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Ensaios-->24. EIS-ME AQUI -- 20/06/2002 - 05:33 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Pobre ser inferior, pretendo também ter o privilégio de vir trazer a minha palavra. Bem que quis falar aos meus antigos companheiros na Terra, mas fui impedido, quer por quem reage tão mal quando me aproximo, quer por estes amigos de agora, que me dizem para não fazer qualquer referência específica às pessoas ainda internadas na carne.

Pois bem, se me disserem para que serve esta comunicação, ficarei feliz.

Primeiro, para conhecer a extensão de meus crimes. Vocês, é claro, pois sei muito bem o que fiz e o que desejei fazer mas não fiz. É claro que tudo o que disser pode oferecer a dificuldade da inverdade. Dizem que não, pois estão capacitados a surpreender as mentiras. Então significa que a confissão terá efeito como quando as pessoas vão à igreja. Quer dizer que nisto os padres estão certos? Só se souberem dar segura orientação aos fiéis. É verdade.

Em segundo lugar, irá oferecer oportunidade de promover uma espécie de exemplificação aos mortais que lerem o “caso”. É digno de nota. Sendo assim, pretendo esmerar-me nos conceitos e expor com elegância, em linguagem fluente e moderna. Dizem-me para não me preocupar, pois o que se pretende é o máximo de autenticidade. De qualquer forma, em respeito aos leitores, posso caprichar.

Por último, o trabalho doutrinal valerá como recurso para a aprendizagem dos irmãos socorristas que se encontram em estágio na Escolinha de Evangelização, à qual pertence o grupo. Pois eis aí finalidade mui plausível, pois as pessoas não podem exercer qualquer atividade sem que estejam preparadas. Se existe instituição para isso, é altamente digno dos melhores encômios.

Peço ao irmão escrevente que releve o distúrbio de dar preferência a este ou àquele vocábulo, mesmo que seja necessário riscar o que se viu repudiado. Desejo ainda, se me for possível, estar presente no momento em que se irão escoimar os principais defeitos, para exercer o papel de autor, de segunda mão, embora, mas cônscio da importância de minha participação.

Vejo com interesse que, por meio de minha voz, foi possível aos mentores demonstrar aos amigos encarnados os diferentes objetivos desta sessão de amparo a espíritos carentes. Estão de parabéns, apesar de merecerem ralhos por se utilizarem de método indireto, malicioso, posto inteligente.

Querem que me limite a relatar os fatos principais de minha vida, os de que me arrependi e que se constituíram em objeto de culpa consciencial, a ponto de me impelirem a apresentar-me diante dos amigos, para aconselharem-me. Pois o tacho ferveu lá no fundo, quando admiti ter errado na conceituação da vida que levava. Enquanto os assassinatos simplesmente representavam atos de sangue em vingança de toda espécie, ainda arranjava os acontecimentos de forma a fazerem-nos evoluir por si, a tornarem-me joguete do destino. No entanto, quando percebi que fora a mola propulsora dos eventos e que tudo residia na minha iniciativa livre de realizar a vontade que sentia, por força dos impulsos íntimos, aí verifiquei que, se não me reconduzisse à presença daqueles a quem ofendera, para requisitar deles o perdão, não teria mais sossego.

Mas tal ocorreu há muito tempo, tendo ficado curtindo as dores das acusações que me vinham de todos os lados, personificação evidente de meus fantasmas morais. Era o inferno e, por isso, comecei a caracterizar os seres que perpassavam por mim como demônios ou possessos, segundo desejavam perseguir-me ou fugiam de mim, espavoridos.

O dileto confrade da escrita vem surpreendendo-se com a facilidade com que escolho as palavras que melhor expressem o conteúdo silogístico de minha exposição. Claro está que, dentre o repertório lexical que me é apresentado, fica fácil para quem teve muito trato com as leituras optar pelos termos, segundo o reflexo psicossocial em que se irá inserir. Mas não se espante o amigo. Quando chegar a sua vez, em sendo bom e honesto o mediador, verá que não há grande emoção nem sabedoria, dada a precariedade do momento. Isto necessariamente significa que, se o texto estivesse adrede montado, possivelmente iríamos poder conduzir-nos com mais harmonia e equilíbrio, o que não é possível assim abruptamente, empolgado ainda pela novidade do exercício.

Prosseguindo sem delongas, para não dar a sensação de que tudo não passa de farsa para iludir os companheiros do auxílio, devo acrescentar que obtive da vida, no derradeiro encarne, tudo o que desejei. Se fiz menção a certos crimes é porque não fui feliz no matrimônio e essa foi a desgraça que me conduziu ao patíbulo dos infelizes criminosos.

Na última hora, a pena que recebi foi comutada para simples prisão e pude ficar penando atrás das grades, no fundo de fétida masmorra, a desonra moral. Mas fugi de lá, com o auxílio dos companheiros de cela. É aventura que daria para preencher diversas páginas e que, realmente, se constituiu em motivo de orgulho para mim, pois safara-me às garras da rapaziada da polícia. No entanto, o emprego da força resultou em diversas mortes, das quais participei ativamente, vindo a ser outro sangue derramado em desfavor de minha compostura lá no ermo da prisão espiritual, verdadeiro e terrífico inferno.

Confundido entre os marginais, fiquei à deriva no mundo por algum tempo, até que me despacharam, sem protocolo, para as terras do além. Sem visto de entrada, desde logo fui perseguido por quanto mequetrefe se apercebia de meu noviciado. Foi época de tristes recordações, pois me vi humilhado ao extremo. Mas com os dotes de inteligência de que estava munido, logo reverti o processo e me tornei tremenda besta-fera a rechaçar quanto incauto se enganasse com o intuito de me perturbar. Aí não perdoava. E esse é o terceiro evento de que me arrependi, estando esquecido, na profundidade mais escura do Umbral.

Não perdoei e me atrevo a pedir perdão. Sei que não alcançarei tal privilégio de graça e, por isso, propus-me a acompanhar quem tão gentilmente se ofereceu para o início do resgate de minhas culpas. Aceitei, temeroso de que deveria passar por crivos dificultosos, mas, de imediato, tranqüilizaram-me, dizendo que somente haveria de sofrer o corolário das atrozes dores que me haviam purgado os principais sentimentos de culpa.

Daqui por diante, a caminhada será aplainada, facilitada pelo conhecimento que deverei adquirir das falhas reais da personalidade. Naquela esfera virtual, criada pela imaginação arrebatada pelas paixões em desalinho, a mente se confundia e o aparato crítico não permitia manter viva a chama da esperança. Agora, a lhanura de trato dos parceiros e a luz benigna do sol serão a fonte que me revitalizará o organismo corroído pelos vermes das culpas.

Peço perdão por não oferecer algo de novo ao amigo leitor. É que, por instantes, me preocupei demasiado comigo mesmo, sinal evidente de que grassa em meu caráter o pior egoísmo, revelado, drasticamente, pela vaidade transubstanciada neste pretensioso e efêmero ditado.

Desditosa criatura, este ser que lhes fala. Lembrando-me de minha juventude até certa altura da maturidade, posso vislumbrar pessoa amável e cordata, cuja aspiração maior era deixar impressa na memória do planeta personalidade de vigorosa luz intelectual. Arremeti-me, deveras, pelos meandros do jornalismo de fundo e realizei diversos trabalhos de cunho editorial promissor. Se me fora permitido revelar o meu nome, iria conduzir as pessoas de maneira mais fácil até o ponto em que compreenderiam a verdade deste relato.

Pedem-me para restringir-me ao estado atual, pois a alternativa que propus muito tem de ufania e de vaidade. Concordo plenamente, mesmo porque a empolada linguagem de que me utilizei nesta simples narrativa improvisada não está de acordo com as modernas normas de escritura.

O escrevente pede esclarecimentos, pois está a parecer-lhe que existe flagrante contradição temporal, uma vez que a prisão em que fui encerrado não existe desde há muito nas diversas paragens da Terra. Pois a minha linguagem acabou constituindo-se em verdadeiro óbice para a compreensão dos informes. A cadeia era a mais vil dos tempos atuais. A descrição dela é que, lamentavelmente, se inscreveu entre os diversos deslizes que procedi, ao intentar burilar demasiado a contextura frasal.

Quanto ao conhecimento dos autores modernos, apenas significa aqueles de meu tempo, pois os atuais desconheço completamente; pelo menos não me entretive com a leitura das recentes produções literárias, pobre ser das cavernas morais que tenho sido nos últimos quarenta anos.

Mas valha-me a experiência desta maravilhosa tarde primaveril, para voltar a ouvir os pássaros a chilrear e o bulício da vida a fremir em toda a cidade.

Queira Deus possa ser aceito novo integrante dos grupos de serviçais deste piedoso instituto de ensino e de socorro. Com certeza, um dia estarei de volta a esta pena, com mensagem mais condizente com a expectativa dos bons amigos mentores, para que possa vir a ser útil em relação aos encarnados que peregrinam desatentos por este vasto mundo de Deus.

Sinto-me bem melhor e despeço-me, exalçando aos céus minha humilde frase de despedida: muito obrigado, verdadeiramente, a todos, principalmente ao Criador, sem cuja misericórdia não teria conseguido vibrar este pouquinho em harmonia com os demais. Fiquem todos em paz!


Comentário

Como se pode notar, nem sempre a desenvoltura vocabular e a presteza da inteligência são méritos capazes de elevar o indivíduo moralmente. Por injunção de nossos preceitos, devemos dizer que muito do que nos relatou o amigo é fruto de sua candente imaginação. Nem foi tão mau, nem teve tantos brilhos e aspirações de grandiosa realização intelectual, pobre revisor de fundo de redação.

No dizer dele, deveríamos encerrar os comentários, com esse rude desvelamento; entretanto, sem pretender executar qualquer agressão, temos sérios compromissos com a divulgação das mensagens, não podendo deixar o espírito dos leitores a debater-se em ânsias, na expectativa de estar reconhecendo a identidade do autor do relato.

Digamos, simplesmente, que a sagacidade do amigo está bem desenvolvida e mal direcionada, devendo dedicar-se, a partir de agora, à reflexão a respeito da maneira de ser, buscando, com o menor sofrimento possível, caracterizar, com perfeição, os aspectos essenciais do caráter, para imprimir-lhe no cerne as notações evangélicas adequadas.

Eis que chegamos ao ponto básico das atividades, o costumeiro pedido da prece, em alívio das aflições que tomaram de assalto a pobre vítima da presunção.

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