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Ensaios-->Com a Mão na Massa -- 05/01/2002 - 20:20 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
COM A MÃO NA MASSA


A notícia do padeiro analfabeto, que teria sido aprovado no vestibular para o Curso de Direto, na Universidade Estácio de Sá, na Cidade do Rio de Janeiro, conforme veiculada pelo 'Fantástico', programa da emissora Globo de Televisão, levado ao ar dia 09 de dezembro próximo passado, está, no mínimo, mal contada; ou, no máximo, mal intencionada. Senão vejamos.

Primeiro Ponto.
A necessidade do Vestibular

Sempre que o número de vagas oferecidas - por qualquer instituição de ensino superior - em países democráticos como o nosso, for inferior à demanda, vale dizer, ao número de candidatos interessados, há que se fazer um processo seletivo, de caráter classificatório e eliminatório, a fim de ordenar, com justiça, pela via do sistema mérito, a ordem de convocação para matrícula e preenchimento das vagas.

Segundo Ponto.
A Pré-Seleção (requisitos exigidos para participar do processo seletivo)

A fase de pré-seleção, procura colocar todos os candidatos em igualdade de condições para participar do evento. No caso em tela, nossa ênfase se dará em relação ao aspecto de escolaridade, requisito que motivou ampla crítica por parte da mídia em geral, justamente pelo fato de o aprovado ser padeiro e analfabeto.

Manda a boa técnica de recrutamento e seleção, que a comprovação de conclusão do curso de ensino do segundo grau (ou equivalente) , para inscrição em qualquer processo seletivo, inclusive no vestibular, seja feita antes da realização das provas.

Entretanto, e com base em algumas especificidades ou exigências do momento, (que não é o caso aqui detalhar) pode-se estabelecer, no edital, a possibilidade de que tal comprovação - de conclusão do segundo grau ou equivalente - seja feita 'a posteriori', ou seja, no ato da efetivação da matrícula. Evidentemente, apenas no caso de o candidato conseguir habilitação prévia e classificação no concurso a que se submetera. No caso em tela, pelo fato de o candidato ter sido considerado, pela mídia, analfabeto, tudo leva a crer que a instituição optou pela comprovação da escolaridade 'a posteriori', posto que, se fosse o contrário, o mesmo não teria sua inscrição aceita e, por conseguinte, não teria participado do concurso.

Terceiro Ponto.
Os Instrumentos de Avaliação. As Provas.

Há vários modelos e formas de avaliação em concursos de provas e de provas e títulos. Tudo irá depender, naturalmente, de uma série de fatores específicos, de peculiaridades e do objetivo, caso a caso.

Entretanto, e em tese, podemos afirmar que os concursos de vestibulares para ingresso de candidatos aos cursos ministrados por instituições de ensino superior, geralmente, utilizam o modelo conjugado: PROVAS OBJETIVAS (com questões de múltipla escolha e utilização - opcional - de pesos que variam conforme a importância de cada disciplina para o curso objeto de seleção) conjugado com PROVA DE REDAÇÃO (geralmente versando sobre tema relacionado à área de interesse da futura profissão escolhida pelo candidato ou tema atual de caráter geral).

As provas objetivas, com questões de múltipla escolha, geralmente são de caráter apenas classificatório. Isto permite, na verdade, que um maior número de candidatos participe da Segunda fase, digamos assim, do concurso, que é a Prova de Redação.

As Provas Objetivas podem (e devem) valer-se da aplicação de pesos, ponderando com maior valor as disciplinas mais afins com a área de interesse . Por exemplo: no vestibular para Engenharia, o peso para a prova de matemática deveria ser maior do que o peso estabelecido para a prova de biologia; ao contrário, na prova para Medicina, inverte-se os valores. A biologia, nesse caso, terá maior peso do que a matemática.

Com relação a Prova de Redação, vale dizer que esta prova afere, sem sombra de dúvidas, com maior probabilidade de acerto, as verdadeiras potencialidades de cada candidato em relação ao seu provável sucesso ou insucesso no decorrer do curso a que se propõe concluir.

Por esta razão, principalmente, é que a Prova de Redação deve ser, sempre, de caráter eminentemente eliminatório. Não é recomendável, portanto, que os pontos a ela atribuídos possa juntar-se aqueles obtidos nas provas objetivas.


Este fato, se levado a termo, implicará, na melhor das hipóteses, avaliar incorretamente os candidatos; permitindo, inclusive, como parece ter sido o caso do padeiro, a aprovação de3 candidato analfabeto. Particularmente, tenho minhas razões para não acreditar neste fato. A menos que tenha havido grave negligência da parte dos responsáveis pelo vestibular. Voltarei a este assunto mais adiante.
As mesmas observações e os mesmos cuidados, em relação a elaboração das questões das provas objetivas, devem ser observadas, guardadas as proporções, em relação a Prova de redação.

Sua elaboração deve ser entregue à Banca Examinadora constituída por profissionais que detenham, efetivamente, competência e experiência comprovadas, seja no que tange aos aspectos de ordem linguística, seja no que tange aos aspectos relacionados ao tema, isto é, aos conhecimentos específicos exigidos dos candidatos. Deve-se ainda, sempre que possível, dar preferência aos profissionais ou professores que, de fato, estejam militando nas áreas do conhecimento específico e nas áreas afins aos conhecimentos linguísticos. Gramática, sintaxe, concordância, ortografia, clareza, compreensão, idéias, enfim.

As questões a serem aplicadas nas provas devem ser reexaminadas, do ponto de vista da técnica de elaboração de provas, por administrador especializados na área de Recursos Humanos, que detenham bastante experiência em recrutamento e seleção, avaliação de desempenho, elaboração de provas, enfim, do ramo.

A finalidade é evitar questões com dubiedade de interpretação, que dificultam o seu entendimento. Ou, o que é pior, facilitar o acerto ao acaso. Induzir ao erro ou ao acerto não é boa técnica.

Igual tratamento deve ser dispensado às alternativas de cada questão. Não se deve, por exemplo, além da alternativa correta, criar outras tão absurdas a ponto de induzir ao acerto. Ou que tenha os famosos 'pegas' que, a rigor, não medem conhecimento algum.

Importante neste ponto é concluir que a prova objetiva, bem elaborada, contendo, geralmente, 30 a 50 questões, e com cinco alternativas cada, torna-se, do ponto de vista estatístico, praticamente impossível o acerto ao acaso de mais de cinqüenta por cento das questões ali contidas.

Basta lembrar, para melhor elucidação dos fatos, que a Loteria Esportiva, jogo ministrado pela Caixa Econômica Federal, na realidade, é uma prova contendo, apenas, treze questões, com três alternativas cada (time vencedor, empate e time perdedor).Bem inferior, portanto, ao número de questões e de alternativas que são aplicadas em concursos vestibulares. É fácil de concluir: Se acertar na loteria esportiva, ainda que se acompanhe o futebol, é tarefa dificílima - geralmente o prêmio acumula por falta de ganhadores - imagine-se acertar - ao acaso - uma prova de vestibular, sabidamente bem maior e muito mais complexa do que a loteria esportiva.

Por essas e outras razões, acredito que as notícias sobre a aprovação do padeiro analfabeto em concurso de vestibular deixam a desejar. Ou seriam outras as razões escondidas na notícia que, de imediato, não se pode, de forma clara, vislumbrar. O que motivou um padeiro, analfabeto, a participar do vestibular, numa universidade privada, e bastante cara, optando pelo Curso de Direito? Quem teria pago sua inscrição e com que objetivo? Seria uma notícia previamente plantada? Por quem? Com que interesse?

Como foi que o candidato assinou a sua Ficha de Inscrição para participar do concurso? Algum funcionário da universidade, por acaso, teria recolhido suas impressões digitais e ficou calado?

Qualquer faculdade, mesmo aquelas que vêm na Educação apenas meios de enriquecimento e fonte de lucros fáceis, não permitiria que a ausência do candidato à ensejasse sua aprovação. Até porque, tem muito candidato no mercado. E não seria 'inteligente' deixar passar a oportunidade de fazer de conta que a coisa ali é séria.

E as provas objetivas? Se, comprovadamente, do ponto de vista estatístico, a possibilidade de acerto ao acaso é praticamente impossível, como se explicaria que um candidato, ainda por cima analfabeto, e portanto sem ler as questões, pudesse lograr êxito? Ou alguém o teria ajudado? Como? E com que intenção?

E se fosse tudo verdade? Vamos fazer de conta que sim. Será que o padeiro teria condições de efetuar suas matrícula, mesmo sem ter concluído o segundo grau? Será que o padeiro teria condições de concluir o curso? Quem pagaria suas mensalidades? Quem leria e faria as provas para ele? Sem qualquer chance.

Algumas conclusões:

Que a situação do ensino em nosso país está ruim, todos sabemos. Mas não vamos exagerar a ponto de induzir que basta ser analfabeto e pedreiro para cursar Direito numa Faculdade, cá no Brasil.

Ainda que possamos ter razões para tanto, posto que foi de lá, da Universidade Estácio de Sá, que seu dono, o Sr. Uchôa Cavalcanti, em entrevista ao Jornal do Brasil de 16 de novembro próximo passado, em entrevista surpreendente, deixou para a história as seguintes pérolas:

'Não acho que seja uma pessoa muito interessada em educação. Sou interessado na Estácio de Sá, isso é que é importante. Estou interessado no Brasil? Não, não estou interessado no Brasil. Na cidadania ?Também não'.

Pelo visto, o negócio do 'empresário do ramo de educação' é, apenas, ganhar dinheiro. Muito dinheiro aliás. Lucrar, com o ensino, utilizando expressão da mestre em Linguística Aplicada da UFRJ, Dra. Tania Maria Mazzillo, equivale a prejuízo socializado. O ganho do 'negócio' em educação é só do seu proprietário. 'Por isso, no 'negócio' do ensino para ganhar dinheiro não existe pesquisa, porque pesquisa demanda investimento e tempo e o resultado da pesquisa reverte para a sociedade e não para o dono do negócio'. Do mesmo modo, o professor e o pesquisador não têm utilidade para o negociante do ensino com fins lucrativos. São aplicações de longo prazo, que se revertem em favor dos cidadãos, 'tudo para que a sociedade progrida, distribua suas riquezas e saiba eliminar os mercadores do lucro cínico'.

É triste, mas é verdade, saber que no Brasil existe elementos deste tipo administrando uma entidade de ensino. É triste saber que o Ministério da Educação, não tome qualquer providência a respeito. Ao contrário, não faz muito tempo, o MEC, a exemplo de tantas outras instituições, fez foi aumentar o número de vagas solicitadas pelo dito 'empresário'.

Conclusão Final

A reportagem conseguiu entre outras coisas:

Denegrir, sem necessidade, a imagem do Brasil, no exterior, já tão desgastada. Roupa suja se lava em casa!

Macular, injustamente, a imagem dos futuros profissionais que sairão formados pela Estácio de Sá. O aluno também faz a faculdade.

Ferir, de forma preconceituosa, a profissão de padeiro. Nem todo padeiro é analfabeto.

Desmotivar uma parcela da população que ainda sonha com melhores dias através da educação.

E, por fim, é forçoso concluir, o trabalho de reportagem deixou a desejar, seja pela ausência de detalhes significativos, seja porque deixou a população sem entender DIREITO o que teria, DE FATO, acontecido.

Já começo a desconfiar que o jornalista que iniciou a reportagem do padeiro analfabeto possa ter sido aprovado no vestibular nas mesmas condições do padeiro, mas que, depois de muito esforço próprio, conseguiu superar todas as barreiras a ponto de conseguir, hoje, um bom emprego, num conceituado órgão de imprensa.

Domingos Oliveira Medeiros
16t de dezembro de 2001






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