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Artigos-->Conhecendo um amigo -- 02/10/2010 - 08:13 (valentina fraga) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Gostaria de transcrever um conto do meu amigo Alfredo Domingos, de quem recebi autografado o texto abaixo. Sua proposta é fazer sorrir ou chorar em seus contos, mexendo com a emoção do leitor, trazendo à tona lembranças de outra época bem dentro do cotidiano. Sugiro uma olhada detalhada nos textos editados na Usina de Letras.

Agradeco ao querido amigo.

Valentina Fraga

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Cara lembrança, caro conserto



O relógio foi dado de presente por mim ao meu pai. Já faz tempo, em 1974. É coisa fina, cara, comprada nos “States”. Teve direito a certificado, a garantia e o escambau. A marca é “das antigas e das boas”. A escolha foi com carinho.

Lembro-me que trouxe a caixa de couro, na cor vermelha, entre as camisetas, evitando qualquer risco.

O velho adorava a peça. Valeu-se dela anos a fio, sem nenhuma dor-de-cabeça. Dizia que o filho lhe dera. Esticava, em seguida, o braço esquerdo apresentando com orgulho a raridade.

Há mais ou menos oito meses, entregou-me o relógio dizendo ter parado de funcionar. Prometi providências, mas falhei; deixei-o guardado e não fiz nada em prol.

No último mês de julho, no entanto, deu-se a tragédia, quando, por atropelamento, meu pai veio a falecer. Coitado do Alfredão! Como faz falta a todos nós!

Além da grande perda, é claro, fiquei com remorso ao encontrar, ainda que combalida, a tal caixa de couro.

Falei comigo, tentando melhorar as coisas, redimir-me: - Bom, é chegada a hora! Vou levar o relógio para o conserto e também mandar fazer uma revisão geral. Tirar os defeitos. Antes tarde do que nunca, não é?

Fui recomendado a levá-lo a um representante autorizado e juramentado da marca suíça. Deixei-o para orçamento e apostei que poderia passar a usá-lo, lembrando a cada segundo do meu pai.

Ao receber o valor, nem acreditei. Eram tantas as linhas do que precisava ser feito, que o total indicado lá no final do papel, quase caindo, expressou uma doída realidade. A quantia chegou aos astronômicos R$ 2.000,00. Ah! Para ser exato, constatei pasmo os R$ 2.119,00.

A pretensão de portar a relíquia, que por trinta e seis anos esteve com ele, foi por água abaixo. Frustração é o nome da sensação que me invadiu!

Na verdade, é uma cifra muito alta, independentemente da condição financeira da pessoa, que talvez não corresponda ao valor comercial do bem. Isso, sem tratarmos do peso sentimental, pois este não se consegue calcular.

Decidi, diante da surpresa nefasta, abandonar a ideia do reparo. Resolvi colocá-lo de volta na embalagem e mantê-lo bem guardado, escondido, longe de todos os males, inclusive do mal da ganância dos orçamentistas desmedidos.

Pus-me a procurar conforto. Fazendo contato com o “além-mundo”, conversei várias vezes com o Alfredão. Lamentei-me e pedi desculpas pelo ocorrido. Tomara que tenha ouvido as minhas escusas.

Mas ainda faltava algo para que eu ficasse em paz definitivamente, se é que existe essa possibilidade. Bolei, na tentativa de salvar-me, ou de remediar a situação, colocar dentro da caixa, junto com o relógio, o seguinte bilhete, feito à mão, recheado de boas intenções: “Pai, sinto-me culpado por não ter consertado o relógio antes, com você vivo. Agora, já era. Tentei trazê-lo para a ativa, em sua homenagem, para pôr no meu pulso, porém, não consegui. Tenho a meu favor, convenhamos, o preço exorbitante, fora de propósito. Sem chance! Fico mais aliviado quando imagino que você próprio não aceitaria tamanha exploração. É muito dinheiro, demais da conta! Tenho certeza de que exclamaria “Tá louco, isto é um assalto!”. Não adiantaria, pai, se eu comprasse um relógio novo, bacana, até melhor. Você não está aqui para aproveitá-lo. É uma pena! Estou descartando essa solução. Entendo que é melhor ficar assim. Mesmo sem funcionar, ele é seu, guardadinho, de coração. Fique bem. Seu filho”.



Alfredo Domingos Faria da Costa.



Nota do autor: Alfredo da Costa é o nome do meu pai, falecido em 28/07/10, no Rio de Janeiro, aos 81 anos.

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