Lá vem o menino...
Cuidado!... é bandido
Tem arma escondida
Querendo assaltar...
E fogem assustadas...
o povo, as pessoas,
sem tato, sem rumo
nem olham pra trás.
Menino de rua, coitado...
faminto, acuado
só queria um trocado
pra sua fome matar.
Com o olhar cabisbaixo
triste, melancólico
retorna para a marquise
sua casa... uma caixa de papelão.
Abandonado na vida
vive em ruelas, escondido
que nem que rato de esgoto
comendo só o que sobra
dos restos... jogado fora.
Banho, só vez em quando
com o calor escaldante.
São os mergulhos em águas sujas,
turvas, poluídas...
de tudo que é chafariz.
Sem teto, sem vínculos
sem família, direção
sem apoio, coração
nem mais consegue sonhar
como quando ainda criança
que achava que tinha um lar.
Mãe... viciada, presa pela bebida
vive desacordada, jogada na vida
sem ver o tempo passar,
por estar embriagada.
Pai... traficante, assaltante
desempregado há anos.
Por não ter achado trabalho
Caiu na perdição... foi preso...
e morto na delegacia.
Menino de rua
continua abatido
na rua, escondido
faminto, perdido
pegando rebarbas
da cola, da droga,
pra sua fome matar.
Faz de tudo um pouquinho
Parece até sete chaves...
Seus sonhos de criança,
se perderam...
nunca mais foram encontrados.
Maltrapilho, empoeirado
pés no chão, dedos cortados
de no asfalto quente pisar
tentando ganhar um trocado
Menino de rua carente
de afeto, atenção
das portas de um lar verdadeiro,
onde possa abrigo encontrar
Acaba virando "o bandido"
deixando de ser "a criança"
de tanto ter sido acusado
de tanto ter sido marcado
sem nada ter feito errado
Por culpa dos homens
por culpa do povo
está total abandonado
à sua sorte ou azar...
Cadê o governo?
Cadê a Unesco?
a Criança-Esperança?
E tantos outros que existem, sei lá...
Criança-esperança de uma nação
Com frio, com fome
sem casa, família
acaba virando um ladrão
Culpa minha, culpa sua
Culpa de tantas pessoas
Que se calam, que se omitem
Que não querem ajudar.
Criança-esperança
virou traficante
pra fome poder matar
perdeu seus direitos constituintes
perdeu sua dignidade
perdeu sua infância
Matando a criança do seu coração
Na fuga da fome, do teto das ruas
Das noites de frio
dormindo enroscado
em papel de jornal.
Sem ter que ficar escondido
correndo pra cá e pra lá
Uma chance somente...ele pede...
em seu silêncio tristonho...
Criança-esperança
que acreditou que um dia
estaria feliz em um lar
sem pancadas, sem mordidas
sem ter que sair pra roubar.
De mostrar que é capaz
que podia vencer todo mal
Criança de rua...
quer só uma chance
um pouco de nossa atenção
carinho. compreensão.
Quer ser alguém algum dia
quem sabe um cidadão.
Andar de cabeça erguida
aproveitando da vida
como qualquer ser normal.
©Neli Neto
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