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Artigos-->Breve Histórico da Educação Especial e Inclusiva no Br e RJ -- 18/01/2011 - 21:28 (Fernanda Duclos Carisio) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PROGRAMA EDUCAÇÃO EM AÇÃO

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EDUCAÇÃO ESPECIAL/INCLUSIVA



















BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA NO BRASIL E, EM ESPECIAL, NO MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO

























Fernanda Duclos Carisio

Rio de Janeiro / 2008.











UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PROGRAMA EDUCAÇÃO EM AÇÃO

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EDUCAÇÃO ESPECIAL/INCLUSIVA

















BREVE HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA NO BRASIL E, EM ESPECIAL, NO MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO

















Fernanda Duclos Carisio











Monografia apresentada como requisito final para a conclusão do Curso de Pós-Graduação Lato Senso em Educação Especial e Inclusiva da Universidade Cândido Mendes.





Orientadora:

Professora Daniele Nunes Henrique Silva













Rio de Janeiro

2008.













































Ao meu filho, Felipe e a sua esposa Érica, meus colegas nessa turma de Educação Especial, na qual, além de adquirir conhecimento, ganhei uma nora e uma nova família em Volta Redonda.



A minha mãe,

Pelo incentivo, confiança, conselhos e orações.



A todas as crianças da Aquarela,

Origem e estimulo para o estudo, a pesquisa e o trabalho a cada dia.









































































Agradecimentos,



Muito obrigada a Daniele pelo apoio, atenção e por me ter amarrado para sempre no estudo de Vygotsky.

Meus agradecimentos e pedidos de desculpa ao Rodrigo e ao Pedrinho pelo tempo que lhes roubei enquanto a Dani me orientava.

Muito obrigada às coordenadoras entrevistadas que emprestaram seus conhecimentos e sua prática para a fundamentação desse trabalho.























































“Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar”.

Paulo Freire, 1997.

SUMÁRIO





Apresentação ............................................................................................................ 07

Capítulo I – Da Segregação à Inclusão ....................................................................10

Capitulo II – A Educação Especial /Inclusiva no Brasil ....................................... 17

2.1 – A Educação dos Deficientes: da segregação à escolarização .......................... 17

2.2 – Integração – Todo ser humano tem direito à educação .................................. 27

2.3 – A Educação Inclusiva – um novo paradigma .................................................. 34

Capítulo III – A Educação Especial/Inclusiva no Município do Rio de Janeiro. 41

3.1 – Educação Especial no Rio de Janeiro: Anísio Teixeira e Helena Antipoff .... 42

3.2 – Integração e Normalização – o modelo comportamentalista .......................... 45

3.3 – Construtivismo – Piaget e Emília Ferrero ........................................................ 48

3.4 – A influência de Vygotsky e a Multieducação ................................................... 49

3.5 – As bases teóricas da Multieducação e sua aplicação na Educação Especial . 51

3.6 – A prática da Educação Especial no Rio de Janeiro ........................................ 55

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 58

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 59



















RESUMO



Palavras-chave: inclusão - educação especial - Rio de Janeiro - Vygotsky



É crescente a presença, em nossas escolas, de crianças portadoras de necessidades especiais. Esse quadro é fruto tanto das determinações legais quanto da pressão dos movimentos de portadores de deficiência e, mesmo, da sociedade em geral contra a discriminação. O tema tem sido objeto de freqüentes abordagens da imprensa, de novelas e de programas populares de TV. No entanto, fora da mídia, como se processa essa “inclusão"?

O objeto desse trabalho e, justamente, analisar a partir do histórico da exclusão/inclusão em que se situação se encontra, hoje, a Educação Especial e Inclusiva no Município do Rio de Janeiro. A escolha do Rio de Janeiro se explica uma vez que detém a maior rede de educação municipal da América Latina e conta com o Instituto Helena Antipoff (IHA) como órgão responsável pela elaboração e implementação de políticas públicas em Educação Especial. O IHA, a partir de 1993, reformulou a proposta curricular do município e passou a trabalhar com os conceitos desenvolvidos pelo pesquisador russo Lev Seminovch Vygotsky.

Com esse propósito, inicialmente, procuramos identificar como, historicamente, foi tratado o portador de necessidades especiais, desde a era pré-cristã, quando o deficiente mental, deficiente físico, aleijado, idiota, em resumo, todos os que despertavam repulsa ou temor eram considerados como ameaças à sociedade sendo, sistematicamente, abandonados, perseguidos ou até mesmo eliminados, até o momento atual quando o debate do respeito à diversidade e da inclusão toma conta do universo social e educacional, embora ainda permaneçam visíveis as marcas da exclusão que foram uma constante durante tantos anos.

Voltando o foco do debate para a trajetória da Educação Especial no Brasil, vale destacar o atraso com que as políticas relativas ao portador de necessidades especiais chegaram ao nosso país, mas também como atualmente vem sendo objeto de importantes iniciativas legais e de debates no meio acadêmico e na sociedade em geral. No entanto, constatamos também que ainda há muito a avançar no campo da sua concretização prática seja do ponto de vista social ou pedagógico.

Por fim entra em cena o Município do Rio de Janeiro, marcado por importantes iniciativas na área da atenção ao portador de necessidades especiais e, em particular, no momento atual com o trabalho desenvolvido tendo por base a “Multieducação”, cuja fundamentação teórica foi objeto de nossa particular atenção, e pelo papel, em todo esse processo, do Instituto Helena Antipoff, criado em 1974 e cuja atuação tem sido de grande importância no desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a educação especial.

Em resumo, constatamos importantes avanços já obtidos no que se refere à legislação e a inclusão de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas regulares. No entanto, marcas do passado ainda persistem na insegurança de boa parte dos professores frente a esses alunos, por insuficiência de conhecimento do tema, problemas de acessibilidade, falta de adaptação material e curricular, e outros que ainda precisam ser superados para garantir a eficácia da inclusão.

O passado marca o presente e se projeta no futuro. Conhecer a evolução histórica é essencial para compreender o contexto atual e, assim, ser capaz de observar, analisar e agir no dia a dia da prática pedagógica com relação ao processo de inclusão, na escola e na vida, dos portadores de necessidades especiais.

APRESENTAÇÃO



Há 9 anos trabalho com Educação Infantil numa escola da Zona Norte da cidade do Rio de Janeiro e, paralelamente, busco aprofundar meus conhecimentos na área pedagógica, por meio de cursos de pós-graduação ligados ao trabalho e ao tema. No estudo monográfico para o curso de pós-graduação em Docência no Ensino Superior, por exemplo, pesquisei sobre: “O que pensam e falam os professores sobre as brincadeiras das crianças pequenas” (2005).

A presença crescente em nossas escolas de crianças portadoras de necessidades especiais despertou minha atenção para a questão. Ressalte-se que essa presença não se deve apenas às exigências legais, mas, também, às pressões sociais contra a discriminação em geral e, em particular, contra a discriminação aos anteriormente denominados “deficientes”.

No entanto, fora da mídia, como se processa realmente essa inclusão, particularmente, na educação infantil? Desse modo, parece importante indagar: como historicamente se organizaram os movimentos de inclusão dos alunos portadores de necessidades especiais na rede municipal do Rio de Janeiro.

O que tenho verificado, através de uma observação, inicialmente de caráter empírico, é que, ainda hoje, os professores tendem a olhar para a criança portadora de necessidades especiais como alguém a ser tratado com carinho piedoso, de quem não se espera que participe das atividades das demais crianças, mas sim um sujeito que precisa ser “adestrado”, “treinado” para “conviver em sociedade”. (Blanco, 2004).

Minha idéia foi investigar como evoluiu nas últimas décadas esse debate sobre a inclusão do portador de necessidades especiais tanto do ponto de vista histórico, quanto do ponto de vista legal. Além disso, considerando que a pesquisa tem como foco o município do Rio de Janeiro, que nos últimos anos tem adotado como arcabouço teórico os conceitos de desenvolvidos pelo pesquisador russo Lev Vygotsky, retende-se nesse estudo, levantar os aspectos centrais que têm servido como roteiro para esse debate, em particular, no que se refere à possibilidade de simbolização do deficiente mental, assunto bastante controverso no meio acadêmico.

O objetivo central da pesquisa, portanto, é investigar a trajetória da educação especial ao longo dos anos, tendo como foco particular a sua concretização, atualmente, no município do Rio de Janeiro. A escolha do Rio de Janeiro deve-se a sua situação particular, como ex-capital da república, o que a tornou sede das principais iniciativas pioneiras no campo da educação voltada para portadores de necessidades especiais. Foi aqui, com apoio do então imperador D. Pedro II, que se instalaram o Instituto Benjamin Constant, para cegos, e o Instituto Nacional para Educação de Surdos (INES).

Observando o momento atual, também, pesaram para a escolha do município suas características diferenciadas. O Rio de Janeiro possui a maior rede municipal de educação da América Latina, contando hoje com 1.058 escolas e mais de setecentos mil alunos matriculados, sendo mais de 8 mil portadores de necessidades especiais. O Instituto Helena Antipoff (IHA) é o órgão responsável pela elaboração e implementação de políticas em Educação Especial, incluindo a formação continuada dos professores das classes regulares que recebem alunos especiais e daqueles que atuam nas modalidades especializadas ou de suporte.

Finalmente, porém não menos importante, destaca-se que, a partir de 1993, a proposta curricular do município foi reformulada e o IHA passou a trabalhar com os conceitos desenvolvidos pelo pesquisador russo Lev Semenovich Vygotsky, conforme citado acima.

Relata Trompiere (2005), destacando a mudança de paradigma:

“O que há de especial nessa teoria? A ênfase nas relações sociais; a educação que deve se orientar para o futuro (Zona de Desenvolvimento Proximal), a mediação pedagógica e a centralidade da linguagem como organizadora das funções psíquicas superiores. Olhar o deficiente a partir de suas potencialidades; ativar mecanismos compensatórios; ir além”.(p. 33).



Ressalte-se, assim, que o principal referencial teórico desse trabalho foram as considerações gerais dos autores da corrente histórico cultural, em particular, Vygotsky, constituindo o pano de fundo orientador das pesquisas bibliográficas realizadas para o levantamento da trajetória histórica da Educação Especial no mundo, no Brasil e, em particular, no município do Rio de Janeiro. A revisão de literatura envolveu autores como Sonia Kramer, Mônica Santos, Maria Cecília de Góis, Rosana Glats, De Carlo, Pino, Mazzota, Mantoan, Daniele Silva, entre outros e incluiu ainda a fundamentação legal do âmbito federal ao municipal.

É essa realidade que esse trabalho procura verificar: a partir do histórico da exclusão/inclusão dos portadores de necessidades especiais, analisar em que situação se encontra, atualmente, a Educação Especial no município do Rio de Janeiro. A proposta de inclusão, considerados os conceitos desenvolvidos por Vygotsky tem servido realmente como diretriz para a educação dos portadores de necessidades especiais? Estão os professores e demais envolvidos no processo educacional das crianças cariocas sendo preparados para operacionalizar esse processo? Quais as perspectivas que se apresentam?



















































CAPÍTULO I

DA SEGREGAÇÃO À INCLUSÃO

Ao longo dos tempos, o portador de necessidades especiais, em geral, sofreu diferentes tratamentos. Na era pré-cristã, o deficiente mental, deficiente físico, aleijado, idiota, em resumo, todos os que despertavam repulsa ou temor eram considerados como ameaças à sociedade sendo, sistematicamente, abandonados, perseguidos ou até mesmo eliminados.

Nos primeiros tempos da era cristã e até meados da Idade Média, com a difusão dos chamados ideais cristãos, o deficiente "ganhou alma” e, assim, já não podia ser simplesmente abandonado ou eliminado. Com base nesse viés caritativo, (mas, também, por terem bens e direitos de herança) eram, em geral, mantidos em asilos, com a desculpa formal de protegê-los. Contudo, essa era a forma como a sociedade se protegia contra a desordem e os perigos representados pelos “loucos”, visionários, mendigos, velhos, prostitutas, incapazes, idiotas, ou seja, todos os que poderiam não servir aos interesses da organização social vigente. Nesse período histórico, a legislação das reclusões previa ainda as responsabilidades jurídicas, inclusive com a possibilidade de interdição dos ricos (e de suas fortunas) e repressão para os pobres. (BRASIL – MEC/SEESP, 2004).

É em meio ao crescimento das concepções humanistas, consubstanciadas, por exemplo, nos ideais da Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade), que os deficientes mentais começam a ser percebidos na sua essência e dignidade humana, partindo-se assim em busca do estabelecimento de distinções no grupamento da clientela dos asilos, separando o louco do idiota. No entanto, essa visão humanista se afirma com um viés claramente patologizante. Tratavam-se de “doentes” e, assim, cresceu o poder dos médicos, que detinham a autoridade legal para estabelecer o diagnóstico, segmentar a população internada e definir o tratamento que objetivava, principalmente, reformar o espírito do doente, através de técnicas disciplinares e do seu isolamento do ambiente sócio-familiar. (FONTES, 2003)

O pensamento pedagógico moderno já começara a ganhar dimensão significativa no séc. XVI e XVII, tendo como primeiro estudioso Comenius (1592-1670), que valorizava a criança como ser que possui necessidades e vontades próprias e apontava a urgência de se utilizar materiais e atividades diferentes, de acordo com os estágios pelos quais ela passava. No século XVIII, destaca-se Rousseau (1712-1778), o qual insistia na necessidade de respeitar o ritmo de cada criança e suas vivências. Considerava a natureza de cada criança, enquanto indivíduo, juntamente com os aspectos biológicos, como fatores muito importantes. Esses conceitos, ainda hoje, influenciam as proposições relativas ao processo ensino-aprendizagem.(BRASIL, MEC/SEESP, 2004)

No entanto, apenas em meados do século XIX, configurou-se a primeira tentativa para educação de pessoas com deficiência mental levada a efeito por Jean Itard, médico francês, discípulo de Philipe Pinel, que tentou educar um menino que fora encontrado vagando na floresta nos arredores de Aveyron, utilizando uma metodologia que consistia na repetição de experiências positivas.

Um de seus alunos, Edward Seguin, desenvolveu muito as suas abordagens e tornou-se líder reconhecido do movimento de auxílio às crianças e adultos retardados, sendo um marco o seu livro: “Tratamento Moral, Higiênico e Educação dos idiotas e de outras crianças retardadas”, publicado, em Paris (1846). Tal autor desenvolveu o método fisiológico de treinamento que consistia em estimular o cérebro por meio de atividades físicas e sensoriais. Além disso, ele questionava a segregação, pregando um ambiente mais livre e estimulante. Seguin criou a primeira instituição pública para educação de crianças com deficiência mental de caráter residencial. Em 1848, devido à agitação política na Europa, partiu para os Estados Unidos e se tornou o 1º presidente de uma organização de profissionais voltados para o deficiente mental, hoje conhecida como Associação Americana sobre Retardo Mental. (MIRANDA, 2003).

Santos (1997) destaca que a situação de segregação persistiu, por longos anos, mas no final do século XIX e início do século XX já se considerava a possibilidade de alguma aprendizagem para os deficientes, embora ainda através de uma educação à parte, em asilos e abrigos, muitas vezes, anexos às instituições psiquiátricas, “dos quais estes raramente sairiam, e nos quais eram submetidos a tratamentos e práticas, no mínimo, alienantes”.(p. 2). O tratamento passava a ser prestado, em paralelo, nas instituições psiquiátricas, ainda, mantendo-se o já longo processo de subordinação das instâncias jurídicas e familiares ao poder médico.

Para contextualizar esse período e o conjunto de mudanças nele registrado em todos os campos, inclusive na educação, é importante assinalar que o final do século XIX e o limiar do século passado colocaram em questão o sistema capitalista industrial em forte processo de monopolização e busca de dominação planetária sob a lógica do imperialismo.

A expansão desse modelo determinou a ampliação da questão social e das tentativas de enfrentamento das mesmas. Isto reforçou as teorias críticas ao capital, além das formas de organização e luta dos trabalhadores, com destaque para o movimento conhecido como a Comuna de Paris, em 1871, e a Revolução Socialista, na Rússia (1917). Esta, liderada pelo Partido Operário Socialdemocrata (bolchevique) russo, utilizou e aprofundou os fundamentos formulados por Karl Marx e Friedrich Engels que, a partir de um estudo das bases essenciais do capitalismo, explicitaram uma teoria e um método de análise da sociedade de caráter revolucionário.

Para além de tentar explicar o funcionamento dos mecanismos de poder do capital, o método desenvolvido por Marx e Engels armava os trabalhadores com elementos para combatê-lo, e não reformá-lo ou melhorá-lo. A organização partidária independente da burguesia, o internacionalismo proletário e o reconhecimento da luta de classes como força motriz da História pela derrubada do sistema sustentado pela propriedade privada e a absorção dessa consciência anticapitalista pela classe operária seriam elementos essenciais para a construção de um processo revolucionário que, sem esta consciência, organização e luta proletária não levaria à débâcle do capitalismo por mera inevitabilidade das crises desse sistema.

Moacir Gadotti (2002) destaca que embora Marx e Engels nunca tenham realizado uma análise sistemática da escola e da educação, a problemática educacional permeia sua obra sempre no contexto da crítica das relações sociais e das linhas mestras de sua modificação. Assinala ainda que a perspectiva do trabalho como base do processo de constituição do indivíduo dominou a preocupação de todos os educadores socialistas.

“Antonio Gramsci (1891-1937) histórico defensor da escola socialista (...) também colocou o trabalho como um princípio antropológico e educativo básico de formação, criticou a escola tradicional que dividia o ensino em ‘clássico’ e ‘profissional’, o último destinando-se às ‘classes instrumentais’ e o primeiro ‘às classes dominantes e aos intelectuais’”.(GADOTTI, 2002, p. 127).



Em meio às contradições representadas pela escola tradicional burguesa e pelos novos conceitos trazidos pelos ideais socialistas, abriu-se o questionamento da educação “tradicional” em defesa da renovação da escola, tendo por base, de um lado, as descobertas da psicologia, afirmando a radical diversidade da psique infantil em relação à adulta e, de outro, o movimento de emancipação das amplas massas populares nas sociedades ocidentais. Destaca Gadotti (2002) que foi nesse contexto que surgiu o movimento denominado Escola Nova fruto de uma proposta de renovação geral que valorizava a auto-afirmação e a atividade espontânea da criança.

O educador estadunidense John Dewey (1859-1952) foi o primeiro a formular esse novo ideal pedagógico, afirmando que o ensino deveria dar-se pela ação e não pela instrução, continuamente reconstruindo a experiência concreta, ativa e produtiva de cada um. Dewey trabalhava com o conceito de convivência democrática sem por em questão a sociedade de classes. Para Dewey, a Educação era um processo e não um produto. A Escola deveria preparar os jovens para o trabalho, para a atividade prática, para o exercício da competição. Nesse sentido, a renovação trazida pela Escola Nova se coadunava com os interesses da nova sociedade burguesa acompanhando o desenvolvimento e o progresso do capitalismo exigindo uma mão-de-obra cada vez mais qualificada.

Entre esses estudiosos destaca-se Maria Montessori (1870-1952), que, no viés médico/pedagógico, começou a desenvolver mecanismos de estudo e educação dos “deficientes”. Médica pela Universidade de Roma, onde também atuou como assistente de clínica psiquiátrica, Montessori recebeu influências de Rosseau (individualismo), Pestalozzi (educação sensorial), Herbart (educação das faculdades) e Froebel (auto-atividade, jogos e criação de hábitos) e, em especial, dos fundamentos desenvolvidos por Seguin. Dedicou-se à preparação de professores primários de Roma, na Escola Normal Ortofrênica, que fundou. Inspirada na rotina diária e na ação funcional, fundamentou sua ação pedagógica na estimulação sensório-perceptiva e auto-aprendizagem, desenvolvendo um programa de treinamento para crianças deficientes mentais estruturado no uso sistemático e na manipulação de objetos concretos.

Montessori transpôs para crianças normais seus métodos utilizados para educação de crianças deficientes. Surgiu, assim, a Casa dei Bambini (Casa das Crianças) fundada por Montessori, em 1907, para crianças de 3 a 6 anos, com finalidades pedagógica e social, já que o bairro operário onde se instalou a primeira casa tinha péssimas condições de higiene e infra-estrutura.

“Pela primeira vez na história da educação, construiu-se um ambiente escolar com objetos pequenos para que a criança tivesse pleno domínio deles: mesas, cadeiras, estantes, etc. Com materiais concretos, Montessori conseguia fazer com que as crianças pelo tato, pela pressão, pudessem distinguir as cores, as formas dos objetos, os espaços, os ruídos, a solidez, etc. Montessori explorou técnicas completamente novas como a lição do silêncio que ensinava a dominar a fala e a lição da obscuridade para educar as percepções auditivas”. (Gadotti, 2002, p. 145/6).



O conceito de educabilidade do potencial do ser humano passou, portanto, a ser aplicado também à educação das pessoas que apresentavam deficiência mental. Desse modo, na segunda metade do século XIX e início do século XX, as escolas especiais proliferaram em toda a Europa e Estados Unidos.

No entanto, cabe lembrar que, até os anos 30 a educação especial abrangia fundamentalmente os deficientes mentais, auditivos, visuais e físicos, atendidos em instituições isoladas. Apenas no pós-guerra, o termo excepcional, referindo-se às crianças que não se comportavam dentro dos padrões esperados, passou a ser utilizado, abrangendo aquelas com distúrbios de linguagem, problemas de saúde e os superdotados.

Com o avanço científico, as causas e as origens das deficiências foram sendo investigadas e esclarecidas, colaborando para a compreensão da deficiência como condição humana e expressão da diversidade entre os homens e a natureza. No entanto, os preconceitos continuaram fortes – eles oscilaram entre a patologização inerente ao indivíduo ou ao ambiente. Assim, a idade contemporânea foi marcada pelo paradigma da cientificidade, do psicologismo, da valorização dos testes quantitativos, do treinamento sensorial e motor. O objetivo subjacente é disciplinar, adaptar essas pessoas para que se tornem socialmente produtivas.

Após a Segunda Guerra Mundial (1938/45), consolida-se na Europa e Estados Unidos o chamado Estado do Bem Estar Social, procurando apresentar uma opção entre o capitalismo selvagem e os projetos socialista e comunista. Incorpora idéias da planificação socialista e principia um quadro de recuperação e estabilidade.

“O Estado de Bem Estar vai desenvolver políticas sociais que visam à estabilidade no emprego, políticas de renda com ganhos de produtividade e de previdência social, incluindo seguro desemprego, bem como direito à educação, subsídio ao transporte, etc”. (FRIGOTTO, 2003, p. 70/71).



Nesse contexto é que foi aprovada na ONU, em 1948, a Declaração dos Direitos Humanos, que veio assegurar o direito de todos à educação pública e gratuita. Reforçado por essas idéias, o movimento mundial de integração de pessoas com deficiência defendeu oportunidades educacionais e sociais iguais para todos, contribuindo fortemente para a criação de serviços de educação especial e classes especiais.

No entanto, os limites do modelo de Bem Estar Social começaram a se fazer sentir já na década de 60 e se agravaram na década de 70, com a “progressiva saturação dos mercados internos de bens de consumo duráveis, a concorrência intercapitalista e a crise fiscal e inflacionária”. (Frigotto, 2003, p. 73). A crise era estrutural, uma vez que derivava de contradições do próprio modelo ao tentar atender simultaneamente às demandas sociais e às necessidades privadas do capital.

Diante desse quadro afirmam-se as teorias neoliberais que defendem a volta às chamadas “leis naturais de mercado”, o Estado mínimo e o fim das políticas sociais. Com essa progressiva retirada do Estado da área social, a necessidade de defesa e sobrevivência levou ao crescimento dos movimentos das minorias (étnicas, sexuais, religiosas, etc).

Assim, a partir dos anos 60, foi possível identificar um novo momento no tratamento ao deficiente marcado, não mais por iniciativas de caráter individual, mas por movimentos coletivos, que podem ser definidos pelo “reconhecimento do valor humano desses indivíduos e como tal, o reconhecimento de seus direitos” (SANTOS, 1997, p.3).

“É neste espírito, acreditando que a pobreza e a miséria verificadas no mundo atual são produtos, em grande parte, de falta de conhecimento a respeito de seus deveres e direitos, e acreditando ainda que a própria falta de garantia deste direito básico que é o da educação (e do acesso à informação) constitui fonte de injustiça social, que a Conferência Mundial de Jontiem sobre Educação para Todos que aconteceu em 1990, adotou como objetivo o oferecimento de educação para todos até o ano 2000” (SANTOS, 1997, p. 3).



A Declaração de Jontiem destacava a necessidade de garantir maiores oportunidades de uma educação duradoura, através de medidas que aumentassem o número de crianças na escola, mas também que assegurassem a sua permanência o tempo suficiente para obter um real benefício da escolarização, bem como a realização de reformas educacionais significativas capazes de, mediante os mecanismos da inclusão, corresponder às necessidades dos alunos, famílias e comunidades locais. Preconizava, ainda, a necessidade da inclusão da própria educação especial dentro dessa estrutura de “educação para todos”.

Dando continuidade a esse processo, realizou-se, em 1994, em Salamanca, a Conferência Mundial sobre Necessidades Especiais, que teve como princípio fundador do seu marco de ação:

“todas as escolas devem acolher a todas as crianças, independente de suas condições pessoais, culturais ou sociais, crianças deficientes e superdotadas/altas habilidades, crianças de rua, minorias étnicas, lingüísticas ou culturais, de zonas desfavorecidas ou marginalizadas, o qual traça um desafio importante para os sistemas escolares. As escolas inclusivas representam um marco favorável para garantir a igualdade de oportunidades e a completa participação, contribuem para uma educação mais personalizada, fomentam a solidariedade entre todos os alunos e melhoram a relação custo benefício de todo o sistema educacional”.(GUIJARRRO, 2005, p. 9).



Santos (1997) ressalta que a declaração de Salamanca ampliou o conceito de necessidades educacionais especiais passando a incluir todas as crianças que não estivessem conseguindo se beneficiar com a escola. Passaram, portanto, a ser abrangidas pelo conceito, além das crianças portadoras de deficiências, as que apresentam dificuldades de aprendizagem temporárias ou permanentes ou freqüentes repetências, as forçadas a trabalhar, que vivem nas ruas, em condições de extrema pobreza ou desnutridas, vítimas de guerra ou conflitos armados, que sofrem abusos contínuos físicos, emocionais ou sexuais, ou que estejam fora da escola por qualquer motivo.

Santos (1997) lembra que, até então, a lógica da educação especial se fundava na necessidade de prover para o portador de necessidades especiais um ambiente segregado, o que resultava na existência de dois sistemas paralelos de educação: o regular e o especial. Com a ampliação do conceito de educação especial essa segregação começou a ser posta em cheque, principalmente considerando que os dados mostravam que o fracasso escolar verificado na educação especial era quase tão alarmante quanto o da educação regular.

Para além, é importante salientar que pela nova definição pós-Salamanca, todos os sujeitos possuem, temporária ou permanentemente, “necessidades educacionais especiais”, cabendo constituir um sistema único de ensino capaz de prover educação para todos, a partir de um princípio: todos os seres humanos possuem o mesmo valor e os mesmos direitos, otimizando seus esforços e utilizando práticas diferenciadas sempre que necessário para que tais direitos sejam garantidos (SANTOS, 1997).































CAPÍTULO II - A EDUCAÇÃO ESPECIAL/INCLUSIVA NO BRASIL



As primeiras referências ao deficiente surgem na Constituição de 1824, infelizmente, pelo seu aspecto restritivo. A sociedade se protegia do deficiente adulto (Título II, Art. 8º, item 1º) privando do direito político o incapacitado físico ou moral (Jannuzzi - 1992) Essa mesma Constituição garantia, ainda que apenas formalmente, a instrução primária gratuita a todos os cidadãos.

Do ponto de vista institucional, a educação de deficientes só começou a se fazer presente em 1854, através do apoio do Imperador D. Pedro II à criação do Instituto de Meninos Cegos (hoje Benjamim Constant) e, posteriormente, em 1857, do Instituto dos Surdos Mudos (hoje Instituto Nacional para a Educação de Surdos – INES), ambos no Rio de Janeiro, então capital do império.

Ressalta-se que esse atendimento era bastante precário em termos nacionais, pois em 1872, com uma população de 15.848 cegos e 11.595 surdos no país, eram atendidos apenas 35 cegos e 17 surdos, segundo dados apresentados por Jannuzzi (1992). O atendimento continuava seguindo modelos assistencialistas, de caráter segregativo e de segmentação das deficiências, relegando os portadores de necessidades especiais a uma vida apartada da sociedade. O atendimento aos deficientes mentais era, praticamente, nulo.

2.1 – A Educação dos Deficientes: da segregação à escolarização.

Aos poucos, seguindo tardiamente o exemplo europeu ou norte-americano, começaram a se desenvolver as escolas para deficientes mentais, voltadas inicialmente para os mais “lesados”, os que incomodavam mais, como destaca Jannuzzi, pelo comportamento social muito divergente e que não conseguiam ser incorporados a tarefas sociais, mesmo muito simples, numa sociedade predominantemente rural e pouco escolarizada.

Nesse período, a abordagem médica era marcante: o primeiro estabelecimento de ensino para o deficiente mental foi instalado no Hospital Juliano Moreira, na Bahia, em 1874. No mesmo ano, surgiu o Asilo São João de Deus para alienados, mostrando que já havia uma sensibilidade para a necessidade de separar crianças de adultos com comprometimentos mentais mais graves. Em 1887, surge a Escola México no Rio de Janeiro, de ensino regular, mas atendendo também deficientes físicos e visuais. (JANNUZZI, 1992).

Até a República, surgiram mais seis instituições voltadas para deficientes visuais e auditivos e para deficientes físicos, todas administrativamente vinculadas ao Estado. O pequeno número dessas instituições era coerente com o tratamento que recebia a educação popular em geral. Prevalecia o trabalho no campo e eram poucos os operários, geralmente ligados ao setor têxtil. Com isso, era inexpressiva a demanda por educação popular e, muito menos ainda, pela do deficiente. Mesmo do ponto de vista institucional a educação das camadas populares ainda era considerada de pouca importância, cabendo registrar que, neste período, o voto era censitário, vinculado à renda anual de 200$000 contos de reis e não à alfabetização.

Com o advento da República, a nova Constituição, promulgada em 1891, não tratou do ensino primário e, muito menos, da gratuidade do ensino. No entanto, ao adotar o federalismo como princípio de organização política do país, possibilitou que alguns estados como São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro dessem impulso à organização escolar primária e, influenciados pelos médicos, desenvolvessem escolas voltadas para os deficientes mentais.

Essa vinculação do deficiente mental ao campo médico, mesmo no que se refere aos aspectos educacionais, persiste, em muitos casos, até hoje. Vale lembrar que os médicos foram pioneiros na teorização do tema, como foi o caso do Dr. Carlos Eiras que, em 1900, no 4º Congresso de Medicina e Cirurgia, apresentou um estudo sobre: “Da educação e tratamento médico-pedagógico dos idiotas”.

É também por interferência de médicos, revoltados com a situação de promiscuidade reinante nos hospitais psiquiátricos, nos quais adultos e crianças eram acolhidos indiscriminadamente, que foram criados pavilhões, anexos ao corpo principal desses hospitais, destinados às crianças portadoras de deficiência mental. (JANNUZZI, 1992).

Mantinha-se a segregação, mas começava a se configurar um campo de reflexão sobre a deficiência mental, aglutinando médicos, professores e psicólogos, que, com preocupações de natureza médico-pedagógica, voltavam seus esforços para a formação de hábitos de higiene, de alimentação, de vestuário, considerados necessários ao convívio social. Ademais, na perspectiva de torná-los socialmente produtivos, colocava-os a trabalhar geralmente em oficinas protegidas, na produção artesanal de objetos simples.

O advento da república e a extensão do direito de voto, vinculando-o à idade e a alfabetização, “com exclusão das mulheres, mendigos, soldados, praças e religiosos, obrigados a voto de obediência” (Jannuzzi, 1992, p.54), não levou necessariamente à busca da escola, uma vez que para votar bastava conseguir assinar o nome. No entanto, a progressiva substituição do sistema agrário-comercial pelo sistema urbano-industrial gerou inúmeras modificações nos diversos ramos de atividade e nos contingentes de população empregados nesse ou naquele ramo, dos quais se passou a exigir uma maior especialização. Por outro lado, a contraposição entre esses dois sistemas tinha a sua representação política que se expressou na expansão do ideário liberal em oposição ao governo de então, basicamente vinculado ao modelo agrário.

Nagle (2001) chama a atenção para o fato de que o liberalismo brasileiro se manifestou principalmente pelas reivindicações de representação e justiça, com ênfase na defesa do nacionalismo. A escolarização se afirmou como instrumento primordial na crença de que a reforma da sociedade só é possível pela reforma do homem. Foi o período do chamado “entusiasmo e otimismo pedagógico”: mais educação para todos, como forma de incorporar o país na senda do progresso vivido pelas outras nações. A educação, em particular a alfabetização, passou a ser considerada essencial na reformulação do homem e da sociedade.

Com a crescente importância conferida à escolarização, surgiu a preocupação com as crianças que se mostravam incapazes de acompanhar a escolaridade formal. Nesse sentido, destacou-se, no Rio de Janeiro, o Decreto 838, de 1911, relativo à Reforma do Ensino Primário, Normal e Profissional que propunha sub-classes especiais para crianças hígidas e retardadas nas escolas-modelo da capital (JANNUZZI, 1992).

Era preciso, portanto, estabelecer critérios para a classificação da anormalidade. Por iniciativa do Dr. Francisco Sodré, médico, puericultor e sociólogo, em São Paulo, 1917, foi instituído um serviço de inspeção escolar a cargo de médicos a quem cabia classificar os “anormais” nos próprios locais de estudo, lembrando-se que, de acordo com a legislação então em vigor, era negada a matrícula em grupos escolares e escolas-modelo aos “imbecis” e aos que por qualquer defeito orgânico fossem incapazes de receber instrução.

“Decreto-lei nº 1.216, de 27 de abril de 1904. In: Coleção de Leis e Decretos do Estado de São Paulo, tomo IV, Art. 68, do Capítulo II: Da matrícula: Não serão matriculados, e portanto não entrarão no sorteio (Havia sorteio caso ocorresse mais demanda do que vagas): a) As crianças com idade inferior a 6 anos incompletos (...) c) os que sofrerem de moléstia contagiosa e repugnante (...) e) os imbecis e os que por defeito orgânico forem incapazes de receber educação”. (JANNUZZI, 1992, p. 41/42).



Continuava, portanto, a prevalecer o poder médico no diagnóstico e classificação dos indivíduos como “normais” ou “anormais”. Os diferentes tipos de deficiência apontados eram sempre considerados como decorrentes de algum mau funcionamento orgânico ou psicológico da pessoa deficiente, ou seja, a origem da deficiência estaria no próprio indivíduo, restando apenas catalogá-lo, definir em que categoria enquadrá-lo, numa hierarquia classificatória que estabeleceria graus de “anormalidade” ou “desvios”.

Ainda segundo Jannuzzi (1992), ganhou destaque no período a publicação do professor Basílio de Magalhães (1913) que teve suas orientações distribuídas às escolas normais do Estado para que as futuras professoras melhor conhecessem as crianças. Magalhães considerava indispensável o diagnóstico da anormalidade que deveria ser feito por um especialista, “um homem da ciência”. Para ele as causas da anormalidade seriam geralmente: hereditariedade, sífilis, embriaguez e tuberculose.

Destaca, ainda, que as crianças anormais deveriam ser educadas em classes separadas, não só porque não aprendem como as normais, mas, “até por vezes se viciam e, o que é pior, impedem que as crianças normais aproveitem convenientemente a instrução que lhes é proporcionada”.(Magalhães, 1913, p.57, In: Jannuzzi, 1992, p. 46/47).

A defesa da educação dos “anormais” ganhava apoio já que representava economia para os cofres públicos e para a iniciativa privada, proporcionando a sua incorporação ao trabalho, gerando renda adicional e evitando manicômios, asilos e penitenciárias.

Seria benéfico também para os “normais”, uma vez que o desenvolvimento de métodos e processos com os menos favorecidos agilizaria a educação que “deveria preparar a criança para a vida moderna sem o que poderia haver posteriormente perturbação da ordem e aumento da criminalidade”. (Sampaio Doria, citado em Oliveira, 1917: 151-3. In JANNUZZI, 1992, p. 43).

Essa centralidade na ordem e na disciplina foi questionada pelos adeptos da Escola Nova, entre eles Anísio Teixeira, que buscaram acentuar o desenvolvimento de aptidões individuais, fugindo do conceito de “ordem e progresso” rígido e normativo.

Surge a idéia das escolas-parque, dos grupos escolares, associando conceitos de higiene à necessidade também de flexibilizar horários, adequar-se à sociedade a que a escola deveria servir, reforçando conceitos de estética e de nacionalidade.

No entanto, baseados nos conceitos de Dewey e também de Decroly e Montessori, inclusive no que se refere à ênfase nas diferenças individuais, o movimento escolanovista, mesmo sem dispensar o aval médico, absorve a preocupação com os testes de inteligência, como forma de triagem das crianças e aplicados por especialistas. Em 1929, Lourenço Filho, traduziu para o português “Testes para medida do desenvolvimento da inteligência”, trazendo a escala métrica de inteligência de Binet e Simon, que se propunha a:



“determinar quais as crianças incapazes de acompanhar seus condiscípulos, por insuficiência de meios intelectuais”. (BINET e SIMON, 1929, p.12. In JANNUZZI, 1992, p.50).



É de ser prever as distorções que tal método de classificação trazia, uma vez que, o parâmetro de normalidade se baseava nos conteúdos escolares assimilados com os padrões das classes mais favorecidas, fazendo com que pudessem ser tachados como “retardados”, em maior ou menor grau, alunos que manifestassem níveis diferentes de conhecimento em função da sua proveniência de camadas menos favorecidas.

Os testes de inteligência foram aceitos, ainda que com restrições, mesmo por Helena Antipoff, embora, reconhecendo que eles mediam o que o individuo recebia do seu meio familiar, grupo social e da própria escola.

Nome fundamental para a educação especial no Brasil, Helena Antipoff nasceu na Bielorrússia, em 1892, e aos 17 anos ingressou na Sorbone, em Paris. Mais tarde seguiu para Suíça, a fim de estudar com o psicólogo Edward Claparèd (pioneiro do estudo do mecanismo de aprendizagem das crianças) que a convidou para integrar a equipe de pesquisadores do Instituto Jean Jacques Resseau, em Genebra.

Em 1929, Helena Antipoff desligou-se da equipe de Claparèd e veio para o Brasil, a convite do Governo de Minas Gerais, para aplicar os seus conhecimentos no Estado. A educadora teria por desafio participar da implantação de uma Escola de Aperfeiçoamento Pedagógico.

Além de Helena Antipoff, outros estrangeiros também foram convidados pelo, então, Secretário do Interior de Minas Gerais, o professor Francisco Campos, a participar da organização da nova escola, que seria um núcleo de formação de professores e elemento de estímulo ao aprimoramento da cultura e das técnicas de pedagogia e psicologia.

A educadora e psicóloga russa procurou recriar, na Escola de Aperfeiçoamento, o ambiente de integração entre teoria e prática experimentado em Paris e Genebra. Assim, o ensino teórico em Psicologia era acompanhado de demonstrações concretas no Laboratório, equipado com aparelhos clássicos da psicologia experimental.

Campos (2003) destacou que os estudos práticos do Laboratório deram origem a extenso programa de pesquisa sobre o desenvolvimento mental, ideais e interesses das crianças mineiras. O objetivo dessas pesquisas era subsidiar a introdução dos testes de inteligência nas escolas primárias, fornecendo os padrões aos quais seriam comparados os resultados obtidos anualmente pelos alunos. A partir dos resultados, seriam organizadas as chamadas classes homogêneas, isto é, selecionadas por nível de inteligência, uma das iniciativas pioneiras no Brasil na aplicação da psicologia à educação.

No entanto, Campos (2003) ressalva as diferenças entre a perspectiva adotada por Antipoff a respeito da psicologia da inteligência e a corrente inatista hegemônica na época, ao propor uma interpretação em bases socioculturais. Para ela, as medidas da inteligência utilizadas pelos estudiosos, em grande parte baseadas nos trabalhos de Binet e Simon, poderiam ser consideradas índices da "inteligência civilizada", revelando a ação da sociedade em que vive o indivíduo e a sua experiência acumulada.

“A partir dessa definição, que evidencia o amadurecimento da perspectiva sociointeracionista, a autora estabelece uma série de correlações entre o meio socioeconômico e o desenvolvimento mental, e sugere às escolas a adoção de programas de "ortopedia mental" visando a equalizar as oportunidades para as crianças de baixa renda que não obtinham resultados satisfatórios nos testes.” (CAMPOS, 2003, p. 4).



É nessa época que Antipoff introduz no léxico da psicologia o termo “excepcional” (em vez de retardado) para se referir às crianças cujos resultados nos testes afastavam-se da zona de normalidade, o que se justificava, a seu ver, por evitar a estigmatização, e também por possibilitar a reversão do distúrbio por meio de medidas psicopedagógicas adequadas (CAMPOS, 2003).

Essa posição levava-a a acreditar no sucesso de programas de educação compensatória, e a procurar estimular os educadores a promoverem programas de reeducação para crianças excepcionais, entre os quais podiam se distinguir os excepcionais "orgânicos", portadores de distúrbios de origem hereditária, e os excepcionais "sociais", isto é, aqueles cujas condições de vida familiar ou social impediam uma adequada estimulação.

Anos após a fundação da Escola de Aperfeiçoamento, Helena Antipoff, em novembro de 1932, com a colaboração de algumas antigas alunas da Escola de Aperfeiçoamento, fundou a primeira Sociedade Pestalozzi do país, com sede em Belo Horizonte. No ano seguinte, elas passariam a atender às crianças de grupos escolares e seus pais, em um consultório médico-psico-pedagógico. Enquanto isso, no Laboratório de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento Pedagógico, semanalmente, havia reuniões com professores de grupos escolares que se interessassem em discutir a educação de portadores de deficiência.

Campos (2003) destaca, ainda, que, a partir do segundo semestre de 1933, passaram a existir também, classes para alunos portadores de deficiência e no ano seguinte, dá-se a construção de um pequeno prédio com salas e consultórios médicos e psicológicos, além de laboratório para pesquisas comuns e endocrinológicas. Nas áreas da Pestalozzi, os alunos com desajustamento de conduta ou incapacidade de aprendizagem completavam suas atividades escolares e de educação psico-motoras, com atividades manuais e agrícolas em regime de semi-internato. Existiam também oficinas, hortas e serviços domésticos, partes integrantes da educação.

Influenciado pela Sociedade Pestalozzi fora criado em 1935 o Instituto Pestalozzi de Belo Horizonte, que funcionava como órgão da Secretaria de Educação em que eram realizadas pesquisas de psicopatologia e genética, endocrinologia, farmacologia e em psicologia de aprendizagem, sob orientação técnica da Pestalozzi. Também se deve a ela a instituição da cadeira de Psicologia Educacional, na Universidade de Minas Gerais.

A Sociedade Pestalozzi de Minas Gerais atendia a uma variedade de crianças: com dificuldade de aprendizagem, desajustamentos de conduta, problemas psicomotores, “retardados, nervosos, psicastênicos, surdos-mudos”. (RBEP, 1944, p. 467, In: Jannuzzi, 1992, p. 90). As atividades propostas por ela, intituladas de “ortopedia mental” (correção do pensamento), são baseadas em Binet, Claparède e Montessori e apoiadas em exercícios sensoriais para aprendizagem de números letras, cores, etc.

Helena Antipoff considerava como função da escola pública executar a educação com envolvimento completo da criança na sua parte física, psíquica, social e intelectiva. Segundo a linha da Escola Nova, a instituição escolar era considerada como agente de transformação da realidade, assim era necessário trazer para o ambiente escolar o especialista, o psicólogo, o orientador profissional, o médico ou o dentista, exigindo-se um processo mais complexo na formação de professores e no aparelhamento escolar. Helena Antipoff destacava, ainda, que a classe especial era indispensável na formação dos professores, pois os educaria numa atitude psicológica favorável a convivência com as diferenças individuais. (JANNUZZI, 1992).

Na IV Conferência da Associação Brasileira de Educação, em 1932, oficializou-se o “ensino emendativo”, ramo do “ensino supletivo” que integraria o “ensino especial” contraposto ao “ensino comum”. Como nos relata Jannuzzi, tal ensino destinava-se:

“aos ‘anormais do físico’ (débeis, cegos e surdos-mudos), ‘anormais de conduta’ (menores, delinqüentes, perversos, viciados) e ‘anormais de inteligência, que não são conceituados, apenas desaconselhava escolas separadas para os ‘débeis mentais ligeiros’ e ‘débeis mentais profundos’” (JANNUZZI, 1992, p. 73).



Também em 1932, sob os auspícios da Liga Brasileira de Higiene Mental, inaugura-se a Clínica da Eufrenia, “destinada a prevenir as doenças nervosas da infância, corrigir as reações psíquicas anormais e sublimar o caráter da juventude" (Arquivos Brasileiros de Higiene Mental apud Schechtman, 1981:38, In: Bentes, 1999, p. 52). Em 1934, esta clínica passa a funcionar no Engenho de Dentro, no Ambulatório Rivadávia Correa, até seu fechamento em 1939. Posteriormente, surge no local uma escola-hospital, em consonância com os preceitos da época: “... a Escola-Hospital é o melhor meio de realizar a profilaxia de todos os males físicos e morais que ameaçam a criança e, não raro, infeccionam o homem" (Clark, apud Schechtman, 1981:48, In: Bentes, 1999, p.52).

A Constituição de 1934 traz de volta ao texto legal a gratuidade da educação, juntamente com a garantia a isenção de todos os impostos aos estabelecimentos particulares de educação primária e profissional oficialmente considerado idôneo.

No texto constitucional não havia qualquer referência à educação do portador de deficiência, no entanto, no Plano Nacional de Educação havia a recomendação de que os sistemas estaduais de educação infantil deveriam formar o profissional para “a educação dos débeis, deficientes, abandonados e delinqüentes”. (Revista da Educação, ano VII, nº 80, Jan./1933. In JANNUZZI, 1992, p.75).

Esta carta constitucional, no entanto, teve curta duração. Com o Golpe de 1937 e a instalação da ditadura de Getúlio Vargas, é outorgada a chamada “Carta Polaca”, elaborada por Francisco Campos, Ministro da Justiça de Vargas. A Carta Polaca previa:

“A infância e a juventude a que faltarem recurso à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas aptidões e tendências vocacionais”. (Art. 129).



No mesmo texto legal foi oficializada a realização de “testes vocacionais” destinados a direcionar os alunos para as necessidades do mundo do trabalho. Passava a priorizar o ensino profissionalizando, num momento em que se consolidava o modelo urbano industrial que demandava mão de obra técnica especializada.

Em 1941, fruto da visão paternalista e assistencialista que marcou o governo Vargas, assinala Kramer (2003) que foi criado o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), voltado ao atendimento de menores de 18 anos abandonados e carentes. Subordinado ao Ministério da Justiça equivalia a um sistema penitenciário para a população menor de idade, com a missão, oficial, de amparar socialmente os menores carentes, abandonados e infratores, na execução de uma política de caráter corretivo-repressivo-assistencial em âmbito nacional.

No entanto, cabe destacar que o indicador utilizado para a internação pautava-se nos critérios de pobreza, classe social, na miséria, na falta de condições psicológicas, na orfandade, no abandono, na vadiagem, na mendicância, entre outros fatores, muito mais econômicos do que por contravenções penais. Com base nesses critérios é que muitos desses menores eram recolhidos pelo SAM e encaminhados para o recém-criado Hospital de Neuropsiquiatria Infantil, o HNPI, no bairro do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro.

“Este hospital, inaugurado em 10 de outubro de 1942, era composto por:

I - Enfermaria Ana Nery - onde se internavam encefalopatas, oligofrênicos profundos, prova viva das teorias de degenerescência que ainda impregnavam o saber psiquiátrico. II - Enfermarias Bourneville (masculina) e Fernandes Figueira (feminina), voltadas para pacientes portadores de várias condições psiquiátricas, além de desviantes sociais encaminhados através de órgãos como o extinto SAM - Serviço de Assistência ao Menor". (BENTES, 1999, p.53).



A Constituição de 1946 recuperou o ensino primário gratuito, mas, manteve o financiamento à iniciativa particular e não fez qualquer referência à educação especial ou similar. No entanto, pais e parentes começaram a se organizar em prol de melhores condições para aqueles que apresentavam algum tipo de “anormalidade” surgindo também teóricos que defendiam a “normalização”, ou seja, “a adequação da pessoa com deficiência à sociedade, para permitir a integração”.(CAPUTO e GUIMARÃES, 2003, p. 93).

É nesse contexto que em 1945, Helena Antipoff criou, no Rio de Janeiro, a Sociedade Pestalozzi do Brasil e, em 1954, pais e familiares de excepcionais criaram a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE).

Em 1946, junto com o professor e psicólogo Emílio Mira Lopes, Helena cria no Rio de Janeiro, o Centro de Orientação Juvenil (COJ), que vinculado ao Departamento Nacional da Criança tem o objetivo de estudar técnicas de trabalho, demonstração e treinamento de pessoal de orientação psicológica, atendendo não só aos menores como seus pais e responsáveis.

Já em 1955, Helena Antipoff sentiu necessidade de criar uma Federação das sociedades que unisse esforços e experiências das entidades, porém, mesmo após inúmeras reuniões, faltaram adeptos à idéia. O projeto ficou esquecido durante alguns anos e só veio a se concretizar em 1970, quando, após convocação de todas as entidades Pestalozzi, foi fundada, no Rio, a Federação Nacional das sociedades Pestalozzi (Fenasp), propondo-se a promover a expansão das instituições dando apoio técnico e se preocupando com uma política de educação justa para os portadores de deficiência.



2.2 – Integração – Todo ser humano tem direito à educação

Em 1948, um marco fundamental nesse debate foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada pela Organização das Nações Unidas. Tal declaração determina, no tópico relativo à educação, que: “Todo ser humano tem direito à educação”.

Amplia-se o horizonte das pessoas com deficiências, que passaram a ser vistas como cidadãs. A partir da década de 50, o conceito de educação especial passa a incluir diferentes aspectos das chamadas “necessidades especiais”, levando o poder público a criar “Campanhas” destinadas a atender as diferentes deficiências.

1957 – Campanha Nacional para Educação do Surdo Brasileiro;

1958 – Campanha Nacional para a Educação e Reabilitação dos Deficientes de Visão:

1960 – Campanha Nacional para a Educação e Reabilitação de Deficientes Mentais (CADEMI) destinada a promover em todo o território nacional “educação, treinamento, reabilitação e assistência educacional das crianças retardadas e outros deficientes mentais de qualquer idade ou sexo”. (MAZZOTTA, 1996, p. 52, In: MIRANDA, 2003, p.5).

Essas campanhas foram encaminhadas basicamente por voluntários, praticamente sem orientação profissional oficial. O atendimento educacional especializado se efetuou através de instituições privadas, as Sociedades Pestalozzi e as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAEs, que já se estendiam por vários estados brasileiros.

A primeira referência oficial à educação especial, no Brasil, surge na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 4024/61, que garantiu o direito dos “alunos excepcionais” à educação, estabelecendo em seu Art. 88 que para integrá-los à comunidade, sua educação deveria, dentro do possível, enquadrar-se no sistema geral de educação. No entanto, tal educação não necessariamente seria efetivada pelo estado, uma vez que, em seu Art. 89 a LDB garantia o repasse de recursos:

“mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções a toda a iniciativa privada relativa à educação de excepcionais, considerada eficiente pelos conselhos estaduais de educação” (MAZZOTTA, 1996, pg. 6 – Cadernos Cedes).



Além disso, é importante lembrar, que o direito à educação e à obrigatoriedade escolar permitia tantas exceções que a lei se tornava letra morta. Não estavam sujeitos a essa obrigatoriedade os casos de: a) comprovado estado de pobreza do pai ou responsável; b) insuficiência de escolas; c) matrícula encerrada e d) doença ou anomalia grave da criança.

Consolidado o Golpe Militar de 1964 é editada a Constituição de 1967. No que se refere à educação, garante, em seu Art. 168 que a educação é direito de todos e será dada no lar e na escola, que o ensino dos sete aos quatorze anos è obrigatório para todos e gratuito nos estabelecimentos primários oficiais, mas mantém o financiamento para a iniciativa particular, “a qual merecerá o amparo técnico e financeiro dos poderes públicos, inclusive bolsas de estudo” (Art. 168, § 2º).

Em seu Art. 169, que trata da organização dos sistemas de ensino pelos Estados e Distrito Federal, no § 2º tem-se que:

“Cada sistema de ensino terá, obrigatoriamente, serviços de assistência educacional que assegurem aos alunos necessitados condições de eficiência escolar”.



A Emenda Constitucional nº 1, de 17/10/1969, aponta para lei especial que deveria dispor sobre a educação de excepcionais o que ocorre, finalmente, na Emenda Constitucional nº 12, de 17/10/1978, que inclui como Artigo único:

“É assegurado aos deficientes a melhoria da sua condição social e econômica, especialmente mediante: I – educação especial e gratuita, II – assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do país, III – proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço público e a salários e IV – possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos”.



Caputo & Guimarães (2003) alertam que a obrigatoriedade e a conseqüente expansão da educação básica levou ao registro de um considerável aumento de alunos com deficiência, dificuldades de aprendizagem e outras necessidades especiais nas classes regulares. Buscando métodos para selecionar esses alunos, cresceu a influência dos testes psicológicos e de quociente intelectual, que permitiam segregar em classes ou escolas especiais todos os que eram considerados de alguma forma “problemáticos”, entre eles, os cegos, surdos, deficientes mentais, mas também os repetentes e os desajustados em geral.

O diagnóstico, categorização e classificação de alunos através dos famosos testes de QI, em muitos casos, levava a rotular a criança, a criar/estimular preconceitos e a favorecer a criação de instituições cada vez mais especializadas para atender pessoas portadoras de deficiências, garantido-lhes os “serviços possíveis” já que a sociedade não os aceitava nos espaços regulares.

“Essa perspectiva, que teve seu auge na década de 60, reforçava as relações de dependência, de exigência nos cuidados, incapacidade para o trabalho e isenção dos deveres normais, o que lhes acarretava uma perspectiva de vida inútil e inválida”. CAPUTO & GUIMARÃES, 2003, pg. 96).



Na década de 70, cresce em todo o mundo o debate sobre a integração dos deficientes como parte da construção e consolidação do chamado “Estado de Bem Estar Social”, feição que tomou o capitalismo nos países mais avançados e que se expressou politicamente na chamada social-democracia. Uma de suas principais características é a implantação de políticas sociais através de serviços públicos de atendimento à população em geral, extremamente abrangentes, que visavam criar um “colchão” destinado a conter e prevenir reivindicações e revolta no seio das massas populares.

No Brasil, no entanto, estávamos em plena ditadura militar onde ao invés do “Bem Estar Social” prevalecia o discurso liberal, a ideologia do nacional-desenvolvimentismo com a qual se buscava mascarar a crescente dependência econômica dos grandes centros do capitalismo. Aumentavam as desigualdades sociais em meio à política do “primeiro é preciso deixar cresce o bolo para depois dividi-lo”, famoso slogan do então Ministro da Fazenda, Delfim Neto, criado para justificar a situação do “país vai bem, mas o povo vai mal”. O individualismo e a lei do mais forte, típicos do liberalismo, se expressavam na defesa da educação como fator de aumento de produtividade individual, que beneficiaria o progresso e o desenvolvimento do país.

Cresce a preocupação com a profissionalização e com o tecnicismo. A Lei 5692/71, conhecida como a “Reforma Passarinho” (Jarbas Passarinho, Ministro da Educação na época), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional para 1º e 2º grau, que ficou em vigência por mais de duas décadas, veio completar o ciclo de mudanças destinadas a adequar a educação brasileira à ruptura política levada a efeito pelo golpe militar de 1964. Assume como objetivo geral da educação de 1º e 2º graus:

“proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício constante da cidadania”, mostrando forte influência do pensamento liberal. No caso da educação especial limita-se a propor “tratamento especial” para os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, ou que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados. (Art. 9º, Lei 5692/71).



O viés tecnicista torna-se mais claro no Parecer do CFE nº 848/72 que enfatiza a importância da implementação de técnicas e serviços especializados para o atendimento adequado aos excepcionais. No entanto, cabe reconhecer o crescimento da institucionalização da educação especial em termos de planejamento de políticas públicas com a Criação, em 1973, do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), com a previsão de instalação de um subsistema educacional, com o crescimento de instituições públicas e privadas de atendimento ao excepcional e a criação de órgãos normativos federais e estaduais.

O objetivo do CENESP era centralizar e coordenar as ações da política educacional voltadas para os portadores de necessidades especiais. Sua atuação marcou o início da pesquisa nacional na área da educação especial ao proporcionar a um grupo grande de docentes a qualificação em nível de mestrado e doutorado, com a criação dos primeiros programas de pós-graduação em Educação Especial, como o da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e o início da pesquisa nacional na área.

A lei 5692/71 manteve a previsão constitucional de que os recursos públicos seriam destinados às escolas públicas, mas como também permanecia a possibilidade de que fossem “dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei”, persistiu o comprometimento do setor público com a iniciativa privada. Como conseqüência, Jannuzzi (1992) destaca que de 1970 a 1974, para o atendimento ao deficiente mental foram criadas 69 instituições especializadas públicas, enquanto surgiram 213 particulares sendo que para os deficientes da visão, audição e múltiplos, surgiram 15 públicas e 49 particulares.

Coerente com essa lógica geral, em 1977, Mazzota (1989) assinala que o MEC elaborou o 1º Plano Nacional de Educação Especial para o triênio 77/79, prevendo a distribuição de recursos da ordem de 58,7% para as instituições privadas e 14,48% para os sistemas estaduais de ensino. As diretrizes pretendiam garantir: acesso a tratamento diferenciado; aproveitamento dos recursos disponíveis e integração sob o ângulo pedagógico-administrativo; diagnóstico e atendimento precoce; o máximo de eficiência e o menor custo operacional possível e educação permanente.

Nas Diretrizes Básicas para a Ação Integrada no Atendimento a Excepcionais, estabelecidas na Portaria Interministerial nº 477 de 11/08/77, há um posicionamento que atribui um sentido clínico e/ou terapêutico à educação especial, na medida em que o atendimento educacional assume o caráter preventivo/corretivo. Por sua vez, na Portaria Interministerial n.º 186/78, não há uma exigência de professor especializado para classes especiais, mas uma recomendação para que, “sempre que possível”, se empregassem esses profissionais.

É ainda Mazzota (1989) que relata o lançamento, em 1980, do Plano de Ação da Comissão do Ano Internacional das Pessoas Deficientes que define como fundamento das novas tendências de integração e normalização, sete objetivos: conscientização, prevenção, educação especial, reabilitação, capacitação profissional e acesso ao trabalho, remoção de barreiras arquitetônicas e legislação. Na apresentação dos projetos não houve detalhamento dos recursos financeiros, mas mereceu destaque o “apoio técnico-financeiro as entidades federais e instituições particulares”.

Já na chamada “Nova República”, que sucedeu ao regime militar, o CENESP-MEC, em 1985, elaborou o Plano “Educação Especial – Nova Proposta” indicando a necessidade urgente de redefinição da política para educação especial no Brasil. Mazzota (1989) lembra ainda que a essa proposta seguiu-se a Portaria CENESP-MEC nº 69 de 28/08/86 que tratava do apoio técnico-financeiro à Educação Especial no sistema de ensino público e particular, continuando resguardadas as abrangências maiores para as instituições e entidades particulares.

Em 1986, pelo Decreto n° 93.481, de 29 de outubro, o Presidente José Sarney instituiu, no Gabinete Civil da Presidência da República, a Coordenadoria para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE), órgão com autonomia administrativa e financeira e com destinação de recursos orçamentários específicos e que elaborou o Plano Nacional com o objetivo de nacionalizar a Política para Integração da Pessoa Portadora de Deficiências apresentando como Programa de Ação: conscientização, prevenção da deficiência, atendimento a pessoas portadoras de deficiências e inserção das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho.

Destaca Mantoan (2001) que essa é a primeira vez em que se registra essa mudança de nomenclatura – de alunos “excepcionais” para “portadores de deficiências”, no entanto, não significou qualquer alteração na interpretação dos quadros de deficiência ou no enquadramento dos alunos nas escolas, continuando a indefinição que possibilitava o enquadramento nas chamadas “classes especiais” de todos os alunos que não estivessem conseguindo “acompanhar” seus colegas de classe, ou que fossem indisciplinados, oriundos de famílias pobres, todos igualmente rotulados como “excepcionais” ou, o mais moderno “portadores de deficiências”.

O I PND/NR de 1986/89, elaborado já em pleno processo da chamada “redemocratização”, destacou a preocupação com o desenvolvimento social, sendo a questão social detalhada “pobreza, desigualdade, desemprego”. A principal diretriz para a educação é:

“assegurar a todos o acesso ao ensino de boa qualidade, notadamente o básico, enquanto direito social, com base em soluções que traduzem os anseios da coletividade. Há uma busca de recuperação de credibilidade da escola pública. São delineados seus programas, incluindo o de redimensionar as modalidades supletiva e especial de ensino”. (MAZZOTTA, 1989, p.13).



Foi a nova Constituição Brasileira, promulgada em 05/10/1988 que legitimou formalmente o atendimento educacional especializado no Brasil. A chamada “constituição cidadã”, até hoje em vigor, foi fruto de uma conjuntura específica: o fim da ditadura militar e a redemocratização. A luta pelas “diretas já” exigindo eleições diretas para presidente da República (a última fora realizada em 1961) levou milhões de pessoas às ruas em todo o país. Nas eleições de 1985, o presidente Tancredo Neves, ainda foi eleito indiretamente, mas a Assembléia Constituinte eleita nesse clima, elaborou a nova Constituição incorporando, fruto da pressão popular, uma série de iniciativas no campo dos direitos sociais.

Isso também se refletiu na Educação, registrando avanços importantes como a igualdade de acesso e permanência na escola, a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais, a garantia do padrão de qualidade e a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber (Art. 206). Ainda que no art. 208 essa obrigatoriedade seja restrita apenas ao ensino fundamental, como não se delimitou a faixa etária, na prática, foi estendido o direito à educação gratuita no ensino fundamental, também aos jovens e adultos. Ficou previsto ainda o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade.

Na Constituição de 1988, foi definido ainda um percentual da receita resultante de impostos para “manutenção e desenvolvimento do ensino”, cabendo a União aplicar pelo menos 18% e os Estados 25% (Art. 212).

Especificamente com relação à educação especial, destacamos:

Art. 208 – O dever do Estado com a educação será efetivado com a garantia de:

(...)

III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.



Sendo posteriormente complementado e/ou regulamentado por:

- Lei nº 7.853, de 24/10/1989, regulamentada pelo Decreto nº 3.298, de 20/12/1999, que consolida as normas de proteção à pessoa portadora de deficiência, e, em seu art. 2º estabelece que “ao poder público e aos seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos”.

- Decreto nº 3.956, de 08/10/2001, Ratificação pelo Brasil da Convenção Interamericana para a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as pessoas portadoras de Deficiência, realizada na Guatemala em 07/06/1999.

- Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS: Lei nº 10.436, de 24/04/2002 (meio legal de comunicação e expressão de comunidades de pessoas surdas).

- Lei nº 10.845, de 05/03/04, institui o Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado a Pessoas Portadoras de Deficiências – PAES, em cumprimento ao disposto nesse inciso da constituição.

Ainda com relação ao Artigo 208 da Constituição de 1988, é importante destacar os incisos IV (atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade) e V (acesso aos níveis mais elevados do ensino e da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um), VI (oferta de ensino noturno regular) e VII (atendimento ao educando no ensino fundamental através de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde) que combinados com o artigo III, que define como dever do Estado o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino, tornam os direitos neles previstos como extensivos aos portadores de necessidades especiais.

Além disso, o Art. 209 determina que o ensino é livre à iniciativa privada, desde que garantido o cumprimento das normas gerais da educação nacional, portanto, ao ser combinado com o inciso III, também obriga às escolas privadas a cumprir as normas relativas à educação especial, uma vez que as mesmas fazem parte das “normas gerais da educação nacional”.

Outro importante instrumento foi o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8069 de 13/07/1990, que destaca em seu Artigo 11, parágrafos 1º e 2º que: “a criança e o adolescente portador de deficiência receberão atendimento especializado” e que a eles “será garantido o fornecimento gratuito de medicamentos, próteses e outros recursos para tratamento, habilitação ou reabilitação”, além de confirmar em seu art. 54 que “é dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”.

A intensificação dos movimentos sociais de defesa dos direitos das minorias que se verificava em meio ao processo de redemocratização do país se refletiu no campo da Educação Especial consolidando o conceito de integração que consistia na preparação de alunos oriundos das classes e escolas especiais para serem “preferencialmente integrados no ensino regular, recebendo atendimento paralelo em salas de recursos ou outras modalidades especializadas”. (GLAT & FERNANDES, 2003).

2.3 – A Educação Inclusiva – um novo paradigma.

No entanto, embora representasse um indiscutível avanço com relação à situação anterior, onde predominava a segmentação e a exclusão dos portadores de deficiência, o modelo da integração começou a ser questionado por responsabilizar o próprio aluno pela sua preparação e adaptação ao ensino regular, uma vez que, só seriam integrados nas classes regulares os alunos que demonstrassem condições de acompanhar a turma, recebendo atendimento paralelo em salas de recursos ou outras formas de apoio.

Com essa determinação as salas de recursos se transformavam em depositários de alunos com deficiências e de problemas de aprendizagem detectados nas escolas, resultando, com freqüência, em rotulação e atendimento indevido de alunos nas classes especiais. Em sua dissertação para Mestrado da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) (2005), Kátia Machado chama ainda atenção para o fato de que as classes especiais e os apoios das classes de recursos não foram capazes de aumentar o contingente de alunos com deficiências integrados em salas regulares e os que nela foram inseridos não demonstravam substanciais ganhos acadêmicos e sociais.

As críticas a esse modelo de Integração culminaram com a proposta de Educação Inclusiva. Esse novo paradigma já começa a ser tornar visível quando da Conferência de Jontiem, realizada em 1990, na Índia, por iniciativa das Nações Unidas, representadas pela UNESCO, que preconizava “Educação para Todos”. Mônica Santos destaca entre seus objetivos:

“início de reformas educacionais significativas que assegurem que a escola inclua em suas atividades, seus currículos e através de seus professores, serviços que realmente correspondam às necessidades dos alunos, de seus respectivos pais e das comunidades locais e que correspondam às necessidades das nações de formarem cidadãos responsáveis e instruídos”. (SANTOS, 1997, p. 4).



Santos (1997) aponta como conseqüência direta no que se refere à educação especial a ampliação da clientela potencialmente relacionada como possuindo necessidades educacionais especiais, além da inclusão da própria educação especial na estrutura de “educação para todos” preconizada em Jomtiem.

Dando prosseguimento às deliberações de Jomtiem, realizou-se em 1994, em Salamanca, na Espanha a “Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: acesso e qualidade”, reunindo delegados de 88 países e 25 organizações não governamentais e que resultou na “Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre Necessidades Educativas Especiais”.

O Texto de Salamanca contém recomendações e orientações para que governos e ONGs possam garantir educação para todos, considerando como princípio norteador o atendimento pela escola comum:

“aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer as suas necessidades – escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos, além disso, tais escolas provêem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional”. (Declaração de Salamanca, 1994).



Essas recomendações têm servido de diretriz para a elaboração e implementação das políticas de educação especial no Brasil e no mundo.

Em 1993 o MEC lançou o Plano Decenal de Educação para Todos, visando (Prieto, 2000) “o imperativo da universalização com qualidade, aspiração maior da sociedade brasileira, com a conseqüente erradicação do analfabetismo” além de incluir os portadores de deficiência como um dos segmentos da clientela escolar merecedores de “atenção especial nos esforços para o alcance da universalização com qualidade e equidade”.

Em 1994 surge a Política Nacional de Educação Especial sistematizando e organizando em um único documento às ações e políticas voltadas à educação especial, que, no entanto, ainda trabalhava com o conceito de Integração. No documento figura a indicação de que a educação escolar deve se dar da forma mais integrada possível, aí compreendida a integração como o processo de ensinar, no mesmo grupo, a crianças com e sem necessidades educativas especiais, durante uma parte ou na totalidade do tempo de permanência na escola. (PRIETO, 2000).

Registre-se que, desde 1988 estava em gestação a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. O debate no Congresso Nacional teve sua origem na apresentação pelo deputado Octávio Elísio de projeto de concepção progressista que vinha sendo acompanhado de inúmeras discussões entre educadores e organizações sindicais e acadêmicas. Quando já em fase final de tramitação, esse processo foi interrompido pela apresentação de um novo projeto do então senador Darcy Ribeiro, que na prática ignorava os avanços obtidos no debate anterior. Após inúmeras negociações, chegou-se a um texto final, considerado como de caráter social democrata, aprovado em 1996, e que, mesmo incorporando diversos aspectos correspondentes a uma concepção conservadora, mantinha também em suas linhas gerais importantes avanços no sentido progressista e democrático, graças à mobilização e o envolvimento de significativos setores ligados à área de educação, durante todo o período que durou o debate. (SAVIANI, 2003).

A nova LDB/EN dedicou o Capítulo V a Educação Especial, já como desdobramento do previsto na Constituição de 1988, como podemos ver a seguir:

Art 58 – Entende-se por educação especial para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

§ 1º (...) quando necessário, apoio específico.

§ 2º (...) atendimento em classes, escolas ou serviços especializados quando não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular.

§ 3º (...) início na faixa etária de zero a seis anos.

Art. 59 – Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:

I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos.

II – terminalidade para os que não atingem o nível exigido e aceleração para os superdotados.

III – professores com especialização.

IV – educação especial para o trabalho – integração na vida em sociedade.

V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60 – Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de qualificação das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação inclusive em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público.

Parágrafo Único – alternativa preferencial, ampliação do atendimento (...) na própria rede pública regular de ensino.



A nova LDB/EN trouxe para o terreno institucional o debate sobre a inclusão escolar, ou seja, em lei muitas conquistas foram alcançadas, no entanto, o texto legal não definiu, por exemplo, quem são as pessoas portadoras de necessidades especiais, por quem e como deveriam (ou não) serem identificadas, que critérios, metodologia, recursos humanos e financeiros deveriam ser utilizados para a integração dos alunos com necessidades especiais na rede regular de ensino.

Em outubro de 2001, o Brasil aprovou o texto da Convenção Interamericana para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Pessoa Portadora de Deficiência, fruto de reunião da Organização dos Estados Americanos, realizada na Guatemala, em 1999. A Convenção da Guatemala deixou clara a impossibilidade de tratamento desigual com base na deficiência, definindo a discriminação como:

“toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, conseqüência de deficiência anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais.” (art. 1º, nº 2 e “a”).



Nesse processo, o conceito de Educação Inclusiva começa a ser incorporado ao contexto da educação brasileira passando a ser amparado pela legislação em vigor e convertido em diretriz para políticas públicas educacionais a nível federal, estadual e municipal.

Assim é que, ainda em 2001, foi aprovado o Plano Nacional de Educação (Brasil – MEC – 2001) estabelecendo o período de uma década para que algumas metas fossem atingidas e outras superadas. Trouxe como diretriz a plena integração das pessoas com necessidades especiais em todas as áreas da sociedade.

A Educação Especial foi considerada como modalidade de ensino tendo como pressuposto fundamental para a inclusão desse alunado ao ensino regular a eliminação das barreiras arquitetônicas nas escolas e a adequação do material didático-pedagógico conforme as necessidades específicas dos alunos. Previu ainda a ampliação do regulamento das escolas especiais para prestarem apoio e orientação aos programas de integração, além do atendimento específico; melhoria na qualificação dos professores do ensino fundamental para essa clientela e expansão da oferta dos cursos de formação/especialização pelas universidades e escolas normais.

Observou-se também a preocupação com a educação infantil expressa nas Diretrizes Nacionais da Educação Especial na Educação Básica CNE/2001, conforme ressalta Cláudia Pereira Dutra, Secretaria de Educação Especial em entrevista para a revista Inclusão – Revista da Educação Especial, editada em out/2005 pelo MEC:

“o atendimento educacional aos alunos com necessidades educacionais especiais terá início na educação infantil, nas creches e nas pré-escolas, assegurando-lhes o atendimento educacional especializado”. Essa preocupação está presente também nas Diretrizes da Política Nacional de Educação Infantil – MEC/2004 “a educação de crianças com necessidades especiais deve ser realizada em conjunto com as demais crianças, assegurando-lhes o atendimento educacional especializado, mediante a avaliação e a interação com a família e a comunidade”. (Inclusão – Revista da Educação Especial – Out/2005 – MEC – pg. 6).



Especificamente com relação ao Deficiente Mental, foi publicado o documento MEC/SEESP 2005 – Educação Inclusiva – Atendimento Educacional Especializado para a Deficiência Mental que, na Apresentação do texto, explicita ter como objetivo: “oportunizar aos sistemas de ensino orientações e informações para a organização do atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos com deficiência mental”. Tomando por base a Definição da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2001 e a Convenção da Guatemala, o documento do MEC destaca ainda que o aluno com deficiência mental têm dificuldade de construir conhecimento como os demais e de demonstrar a sua capacidade cognitiva, principalmente nas escolas que mantêm um modelo conservador de atuação e uma gestão autoritária e centralizadora, que acentuam a deficiência e, em conseqüência, aumentam a inibição, reforçando os sintomas existentes e agravando as dificuldades do aluno com deficiência mental.

O Ministério da Educação alerta ainda para o grande equívoco de uma pedagogia que se baseia nessa lógica do concreto e da repetição alienante, negando o acesso da pessoa com deficiência mental ao plano abstrato e simbólico da compreensão, ou seja, negando a sua capacidade de estabelecer uma interação simbólica com o meio.

“O perigo desse equívoco é empobrecer cada vez mais a condição das pessoas com deficiência mental de lidar com o pensamento, usar o raciocínio, utilizar a capacidade de descobrir o que é visível e prever o invisível, a criar e inovar, enfim, ter acesso a tudo o que é próprio da ação de conhecer”.(Documento do MEC/SEESP 2005 – p.21/22).



Dando continuidade a esse processo vem sendo desenvolvido, entre outros, desde 2003, o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, com a proposta de disseminar a política da educação inclusiva nos municípios brasileiros e propiciar a formação de gestores e educadores para atuar como multiplicadores no processo de transformação do sistema educacional em sistema educacional inclusivo. (Inclusão – Revista da Educação Especial – out/2005 – MEC – p. 50).

Em 2006, a convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU, e da qual o Brasil é signatário, desloca a idéia da limitação presente na pessoa para a sua interação com o ambiente. Também define como compromisso dos Estados Parte para assegurar um sistema de educação inclusiva em todos os níveis de ensino, a adoção de medidas para garantir que:

“a) As pessoas com deficiência não sejam excluídas do sistema educacional geral sob alegação de deficiência e que as crianças com deficiência não sejam excluídas do ensino fundamental gratuito e compulsório, sob alegação de deficiência;

b) As pessoas com deficiência possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo, de qualidade e gratuito, em igualdade de condições com as demais pessoas na comunidade em que vivem”. (Convenção da ONU, 2006, Art. 24).



Ainda em 2006, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, o Ministério da Educação, o Ministério da Justiça e a UNESCO lançam o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos inserindo o Brasil na Década da Educação em Direitos Humanos prevista no Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos. O Plano define ações para fomentar no currículo da educação básica as temáticas relativas às pessoas com deficiência para desenvolver ações afirmativas que possibilitem inclusão, acesso e permanência na educação superior.

Recentemente, em setembro 2007, a Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação editou documento contendo a versão preliminar da Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. O documento realiza extenso diagnóstico sobre a atual situação da educação especial no país, a partir da constatação do Censo Demográfico/IBGE de 2000 que identifica que 14,4% da população brasileira apresenta alguma dificuldade de ouvir, enxergar, locomover-se ou deficiência mental.

Quanto ao censo escolar, no que se refere à distribuição de matrículas nas esferas pública e privada, observa-se que, em 1998, 46,8% dos alunos com necessidades educacionais especiais estavam em escolas privadas, principalmente instituições filantrópicas. Já em 2006 registrou-se sensível crescimento das matrículas nas escolas públicas que passaram de 53,2% para 63%. O documento relata ainda evolução nos indicadores de acessibilidade arquitetônica em prédios escolares e com relação à formação de professores com atuação na educação especial.

Define ainda como objetivo:

“assegurar a inclusão escolar de alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, orientando os sistemas de ensino para garantir:

- Acesso com participação e aprendizagem no ensino comum;

- Oferta do atendimento educacional especializado;

- Continuidade dos estudos e acesso aos níveis mais elevados de ensino;

- Promoção da acessibilidade universal;

- Formação continuada de professores para o atendimento educacional especializado;

- Formação dos profissionais da educação e comunidade escolar;

- Transversalidade da modalidade de ensino especial desde a educação infantil até a educação superior; e

- Articulação intersetorial na implementação das políticas públicas.” (BRASIL, MEC/SEE – setembro/2007).



O documento destaca ainda a importância da resignificação dos conceitos de deficiência, transtornos globais e das altas/habilidades e superdotação a partir da compreensão de que as pessoas se modificam transformando o contexto no qual se inserem. Isso possibilita uma atuação pedagógica voltada para alterar a situação de exclusão e ausência de atenção às especificidades desses alunos e, assim, enfatiza a importância de ambientes heterogêneos para a aprendizagem de todos os alunos e aponta para a superação de práticas pedagógicas incompatíveis com a complexidade dos processos de ensinar e aprender.

O documento da Secretaria de Educação Especial do MEC estabelece entre as diretrizes da Política Nacional de Educação Especial que:

“A educação inclusiva constitui uma proposta educacional que reconhece e garante o direito de todos os alunos de compartilhar um mesmo espaço escolar, sem discriminações de qualquer natureza. Promove a igualdade e valoriza as diferenças na organização de um currículo que favoreça a aprendizagem de todos os alunos e que estimule transformações pedagógicas nas escolas, visando à atualização de suas práticas como meio de atender às necessidades dos alunos durante o percurso educacional. Compreende uma inovação educacional, ao romper com paradigmas que sustentam a maneira excludente de ensinar e ao propor a emancipação com o ponto de partida de todo processo educacional”. BRASIL, MEC/SEE – setembro/2007).



A partir dessas definições apresenta um conjunto de orientações aos sistemas de ensino destinadas a viabilizar a implementação dessa política. As orientações vão desde a “participação dos alunos, professores, gestores, pais ou responsáveis e demais profissionais na elaboração e avaliação” das propostas, até a celebração de convênios e a constituição de redes de apoio à inclusão “com a colaboração de setores responsáveis pela saúde e assistência social e participação dos movimentos sociais em todos os municípios”. (BRASIL, MEC/SEE – setembro/2007).

É interessante destacar que nesses últimos anos, particularmente após a Declaração de Salamanca (1994) foi sendo traçada a definição sobre a abrangência da Educação Inclusiva. Rosana Glat resume essas informações:

“A Educação Inclusiva protagoniza que todos os alunos, independentemente de sua condição orgânica, sócio-econômica ou cultural, devem ser inseridos na escola regular, o mínimo possível de distorção idade-série. Entre os grupos historicamente excluídos do sistema regular de ensino, beneficiados pela Educação Inclusiva destacam-se os portadores de necessidades educacionais especiais – deficiências sensoriais (auditiva e visual), deficiência mental, transtornos severos de comportamento ou condutas típicas (incluindo quadros de autismo e psicoses), deficiências múltiplas (paralisia cerebral, surdocegueira e outras condições) e altas habilidades (superdotados) e outros atendidos exclusivamente pela Educação Especial.” (GLAT, FONTES e PLETSCH, 2006, p.14)



Mesmo considerando os inúmeros avanços registrados, tanto do ponto de vista da legislação quando da conquista de espaço e direitos, ainda assim, consideramos importante, o alerta feito pelas professoras Rosana Glat e Edicléa Mascarenhas Fernandes, em artigo publicado na revista Inclusão, lembrando que:

“embora nos últimos anos tenham sido desenvolvidas experiências promissoras, a grande maioria das redes de ensino carece das condições institucionais necessárias à sua viabilização, ainda sendo poucas as pesquisas, experiências e práticas educacionais, validadas cientificamente, que mostrem como fazer para incluir no cotidiano de uma classe regular alunos que apresentem diferentes tipos de necessidades educacionais especiais”.(GLAT e FERNANDES, 2005, pg. 39).

Na mesma linha, lembra Bueno (2001) que o princípio da educação inclusiva não se efetuará simplesmente por decreto, sem que se avaliem as reais condições que possibilitem a inclusão gradativa, contínua, sistemática e planejada de crianças com necessidades educativas especiais nos sistemas de ensino. Bueno chama atenção ainda para a necessidade de serem definidas que ações precisam se efetivadas para que se garanta inclusão com qualidade.

“ Fica claro que a simples inserção de alunos com necessidades educativas especiais, sem qualquer tipo de apoio ou assistência aos sistemas regulares de ensino pode redundar em fracasso, na medida em que estes apresentam problemas graves de qualidade, expressos pelos altos níveis de repetência, de evasão e pelos baixos níveis de aprendizagem.

No momento em que o princípio da promoção automática começa a ser defendido e implantando nos sistemas de ensino, os níveis de rendimento escolar passam a ser fundamentais para que se acompanhe, se ofereça assistência e se avalie os processos pedagógicos desenvolvidos pelas instituições escolares”. (BUENO, 2001, p.5).



É ainda Bueno (2001) que alerta que o incremento gradativo, contínuo e consistente das condições dos sistemas de ensino, com vistas a uma qualificação crescente do processo pedagógico, implica em ações políticas de largo alcance, envolvendo financiamento, organização técnica dos sistemas de ensino, melhoria das condições do trabalho docente (expressas por políticas de seleção, de carreira, de salário, de contrato de trabalho, etc.) e tantas outras.

Entre essas políticas de largo alcance, entretanto, deve ser incluída uma política de formação docente, pois a qualidade do professorado joga papel fundamental, embora não único, nesse processo de qualificação do ensino.

“Em suma, a implantação da Educação Inclusiva implica uma nova postura da escola regular, valorizando a diversidade em vez da homogeneidade. O projeto pedagógico e o currículo (englobando metodologias, avaliação e estratégias de ensino) devem incorporar ações que favoreçam a inclusão social e práticas educativas diferenciadas que atendam a todos os alunos. Esse processo requer o envolvimento de todos os atores do cenário internacional, e não apenas dos profissionais ligados à Educação Especial. Nesse sentido, a Educação Especial não é mais concebida como um sistema paralelo, mas como um conjunto de medidas que a escola regular põe a serviço de uma resposta adequada à diversidade dos alunos. (OlIVEIRA e GLAT, 2003, In: GLAT, ANTUNES, OLIVEIRA e PLETSCH, 2006).



CAPITULO III - A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO



Capital do país desde o Brasil Colônia foi no Rio de Janeiro que tiveram lugar a maior parte das iniciativas pioneiras na área da Educação Especial. Com apoio do então imperador D. Pedro II, foi nesta cidade que foram criados em 1854, o Instituto de Meninos Cegos, hoje Instituto Benjamin Constant, em 1857, o Instituto dos Surdos Mudos, hoje, Instituto Nacional de Educação de Surdos e em 1887, a Escola México, estabelecimento de ensino para deficientes mentais.

Hoje, o Rio de Janeiro tem a maior rede municipal de Educação da América Latina, com 1054 escolas e mais de seiscentos mil alunos matriculados. No município, o órgão responsável pela elaboração e implementação de políticas em Educação Especial é o Instituto Helena Antipoff (IHA), criado em 1974. A ele compete a organização e o desenvolvimento de ações dirigidas aos alunos com necessidades especiais na rede municipal de ensino. O IHA também é responsável pela formação continuada dos professores das classes regulares que recebem alunos especiais, bem como dos que atuam nas modalidades especializadas ou de suporte.



3.1 – Educação Especial no Rio de Janeiro – Anísio Teixeira e Helena Antipoff.

Analisando a trajetória da Educação Especial, merece especial destaque o trabalho de Anísio Teixeira. Importante educador ligado ao movimento da Escola Nova, em 1931, tornou-se Secretário da Educação do então Distrito Federal. Aqui, Anísio desenvolveu o Serviço de Higiene Mental nas Escolas e realizou uma ampla reforma na rede de ensino, integrando o ensino da escola primária à universidade.

Em 1934 organizou a Seção de Ortofrenia e Higiene Mental no Instituto de Pesquisas Educacionais. Foram instaladas clínicas de higiene mental nas escolas experimentais, articuladas com a tarefa pedagógica. O chefe desse serviço, Dr. Arthur Ramos empreendeu uma pesquisa durante cinco anos, de 1934 a 1939, com duas mil crianças, encaminhadas pelos professores e diretores dessas escolas como crianças incapazes de seguir a classe comum de ensino porque eram “débeis mentais” (JANNUZZI, 1992).

Em 1935, Anísio Teixeira criou a Universidade do Distrito Federal, no Rio de Janeiro. Nesse mesmo ano, perseguido pelo governo de Getúlio Vargas, mudou-se para Salvador na Bahia, onde continuou a atuar na área da educação tendo criado a Escola Parque, que se tornou um centro pioneiro de educação integral.

Em 1945, também sob a influência do Estado Novo de Getúlio Vargas, o governo do Estado de Minas recusou a renovação do contrato de Helena Antipoff, que ali desenvolvia seu trabalho desde 1929. Helena veio, então, para o Rio de Janeiro, onde instalou a Sociedade Pestalozzi do Brasil. Em 1946, após o fim da ditadura varguista, Helena criou, no então Distrito Federal, juntamente com o professor e psicólogo Emílio Mira Lopes, Helena criou no Rio de Janeiro, o Centro de Orientação Juvenil (COJ), vinculado ao Departamento Nacional da Criança, com o objetivo de estudar técnicas de trabalho, demonstração e treinamento de pessoal de orientação psicológica, atendendo não só aos menores como seus pais e responsáveis.

Em 1951, Helena Antipoff obtém a cidadania brasileira e volta a atuar em Belo Horizonte. Em 1954, sob a inspiração do seu trabalho, surgiu a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE – que logo se disseminou por todo o país. Considerando a escola a melhor saída para todos os males, Helena Antipoff dedicou sua vida à educação das crianças. Sempre defendeu o conceito de inteligência inovador para sua época, considerando fatores socioculturais no desenvolvimento mental. Helena Antipoff morreu em 1974, em Belo Horizonte, readmitida e reabilitada pela UFMG.

Em 1957, o Governo Federal instituiu campanhas destinadas a atender à Educação dos Surdos Brasileiros, Educação e Reabilitação dos Deficientes Visuais e Educação e Reabilitação dos Deficientes Mentais.

A Educação Especial foi institucionalizada no Município do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em 1959 quando a Lei 953 é decretada, vinculando a atenção ao “excepcional” à Secretaria Municipal de Educação e Cultura, através da Assessoria de Educação Especial. (ALVES, 2003, p. 2).

Seguindo essa orientação, a então capital da República, passou a formar classes especiais em escolas regulares da rede pública, destinadas a receber, entre outros, os alunos atendidos nas escolas especiais. Para isso, foram criadas equipes técnicas de Educação Especial em todo o município do Rio de Janeiro (TROMPIERE, 2005, p. 25).

Em 1961, foi editada a Lei 4024, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que em seu artigo 88 determinava a absorção do aluno “excepcional” pelo sistema geral de educação. A capital do Brasil tinha sido transferida para Brasília neste mesmo ano. No Rio de Janeiro, agora cidade-estado da Guanabara, o atendimento a essa nova legislação gerou a criação de inúmeras modalidades de atendimento a esse segmento de alunos, desde a Escola Especial até o acompanhamento de deficientes integrados em turmas regulares por professores itinerantes.

Surgiram também as classes hospitalares, os Centros Ocupacionais, os atendimentos domiciliares (para deficientes físicos); as classes especiais (para deficientes auditivos e visuais); as salas de recurso (também para DA e DV); as classes especiais para alunos “treináveis” e os núcleos de atendimento precoce. (TROMPIERE, 2005, p. 27).

Tendo por base o modelo tecnicista que marcou o período do regime militar, instalado no país em 1964, e marcado pela crescente influência dos testes psicológicos e de QI (Quociente de Inteligência), a SME do Rio de Janeiro, então Estado da Guanabara, editou a Resolução 48 (GB/SEC/DEP, 1964), estabelecendo os critérios para o atendimento de alunos deficientes mentais adaptáveis ao ambiente escolar, ou seja, que podiam ser educáveis em classes especiais das escolas comuns e os treináveis.

Adotou-se no Rio, o teste “Mosaico” de Gille – Forma T – oriundo da França, que após as adaptações realizadas pelo Instituto de Pesquisas Educacionais (organismo ligado à Secretaria de Educação do Município do Rio de Janeiro) passou a ser utilizado para classificar os alunos de acordo com o seu QI.

De acordo com o QI os alunos poderiam ser classificados como portadores de “Retardo Mental Leve”, considerados educáveis, de “Retardo Mental Moderado”, considerados como treináveis ou de “Retardo Mental Profundo” (QI abaixo de 24) que deveriam ser abrigados em instituições especiais, por serem considerados sem condições de aprendizagem.

Cabia ao professor realizar a primeira triagem para definir os alunos a serem submetidos aos testes. Para isso, o universo considerado era o das crianças com até três reprovações na primeira série, que apresentassem dificuldade de raciocínio e compreensão e com suspeita de DM (Deficiência Mental). Tentando evitar distorções, eram excluídos do processo os faltosos, com problema de visão, audição, físicos, distúrbios graves de conduta, ou outros itens que pudessem explicar o não acompanhamento do processo escolar. Após a seleção, os indicados seguiam para a avaliação diagnóstica do teste de Gille com agenda pré-marcada e publicada no Diário Oficial.

A partir dessa classificação os alunos eram enquadrados nas Classes Especiais para alunos atrasados especiais (AE) ou para alunos considerados deficientes mentais (DM) (treináveis). Formaram-se também turmas para deficientes visuais (DV), deficientes auditivos (DA) e deficientes físicos (DF). A SME cria currículos especiais que abrangiam o núcleo comum (Comunicação Expressão, Matemática, Estudos Sociais e Ciências) e também a área específica (atividade diária e desenvolvimento das funções intelectuais).



3.2 – Integração e Normalização – O modelo comportamentalista

Em 1974, o então presidente da República, general Ernesto Geisel enviou ao Congresso Nacional o projeto de Lei Complementar nº 20, de 1974, que dispunha sobre a criação de Estados e Territórios. Aprovado o projeto, foi feita a fusão dos antigos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro, que passou a vigorar a partir de 15 de março de 1975, quando terminava o mandato dos governadores dos dois estados.

A cidade do Rio de Janeiro passou a ser a capital do novo estado o que trouxe, evidentemente, inúmeras mudanças de caráter administrativo, como a divisão das escolas até então ligadas ao Estado da Guanabara entre o Estado do Rio de Janeiro e o agora município do Rio de Janeiro. Essas alterações haviam sido antecedidas de outra mudança significativa que foi a centralização da estrutura da educação especial num só órgão.

Essa centralização refletia as inúmeras críticas ao controle deficiente das matrículas, à falta de vagas, tanto nas escolas especiais quanto nos Centros Educacionais e também à falta de profissionais especializados e de material adequado ao trabalho, além do crescente debate de educadores e psicólogos que questionavam o enquadramento mediante o teste de Gille.

O Instituto de Educação do Excepcional foi absorvido pelo Instituto Helena Antipoff, criado em 1974, e que, com a fusão, passou a integrar a estrutura do município do Rio de Janeiro. A centralização de funções possibilitou o levantamento do número de alunos que esperavam por vaga nas instituições e o encaminhamento destes para as escolas na estrutura então existente.

A partir de 1976, a Educação Especial passou a visar o processo de integração ao Ensino Comum, com ações voltadas para o aumento do número de vagas no sistema de ensino, a atualização de profissionais, o desenvolvimento de instrumentos de avaliação e a instalação de equipamentos especializados.

Ampliou-se, em 1977, a estrutura básica para o atendimento educacional ao aluno multideficiente, por meio da criação de currículos específicos para cada tipo de deficiência, caracterizando uma prática voltada para a iniciação para o trabalho e formação profissional do jovem deficiente. (Alves, 2003). Lembramos, ainda, que em 1978 entrava em vigor a Emenda Constitucional nº 12 que assegurava aos “deficientes” o direito à educação especial e gratuita”. (Emenda 12, Art. Único).

No município do Rio de Janeiro, propunha-se uma mudança, do modelo pedagógico tradicional médico-psicológico, até então adotado, para o modelo comportamental. Lembra Trompiére (2005) que a então chefe da Educação Especial, Terezinha Machado, promoveu a capacitação para todos os profissionais envolvidos com esse segmento tendo por base o método denominado “Modelo Educacional ou Modelo Diagnóstico Prescritivo – Análise de Tarefa” que deslocava o eixo de discussão sobre fracasso escolar do aluno para o ambiente escolar.

Foram extintas as classes especiais para os Deficientes Mentais Educáveis, mas ainda persistiram as classes voltadas para os DM treináveis. O critério para o acolhimento na Educação Especial passou a ser o baixo rendimento na leitura e escrita por três anos ou mais na primeira série. Foram formadas equipes técnicas nas seguintes modalidades: Deficientes Visuais, Deficientes de Audiocomunicação, Superdotados, Serviços Social, AudioVisual, Deficientes Mentais, Deficientes Físicos, Aprendizagem Lenta, Avaliação e Centro de Estudos.

A transformação foi bastante grande: ao invés de focar no aluno o problema, passou-se a considerar que a diferença estava no ensino, no ambiente educacional, sem ignorar que o aluno pudesse apresentar falhas em processos ou habilidades básicas. Em 1979, o teste de Gille foi oficialmente abolido como instrumento de seleção do alunado.

Sob essa nova orientação, iniciou-se a década de 80. O número crescente de alunos na Educação Especial (19.434, sendo 3.855 portadores de alguma deficiência e 15.549 com deficiência de aprendizagem), indicava que aí, se misturava uma grande parcela do chamado “fracasso escolar”. As estatísticas do censo de 1980 apontaram que de cada 1.000 crianças que entravam na escola na primeira série, menos da metade chegava à segunda série, menos de um terço à quarta série e menos de um quinto concluía o primeiro grau (ALVES, 2003, p. 4).

Esse quadro de repetência e evasão escolar, conforme relata Trompiére (2005) teria sido responsável pela nova modalidade, adotada inicialmente a título de experiência, em que passavam a ser atendidos na Educação Especial os egressos das turmas de primeira série repetentes (três anos ou mais) bem como aqueles das antigas classes especiais de DM educáveis. O trabalho era realizado em turmas pequenas, com apoio sistemático à professora, visitas técnicas às escolas e levantamento do desempenho escolar. Após um ano de trabalho diferenciado, era possível que parte desses alunos fossem reintegrados à Educação regular voltando alfabetizados à segunda ou terceira série.

Lembramos que, em 1980, fora lançado o Plano de Ação da Comissão do Ano Internacional das Pessoas Deficientes, que tratava das novas tendências de integração e normalização. (Mazzotta, 1989). Seguindo esta linha, no trabalho realizado no Rio de Janeiro, o enfoque era individual, apoiando-se no chamado “princípio da normalização”, objetivando fornecer o que cada aluno necessitaria para alcançar o comportamento esperado. O fundamento básico era que as pessoas portadoras de deficiência tinham o direito de usufruir as condições de vida da forma mais “comum e normal” possível na comunidade em que vivem, participando das mesmas atividades sociais, educacionais e de lazer que os demais, na medida de suas possibilidades. Nos anos seguintes, 81/82, o trabalho foi estendido a todos os alunos da primeira série.(TROMPIERE, 2005).

Em 1983, um novo governo assume no Rio de Janeiro passando a adotar uma nova orientação: a responsabilidade pela não aprendizagem passa da criança para a equipe escolar. O programa de acompanhamento das turmas de Educação Especial deixou de existir, os alunos foram distribuídos pelas turmas regulares de primeira série e os professores que trabalhavam na Educação Especial retornaram para as escolas regulares.

Em 1985, foi extinta a Assessoria de Educação Especial, em funcionamento desde 1959. Suas funções foram assumidas pelo IHA, que criou o Grupo de Análise Institucional (GAI). As equipes formadas desde a década de 70 foram organizadas em dois subprogramas de Educação Especial: 1 – Salas de recursos e Salas de Atendimento Precoce e 2 –Classes Especiais, Classes Hospitalares e Escolas Especiais.

O IHA se voltou para o desenvolvimento de pesquisas que pudessem garantir a qualidade do ensino aos deficientes, tendo publicado um documento com sugestões de atividades para viabilizar comportamentos adaptativos e gerar uma reorganização curricular voltada para situações reais de vida, com o objetivo de ampliar o desempenho do deficiente em seu cotidiano.

O planejamento do IHA se aproximou mais da Educação Regular visando “desenvolver procedimentos para uma política de eqüidade, eficiência e efetividade no que tange a educação dos deficientes”. (Alves, 2005, p.5/6). Esse projeto apontava tanto para o aspecto quantitativo (aumento do numero de vagas), quanto para o qualitativo (valorização do processo pedagógico), assim é que, em 1987, pela primeira vez, o calendário das matrículas para as Escolas Municipais incluiu a matrícula para o deficiente na mesma época que os demais alunos e as ações educativas dirigidas a eles passaram a figurar na proposta curricular geral. (TROMPIERE, 2005).

Os Centros Educacionais, com número reduzido de alunos, foram transformados em Escolas Especiais (EE), que atendiam a partir da pré-escola, abrangendo alunos com diferentes necessidades de adaptação curricular e de acesso. Ampliaram-se as vagas, mas, principalmente, mudou o critério: o aluno portador de deficiência passou a ser objeto de atenção da Educação e da escola como um todo e não só da educação especial.

Com essa nova perspectiva, os alunos passaram a ser agrupados por faixa etária e não pela severidade da deficiência. Em 1988, foi inaugurada a primeira EE com todas as adaptações consideradas necessárias: a Escola Especial Hélio Pelegrino. O IHA ampliou seu quadro técnico caracterizando cada vez mais uma ação multidisciplinar para atendimento ao deficiente.

No entanto, como em 1983 haviam sido extintas as turmas de Educação Especial, as escolas passaram a indicar para as escolas de Educação Especial os alunos vítimas do fracasso escolar que passaram a ser atendidos pelos pólos de psicomotricidade, inchando e desvirtuando o atendimento.



3.3 – Construtivismo – Piaget e Emilia Ferrero.

Em 1988, foi promulgada a nova constituição trazendo referências específicas ao atendimento aos portadores de deficiências:

Art. 208 – O dever do Estado com a educação será efetivado com a garantia de:

(...).

III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. (Constituição do Brasil, 1988, Art. 208).



Em 1989, um novo prefeito tomou posse e as mudanças recomeçaram. O IHA voltou a ter programas calcados na deficiência: classe especial para portadores de retardo mental (RM), para portadores de deficiente visual (DV), portadores de deficiência auditiva (DA), portadores de deficiência física (DF), Escolas Especiais e Atendimento Precoce. A maioria desses programas funcionava dentro da escola regular com salas de recurso ou classes especiais, com exceção das escolas especiais cuja clientela, em princípio, era o portador de graves comprometimentos.

Alves (2005) registra que o modelo comportamentalista de educação deixou de fazer parte da proposta pedagógica, que passou a ter por base o construtivismo, fundamentado nas teorias de Piaget e Emília Ferreiro. O IHA passou a realizar estudos e capacitações intensivas para transformar as práticas pedagógicas com o deficiente. Consolidou-se a regulamentação das Escolas Especiais.

Em 1992, o IHA realizou o 1º Encontro Nacional da Educação Especial, colocando em debate importantes temas como: Especificidades da Educação Especial, Construção do Conhecimento, Construtivismo e Educação Especial, Saúde e Educação, Fracasso Escolar, Sistema de Integração – Sociedade, Família e Escola, Alternativas Educacionais e Relatos de Experiências Bem Sucedidas no Brasil.

Nesse período foi criada a primeira classe para alunos autistas e síndromes correlatas atualmente designadas como Condutas Típicas de Síndrome (CE/CT) e, também, a primeira escola especial – Ulisses Pernambuco – para atendê-los (TROMPIERE, 2005).



3.4 – A influência de Vygotsky e a Multieducação.

Em 1993, novas eleições, novas políticas para a educação especial. O IHA passou por nova reestruturação interna, administrativa e pedagógica, os programas de atendimento foram extintos e foram criadas 10 equipes destinadas a estabelecer uma parceria de trabalho com as Coordenadorias Regionais de Educação (CREs), descentralizando as ações do IHA.

A proposta curricular começa a ser reformulada. O IHA começa a trabalhar com os conceitos desenvolvidos pelo pesquisador russo Lev Seminovch Vygotsky. Relembrando esse período Trompiére (2005) destaca a mudança de paradigma:

“O que há de especial nessa teoria? A ênfase nas relações sociais; a educação que deve se orientar para o futuro (Zona de Desenvolvimento Proximal), a mediação pedagógica e a centralidade da linguagem como organizadora das funções psíquicas superiores. Olhar o deficiente a partir de suas potencialidades; ativar mecanismos compensatórios; ir além.” (p. 33).



Em dezembro de 1993, realizou-se a I Jornada de Educação Especial, compartilhando com profissionais de educação temas voltados para uma política de Educação Inclusiva. Dessa jornada resultou o documento editado pela Secretaria Municipal de Educação: Multieducação, uma sala de aula do tamanho do mundo.

Em 1994, o IHA inaugurou o primeiro Centro de Referência em Educação Especial, que tem hoje reconhecimento nacional e internacional e onde são oferecidas diversas oficinas e atividades de enriquecimento para alunos com necessidades educacionais especiais, como artes plásticas, ginástica, teatro, dança, música e conversação. Funcionam no Centro o laboratório de informática educativa, a brinquedoteca, a sala de leitura e o Centro de Transcrição à Braile, abertos para alunos da Rede Pública Municipal e comunidade em geral.(GLAT, 2005).

A proposta curricular básica é reformulada, a Educação Especial passa a incorporar as mesmas diretrizes e orientações curriculares que o ensino básico, descaracterizando-se uma ação de reabilitação e acomodação do sujeito portador de deficiência, priorizando uma prática eminentemente pedagógica por parte da Educação Especial, onde as diferentes formas de aprendizagem e conteúdos escolares são ressaltadas.

A LDB/EN 9394/96 aprofundou o reconhecimento de direitos para os portadores de deficiência. A resolução nº 2, de 11/09/2001 instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, obrigando os sistemas de ensino e conceber a demanda real de atendimento a alunos portadores de necessidades educacionais especiais. No Rio de Janeiro a matrícula inicial do aluno portador de necessidades educacionais especiais passou a ser admitida em qualquer nível de escolaridade, desde a Educação Infantil, incluindo as creches, até a 8ª série do ensino fundamental, após o que o professor pode solicitar uma avaliação pedagógica do IHA, no sentido de verificar a necessidade de apoio ou as modalidades de atendimento que melhor se adeqüem ao aluno em questão, visando o seu pleno desenvolvimento.

O atendimento passou a incluir as Creches para a atenção à criança de 0 a 3 anos e 11 meses, com apoio e orientação de um professor itinerante; nos Pólos de Educação Infantil, também para crianças de 0 a 3 anos e 11 meses, com o desenvolvimento de ações destinadas a ampliar as possibilidades de desenvolvimento e aprendizagem da criança com deficiência e na Educação Infantil e para crianças a partir de 4 anos, prioritariamente, garantida em turma comum, com apoio de professor itinerante e/ou sala de recursos.

A idéia da Multieducação, originada na I Jornada de Educação Especial começou a ser divulgada em algumas publicações da Secretaria Municipal de Educação que trabalhava com a seguinte imagem:

“Uma sala de aula do tamanho do mundo, com espaço para todos os tipos de manifestações culturais dos diferentes grupos sociais, étnicos, de gênero, de idade. Sintonizado com as diferentes linguagens - TV, literatura, jornal - E mais: atenuando as fronteiras entre as disciplinas. Esta sala de aula será construída através da proposta Multieducação que está sendo elaborada pela SME”. (SME, 1993, p.4, In: HENRIQUE, 2000, p. 2).



Concluído o processo de debate, a proposta da Multieducação se consolidou em um documento, aprovado em 1996 e definido pela Secretaria Municipal de Educação como:

“Base sobre a qual as escolas municipais criam e organizam seus projetos pedagógicos. Redefine a escola pública de Educação Infantil e Ensino Fundamental, contemplando as múltiplas faces da cidade e os diferentes contextos culturais em que vivem seus alunos, pais e professores. Sugere a abordagem das disciplinas curriculares a partir de Princípios Educativos e Núcleos Conceituais.” (Site da SME)



que se subdivide em três partes:

“Primeira Parte mostrando como conhecimentos, afetos e valores se constituem criando uma relação entre as diferentes formas de linguagem e pensamento a partir de uma cultura e uma história. Nessa parte são trabalhados os conceitos e o pensamento teórico dos autores citados pela proposta; uma Segunda Parte onde surge uma nova concepção de organização curricular que vai propor uma articulação entre Princípios Educativos (meio ambiente, trabalho, cultura, linguagens) e Núcleos conceituais (identidade, tempo, espaço, transformação) e Uma Terceira Parte onde se comenta as disciplinas do Núcleo Curricular Básico através da articulação Princípios Educativos/ Núcleos Conceituais se apresentam elementos para planejar e executar atividades pedagógicas.” (HENRIQUES, 2000, p. 2).



De um modo geral, a proposta da Multieducação se apresenta tendo como objetivo

“lidar com os múltiplos universos que se encontram na escola. Múltiplas idéias e visões de mundo, múltiplos contextos e culturas de pessoas de diferentes idades e lugares.” (SME, 1996, p.108).



Para isto o projeto afirma como importante a compreensão de que “conhecer é apreender o mundo em suas múltiplas facetas”, afirmando a não existência de um único ponto de vista que abarque a explicação da realidade física e social, objetivando, assim, recuperar e integrar as múltiplas linguagens ao ato de educar.



3.5 – As bases teóricas da Multieducação – sua aplicação na Educação Especial.

Entre os inúmeros pontos que compõem a Multieducação consideramos interessante para o escopo desse trabalho destacar a concepção teórica que a informa e os aspectos relativos à Educação Especial.

Do ponto de vista da fundamentação teórica o documento da SME defende que “um só posicionamento teórico é insuficiente para embasar um projeto pedagógico”. Nesse sentido, considera-se que as informações contidas nas diversas teorias educacionais devem ser disponibilizadas aos professores

“oferecendo-lhes, assim, as ‘pistas’ para entenderem melhor o seu próprio trabalho e possibilitando construírem uma prática pedagógica renovada e renovadora.” (SME, 1996, p. 108).



A proposta da Multieducação, disponível no site da Secretaria de Educação do Município do Rio de Janeiro, apresenta as linhas gerais de um conjunto de teóricos, fazendo, no entanto, questão de enfatizar que “não se trata de fazer uma “salada pedagógica” e, sim, de buscar nos estudos dos diferentes teóricos os pontos convergentes e complementares.”.

Um dos capítulos do documento é dedicado ao Construtivismo apresentando os conceitos de Piaget e Emília Ferreiro. São também abordados em outros capítulos Winnicot, Freinet e Paulo Freire.

No entanto, considerando que esse trabalho aborda em particular a Educação Especial e Inclusiva, dedicaremos mais atenção aos capítulos da Multieducação que tratam de Vygotsky e a concepção histórico-cultural. É principalmente esse autor que serve de base para o capítulo relativo à Educação Especial, além de ser o mais freqüentemente citado, também, nos demais capítulos, inclusive no que se refere à avaliação.

O texto dedica amplo espaço aos conceitos de Vygotsky que são apresentados em tópicos: o processo de desenvolvimento, a relação entre desenvolvimento e aprendizagem, a importância das trocas interpessoais na constituição do conhecimento, a formação de conceitos, a constituição do sujeito, a “leitura do mundo”, o encontro com o “Outro” e a discussão do diálogo interior, o papel da mediação da linguagem e da interação na perspectiva histórico-cultural, autoconceito e preconceitos, linguagem e construção de conhecimentos e a construção do conhecimento como um processo interativo. Com relação à Educação Especial, merece destaque especial na “Multieducação” a aplicação dos fundamentos teóricos de Vygotsky.

A “atividade lúdica e sua importância, não só no desenvolvimento cognitivo da criança, como também na constituição do sujeito” mereceu capítulo especial no documento da Multieducação. Voltamos aí a encontrar conceitos desenvolvidos por Vygotsky, Leontiev e Luria:

“Segundo Vygotsky e Leontiev (1988), as atividades lúdicas não estão simplesmente ligadas ao prazer. A imaginação e as regras são características definidoras da brincadeira. Não existe brinquedo sem organização e sem motivo. A situação imaginária tem uma lógica, previamente estabelecida, mesmo não sendo formal”.(SME, 1996, p. 62).



Como orientação geral, o texto indica que a brincadeira e o jogo precisam “vir à escola”, se acreditamos na importância do “brincar” para o desenvolvimento do sujeito.

“Para a criança muito pequena, os objetos têm uma força motivadora intrínseca. (...) Nestas brincadeiras de faz-de-conta, o objeto adquire a função de signo, com características e histórias próprias que navegam ao sabor das necessidades e desejos das crianças. Para Vygotsky, ocorre um movimento no campo do significado. O predomínio do significado sobre o objeto e sobre a ação / situação observada a partir do aparecimento da brincadeira, introduz o pensamento infantil num mundo absolutamente novo, independente das restrições situacionais próprias das crianças muito pequenas. Livre, o pensamento pode imaginar, criar, inventar e representar. Enfim, tornar-se instrumento para a compreensão e transformação do mundo objetivo”.(SME, 1996, p. 64).



Por outro lado, o jogo e a brincadeira não devem ser entendidos apenas como situações em que se envolvam as crianças menores. É importante notar que as atividades lúdicas podem - e devem - ser desenvolvidas em todas as disciplinas que compõem o currículo escolar. Não existem componentes curriculares que, necessariamente, sejam mais propícias ao jogo, assim como também não existem séries onde devam prevalecer as brincadeiras, e outras onde estas e os jogos estejam ausentes.

Entretanto, o que se verifica é que o ato de brincar - tão privilegiado pelas crianças e adolescentes - ocupa poucos espaços na escola: espaços onde é “permitido” brincar, onde supostamente não se realiza um trabalho sério, como se a brincadeira e o jogo não fossem importantes para o desenvolvimento da capacidade de pensar, refletir e abstrair, organizar, realizar, avaliar.

“Possibilitar a entrada efetiva da ludicidade na escola é o desafio. O jogo e a brincadeira devem invadir o espaço escolar a fim de transformá-lo num espaço de descobertas, de imaginação, de criatividade, enfim, num lugar onde professores e alunos sintam prazer pelo ato de conhecer, através de ensinar e aprender”.(SME, 1996, p. 39).



Além disso, são os conceitos de Vygotsky que servem de base ao capítulo sobre Educação Especial:



“A educação para essas crianças deveria se basear na organização especial de suas funções e em suas características mais positivas, ao invés de se basear em seus aspectos mais deficitários”.(Vygotsky, 1987, p. 28, In: SME, 1996, p.39).



Ou seja, Vygotsky questiona a prática pedagógica que toma como ponto de partida a deficiência em si e apresenta como pressuposto, a dificuldade. Em contrapartida defende que não se deve reduzir, de antemão, as possibilidades do aluno portador de deficiência, mas sim, num processo de interação constante, procurar com ele as “vias de acesso” e à constituição de conhecimentos e valores. Segundo o texto, com isso, “estaremos possibilitando que aprenda e se desenvolva, apesar da deficiência, sem previamente determinarmos até onde terá condições de caminhar”.(SME, 1996, p. 40).

O documento ressalta ainda o debate sobre a capacidade de abstração, muito freqüente entre educadores que atuam com crianças e adolescentes surdos ou portadores de retardo mental, que, para muitos, não conseguem atingir níveis mais elaborados de pensamento, estando restritos ao nível de pensamento concreto. Esse é o motivo apresentado para que limitem o trabalho com esses alunos, ao desenvolvimento de atividades concretas, não considerando que muitos, apesar de apresentarem deficiências mais graves, podem desenvolver formas mais elaboradas de pensamento.

Mais uma vez a Multieducação faz uso dos argumentos de Vygotsky, defendendo que a utilização do recurso concreto deve servir, tão somente, de apoio, como ponto de partida para o desenvolvimento do pensamento abstrato:

“... precisamente, porque as crianças retardadas, quando deixadas a si mesmas, nunca atingirão formas bem elaboradas de pensamento abstrato, é que a escola deveria fazer todo o esforço para empurrá-las nessa direção, para desenvolver nelas tudo que está intrinsecamente faltando no seu próprio desenvolvimento”.(Vygotsky, 1988, p.100, In: SME, 1996, p. 40).



O documento base da Secretaria Municipal do Rio de Janeiro propõe uma reflexão sobre os caminhos alternativos a serem trilhados com os alunos portadores de necessidades educativas especiais, de forma compartilhada com os demais, sem perder de vista o ponto de chegada.

Para isso, os Princípios Fundamentais e Núcleos Conceituais da MULTIEDUCAÇÃO devem ser os mesmos para todos os alunos, sendo necessário promover adaptações curriculares de modo que os alunos portadores de necessidades educativas especiais sejam atendidos em suas especificidades.

A SME-RJ lembra que a diversidade de alunos requer algumas vezes respostas diferentes por parte da escola e para isso define que:

“Um aluno tem necessidades educativas especiais quando apresentar dificuldades maiores que o restante dos alunos da sua idade para aprender o que está previsto no currículo, precisando assim de caminhos alternativos para aprender”. (SME, 1996, p.31).



Isso significa que, como está, aliás, previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Especial (MEC/SEESP, 2001), a Escola deve propor no projeto político pedagógico, no currículo, na avaliação e nas estratégias de ensino, ações que favoreçam a inclusão social e práticas educativas diferenciadas que atendam a todos os alunos. Significa também, como alerta Glat (2006) (Inclusão Escolar) que não devem ser ignoradas as suas necessidades especificas, ou seja, deve ser garantido ao professor e à escola o suporte necessário à sua ação pedagógica.





3.6 – A prática da Educação Especial no município do Rio de Janeiro.



Um aspecto interessante da política educacional que vem sendo desenvolvida pela prefeitura do município do Rio de Janeiro tem sido a formação de grupos integrados de pesquisa constituídos por pesquisadores da universidade e da rede de ensino. O livro “Educação Especial: Memórias e Narrativas Docentes”, inúmeras vezes citado nessa pesquisa, já é um resultado dessa parceria.

Agora, no momento em que buscamos verificar como a Educação Especial tem se efetivado no Rio de Janeiro, nas escolas da rede municipal, no paradigma da inclusão preconizado pelos documentos teóricos analisados, além de documentos oficiais da secretaria municipal de educação, levamos em conta, pela sua abrangência, estudo relativo à educação especial no Rio de Janeiro, patrocinado pela FAPERJ e levado a efeito pelas pesquisadoras de núcleo de pesquisa da UERJ, Rosana Glat, Márcia Pletsch e Rejane Fontes, que teve como objetivo, entre outros:

“a) fazer um mapeamento quantitativo e qualitativo da estrutura e funcionamento do atendimento oferecido aos alunos com necessidades educacionais especiais matriculados nessa rede; b) analisar o papel e ações da Educação Especial no âmbito da proposta de educação inclusiva que vigora neste município”. (Glat, 2006, p.1).



Na justificativa da pesquisa, Glat (2006) ressalta algumas características da rede municipal de educação que são significativos para o objeto do nosso trabalho como o expressivo número de alunos com necessidades especiais matriculados, o percurso consolidado de políticas e ações do município no campo da Educação Especial, as quais acompanharam os diversos movimentos da História da Educação Especial em nosso país e, finalmente, a flexibilidade do sistema, que oferece simultaneamente várias modalidades de atendimento educacional, desde as de caráter segregado (como a escola ou classe especial) até a inclusão em classe regular (com ou sem suporte especializado).

De acordo com a pesquisa acima referida dos 8.869 alunos com necessidades especiais matriculados na rede no segundo semestre de 2005, 27% estudavam em classes regulares, sendo que a maioria 82% recebia atendimento especializado paralelo.

A deficiência mental abrange cerca de 43% dos alunos assistidos pela Educação Especial, a maioria atendida em classes especiais de escolas regulares. Os alunos com condutas típicas (autismo, psicoses e outros distúrbios graves de comportamento) constituem 12% dos alunos especiais, em sua maioria atendidos em classes especiais, embora já existam experiências de inclusão em classes regulares.

Os alunos com deficiência auditiva constituem 11% e em terço estão incluídos em classes regulares, com suporte especializado em salas de recursos em horário paralelo, em programas de bilingüismo e/ou aprendendo Língua Brasileira de Sinais.

Os portadores de deficiência visual (cegos ou de baixa visão) são 3% do total de alunos especiais, a maioria em classes regulares com suporte de salas de recurso. Os portadores de deficiência físicas (paralisia cerebral e/ou outras limitações ligadas ao desenvolvimento motor) representam 3% dos alunos portadores de necessidades especiais, em classes regulares e com assistência de um professor itinerante. No entanto, os portadores de deficiências múltiplas e/ou severas estudam em classes especiais ou pólos especializados de Educação Infantil.

Também são incluídos no atendimento especial da SME/RJ crianças e jovens com doenças graves ou crônicas internados em hospitais, que estudam nas chamadas classes hospitalares. Ainda é muito limitado o atendimento aos alunos com altas habilidades.

Embora a determinação da SME/RJ indique que os alunos com necessidades especiais devem ser matriculados preferencialmente em turmas regulares, recebendo suporte paralelo da Educação Especial, quando necessário, a maioria ainda vem sendo atendida em classes especiais (56%). Além disso, ainda permanecem em funcionamento 10 Escolas Especiais que atendem a 12% dos alunos portadores de deficiências físicas severas ou múltiplas. Destas, 6 escolas estão vivenciando um processo do que Glat (2006) denominou “inclusão inversa”: as turmas de educação infantil estão recebendo alunos que não tem deficiências, com o objetivo de alterar a configuração da escola especial.

A pesquisa desenvolvida por Glat et alli (2006) permitiu, a partir das entrevistas realizadas, constatar a existência de controvérsias quanto aos critérios de avaliação pedagógica e encaminhamento dos alunos das classes especiais para o ensino regular, sobretudo nos casos de deficiência mental, deficiências múltiplas e condutas típicas:

“De modo geral, esses critérios passam pelo domínio de conhecimentos básicos adquiridos pelo aluno (próprio nome, algumas palavras, conteúdos acadêmicos), a observação do comportamento do aluno em sala de aula e o diagnóstico (até mesmo se o aluno tem ou não “acompanhamento clínico”). Embora a diretriz da SME/RJ afirme alguns preceitos da proposta da Educação Inclusiva – segundo os quais não exige que o aluno esteja “preparado” ou “dominando um certo conteúdo curricular” para ingressar na classe regular – observamos que as práticas avaliativas ainda seguem, predominantemente, o modelo da “integração” (GLAT, 2006, p. 8 (O papel da educação especial).



A distância entre o discurso oficial e a prática do dia a dia, revela um ponto fundamental para a garantia da inclusão como corolário de uma educação de qualidade: a formação dos profissionais de educação, tanto do professor da classe regular quanto dos “especializados”. Segundo a pesquisa, as entrevistas realizadas revelam que ainda persiste uma visão de que a responsabilidade pela aprendizagem do aluno com necessidades educacionais especiais está a cargo do professor vinculado à Educação Especial, ou diretamente nas classes ou Escolas Especiais, ou através do professor itinerante ou do professor da sala de recursos.

Os próprios professores entrevistados, conforme relato das pesquisadoras (GLAT, 2006), apontaram que não se sentem qualificados para receber alunos especiais em suas turmas, apesar de terem participado de alguns cursos de formação. Para Glat (2006) este talvez seja o maior entrave no processo de inclusão. No entanto, as pesquisadoras constataram que o IHA tem feito nos últimos anos um grande investimento em programas e reuniões de sensibilização e formação com os professores do ensino regular.

O estudo apontou ainda outras dificuldades para a efetivação do processo de inclusão que englobam a infraestrutura dos prédios, situações do entorno físico das escolas e a violência urbana, com evidentes prejuízos para a acessibilidade e para a freqüência e permanência do aluno na escola.

A resistência familiar também é apontada como entrave à inclusão. Muitos pais acreditam que a inserção de seu filho numa turma regular pode levar a uma situação de discriminação ainda maior. As pesquisadoras citam como experiência bem sucedida, porém ainda isolada, o trabalho realizado por professores itinerantes da 7ª CRE que esclarecem aos pais sobre as possibilidades de desenvolvimento dos seus filhos.

A partir dos elementos de análise colhidos nas informações oficiais da Prefeitura do Rio de Janeiro, quanto analisando pesquisas realizadas, como a citada acima, é possível assinalar que a rede municipal de educação do Rio de Janeiro ainda encontra problemas para efetivar, em grande escala, a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular. Por outro lado, também fica visível que o conjunto de medidas de natureza legal, administrativa e pedagógico que foi possível levantar, tem contribuído muito para que a Educação Especial no Rio não se constitua como um sistema educacional paralelo, nem apenas como serviço especializado.

“O projeto político pedagógico da SME/RJ é efetivamente direcionado para uma proposta de Educação Inclusiva: os alunos com deficiências ou outras necessidades especiais tem matricula assegurada em qualquer escola e o IHA acompanha e orienta diferentes modalidades de suporte para os que escolarizam na classe regular”. (Glat, 2006, p.10).



A referência ao Projeto Político Pedagógico remete às suas bases conceituais que, no que se refere à educação especial e inclusiva, tem como referencial os estudos e pesquisas desenvolvidos por Vygotsky com crianças e adolescentes portadores de deficiência (física, visual, mental, auditiva e múltipla) no Instituto Experimental de Defectologia - termo utilizado na Rússia, no início do século XX, para se referir ao trabalho desenvolvido com pessoas portadoras de deficiência.

Essa abordagem é fundamental para a construção de uma prática pedagógica que tome como ponto de partida não a deficiência em si:

“A Educação para estas crianças deveria se basear na organização especial de suas funções e em suas características mais positivas, ao invés de se basear em seus aspectos mais deficitários” (Vygotsky, 1987, p.28).













































CONSIDERAÇÕES FINAIS



Investigar a história da Educação Especial e chegar até os dias atuais, no município do Rio de Janeiro foi como abrir uma porta. Por essa porta aberta foi possível verificar como a situação sócio-educacional do portador de necessidades especiais evoluiu ao longo dos tempos, como é descrita hoje e, principalmente, como é compreendida hoje. A importância dos conceitos teóricos desenvolvidos por Vygotsky se reafirma, como assinalado no documento “Multieducação” que serve de diretriz educacional no Município do Rio de Janeiro:

“A educação para essas crianças deveria se basear na organização especial de suas funções e em suas características mais positivas, ao invés de se basear em seus aspectos mais deficitários”.(Vygotsky, 1987, p. 28, In: SME, 1996, p.39).



Em resumo, a pesquisa apontou para importantes avanços já obtidos no que se refere à legislação e a inclusão de crianças portadoras de necessidades especiais em escolas regulares e também registrou a existência de iniciativas de formação continuada para professores e profissionais ligados à Educação em geral voltada para a educação especial. No entanto, também esbarrou com freqüência em relatos de professores reconhecendo sua insegurança frente a alunos portadores de necessidades especiais em suas classes regulares. Esses profissionais relatam insuficiente conhecimento do tema, problemas com acessibilidade, com a falta de adaptações materiais e curriculares para garantir a eficácia dessa inclusão.

Consideramos também importante registrar a cada vez mais freqüente cooperação entre os sistemas de ensino do município do Rio de Janeiro com universidades como a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), a Universidade Cândido Mendes (UCAM) e outras seja através de convênios para grupos de pesquisa, para cursos de extensão ou mesmo de pós-graduação, permitindo aprofundar de forma dialética o universo teórico acadêmico do dia a dia da educação nas escolas.

Ficou aberta a porta. É essencial conhecer a evolução histórica para compreender o contexto atual e ser capaz de observar, analisar e agir no dia a dia da prática pedagógica com relação ao processo de inclusão. Considerando os conceitos desenvolvidos por Vygotsky, para o desenvolvimento e efetivação da educação inclusiva:

"É preciso descobrir a promessa que reside em cada criança (jovem ou adulto). Promessa de potencialidade para as quais até o momento não se encontrou instrumento adequado de avaliação” (JANNUZZI, 1997, apud PADILHA, 2005, p.39).

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