Saudade
(L. Camacho)
Tão suave quanto a mais bela música, ela vem chegando, furtivamente, bem devagarzinho, nos faz divagar sobre épocas passadas, remonta a felicidade pretérita-perfeita e nos faz lembrar de como podemos ser tristes e vazios, de como podemos ser felizes e vivos, e já fomos, e de como existem pessoas que tanto gostamos e gostam de nós. Está é a saudade.
Este sentimento é a prova da felicidade, mais do que isso, é a bússola que nos guia para o caminho da alegria incondicional. Ela começa com uma leve tristeza que vem apertando o peito, daí, vai crescendo, crescendo até se transformar em alegria de memórias, cresce tanto que acaba por quebrar, se esmigalhando em milhares de pedaços, que chamamos de passado. Diante da saudade nossos pensamentos são como a pequena chama azafamada de uma vela, que somos nós, que dança em ondas de acordo com o sopro do vento, que queima, que ao mesmo tempo em que cria luz, cria sombras. De cara com a saudade somos seres ávidos, ávidos para estarmos em companhia das pessoas que nos fascinam, que nos servem de pilares, que constroem a base de nossas alegrias, de nossos consolos nos momentos tristes, da nossa vida.
Tenho saudade de muitas pessoas, de muitos momentos. Sinto falta dos meus amigos e amigas distantes, sinto falta também dos momentos que ainda não acabaram e das pessoas que ainda não se distanciaram, dos meus pais que estão do meu lado, porque eu posso imaginar, dolorosamente, como eu era mais vazio sem essas luzes. Sinto falta até das pessoas que não conheço, pelo menos nesta minha existência, que nunca cheguei a ver com meus olhos passageiros e ingênuos, porque sei como vida será melhor quando eu as conhecer, e sei, mesmo sem ninguém ter me dito, que conheço todas essas almas há tempos, que estou amarrado em todas elas e que eu dependo intrínseca e extrinsecamente delas.
A saudade tem seu lado negro, ela nos faz sentir pequenos diante da grandeza da vida, obriga-nos lembrar que existe tristeza, que estamos longe dos queridos e os queridos longe de nós, ninguém pode abraçar ninguém. Joga na nossa cara que a tortura está por um triz, no afã de um desejo podemos nos perder em perdição, que existe uma linha tênue entre a felicidade plena da existência e loucura explosiva da imortalidade vazia, até o suicídio, faz com que nos sintamos inválidos perante a crueldade do destino, que doe, e doe muito.
Vejam, reparem em todos os sorrisos, em todas as palavras de alento, de todos os momentos que parecem voar, por mais demorados que sejam, lembrem-se de todos os contentos, de toda a satisfação incomensurável que lhes foram dados junto com seus amigos, até das brigas, quando algum amigo parecia te importunar ao dizer para parar com um vício, para tomar cuidado ao amar, dentre tantos outras ocasiões. Leiamo-los atenciosamente, pois são a poesia do universo, a trova da existência, o ensaio da vida.
Mas a saudade é uma moeda, grande e pesada, não se pode brincar de sorte com ela, e tem seu lado bom. Sentir saudade é tão importante quando respirar, porque ela é o oxigênio que alimenta a combustão das boas mudanças, das reviravoltas e das transformações, por isso sou grato aos meus amigos, aos meus familiares, por serem álibis da minha saudade.
Obrigado.
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