Os enigmas nesta vida chegam de repente: um acidente, a perda inesperada de um ser querido, uma deficiência física ou mental, uma separação inimaginável, uma violência aleatória, uma grave enfermidade...Eles são uma via inquietante para irmos a nós mesmos, sem sermos devorados por ilusões de poder ou saber.
Diante do enigma são várias as atitudes. A mais comum é a perplexidade. Face à desgraça, esse comportamento está ligado em geral, à idéia inconsciente de julgamentos e merecimentos. Por que essa pedra no caminho? Por que eu? Por que comigo? O que eu fiz? Quem é o culpado? De onde vem essa desgraça? Bate-se de frente com essa pedra, com esse muro impenetrável, ao querer ver-se através. Essa via, das justificativas e explicações, é plena de esterilidade. A interrogação sobre a origem do mal, quase sempre, não leva a nada. Vem de pressupostos equivocados. Seríamos culpados do que? De haver amado?
Para muitos, os enigmas vem como pedra de tropeço. Para outros, eles são um marco a ser contornado, uma referência no caminho, uma inflexão na trajetória.
Um dos desafios dos enigmas é o passar perto, reconhece-los e não se chocar. Alguns se afastam, fogem para bares, bebidas, sexo, religião...buscam uma nova vida. Evitam a realidade e trilham o caminho ao imobilismo, ao choque ou à destruição. Soçobram na melancolia. Ou, buscam ilusoriamente alguma forma de remover essa pedra ou faze-la desaparecer. No caminho havia uma pedra: marco de referência, baliza ou razão de choque, tropeço e descaminho?
Em muitas parábolas, os evangelhos ensinam: a prova que nos foi dada deve ser transformada numa jóia única e de infinito valor.
Os enigmas desafiam nosso sentimento de onipotência. Esse ilusório sentimento de poder, de poder muito – graças às nossas capacidades materiais e intelectuais – é fortemente questionado pelos enigmas irreversíveis. Eles chegam como uma oportunidade de um novo caminho, sempre próprio e apropriado, para irmos à descoberta de nós mesmos.Eles surgem como uma via de superação da ilusão da onipotência e também da onisciência. Eu não sei , não entendo e nem posso saber tudo ! Aceito o mistério e vou dar-lhe um lugar em minha vida. Enigmas são incompreensíveis e como é difícil aceitar nossa própria miséria, nossa imperfeição e nossa deficiência !
O dom de si começa nesse duro trabalho de preensão ( e aceitação!) do enigma. Para ultrapassar a ilusão da onipotência, da onisciência e da posse é preciso aceitar e doar, no mais completo abandono. Durante um longo momento, não saberemos como prosseguir. É normal. Descobrimos que não somos Deus. Ele assegura a existência de um caminho.
Existe um caminho e não podemos errar. Existe um caminho e não desejamos errar. Senão, seria a morte. O Caminho é espinhoso, mas existe. Ele é próprio a cada caso, a cada enigma. Uma via para transformar em graça a desgraça e a nós encontra-la. E mais tarde, quando tudo parecer enfim superado, quando transformados ressurgirmos das cinzas, ao contemplarmos desglorificados o enigma recebido um dia, descobriremos que ele ainda está lá, inteiro, intacto. Esse são..........os verdadeiros enigmas. Por definição.