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Cronicas-->Desculpas -- 14/06/2000 - 07:51 (Renato Rossi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A desculpa esfarrapada é quase que uma instituição. Algumas de tão usadas servem mais para amenizar o ambiente abrindo espaço para a conciliação do que propriamente para explicar ou justificar uma falta. Não raro temos que dar desculpas. Um atraso para uma reunião, a falta ao trabalho ou à aula, a inadimplência temporária, um trabalho sem a qualidade esperada, um esquecimento involuntário ou mesmo o café frio. Como estamos sujeitos às faltas dos outros, nossas ações são prejudicadas e nós mesmos, quem diria, acabamos tendo que dar desculpas. Assim, gera-se uma cadeia de faltas e desculpas. Situações é que não faltam.

O pneu furou. Quem há de acreditar nesta história? Menos ainda nestes tempos em que os pneus praticamente não furam. No mínimo haveria que dizer que o pneu estourou e sair ameaçando a prefeitura de um processo por perdas e danos e ainda pela imagem de mentiroso passada a clientes ou patrões, ou ambos. Se todos os furos de pneus alegados fossem verdade, borracharia seria o segundo melhor negócio do mundo, perdendo apenas para a produção de óleo de peroba e seus sucedàneos. E naquelas improváveis ocasiões em que o pneu efetivamente furou ou estourou? O que fazer? Nestes casos o remédio é dar uma desculpa alternativa que seja de mais fácil aceitação. Para os menos criativos sempre é possível usar as desculpas furadas clássicas, mas deve-se ter o cuidado de iniciar com um "se eu contar você não vai acreditar...". Depois, só conte mesmo se for absolutamente necessário, iniciando com um "parece mentira mas...".

As doenças sempre comovem e podem gerar a boa vontade dos demais. Optando-se por uma doença própria, a alergia à soja transgênica será muito bem aceita nos próximos meses pois traz à discussão um tema moderno e polêmico, permitindo uma discussão tão demorada que ao seu término o motivo da discussão já terá sido esquecido. Nesta mesma linha sempre é possível dizer que foi uma Coca Cola belga que gerou o desconforto, revelando-se baixinho que o Brasil está importando as latas recolhidas na Europa. Coisas de multinacional que não respeita os países do terceiro mundo. Pode-se ainda citar alguma autoridade menos famosa no momento, dizendo que ele levou uma boa grana para dar a permissão. Mas a informação não deve ser repassada para não criar pànico na população.

Para faltas de dia inteiro, sempre há as viagens inesperadas. Um depoimento secreto em uma destas CPIs que estão em andamento, pode ser uma boa desculpa. A classificação de secreto é como um vestido preto, sempre cai bem. Quem não gosta de saber um segredo? As mortes embora sejam de mau gosto, são muito usadas. A julgar pela quantidade de sogras que morrem imagina-se que a poligamia esteja muito arraigada ente nós. Avós, coitadas das pobres vovós, sempre morrendo por seus netinhos faltosos. Mas deve-se ter o cuidado nunca matar mais de duas no período de seis meses. Depois pode pois ninguém vai lembrar e se algum chato insistir diga que ele não entendeu bem, que na última vez foi a vó de sua mulher a quem ela queria muito pois praticamente a criara. Siga com algumas histórias de infància e logo a situação estará contornada com vantagem. Não sei por que dificilmente ouço falar da morte de avós. Imagino que seja mero preconceito, ou talvez eles já tenham morrido de verdade e aí até os mentirosos mais contumazes respeitam. Talvez guardem a alternativa para ocasiões especiais.

O Correio já foi muito usado para desculpas, mas hoje em dia já não tem a credibilidade de antes (a desculpa). Em compensação a rede telefónica está aí para facilitar as coisas, em especial nestes dias de novas regras para interurbanos.

- Eu tentei ligar, mas você sabe como está a telefonia desde país.

Depois segue um libelo sobre a privatização e os interesses escusos que estão em toda parte, siga falando que se não bastassem as multinacionais americanas agora estamos sujeitos também às ibéricas, quem diria, e ao término, a falta já estará perdoada.

O governo sempre é uma boa desculpa ou um culpado perfeito. Para os menos patriotas sempre é possível iniciar as desculpas com um "Você sabe, neste país, ninguém ...." e aí transfere a culpa para a nossa cultura latina e a colonização portuguesa. Não fora isto você certamente teria cumprido o prometido.

Uma desculpa que está se tornando clássica é o computador, ou o sistema. "Você tem razão, mas o computador não aceita...". Este é um tipo de desculpa que eu chamaria de profissional, pois seu emprego mais adequado é nas centrais de atendimento. Nos serviços públicos não sujeitos à atuação do PROCON ela é imbatível. Em primeiro lugar porque livra o funcionário, remetendo a culpa e a responsabilidade para um obscuro e inatingível Departamento de Sistemas. Em segundo, porque é rigorosamente verdadeira. Na realidade, o funcionário está solidário com reclamante e aproveita para desfiar uma lista de mazelas. Inicia pelo salário pouco e encerra com os altos lucros não distribuídos, sem deixar de falar nas unhas encravadas que o atormentam permanentemente. Nestes casos nem mesmo bispos aceitam reclamações. É o sistema.

Há situações em que não há desculpas. Ninguém as aceita pelo simples fato de que não esperavam mesmo que a promessa fosse cumprida. Obras de qualquer porte, por exemplo. Quem imagina que uma obra será entregue no prazo combinado, seja a pintura da casa do cachorro ou seja um edifício de vinte andares. Quem acredita que o preço final será o combinado, mesmo que não seja um tribunal. Nestes casos não há o que conversar e a briga pode iniciar sem o direito de defesa, mas não adianta. Os mais espertos tratarão um prazo maior do que aquele que imaginam necessários, deixando uma folga. Não adianta. Mesmo o prazo mais seguro será furado. É uma regra da natureza, não há como fugir dela. Outro exemplo são os livros e discos emprestados. Não voltam. Ouvir a desculpa só serve para o aprendizado e uso futuro.

Quando não há mais argumentos, sempre pode-se usar os clássicos, "eu pensei que.." e "estava tudo certo, mas não deu...". Melhor só falando no tal bug do ano 2000.

Minha amiga Christine me emprestou um disco e não sei como dizer a ela que estragou. Fui à várias lojas procurar outro para repor, mas está esgotado. Eles ficaram de telefonar quando chegar mais. Assim que chegar eu devolvo.



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