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Cronicas-->COCÃO DO PADRE -- 29/06/2002 - 07:03 (LUIZ ALBERTO MACHADO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Nhenhenhéns de banda, pàndegas de lado, muitas são as esfoladas polêmicas arrebatadas na càmara de vereadores, nos antros de perdição, nos gabinetes das autoridades, nos púlpitos religiosos, nas alcovas matrimoniais, em todos e inimagináveis locais de aglomeração, com relação a um monumental património da comunidade trombetense, fidedigno de se constituir num dos ícones da humanidade pela sua curiosa pequenez e paradoxal grandiosidade, conferida pela insólita fanatização, tanto contra como a favor pela modesta população que arrudia, resultando nas mais diversas pendengas e querelas da paróquia.
Os a favor, são extremamente violentos quando arregaçam as mangas e compram a maior briga na defesa dessa inquestionável graça divina; os do contra, são irredutivelmente aguerridos na destruição dessa totêmica e supersticiosa coisa ruim, verdadeiro atraso de vida para todos os residentes dali; os da coluna do meio que nem pendem prum lado nem pro outro, nem catingam, nem cheiram; num movem uma palha sequer para acabar com o rebuceteio, nem nem. E ainda tem a turma do saçarico munganguento que são contra os a favor e vice-e-versa e versa-e-vice e do contra em tudo que só tocam fogo botando mais lenha só prá ver o desgraceiro do confronto fumaçando brabo. Mais nada. Essa gentinha gaiata é a que mais se avoluma na peleja, só prá ver a arenga estrondar na risadagem frouxa. Eita, pau!
Sem querer puxar sardinha nem para um nem para o outro, muito menos para lado algum, sem sombra de dúvida, aquilo é uma representativa fulgaração da província nordestina, não tendo lá os holofotes e a pomposidade de figurar entre as grandes vitrines das suntuosidades mundiais, mas que dá no que falar, dá; fuxico que só; enredo, muito; candinhagem, bote fé; lorota, avalie. E que merece, merece, só não sei se para veneração, ou se mangação. Deixe ver.
Para uns acalorados defensores, ele é valioso porque foram os ingleses da Great Western que descobriram esta fonte, vez que se tratava de uma nascente de águas cristalinas, santa curandeira, que, segundo alguns boateiros, foi onde a Besta Fubana deu uma mijada de abrir um buraco enorme no chão. Na vera. E olhe que o insólito esgueirou-se, pois lá, quem chegasse que fosse já se via e testemunhava aleijado andar, cego ver, mudo falar, doente bom, impotente foder, tarado caiar, tudo só com um toque na areia do lugar. E mais: juram pela alma da mãe e pela fé de todos os santos que foi onde Frei Damião Bozzano se batizou; onde António Conselheiro antes de sapecar forças em Canudos, veio se purificar na sua verdadeira água benta; onde Padre Cícero num se cansava de carregá-la nos seus frascos para distribuir aos fiéis no Ceará. E num era pouca a briga de espíritas, xangozeiros, padres, pastores, para ver quem carregava mais daquele santíssimo líquido precioso. Era cada arranca-rabo todo dia e o dia todo. E quanto mais levavam, mais ela se tornava abundante. Por isso, é rodeada de mistérios os mais transcendentais.
Para se ter uma melhor idéia do estrupício, no buraco mencionado, surgiu uma corcova que apresenta uma forma circular de um quengo careca enterrado no chão, ou de um cuscuz de pedra gigante, um cocão de padre mesmo, assim como se só estivesse descoberto acima das orelhas e das pestanas dum gigante, assentada sobre pedras, como uma bulbosa cúpula com uma abóbada escura jamais completamente visitada, situada, entre a estação construída pelos ingleses, hoje desativada, de um lado; e do outro, um antro de perdição: o clube ferroviário, o maior fuá de antanho num trupé da gota de arrasta-pé, que um dia uma ventania fez tal sucedàneos intrigantes do triàngulo das Bermudas, desaparecer com dançantes e tudo, restando só o chão, a lembrança e um mistério irrevelável até hoje. Dizem que esta sumida inopinada foi esconjuro de uma mãe que teve uma filha descabaçada em noite de forró arrepeado, sem que ninguém aparecesse como responsável pelo coito indesejável. Daí, babau: do sarroviário, nem sinal. Só casebres, matagal e os restos da estação.
Para maior pabulagem dos afetos e desafetos, ao longo da extensão desse monolítico cocão, constata-se inúmeras inscrições, complicadas e inexplicáveis, impressas na parte visível dessa pedra ilustradíssima - já que a parte interna jamais fora desbravada -, levando estudiosos, aos muitos, identificarem algumas, como o desenho de uma máscara de elmo da Nigéria; um tabuleiro de adivinhação ioruba; um escorpião de capacete; pênis e pênis e pênis voadores; vaginas e vaginas cabeludas; um crànio de mesossuquiano cretáceo; sílex em forma de pendúnculo; pictografias, descrições e gravuras rupestres; petróglifos; um archaeopteryx; um ET que mais parecia o Artaud de Dubuffet - e que, com certeza, deixou seu autógrafo por toda pedra, nuns garranchos indecifráveis -; umas figuras que mais pareciam a Vênus de Lespugue; enfim, uma variedade de inscrições insólitas jamais interpretadas por curiosos ou homens de ciência, que mais pareciam superposições de escritas com desenhos, maior seboseira mesmo. Pior que porta de banheiro público!
Pois bem, dado, depois de umas quinhentas cercas derrubadas, depois de umas duas mil bravatas ineivadas, depois de muita lengalenga desproposital, como marco zero local, pelo advento de haver surgido do nada esse que seria denominado de Cocão do Padre, assim de repente, sem mais nem menos, naquele lugar, ninguém sabendo ao certo se emergira das entranhas da terra por obra divina, se construída por seres exterrestres, ou se obra de puro acaso. Mais dizem tratar-se de um meteoro que, sem ter o que fazer na sua rota estelar, despencou lá de cima com o maior estardalhaço, findando enterrado naquela localidade. Peiticam mesmo que ser humano é que num foi, batem o pé na insistência.
Essa controversa aparição, representava para os fiéis o dólmen da salvação, onde praticavam o batismo, a remoção dos pecados reincidentes e lavagem de culpas, almas e corpos. Já para os amantes engalfinhados, era o menir das libidinagens, onde os marmanjos levavam suas assanhadas vítimas para sapecarem peiadas muitas. E para o resto, um totem, onde tudo podia acontecer: se curar, bater as botas, trupicar, se envultar, renascer, se atolar ou mesmo perder o juizo.
Sabe-se que de dia era sagrado; de noite, profano. E se qualquer mulher que de lá se aproximasse, ia sentindo logo um fuviamento nas partes pudendas, chegava minar de desejo, endoidando arreganhada e findando por se lavar a choca para acalmar-se com as águas cristalinas, o que era pior, saía doida para se atrepar num raçudo prá-te-vai, amolegado até umasoras sem descanso.
Óxe, reafirmam como se fosse uma pinóia: quando macho enxaguava o pingulim naquela pingueira na hora de tirar água da rótula, o bocó ficava de pau duro só arreando a crista depois de três enfiadas boas de fudelança nas perseguidas sedentas. Era comum, por isso, encontrar por ali caçolas, cabaços e pregas na trepada que vadiava pelas imediações, tome cipoada macha.
Muitos que se encangaram furtivamente nas suas mocréias construíram sólido tálamo com elas, em cerimónia ali mesmo realizada, hoje, testemunham, casais felizes para sempre.
Pois bem, como tudo que é bom dura pouco, tudo ia indo muito bem - se é que uma tronchura dessas pode ser de boa procedência -, até que um dia, a brabura do bispo, acoloiado com o delegado e o prefeito, resolveu tomar pé da situação, apropriando-se daquelas cercanias e suspendendo todo tipo de cerimónia ritualística, safadeza descarada, juramento de promessa, petição de cura, insolências populares e todo e qualquer tipo de menção em suas imediações. Era que tava havendo muita gritaria de apóstolos, de benzedeiros, de enroladores políticos, de num ter quem aguentasse mais passar nem por perto de tanto espetáculo, todos ao mesmo tempo, cada um mais barulhento que o outro. Bafafá acabado eis que, parece que castigo do céu, a fonte secou de nunca mais brotar um só pingo d água. Foi tanto ohohohohohohoh! de não se encontrar a menos plausível explicação. Todo mundo de olho abuticado buscava desvendar o mistério. Restou mesmo só a pedra no cenário, mais nada. Quem se aproveitou, aproveitou. Quem num se aproveitou, num aproveita mais.
Quando tudo se apaziguou, de repente, a pedra voltou a derramar de suas entranhas aquele manancial hídrico de chega inundar a cidade, maior aguaceiro. Enchente de nego ficar atrepado no sino da igreja. Tudo era demovido por força das águas: casa, hipocrisia, tranqueiras, vergonha, crenças e rixas.
Tres dias depois, dava de secar por anos sem dar menor sinal de vida, descansando. Essa sua intermitência já virou teses e mais teses de doutorado, chegando-se a conclusão que se tratava da mestruação regular da pedra, a ponto de curar uns e empestar outros.
O que se sabe é que ela está lá e ninguém tem a mínima idéia do que fazer com ela: se desenterra, se escava, se explora turisticamente ou se deixa prá lá. Eu, hem?

© Luiz Alberto Machado. Direitos reservados.

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