I
A história que se conta às horas tardas,
No intuito de pôr medo na criança,
Há de ficar impressa na lembrança,
Difícil de extrair, tais quais as sardas.
Ao inventares, cria uma esperança,
Que, doutro modo, muito as acovardas.
Coloca, a proteger o inferno, guardas,
Caso contrário, a fé jamais avança.
Caso o temor domine o coração,
Triste, a impedir que o homem bem progrida,
Não vás dizer-lhe que é processo vão
À caridade sempre dar guarida:
Aperfeiçoa a busca dos que são
Muito infelizes nessa rude vida.
II
A sistemática dos versos é
Preocupação de quem verseja mais:
Há de querer as rimas anormais,
Sem tropeçar jamais em um só pé.
Vós que me ledes sempre me ensejais
Um bom motivo p ra aumentar a fé,
Pois, quando chega o ponto, é cré-com-cré,
Quando os sonetos são sensacionais.
A bola que jogamos é redonda,
Quando o parceiro passa bem, de jeito.;
Não é pintura linda, qual Gioconda,
Porém, o coração bate no peito,
Se a opinião, qual barco nesta onda,
Faz balançar o tema que eu respeito.
III
Estrofes mil se perdem pelo etéreo,
Que ser poeta aqui gera “responsa”,
Mas, quando o texto está esta geringonça,
O nosso mestre vem e fala sério.
Todo perneta apenas desengonça.
Que culpa eu tenho de chamar Tibério?!
Desde que vim do negro cemitério,
A rima trago n alma sempre sonsa.
Chuviscos chegam já p ra me molhar
A peça, que se encolhe de vergonha,
Que a minha voz se perde pelo ar.
Eu quero acreditar que vil cegonha
Trafegue com meu filho devagar,
Que é duro de parir, quando se sonha.
IV
Trombetas soam alto a anunciar
Que o fim chegou p ras rimas importunas.
É como, lá na praia, as alvas dunas,
Que fazem movimentos, como o mar.
Aldeias vão-se embora, devagar,
Por mais que tu dos ventos te premunas.
Por mais que termos ricos tu reúnas,
Alguém vai reclamar o teu lugar.
Isso acontece quando o preguiçoso
Não traz assuntos nobres do Evangelho
E pensa que a poesia é simples gozo.
Perdendo o tempo alheio com bobagem,
Folguedo para quem, com ser mui velho,
Não é capaz de dar qualquer mensagem.
V
São traços tão-somente de quem era
Batuta na regência desta orquestra,
Fazendo, num piscar, uma obra-mestra,
Sem nunca o meu papel ficar na espera.
Agora, este imbecil tão-só palestra,
A recitar poemas da cratera,
Tristezas, simplesmente, de monera,
Em obra que se faz sempre canhestra.
E tenho a pretensão das obras-primas,
Que as rimas que se põem geram “frissons”,
Mas nunca são capazes das estimas
Que os melhores encontram, nos seus sons.
És tu, caro leitor, que legitimas
Quem ponha na poesia os nobres dons.
VI
Que valem tantos metros no compasso,
Se o povo paira longe da Doutrina?
Antigamente, as cores da bonina
Ganhavam, nos meus versos, bom espaço.
Hoje, o meu coração só desatina:
É negro o claro tema que desfaço.;
E apenas um soneto dá cansaço,
Enquanto a rima surge mais cretina.
Ao Pai devo rezar do mesmo jeito,
Pois tenho ainda jeito p ra rimar,
Conquanto pese a dor dentro do peito
De ter de deixar logo este lugar,
Que, um dia, não me dei total respeito,
E, agora, triste, luto, em meu penar.
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