No domingo passado, estimei que para corrigir as 3 milhões de redações do ENEM seriam necessários mil profissionais trabalhando durante quinze dias. Continuemos daí.
Há quem defenda que a correção de uma redação será sempre subjetiva. Sou obrigado a concordar com a máxima. Por mais que seja criteriosa, a correção de um texto é o encontro de duas subjetividades e terá sempre algo de impreciso. Se pensarmos que a UFSCAR dobra o peso da redação para a seleção de alunos em diversas carreiras, começamos a temer que uma prova de escrita sujeita a um processo nebuloso de correção, composto por mil subjetividades, seja usada como critério importantíssimo para aprovar ou reprovar alguém.
Há artigos do INEP que explicam quais são os critérios e mecânica da correção das redações do ENEM, mas, fora do papel, o que se tem é um ambiente de incerteza que preocupa professores, pais e, óbvio, candidatos. Fatos e alguns boatos ajudam a deixar todos mais tensos. Como já foi afirmado que este não é um artigo nem científico nem jornalístico, listemos fatos e boatos:
Fato 1: Muitos alunos que são avaliados com notas acima de 8,5 (ou 850, de zero a 1000) em aulas de cursos de redação sérios recebem uma quase padronizada nota 650 na redação do ENEM. É certo que todos eles poderiam estar nervosos no dia da prova, o tema poderia ser difícil e outros poderias. Com nota 650, outro fato: adeus, engenharia da UFSCAR.
Fato 2: Muitos alunos que são avaliados com notas abaixo de 6,0 (600) nas mesmas aulas dos mesmos cursos de redação sérios recebem notas acima de 850 no ENEM. É certo que todos eles podem ser iluminados por guias escritores na hora da prova. Mais um fato: embora tenham limitações acadêmicas, vão tomar a vaga de quem é mais capacitado.
Fato 3: Professor de redação resolve fazer a prova do ENEM só para testar os critérios de correção. Obtém nota 650. É certo que o professor é humano e pode ter se equivocado com os argumentos. Mas 650?
Boato 1: Professor de redação resolve escrever texto sem nexo, mas com caligrafia impecável. Recebe a incrível nota de 925.
Boato 2: Aluno não faz a redação e recebe a nota inexplicável de 850.
Sobre boatos, não sei quem disse que o importante não é se são verdadeiros ou não. O importante é saber se quem escuta o boato o aceita como verdade por achar que poderia mesmo ser. No caso do ENEM, com a inexistência de um mecanismo que permita a revisão das redações, salvo através de ação judicial, todos os boatos são promovidos a fatos. Some-se a isso a impressão de que as provas do INEP dão preferência a quem escreve com registros menos cultos da língua, num estranho mecanismo de inclusão às avessas, e concluímos com uma sugestão: os envolvidos nessa saga – famílias, escolas, imprensa e políticos – devem iniciar um movimento para que a redação do ENEM não faça parte dos critérios de seleção das universidades. Não o ENEM do jeito que é: nebuloso e injusto.
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