Comprei uma jaula nova, que está chegando dos Estados Unidos. Essa é de prata, com acabamento feito na Espanha e tecnologia vinda do Japão. Custou uns 400.000 dólares, é o preço que deve se pagar pela proteção.
Enquanto ela não chega eu fico nessa antiga, de ferro e aço que batizei de Berço. Fico todo o tempo nela mesmo, tudo o que eu quiser eu consigo alcançar daqui de dentro, porque é grande, deu até para colocar um sofá, televisão, cama e escrivaninha. Tinha sido difícil pra montar, porque foi por partes e ela fica na sala da minha casa, levou vinte e cinco dias para terminarem a montagem.
Fica difícil quando eu tenho que atender a porta de casa para algum parente ou amigo meu entrar. É que eu tive que montar o cabo da vassoura na pá para poder girar a manivela. Mas tudo bem, com o tempo eu me acostumei, mesmo porque não é sempre que alguém vem aqui, com exceção do seu Celso, o carteiro, que me entrega pessoalmente todas as cartas.
Neste exato momento eu estou polindo a parte em que a bala atingiu. Atingiu e não perfurou, porque minha jaula é coberta por um material químico que é aprova de balas. Então o ladrão não conseguiu quebrá-la, apesar de ter atirado várias vezes. Enquanto ele tentava destruí-la eu comia meu cereal assistindo filmes no Tele Cine; este tipo de conforto só existe assim, com essa ultra proteção.
Amanhã deve chegar a nova jaula, vou ter medo, muito medo durante os outros vinte e cinco dias em que vou ficar fora desta, durante o tempo que vai levar para armar a outra. Medo, muito medo, já estou até tremendo quando lembro que vou ter que sair. E se algum ladrão invadir novamente a minha casa, como fazem quase todos os dias, e me matar? Acho que vou ter que refazer um esconderijo no subsolo enquanto eles constróiem aqui em cima. É, é a melhor coisa a ser feita.
Então, amanhã, não vou me preocupar, porque ainda vou dormir tranquilo na minha própria prisão. |