas fases da civilização brasileira.

Pedro Calmon

O jornalista, o literato, o poeta, o parlamentar, o político, o homem de Estado, o chefe de família, o esposo e o pai como que se fundiram num mesmo cadinho de metal nobre.

José Auto de Abreu


Foi sempre um sonhador dos mais sinceros, um produto do meio, enriquecido pelas correntes subterrâneas que animam as melhores expressões da inteligência.

Luiz Murat

No poeta como no jornalista, coexistiram e persistem os mesmos ímpetos por um ideal de beleza e de ordem conseguidos com a ironia ou a investida, porém mantidos pela reflexão e pela autoridade, que são apanágio da vitória.

Afrânio Peixoto

Félix Pacheco ingressa nas hostes simbólicas. Seu nome repercutiu fora das nossas fronteiras, nos grandes centros culturais da Europa, levado nas asas do talento multiforme de poeta, jornalista e conferencista, até a Sorbone.

Alarico da Cunha

Se Cruz e Sousa tinha obsessão pelo branco, a linguagem colorida de Félix Pacheco, possivelmente por influência de Baudelaire, acolhia como imagem constante em seus poemas “a grande face do mar”, numa identificação com a própria sensibilidade de poeta, ao manifestar uma poesia interior de profunda reflexão sobre o seu estado de espírito.

Carlos Evandro Eulálio

Excede de trinta anos a distância entre os primeiros e os últimos versos aqui reproduzidos (Poesias, 1932).
A poesia brasileira caminhou tanto, e mudou, nesse dilatado período, que estará no seu legítimo direito, sorrindo com ironia das predileções que o meu simbolismo de emergência nunca deixou de manifestar pelos cânones parnasianos, se ele próprio, no fundo, não era, acaso, puro romantismo, ou deleite retrógrado de árcade.
Félix Pacheco
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Dados biográficos do Autor:

Francisco Miguel de Moura (16-6-1933, Francisco Santos – PI), é membro da Academia Piauiense de Letras, licenciado em literatura e pós-graduado em crítica de arte. Publicou cerca de vinte livros, contemplando os gêneros poesia, conto, romance, crônica e crítica literária, tendo recebido vários prêmios valiosos. Seus mais recentes lançamentos foram Poesia in Completa, poemas, Teresina, l998; Por que Petrônio não ganhou o céu, contos, Teresina, 1999; e Viragens, poesia, Rio, 2001.
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