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Contos-->CONTO DE FADO -- 04/08/2002 - 19:29 (Walter da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
CONTO DE FADO

Há dias nem se falam. Cruzando-se em casa, recantos e espaços cujos tamanho e dimensão, se agigantam, inversamente a eles. Comemoração frustrada aquela dos 10 anos de conhecimento, absorção, paixão solene. Leitora de Clarice, vem do escritório e aloja-se nela, página a página, palavra por palavra. Confundira o irreal com esse tédio amorfo, inexplicável, quase depressivo. Clarice está ali, segundo sua própria ilusão, irrefletida. Ele completara os quarenta. Disse, manhã dessas, continuaria solerte, irônico, dono do nariz, impróprio, para alguns. A carraspana do domingo à tarde, alongou-se demais durante a noite, proporcionando uma “puta ressaca como punição de Baco”, em suas vertentes palavras. Esbarram-se na circulação do apartamento eventualmente. Do escritório, ligaram duas vezes e, fanhosa, a secretária dessas duas décadas, supusera tudo, menos uma abrupta separação, enjôo, encheção de saco, o que quer que seja...
Ligara duas vezes, celularmente. Da primeira, ele falara algo, bocejando: a secretária do alto de seus setenta anos, completos na véspera da rixa, tentou decodificar-lhe os anseios, só que, do bocejo, não deduzira nada.
São estranhos um com o outro. Como que “na deles”, aguçando ainda mais este tipo de ressentimento quando se supõe amar. No recente Kièslowski, aprendera, quase sem querer concordar: “amar é renunciar à liberdade”. Mal soubera, durante todos esses 40, ditos bem vividos, que a liberdade é e pode muito bem continuar sendo uma arma traiçoeira. Conhece-lhe, já se vem conhecendo, sua amarga culatra... Da outra vez, a loura, como um frasco de perfume fraudado, à custa do sorver desse vinho francês legítimo, proporcionara resultado pouco salutar.
O apartamento apequena-se em suas presenças e o cheiro exalado de cada um, perturba o outro, incontinenti. Ele assistiu durante a madrugada, à toda “La Traviata”, no vídeo laser, que lhe emprestara Guga, o amigo de infância, enquanto estivesse viajando, a serviço, 20 dias. “Follie! Follie!”... repetiu umas trinta vezes somente essa ária. Algo feito uma alusão intempestiva ao atual estado de coisas... das coisas.
Sábado, seis e quarenta, invadindo o quarto da suíte. Resolvera dormir no quarto de hóspedes, porque ali instalara o home theater, provisoriamente, quase completo, com aquela gorda comissão dos negócios auferidos no Mercosul. Uruguai para cá, Argentina para lá. Alguma grana, a fim de usufruir tudo o que a religião do capitalismo oferece a um bem sucedido administrador de empresas. Levanta a contragosto, é muito cedo. Cedo demais para se dizer bom dia... Procurou o cigarro, tateando. O quarto está uma zona, mesmo porque, não é quarto coisa nenhuma. Apenas um arremedo de alguém, quando se separa de corpos, seja ou não eventualmente. Mas o cinzeiro, este, pleno do sarro do FREE. Faz uma cara de quem não gosta, mas apenas do sarro do cigarro, after. Põe o robe, presente dela, e sai pulando, vestindo-o sem jeito. A luz da circulação ficara acesa e sobre o aparador, aprisionado ao peso do jarro de flores, um bilhete em papel amarelo, impresso em laser, com os nomes dos dois amantes irrecuperáveis. Ajeita o robe cujo cinto se prendera embaixo do tapete e abre o bilhete: “Terá sido mesmo o destino? Adeus”. Adrenalina percorre seu corpo e espanto. Levou o bilhete até o banheiro, colou-o sobre o espelho e começou a cantarolar a mesma ária da noite anterior: “Follie!... Follie!... delírio vano é questo!”.

WALTER DA SILVA
Olinda Pernambuco 1998
Extraído de “22 CONTOS DE RÉS”.®




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