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Ensaios-->Tempos Modernos - Ensaio sobre a Violência -- 01/10/2002 - 16:31 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tempos Modernos – Ensaio sobre a Violência
(por Domingos Oliveira Medeiros)
(republicação em face de o original ter sumido)

Vivemos o paradoxo da modernidade. Onde o avanço tecnológico acontece, de um lado, proporcionando, em tese, o conforto - facilitando a vida dos seres humanos - e, de outro, na prática, prejudicando a maioria de nós.

Se antes o homem era ironizado e caricaturado por Chapllin, no chão da fábrica, insatisfeito com a rotina de apertar parafusos - a que se obrigava frente à grande engrenagem para a produção de algo que ele nem mesmo sabia -, hoje, este mesmo homem, por conta do avanço tecnológico, passou a ser o próprio parafuso. Ou seja, aos poucos, foi perdendo terreno para a máquina, ferramentas e acessórios. Sai de cena a gerência de recursos humanos, sobressai a gerência de recursos materiais e tecnológicos.

A robotização agregou rentabilidade ao capital investido, mas criou o desemprego. Quer dizer, a relação custo/benefício não é positiva para o bem-estar da população. Apenas para uma pequena minoria ela se tornou positiva. De fato, aumentou a distância entre ricos e pobres. Ampliando a concentração de rendas e aumentando a produtividade na mesma proporção da miséria absoluta. Milhares e milhares de desempregados. O homem, aos poucos, vai perdendo sua dignidade, à medida que a tecnologia avança.

Na área do comércio a coisa não é muito diferente. A prestação de serviços bancários inaugurou uma era de ênfase nos lucros. Para “facilitar” a vida das pessoas, os bancos arranjaram um jeito de que essas pessoas, cada vez menos, precisem entrar nas agências. Logo na entrada, existem as modernas recepcionistas para atendê-los.

São os caixas eletrônicos. Trabalhadores incansáveis. Recebem contas, efetuam saques em dinheiro, fornecem talões de cheques, estratos e transferências para outros bancos. Só não falam, não riem, não se comunicam. São quentes de energia elétrica. Mas faltam-lhes o calor humano. Aquele bom dia. Aquele comentário sobre o resultado do jogo. Sobre algum escândalo. Alguma medida governamental, enfim. O componente humano foi, definitivamente, deixado de lado. Em nome do lucro, travestido de “facilidades” para o cliente.

Assim acontece em quase todas as atividades modernas. Nos hospitais, as cirurgias cardíacas são feitas por um robot, comandado por um médico. O paciente continua sendo anestesiado. E quando acorda, que recebe a notícia de que tudo foi bem, chora e, logo em seguida, não sabe direito a quem agradecer. Se ao médico, que do lado de fora da sala de operação orientou e torceu pelo sucesso da mesma, ou se ao robot, que com suas mãos de aço tocou no seu corpo e foi quem, de fato, realizou o bem sucedido evento.

Assim acontece na gravidez in vitro, dentro do laboratório. Fica difícil entender o conceito de mãe com o avental todo sujo de ovo. Não se vislumbra o colo, não tem calor, não tem afago, não tem cheiro, não tem sabor.

A possibilidade de clonagem é outro avanço tecnológico disicutível. Perdemos uma de nossas mais importantes características. A de sermos, todos, uma pessoa única. Diferente das demais. Em todo o universo. E passamos a condição de meras placas de automóveis. Que são clonadas para enganar a polícia. Descemos muito na escala de prioridades. Da condição de seres racionais, inteligentes, passamos a ser material descartável. Alguns de nós já vivem no lixo. E outras vivem do lixo.

E o computador completa nossa perda de identidade. Encurtamos os caminhos, é certo. Mas aumentamos a distância entre nós. Pois criamos um mundo virtual entre nós. Anônimo. Silencioso. Mágico. Quase irreal. Onde, na maioria das vezes, não vemos as pessoas com quem falamos. Não sabemos de seus gestos. De seu sorriso. De sua fala. De sua energia. Não tocamos a sua pele. Não nos cumprimentamos como devia. Com afeto. Com carinho.

Não sabemos nem se estamos falando com homem ou com mulher. Ou com uma criança. Ou com um jovem. Ou com um adulto. Temos todos o mesmo rosto e a mesma idade. E as mesmas liberdades para dizer o que quisermos um do outro. E quando nos mandam um e-mail, mais “íntimo”, ainda assim, temos que nos contentar com a mesma forma de letra. Não existe mais a caligrafia que dava o toque da personalidade de cada pessoa.

Quanta ansiedade eu tinha para receber uma carta de uma correspondente que tive há alguns anos. Demorava cerca de cinco dias para vir a sua resposta. Eram dias de intensa ansiedade. Mas quando a carta chegava eu a lia com vagar; mastigando cada letra, cada palavra, cada acento. Conhecia todos os “ jotas”, “emes” e “eles”- maiúsculos e minúsculos - da pessoa amada. E o papel tinha o seu cheiro. Amassado talvez pelo correr de suas mãos ao escrever cada palavra.

Creio que disto tudo decorre a violência. Ou contribui para o seu aumento. A banalização e o desapreço pela vida ficou, de certa forma, mais acentuada. Crenças e valores foram deformados. A própria atividade financeira ganhou contornos fraudulentos. A mentira passou a fazer parte do jogo financeiro. Do mercado de capitais. Que se vale da rapidez das informações na Internet, com boatos, com anúncio de riscos, fraudes contábeis e de altas de moedas que enganam, sugerem e transformam o mundo num imenso balcão de negócios de cartas marcadas. E ninguém assina nada. Ninguém se responsabiliza por nada.

A maior prova de tudo isso são as diretrizes traçadas pelas grandes potências. Abandonaram as questões ligadas ao homem e ao meio ambiente. E dão prioridade as guerras, para acumular capitais e poder político.

Invadem países, matam crianças e idosos inocentes; destroem casas e hospitais; redes de esgotos; poluem a atmosfera, rios e mares, por conta do lucro, do imediatismo, da acumulação de capitais. Esse é o avanço tecnológico que temos. Por pouco tempo, penso. Pois a natureza não costuma levar desaforo para casa.

Domingos Oliveira Medeiros
22 de setembro de 2002










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