Paralisação. Estado catártico. Suspensão no tempo e no espaço. Comumente minimizado, em MEDO. Sim, aquele que esteriliza os abraços.
A temática deste texto passa pelo medo, mas não faz dele ponto focal de discussão. Tenta ir além - ou aquém, o importante é aproximar ao máximo de onde se quer chegar.
Quando a vida torna-se busca, por escolha própria ou “sugestão” do destino, alcançar se traduz em fracasso. Violência cruel com a qual não se pode conviver.
Consideremos dois textos, tão distintos em suas origens, mas tão próximos em seus propósitos. Ignoremos as tais prisões da linguagem escrita e ousemos o direito de questionarmo-nos sobre este - estranho? – sentimento que tomou de igual maneira e força Eveline e o personagente - narrador de A Terceira Margem do Rio – em Primeiras Estórias. Este de João Guimarães Rosa, aquela de James Joyce – em Dubliners. Ambos, autores que dispensam comentários, mas que se o fizéssemos careceria de capítulo à parte, em qualquer texto (mas não texto qualquer!). Exclusividade de quem merece ser reverenciado como “humanistas” de primeiro time.
A palavra impressa nas entrelinhas das vidas destes dois personagens é a BUSCA. Daí – mesmo incorrendo no risco de parecer repetitiva – não se pode conviver com a chegada, o troféu, a coroação: o fim. Qualquer que seja este.
“Her eyes gave him no sign of (...) recognition”
Eveline não identificava aquele instante que se projetava para além do mundo conhecido. Sua vida era uma fria e penosa busca; tal desfecho a consumaria a pó. Anularia sua identidade forjada há anos por um discurso real demais para ser “esquecido”. Sua atitude?
“Like a helpless animal”
Um animal tão indefeso quanto aquele que ao se deparar com a terceira margem do rio, corre em disparada, de volta, para a outra margem: a conhecida.
“Sou o que não foi; o que vai ficar calado”
Ao se ver na fronteira entre dois mundos, o personagem de Guimarães Rosa – genialmente não nomeado, explicitando assim sua característica humana universal, abolindo o particular e regional ao que alguns costumam limitar obras do gênero – reconhece:
“Eu não podia... Por pavor (...), corri, fugi, me tirei de lá”
A terceira margem da vida é a que está além das fronteiras; todas as fronteiras. Aquela que ignora a existência de limitações. Aquela que está em toda parte ou em lugar algum.
Ambos personagens encontraram esta margem, mas não puderam cruzá-la. Por quê?
Que pavoroso sentimento é este que arranca a voz do peito, retira da cabeça o “bom senso” e anula qualquer tentativa de enfrentamento? Não parece relevante tentar responder a esta pergunta; mas sim reconhecer que TODOS nós estamos sujeitos a tais intempéries da alma. Todos estamos sujeitos a escolher caminhos – ou abandoná-los – para os quais não temos justificativas sensatas. Será mesmo que o ser humano é um ser completamente racional? Será mesmo que a humanidade é capaz de se encontrar com suas próprias limitações e frente a um mundo desconhecido ir além? Quem quer passar além do Bojador tem que passar além da dor!
Fica aqui a sugestão: vale a pena ler – e para os que já leram reler – essas duas obras que com singular genialidade e intrigante semelhança dialogam sobre o mesmo assunto. Quem consegue cruzar a terceira margem da vida?