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Artigos-->A NOVA PARSÁGADA -- 07/02/2002 - 21:41 (Domingos Oliveira Medeiros) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Aproveitei o feriado de final de ano e fui conhecer a tão famosa Parságada. Peço desculpas ao saudoso Manuel Bandeira. Mas o fato é que, devo confessar, não fiquei

satisfeito com o passeio. O lugar não é lá estas coisas. Nada de tão surpreendente. Aliás, é até muito parecido com tantas outras localidades que conheço.



Assim que cheguei na cidade, fui direto para o parque de diversões. Na verdade, fui conferir o que dela falou o poeta Bandeira. Havia, realmente, o pau de sebo, untado de gordura; e que até premiava, com dinheiro, quem conseguisse chegar ao seu topo; só que o valor do prêmio não cobria o valor do ingresso para acesso ao recinto; nem era suficiente para compensar as despesas com lavagem da roupa de quem se aventurasse nele subir.



Encontrei, também, muitas bicicletas para alugar; porém, enferrujadas e sem qualquer manutenção; e com os preços de locação impraticáveis para grande parte da população. População, diga-se de passagem, muito pobre e sem esperanças de melhorias. O desemprego era grande. Poucas vagas nas escolas públicas. Muita gente fora delas. E os que estudavam, reclamavam da qualidade do ensino. Havia muitos analfabetos.



Constatei a existência do tal burro brabo, a que se referiu o poeta. Sempre à disposição dos mais ousados, que se dispusessem a montá-lo. A surpresa, em relação ao burro brabo, era o risco de queda, com fraturas de ossos, sem que o valente herói, geralmente na classe menos favorecida, pudesse contar com assistência médica adequada. A rede hospitalar pública deixava mito a desejar. E os hospitais particulares, que aceitavam convênios, não guardava correlação com o poder aquisitivo da população.



Mas não ficava só nisso. A questão da prostituição em Parságada era generalizada. Competia, em larga escala, com o descaso e o desrespeito em relação às poucas famílias que ainda preservavam suas crenças e seus valores éticos e morais. Não era à toa que o local registrava grandes índices de pessoas contaminadas com a AIDS, a Sífilis, a Blenorragia e tantas doenças. Até um surto da dengue já começava a se alastrar pela cidade. E havia troca de farpas entre as autoridades. O Monarca colocava a culpa nos governadores, e estes nos representantes municipais. E a população, sem solução, ficava a mercê das doenças.



A imprensa, de modo geral, contribuía para aumentar as incidências daquelas patologias infecto-contagiosas. Fazendo a apologia do sexo pelo sexo. Sexo, como sinônimo de liberdade. Propagavam, como arte, a nudez bem remunerada das mulheres famosas e dispostas a despir-se em páginas de revistas, como se fossem meros objetos de prazer.



As televisões exibiam programas de gosto duvidoso e levados ao ar no chamado horário nobre. Briga de marido e mulher; estrelas e atrizes mostrando para o público, ao vivo e a cores, a cor de sua atual calcinha; a posição sexual de preferência do artista tal, câmaras indiscretas, atores confinados em casas, fazendo abslutamente nada, enfim, a cultura do grotesco, que em nada contribuía para a qualidade e a preservação de valores éticos e morais. E tudo por conta da busca frenética pela audiência, sinônimo de dinheiro. Mas, então, qual o porque de o poeta Bandeira elogiar tanto a cidade de Parságada?



Primeiramente, acredito, em Parságada o sistema de governo é semelhante a uma Monarquia Parlamentarista, onde, a rigor, quem manda é Sua Majestade, o Rei. O Parlamento apenas homologa suas decisões. Em contrapartida, todos são agraciados com presentes de Sua Majestade: empresariado local, banqueiros e outros amigos do Rei.



Nosso poeta, Manuel Bandeira, como é sabido, gozava da amizade do Rei. Boêmio e amante da bebida e das noitadas, gozava, por isso mesmo, do privilégio da companhia de belas mulheres, que lhe era destinado pelo Rei. Assim, nosso poeta podia escolher a mulher e a cama que quisesse. Sendo a libertinagem, princípio e fim dos objetivos do poeta Bandeira, garantida pelo Rei, evidentemente, não poderia haver um lugar melhor para Manuel Bandeira.



Fiquei em Parságada, aproximadamente, uma semana. Tempo mais do que suficiente para desvendar quase todos os seus mistérios e segredos. Depois, soube de outra localidade próxima dali cerca de 50 ou 60 quilômetros, ainda em fase de construção. Totalmente diferente de Parságada. E fui até lá.



Não havia desempregados. A educação recebia tratamento privilegiado do governo. Os colégios e as universidades eram de ótima qualidade, com vagas, o ano todo, para quem quisesse ou se dispusesse a cursar esta ou aquela faculdade. Uma vez formado, o emprego , tanto no setor privado como no público, era garantido. Não havia déficit previdenciário. Os aposentados tinham assistência médica e social gratuitas. E ganhos suficientes para sua manutenção e de sua família. E, detalhe, deixavam de contribuir para a previdência, diferentemente do que se insiste em adotar lá no Brasil.



Todos , em Nova Parságada, pagavam impostos. Proporcional aos seus rendimentos. Havia justiça fiscal. Quem ganhasse mais, proporcionalmente, pagaria mais. Inclusive os banqueiros. Não havia desemprego. A educação, a saúde e a segurança Pública eram de boa qualidade e prestados sob à responsabilidade do Estado. Habitação e Transporte, idem. E assim em quase todos os itens econômicos e sociais.



Em Nova Parságada, impressionou-me o interesse da população pela política. Todos participavam ativamente das ações políticas: sugerindo, reclamando, cobrando, e assim por diante. A re-eleição em Nova Parságada era proibida. Primava-se pela rotatividade do poder, como forma de oxigenação das idéias. Nada de vitaliciedade após deixar o governo. Conforme querem adotar aqui no Brasil.



O mais curioso de tudo, e de certa forma surpreendente, é que governo e população, numa espécie de Carta de Intenções, sobre o futuro de Nova Parságada, utilizou ensinamentos colhidos no livro de um brasileiro, intitulado "A Cortina de Ouro", do Prof. Cristovam Buarque, onde estavam definidos os caminhos que norteavam as ações de Nova Parságada, de onde republicamos alguns trechos:



"Há cerca de mil séculos o homem dobrou um esquina biológica: diferenciou-se de seus ancestrais, adquirindo um cérebro dotado de inteligência suficiente para perceber o mundo, entender parte dele e desejar dominá-lo. Há cem séculos, uma esquina técnica foi dobrada: o homem aprendeu a manejar a produção agrícola e criou uma vida sedentária (...)) Há vinte e cinco séculos (...) o surgimento da esquina ideológica: os gregos inventaram a lógica e construíram uma organização social e política que caracterizaria a civilização ocidental até a queda do Império Romano, quinze séculos atrás. A partir de então, até o Século XVIII de nossa era, a sociedade medieval (...) do qual surgiram o Iluminismo e a Revolução Industrial, que provocaram a esquina da civilização industrial. Hoje a humanidade chega outra vez a um caminho (...) Mas, pela primeira vez em sua história, os homens têm conhecimento do que ocorrerá e têm diante deles a possibilidade de escolha. Em vez de uma esquina dobrada involuntariamente, sem escolha, a próxima dobra é um encruzilhada ética, definida pela vontade do homem, com dois caminhos alternativos: continuar com a ética do progresso deste século, ou fazer um progresso da ética para o próximo".



Continuando a menção que os governantes de Nova Parságada escolheram, como parâmetro para seus rumos, lia-se na Carta de Intenções:





"Ao não se perguntar para que, mas apenas como, o homem perdeu o sentido crítico da sociedade que construiu, e, ao construí-la sem o sentido crítico, caminhou para o desastre".



E assim, a cada dia, nascem Novas Parságadas, totalmente libertas de esquemas e classes do século passado, sem medo de sonhar e de retomar o gosto "pela aventura de imaginar e navegar um futuro incerto, sem mapas pré-fabricados, sem dicionários confiáveis, sem destino previamente definido com clareza".



Terminado o feriado, voltei para a casa, e fiquei pensando como seria bom que o Brasil seguisse os passos, os sonhos e as utopias de Nova Parságada. Aí, sim, ninguém precisaria ir embora para outros cantos. Em terras brasileiras, todos seriam amigos, não do só do rei, mas de todos entre si, e todos, de igual modo, teriam o privilégio da paz e do amor, e da prosperidade com justiça social.



Domingos Oliveira Medeiros

07 de fevereiro de 2002

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