I
Esquecido, num lúgubre lugar,
Sofri muitos horrores conscienciais.
E teria sofrido muito mais,
Não fosse esta turminha me buscar.
Não tive qualidades especiais,
Somente o proceder bem singular
De nunca a Providência ajuizar,
Pois todos os seus filhos são iguais.
A mim é que esticava o rijo dedo,
Culpando-me dos erros desse enredo,
Em que desempenhei como vilão.
Agora, quero ser protagonista
E o mestre manda sempre que eu insista
Em que devo a mim mesmo dar perdão.
II
Terrível vitupério é o elogio
Que diz, para si mesmo, o trovador,
Porém, se bela rima vim compor,
É que dei por aceito o desafio.
Esteja arriscando-me o que for,
Fugir seria só falta de brio,
Por isso é que em Jesus sempre confio,
Em seu bom coração, que é puro amor.
Também, não vou deixar nesta poesia
O estigma do mal, que lhe daria
A forma de minh alma pouco sã.
Apenas vou pedir que o povo estude
Um meio de ganhar cada virtude,
Orando p ro sucesso desta irmã.
III
Estranha o nosso médium que a poesia
Rejeite, quase sempre, o feminino,
Pois, quase sempre, o toque masculino
É que tange estas cordas de harmonia.
Madalena, sou eu, que aqui combino
Os sons da cantilena, todavia,
Consciente de que alguém melhor faria,
Aceito dos poetas seu ensino.
Por ser a prima trova, desespero,
Querendo vê-la logo concluída,
Porém, sem lengalenga ou lero-lero,
Que a turma torce toda reunida,
Na ânsia de ouvir tango e não bolero,
Que foi o que dancei, durante a vida.
IV
Carismas, intempéries, coisas santas
Misturam-se nas mentes combalidas,
E as trovas se desfazem, nestas lidas,
Depois que joguei fora não sei quantas.
— Se estas são as rimas mais queridas,
Que, no jardim dos versos, sempre plantas,
Por que, ó coração, que tu te espantas
Ao veres que a maldade convalidas?...
— Arranca da cabeça a covardia
E faze do sofrer bela poesia,
Para alertar do mal a todo o povo.
— Não penses tão-somente em vil ludíbrio,
Pois nestes metros haverá equilíbrio.
Caso não haja amor, rima de novo.
V
Não foi um bom início, todavia,
Deixamos registrada a nossa marca,
Pendendo para o sério e p ra fuzarca,
Que o bom é estudar com alegria.
O médium, pobrezito, é que aqui arca
Com esta sobrecarga de poesia,
Julgando sempre que melhor seria
Se não fizesse água a tosca barca.
Mas, na verdade, o povo se diverte,
Enquanto põe em verso esta lição,
Pois sabe que o leitor é bem solerte,
Cobrando deste tema distinção,
Querendo que o poeta bem acerte,
Ao dizer “sim” ao bem e ao mal, “não”.
VI
Eu vou compor um último soneto,
Mas, nem por isso, feio como a peste,
Querendo ver que o vate mas empreste
Todas as cores, que não seja o preto.
Embora seja a rima um simples teste,
Nos temas da Doutrina eu me intrometo
E peço p ra dançar um minueto
Os pés do metro em que minh alma investe.
— Não desperdices tempo, amigo meu,
Pondo de molho as barbas da alegria,
E apaga esse azedume que te deu
Idéia que qualquer melhor faria
O universal amor do Bom Judeu
Transparecer nos versos da poesia.
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