Sou visceralmente súdito do império
mas meu coração sangra pela república.
Na carne que as engrenagens da metrópole fincou feridas.; trago cicatrizes de sonho e desilusões:
do mofo do quarto 3x4,
do desconforto do beliche desarrumado,
do encardido da fronha no travesseiro,
do guarda-roupa de meia porta,
do espelho desbotado na parede
da escrivaninha de tampo de vidro,
do odor rançoso de bitucas no cinzeiro,
do violão que o tempo emudeceu,
da janela que dava vista para o paraíso.
O oxigênio desses meus dias, que tanto me mata quanto vicia, não foi capaz de turvar a fuligem impregnada na memória, e azedar as doces lembranças que guardo da Terra da Garoa:
entristecendo o sorriso
de um gozo adolescente,
fecundando as brancas e férteis cochas da moça que fugiu da praia de Santos para se empanturrar nos rodízios de pizzas,
viver o vadiar pelas esquinas,
brincar de carrinho de mão,
engravidar a silhueta do corpo
e desvendar os mistérios do coração.
Se a república tem sede e endereço só pode ficar lá pras bandas da PENSÃO do Senhor OSWALDO, rua Toneleiros, 171.
Do livro: ADOLESCER DOS GIRASSÓIS
ANTONIO VIRGILIO DE ANDRADE
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