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Artigos-->Nossos Valores Literários -- 01/07/2000 - 21:48 (Carla maria Fagundes Moreira) |
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Nossos Valores Literários
Quinhentos anos de Literatura Brasileira?
Não podemos fazer tal afirmativa já que o que tivemos até o início deste
século foi uma literatura ligada a Portugal , seja na forma ou no assunto .
Para muitos, tudo começa com a tão falada certidão de nascimento da
nossa pátria: a Carta de Caminha. Trata-se apenas de um relato histórico e
com este valor pois é uma carta que fala da terra descoberta .
Já no século XVII , tememos a Deus e Padre Antônio Vieira soube usar
seus discurso para persuadir seus ouvintes para defender a terra assim como
ele mesmo o usou para defender os pequenos latifundiários. Os sermões deste
padre são tão atuais que recentemente um famoso advogado os usou na defesa
de José Rainho, o líder do Movimento do Sem Terra . O século ainda trouxe a
malandragem do baiano que começava a aparecer com Gregório de Matos , o Boca
do inferno.
Século XVIII, o século das luzes e da revolução francesa, período de
efervescência cultural em Minas Gerais que respira o ar de independência e
seus poetas produzem poesia lírica e epopéias. A maioria dos inconfidentes
fez parte da chamada “Escola de Minas”, o Arcadismo. Deram a movimento
literário uma feição bem mineira trocando a paisagem da antigüidade clássica
pelas montanhas de Minas em seus poemas. Mas foi só a paisagem pois a forma
ainda era portuguesa.
Século XIX, duas escolas completamente diferentes: Romantismo e
Realismo. Enquanto esta trouxe para a literatura a nossa vida política e
usava a razão e a objetividade, aquela primava pelo uso da emoção , pela
defesa utópica de nossas matas, pela escolha de um herói nacional : o índio.
Só nesta época é que vai aparecer o índio na nossa literatura com uma
pequena exceção feita no século anterior por Frei Santa Rita Durão e Basílio
da Gama. O Romantismo inspirado na filosofia de Jean Jaques Rousseau , “o
homem é bom , a sociedade é que o corrompe”, trouxe um índio completamente
diferente do que se encontrava por aqui. José de Alencar , em seus romances
indianistas, traz o índio europeizado , educado e gentil. O período ainda
traz poesias com mulheres idealizadas, o sofrimento por amor e canto de
amor à pátria na poesia de Gonçalves Dias , a “Canção do Exílio”.
Machado de Assis é um caso a parte e de difícil classificação em alguma
escola literária. Alguns críticos o colocam no Realismo. Mas ele é único em
nossa literatura. Um menino pobre, órfão, gago e epiléptico conseguiu fazer
de seu estilo, algo nobre e diferente. Dono de uma retórica aprimorada, de
humor negro, de conhecimentos de Gothe e Shakespeare deixou-nos o enigma de
Capitu , o fracasso de Brás Cubas e a loucura de Rubião.
Ainda no século XIX , temos a antigüidade clássica de volta com Olavo
Bilac. Ele tentou algumas vezes mudar como em , “Oras, direis ouvir estrelas
“ou ainda “Criança ama com fé e orgulho a terra em que nasceste”, mas o que
importava era ser o ourives da palavra. Ainda temos Alphonsus de Guimarens
nas ruas de Mariana dizendo “Pobre Alphonsus”.
Século XX. Começamos com o regionalismo de Lima Barreto e seu Policarpo
Quaresma, Monteiro Lobato e seu Jeca Tatu, Euclides da Cunha e o triste
massacre de sem- terra no Nordeste e de seu líder Antônio Conselheiro.
Prosseguimos com a famosa Semana de Arte Moderna realizada em São Paulo no
ano de 1922. Seus idealizadores diziam : Não sabemos o que queremos mas
sabemos o que não queremos. Como esquecer que através de Mário de Andrade
descobrimos que somos Macunaíma, o herói sem nenhum caráter? Temos aí uma
descoberta de nossas raízes, de nossas lendas , do nosso passado histórico.
Oswald de Andrade conseguiu trazer a público uma releitura da nossa
história. Manuel Bandeira com a sua simplicidade nos deu a oportunidade de
apreciar as coisas sem pressa e com prazer.
Vivemos um período de descoberta de nosso país. O nosso mineiro, que
tem um coração maior que o mundo, Drummond, soube traduzir para a poesia a
pedra que está sempre no meio do caminho. Murilo Mendes, também mineiro,
trouxe- nos a viagem aos seios de Jandira. Cecília Meirelles, a poeta, nos
diz que que canta porque o instante existe e por isso a vida está completa.
Vinícius de Moraes com a sua musicalidade mostrou ao mundo a nossa Garota de
Ipanema e a Rosa de Hiroxima para a tristeza dos homens.
A prosa da primeira metade do século XX, trouxe a aridez e a seca do
Nordeste na voz de Graciliano Ramos e Rachel de Queiroz. Jorge Amado levou
Gabriela para a tevê popularizando a literatura brasileira. Guimarães Rosa
levou a sua prosa tirada do sertão mineiro e seus falares regionais.
Na prosa intimista , Clarice Lispector e sua dor pela existência humana
e João Cabral de Melo Neto , a morte e vida severina .
A tendência contemporânea nos trouxe a musicalidade de Chico Buarque,
Caetano Veloso e Gilberto Gil associada a literatura. O teatro na pessoa de
Nelson Rodrigues e as mazelas da família brasileira e Oduvaldo Viana Filho
tentando rasgar o nosso coração em tom de alerta para nossa consciência
política.
Temos sim, cem anos de uma literatura genuinamente brasileira e sem
conseguirmos recuperar a beleza e tradição indígena. Temos quinhentos anos
de uma dominação portuguesa e que só sairemos dela valorizando a nossa
cultura.
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