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Contos-->Barata -- 17/09/2002 - 20:09 (Georgina Albuquerque) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



O homem despertava dó... Abandonado e cabisbaixo, os pequenos olhos marejados denotavam cansaço. Uns que com ele se deparavam ficavam penalizados. Outros, confusos e aflitos, escapavam-lhes as palavras de consolo, o constrangimento a evoluir para uma desculpa qualquer que justificasse a fuga encarreirada. 


O desconforto existencial já lhe era íntimo desde a vida colegial. Os colegas punham-se a rir dele, os apelidos cruéis a desafiar-lhe a resistência. O medo e as humilhações convidavam-lhe à covardia, a postura encurvada de quem carrega o peso de ter nascido. 


- “Barata!”...- provocavam-no – "cuidado com o inseticida, heim ?" 


Ao término do curso técnico, o alívio de não mais freqüentar as aulas. O isolamento habitual o havia favorecido quanto à obtenção de profundos conhecimentos de informática e pôs-se a atuar na área com eficiência. Pela primeira vez, gratificava-se com algo por ele produzido. O supervisor apreciava-lhe a dedicação, tornando-se irrelevantes para ele tanto o excesso de timidez do rapaz, quanto a esquisitice de seu temperamento. 


O primeiro amor chegou tardio e inesperado. Judite, a senhora que o tinha como inquilino já havia se referido às novas vizinhas, uma senhora adoentada e a sobrinha que lhe fora confiada quando por ocasião da morte de sua irmã. Apoiada pelo carinho da tia, a menina buscou retribuir-lhe, desde então, com o exercício de uma afeição extremada. Segundo Judite, a gratidão era a maior virtude de Ester e em decorrência disso passou a nutrir-lhe profunda admiração, a amizade entre elas evoluindo e propiciando um convívio de estreita intimidade 


O rapaz pôs-se a aguardar as folgas dos finais de semana com ansiedade. A pequena casa havia se tornado mais aquecida com a alegria da vizinha, que já participava da rotina da casa como se a ela pertencesse, o que veio efetivar-se com a morte da velha tia. Não fosse Judite e Barata, estaria Ester sozinha no mundo, acompanhada apenas dos infortúnios que a vida lhe havia reservado. Em contrapartida, os sentimentos de amizade e reconhecimento que nutria pelo rapaz vieram a propiciar-lhe o seu primeiro beijo, pernas trêmulas e mãos desajeitadas numa até então desconhecida dança de prazer e sofreguidão. 


O casamento não tardou a ocorrer, para deleite de Judite. Surgiram então as noites calmas e bem-dormidas, o corpo de Ester ao alcance dos antigos desejos reprimidos do marido. Finalmente considerava-se um sujeito feliz, o desgosto do passado descolorido diante de tanto deslumbramento e alegria de viver. 


Mas eis que surgem a crueldade e o desespero da perda! Ela o trocara por outro...Certamente a desgraça era resultante de culpa sua. Havia falhado e perdido a mulher desejada, ele que andava tão certo de ter encontrado o paraíso. Havia sido tolo em acreditar que poderia ser como as pessoas privilegiadas para as quais o bom destino nunca se recusa. Por que não havia se resignado à vida medíocre e toda essa destruição evitada? Decididamente não havia nascido para a felicidade !... 


Senta-se no banco da praça, cada vez mais comprometido com a intensidade de sua dor. Uma voz feminina dirige-lhe uma pergunta, que responde mecanicamente. A mulher insiste em estabelecer um diálogo, o sofrimento de Barata indo de encontro a sua solidária preocupação. Precipita-se ele num choro convulsivo, o relato confuso acompanhado de escuta atenta e flutuante. As horas se descomprometem, arrastando-se pela tarde cinzenta. 


"- Você tem me dado o apoio que todos me negaram, Marisa!... Nunca obtive incentivo para prosseguir ou me orgulhar de mim.... Sabe como sou chamado?... Barata!...Um ser repugnante, rejeitado, e agora traído... Não vejo saída alguma na escuridão em que me encontro..." 


A moça abranda as suas inquietações com tranqüilidade fazendo uso de palavras reconfortantes. Percebe ter conseguido atenuar-lhe a angústia e oferece o número de seu telefone para que o homem ligue quando precisar. Barata dá início, daí em diante, a intermináveis conversas, extensas lamentações acolhidas com paciência e carinho. 


Noite fria, o telefonema do rapaz dá mostras de um progresso alcançado. A voz, anteriormente entrecortada por soluços, chega tranqüila até a amiga recente. Pede para visitá-la e conversarem pessoalmente. Fala do quanto lhe tem dado força, a jovem feliz e vaidosa por ter atingido o seu intento. 


A campainha denuncia a chegada de Barata. Marisa corre para recebê-lo, não sem antes consultar o relógio e admitir a sua extrema pontualidade. Na mesa, o lanche preparado com zelo. O coração generoso o recebe com carinho, a grata percepção de que também ele teve o carinho de trazer-lhe flores, os braços ocultos para trás e uma expressão facial de incontida satisfação. 


"- Veio de você, Marisa, a motivação pra fazer aquilo que sempre desejei! Tudo o que na minha vida não ousei por covardia... Jamais encontrei alguém assim...que não me assustasse e nem inibisse os meus impulsos. Ganhei segurança pra dar vazão à pessoa que realmente trago em mim..." 


Dizendo isso, Barata trouxe as mãos à frente... Com elas o cintilar de um enorme punhal, com o qual passou a perfurar o tórax de Marisa. Havia um ar de triunfo em seu olhar; uma sensação de poder nunca antes vivenciada. A metamorfose havia se dado, finalmente... 


 


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