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Contos-->O Homem de Cinco Corpos -- 02/01/2000 - 19:55 (Ciro Inácio Marcondes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Caminhavam os dois lentamente. Passavam por entre as ruelas estreitas e cinzentas da cidade, por entre os escuros e sombrios guetos, cobertos de grades e pichações. Andaram por um bom tempo. Não era fácil encontrar o que procuravam. A princípio, eram apenas rumores, boatos. Porém, depois de algumas conversas e evidências, ficou certa a existência do lugar. Chamavam aquilo de “Jezebel no país das maravilhas”. Uma piada, é claro. Era uma das muitas piadas e rumores sobre o lugar. Um lugar onde tudo aquilo que havia de sombrio e negro no mundo estava hospedado. E os dois prosseguiam, olhando algumas vezes para a cadernetinha de anotações, outras para o mapa.
O primeiro deles era um homem alto, de feições elegantes. Um homem bonito. Vestia apenas uma jaqueta azul e jeans preto. O segundo homem, mais baixo e desarrumado, era loiro, a barba por fazer; mais velho. Estava segurando o mapa. A noite banhava as catedrais e prédios do lugar. Era um canto muito sombrio da cidade. Havia ali pelo menos quatro igrejas, quase todas compostas de seguidores fanáticos. Mendigos desesperados. Era um bairro realmente assustador, principalmente à noite. Eles sabiam que ninguém morava mais por ali desde a invasão dos indigentes, há dez anos. Talvez por isso que eles acreditavam na veracidade das informações que tinham recebido.
- “Homem de cinco corpos”. Que diabos será isso? - Perguntou o loiro, quebrando um longo silêncio.
- Um super-herói, eu acho.
- Estranho. Estranho nome prum super-herói.
- Sim... mas a gente não foi pago pra especular a respeito disso, certo? Vamos pegar logo esse cara a sair daqui. Dizem que os mendigos não gostam muito de gente normal por aqui.
- E se o tal homem de cinco corpos quiser revidar? - Continuou o loiro.
- ...
- Hein? - Persistiu.
- Bem... ele é um herói, certo? Por que ia querer revidar alguma coisa na gente?
- Sei lá...
- De qualquer forma, eu trouxe uma arma...
- Ótimo.
Era impressionante a imensidão do lugar quando percebia-se que não havia ninguém ali. Tudo parecia realmente amplo e espaçoso. Eles olharam para uma grande e para uma iluminada quadra de basquete, praticamente intacta, que pairava em frente e eles. Olharam bem, subiram as arquibancadas. Era aproximadamente meia noite. Preferiram vir à noite, para não levantar nenhuma suspeita.
- Sempre ouvi falar desse lugar, mas nunca imaginei que fosse assim. É muito estranho. Por que as luzes da rua continuam ligadas se ninguém vive aqui?
- É que essas luzes vêm do governo, acho. É tudo programado em rede, acho. Como é que eles iam desligar apenas uma parte da cidade?
- Não sei... deve ser por isso mesmo. É muito estranho mesmo. Essa imensidão toda... está um pouco frio. Fica um clima sinistro. Parece coisa de filme.
- Pois é, mas a gente tem que achar o tal herói antes que amanheça. Não quero que minha esposa fique preocupada.
- O que é que um herói faria por aqui? Não há o que proteger!
- Sim... não sei. Talvez ele esteja prendendo os mendigos. Boa parte deles rouba. O estranho mesmo é que a gente ainda não viu nenhum deles. E, se invadiram a ponto de todo mundo abandonar o bairro, deviam ser numerosos. Entretanto, não tem nem sinal de mendigo nenhum aqui. - Disse o moreno, pensativo. Os dois estavam, lá parados no meio da quadra, sem saber muito o que fazer. As coisas pareciam estar andando para o lado errado. Estavam procurando pelo homem de cinco corpos desde as dez da noite, e nada acharam.
Andaram por mais uma hora. A imensidão azul banhada pelas luzes opacas dos lustres tornava o local mais frio. Os becos transformavam-se em verdadeiras cavernas, sempre à espreita de um novo alvo. Cheias de morcegos sedentos por sangue. Pelo menos era o que parecia. A história desse bairro sempre foi conturbada. Ninguém sabia ao certo o que havia ali, mas ninguém também tinha coragem de invadir o local. Ninguém exceto nossos intrépidos detetives, é claro. Os mendigos invadiram o local há dez anos. A cidade havia crescido mais que seu limite, e a população de indigentes, vagabundos e desempregados aumentou tanto que eles se uniram e invadiram um bairro inteiro. Eram milhares deles. Surpreendentemente, o problema acabou por ser solucionado. Poucas pessoas passaram a freqüentar o antigo bairro da Esperança de dia. Nunca ninguém vinha ali à noite. A princípio, pelo medo de ser morto ou devorado pelos mendigos (afinal, de onde vinha a comida que os alimentava e os fazia sobreviver?). Depois, por simples esquecimento e isolamento do bairro. A cidade cresceu tranqüila. O governo não tomou providências. Tudo se encaixou perfeitamente. Foram construídas algumas avenidas contornando o bairro. O Esperança foi esquecido. Não mais fazia parte da cidade.
- Onde estão os mendigos? Pô... onde é que eles estão? - Perguntou o moreno.
- Não sei! Porra, como eu vou saber? Devem estar mortos. Como eles sobreviveriam esse tempo todo sem comprar comida? A comida que eles acharam no bairro com certeza acabou, ou apodreceu.... - Respondeu o loiro.
- Talvez eles tenham comido uns aos outros.
- Talvez. - Repetiu o loiro, apreensivo. De repente, olhou firme para frente: ali estava algo que não esperavam ver e que não estava no mapa.
- Olha aquilo. - Apontou o moreno.
- Estou vendo. Vamos lá. - O que se seguia era uma enorme vala; uma descida inclinada de uns trinta metros toda de concreto. No final da descida, muitas luzes de fogo podiam ser vistas.
Desceram a vala com cuidado, para não despencar rolando concreto abaixo. Encontraram no final um campo gigantesco, do tamanho de uns cinco de futebol, todo rodeado de tendas e latões cheios de fogo. Porém, nenhuma viv’alma apareceu para recebê-los. Estava tudo vazio. Pelo menos era o que parecia. A lua cheia iluminava o local, e fazia sua atmosfera parecer mais densa, gasosa. Um cheiro forte de peixe pôde ser sentido de dentro de uma das tendas.
- Meu Deus... você... você está sentido o cheiro? - Perguntou o moreno.
- Sim. Aqui deve ser onde os mendigos moram. Bem... é o nosso serviço, certo? Vamos lá falar com alguém que esteja naquela tenda do cheiro e perguntar sobre o Homem de Cinco Corpos.
- E se eles não nos quiserem aqui?
- Bem... nós temos armas, certo? Somos detetives pra quê? Além do mais, nós somos enviados do presidente. Se mexerem conosco, estão mortos.
- Acho melhor não contarmos muito com isso. O que o Presidente iria querer com um super-herói chamado Homem de Cinco Corpos?.
- Não sei, mas vamos lá. Viemos até aqui pra isso, certo? - Desafiou o loiro, inquisidoramente.
- ....
- Certo?
- ... ... ... ... Certo. - Respondeu o moreno, com a mão no coldre da pistola.
Aproximaram-se lentamente da tenda. O cheiro, que parecia uma mistura de bacalhau e enxofre, ficava cada vez mais forte. O moreno, na frente, abriu a tenda pelos lados. Tudo o que viu foi um menino de capuz, de costas, remexendo uma grande panela. O cenário dentro da tenda era muito peculiar: um botijão de gás, ligado a um pequeno forno cuja parte de cima estava ocupada pela panela. Uma cama de casal do outro lado, e uma televisão, desligada. O menino não pareceu ter notado a entrada do detetive. O cheiro se tornara ainda mais forte.
- Olá menino. Qual o seu nome? - Disse o moreno, nervoso. O menino, surpreso, virou-se rapidamente. Ficou olhando, espantado, para o detetive, por alguns instantes, antes de responder.
- Olá. O que você quer aqui? - O tom de voz era grave e grosso. Definitivamente não era a voz de uma criança. O detetive moreno, seguido pelo loiro, que também acabara de entrar, iluminou então a cara do garoto com a lanterna. Uma bomba. Não era realmente um menino. Tampouco um jovem. Era um velho, de pelo menos sessenta anos.
- Santo Deus.... - Exclamou o moreno.
- ... - O loiro, espantado, não conseguiu dizer nada.
- Bonito, não? - Disse, sorrindo sarcasticamente, o indivíduo que ali se apresentava aos detetives.
- Quem... o quê.... ? - Tentou formular o moreno.
- Bem... percebe-se que vocês realmente não são daqui. - Disse o velho, se aproximando ainda mais. A visão tornou-se então ainda mais aterradora e chocante: o corpo dele era miúdo, como o de uma criança magra de seis anos. Porém, sua fisionomia era de um adulto já de muita idade. Era realmente algo espantoso. Seus cabelos (pelo menos os que podiam ser vistos, já que estavam cobertos pelo capuz) eram todos brancos.
- Bem... venham comigo. Já vi que teremos uma longa conversa. Os que tiverem estômago fraco, não precisam me seguir. - Continuou o velho.
- Não estamos interessados nisso. Representamos a presidência da república e viemos atrás de um super-herói que vive por aqui. - Disse o loiro, já com a calma recuperada do choque inicial.
- Hhahahahahahhahahaha. - Gargalhou o velho. Era uma risada grosseira e alta. - Vocês estão procurando o quê?
- Um super-herói. O nome dele é Homem de Cinco Corpos.... o que quer que isso signifique. - Respondeu o moreno. O loiro encarava o velho com uma expressão cheia de raiva.
- O que quer que isso signifique..... - Disse o velho, falando consigo mesmo.
- E então? - Prosseguiu o loiro - Você vai ou não vai nos levar até esse tal Homem de Cinco Corpos?
- É claro que vou. - Respondeu o velho.
- E está esperando o quê? - Disse o moreno, já também um pouco enraivecido. - E vamos sair dessa tenda nojenta que esse cheiro está me causando náuseas.
- Certo. - Disse o velho, olhando para a panela, que soltava fumaça - Depois eu como meu peixe. É comida pra meses, afinal.
O velho os conduziu pelo caminho. Passaram por quase todas as tendas, mas nenhuma parecia habitada. Pelo menos não no momento.
- Por que vocês acharam que encontrariam um super-herói aqui? - Perguntou o velho, de repente, enquanto faziam o caminho.
- Foi a informação que recebemos. Disseram que esse tal Homem de Cinco Corpos estava aqui. - Respondeu o moreno.
- Super-Heróis aqui, hmmm? Isso não é muito significativo. Se bem que há muita gente com poderes extra-humanos aqui. - Disse o velho.
- Verdade? E onde estão? São heróis? - Perguntou o moreno.
- Por que o governo não enviou um herói de verdade, como o Super-Humano, atrás do Fred em vez de vocês? - Perguntou o velho, não dando muita atenção para a pergunta anterior dos dois.
- O quê?
- Sim. Sabe-se que Jezebel é um lugar perigoso. Por que não mandaram alguém mais capacitado?
- Está duvidando de nossa capacidade? - Questionou o loiro.
- É claro! Onde está a escolta policial, as armas...? - Disse o velho.
- Nós temos armas aqui. - Respondeu o moreno, mostrando a Glock 22 em seu cinto.
- Hmmm.... definitivamente... isso não é suficiente.
- Por quê? Os heróis daqui são tão fortes assim? - Continuou o diálogo o moreno. O loiro apenas observava tudo, calado e desconfiado.
- Os heróis daqui? Hahahaha. Sim. Talvez seja por isso. Vocês devem estar intrigados com minha aparência. Eu pareço estranho para vocês, certo? - Perguntou o velho. O moreno, já mais respeitoso, respondeu:
- Bem... sim. Aliás... se o senhor pudesse, poderia nos explicar a origem dessa.... dessa...
- Anomalia. - Completou o loiro.
- Anomalia... - Disse o velho pensativo. - Claro. Posso explicar. Vocês devem conhecer um super-herói chamado Raio, certo?
- Certo.
- Certo.
- Bem. Eu o conhecia, antes de ele se tornar um herói. Se chama Gerald. Meu nome, pouco importa, mas nós dois trabalhávamos num depósito de lixo nuclear. Éramos empregados de baixo escalão. Aliás... éramos nós dois e mais um sujeito chamado Thomas. Um belo dia, houve um acidente. Provavelmente uma das muitas rixas de Thomas o provocou. Era um cara complicado. Uma das máquina de enterrar o lixo explodiu. Nós fomos altamente expostos à radiação. Gerald ganhou super velocidade e se tornou o Raio. Eu fiquei assim. Thomas morreu dois dias depois. Câncer de pele, pulmão, osso, e tudo o que você imaginar. - Disse o velho, com um sorriso macabro na boca.
- Meu Deus! - Exclamou o moreno. - Então quer dizer que você também tem super poderes?
- Depende do seu ponto de vista - Disse o velho, sorrindo ainda. - Desde o acidente que eu venho encolhendo. Quanto mais eu como, mais eu emagreço. Se eu passar a viver como uma pessoa normal, comendo um prato de comida por dia, eu definho até morrer em dois anos. E eu sinto fome como uma pessoa normal, isso que é horrível. Se não comer, eu morro. Se comer, morro também.. Aquele peixe que vocês me viram fazendo será minha única refeição essa semana. Se você considerar isso super poder, eu tenho um.
Os dois olharam perplexos para o velho. A história parecia inacreditável. Ficaram calados, seguindo-o por uns cinco minutos. Andaram mais um pouco, até se aproximarem de uma grande fogueira. Ao longe, podia-se ouvir vozes, e ver várias silhuetas. Tinham finalmente chegado ao lugar onde os mendigos se reuniam. Era mais um aglomerado, só que em vez de tendas, desta vez eram pequenas casas, provavelmente construídas depois da invasão dos indigentes. Um música antiga - uma balada de Frank Sinatra - também podia ser ouvida ao fundo. Parecia umas espécie de festa, celebração, ou algo assim.
- Chegamos. Aqui, vocês poderão conhecer os outros heróis de Jezebel. - Disse o velho.
- Ahhh.... - Suspirou o moreno. Estava impressionado com a magia e atmosfera do lugar.
- Ah, sim - Disse o loiro ao velho, depois de muito tempo apenas ouvindo a conversa dos outros dois indivíduos. - Qual o seu nome?
- Me chamam de Magro. Vocês podem me chamar assim também. - Respondeu ele.
Assim que chegaram ao aglomerado, os dois detetives notaram algumas estranhezas. Coisas esquisitas nas pessoas. Olharam rapidamente para cada um que estava ali, dançando ao som da música e se servindo em uma grande panela que ficava no centro da fogueira. Parecia realmente uma reunião de mendigos. Mesmo assim, havia algo de diferente neles. Assim que entraram na casa onde o velho indicou, entenderam o porquê.
- Este é Bill. - Disse o Magro. Bill era um menino muito pequeno, deitado numa pequena cama. Parecia frágil e inofensivo.
- O que ele tem? - Perguntou o moreno.
- Um super poder. - Disse o velho, seguido de mais um risada sarcástica.
- Qual? - Perguntou novamente o moreno, com um olhar de pena.
- Você conhece a super força do Super-Humano, certo?
- Claro.
- Ele possui o mesmo poder, só que inversamente proporcional. Hahaha. Inversamente proporcional, entende? - Disse o velho, rindo mais uma vez.
- Como assim?
- Bill tem um negócio que nós chamamos de super fraqueza. Ele é tão fraco, mas tão fraco, que não consegue nem se mover. A única coisa que ele mexe são os olhos. Sua mandíbula é paralisada. Ele não consegue falar. Nós injetamos alimento na veia dele. É isso que vou fazer agora.
Os dois fizeram mais uma vez uma expressão de horror. Como poderia haver super poderes como aqueles? Heróis como aqueles? “Heróis? Eles não são heróis! São condenados”, pensou o moreno. O velho injetava algum composto no sangue do menino, quando o loiro perguntou:
- Mas... por que vocês o mantém vivo, como um vegetal? Acham que ele quer viver assim?
- Vocês se lembra quando o Super-Humano perdeu os poderes?
- Sim.
- Quem sabe Bill um dia perca seus poderes também? - Respondeu o velho. O loiro pôde apenas lançar um olhar vazio, meio desolado. Os três ficaram e silêncio por mais um tempo, quando o velho se virou. O moreno, então, perguntou:
- Então quer dizer que só há heróis.... gente... como vocês por aqui?
- Aqui é o país das maravilhas, rapaz! - Respondeu o velho. - Vamos logo ver o Fred.
- Quem?
- O Homem de Cinco Corpos.
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Antes de chegarem à casa do Homem de Cinco Corpos, Magro teve que fazer algumas outras visitas, o que fez com que os detetives passassem a conhecer alguns outros cidadãos do aglomerado. Conheceram, por exemplo, Mark, um homem que possui o super poder de proferir cada palavra que sai de sua boca em uma língua diferente. Ninguém simplesmente entendia nada do que ele falava, porque em cinco minutos ele falava mais de trezentas línguas diferentes, incluindo dialetos alienígenas. Conheceram também Graziela, uma jovem de dezessete anos, muito bonita, que possui o poder de ficar grávida uma vez por semana. E parir uma vez por semana, é claro. O triste da história é que nenhum dos bebês de Graziela viveu mais do que dois dias. Tiveram também o prazer de conhecer Pierre, que possui a carne, ossos e pele elásticos. Porém, ao contrário do super-herói Mr. Látex, Pierre não possui controle do seu corpo, e por isso é maleável como uma liga de borracha. Não consegue ficar em pé, nem se movimentar de forma coerente. Precisa ser carregado por maca ou cadeira de rodas. As poucos os detetives foram se habituando com a atmosfera do local, conhecendo outros heróis, cada um com uma deformidade horrível, pior do que a outra. O local, para ambos, parecia repulsivo. O loiro estava com uma raiva contida que não conseguia expressar. Uma espécie de vazio, por não poder fazer nada. O moreno simplesmente não sabia o que fazer.
Depois das visitas do Magro, ele foram finalmente conhecer o Homem de Cinco Corpos e realizar o verdadeiro objetivo. Estavam exaustos, é claro. Aquilo era demais para apenas um dia. Magro bateu na porta.
- Quem é? - Perguntou uma voz feminina que veio de dentro da casa.
- Sou eu, Jezebel. - Respondeu o velho. Os dois detetives se entreolharam. A porta se abriu, e mais uma figura inacreditavelmente grotesca surgiu diante deles. Parecia um pesadelo vivo. “Meu Deus, meu Deus.... me tire daqui.... que diabo de lugar é esse? Me tire daqui....” pensou o moreno, aflito. O loiro engoliu a seco.
- Céus... - Disse ele, para si mesmo.
- Olá. Quem são esses, Magro? - Perguntou Jezebel. A princípio, o susto inicial se dava pelo fato de ela não ter cabeça. O primeiro choque quase sempre era causado por isso. Não havia nada além do pescoço, que era um toco de carne e pele, como um tronco de árvore cortado. Porém, um ou dois segundos depois, o verdadeiro horror era revelado: Abaixo dos seios velhos e gastos, havia uma enorme boca disforme, e dois olhos esbugalhados, sem cílios ou mesmo sobrancelha, os encaravam. A cena era apavorante, e parecia saída de um filme de terror classe B. Aquela, era Jezebel. No país das maravilhas.
- São detetives. Estão atrás do Fred. Bem... esta é Jezebel. - Disse Magro, abrindo um sorriso perturbador.
A reação do loiro foi olhar intensamente para Jezebel. Não conseguia tirar os olhos daquela forma aberrante. E ela apenas espiava, sorrindo com boca grotesca que ficava no lugar onde deveria estar seu intestino. Continuou olhando perplexo. Foi Jezebel que quebrou o silêncio:
- Facilita bastante no sexo oral.
O moreno não agüentou. Virou-se, e vomitou no chão. Jezebel e o Magro puderam apenas rir da cena. Riam desesperadamente. O loiro ainda estava chocado. Não conseguia proferir uma só palavra. Fez uma cara de nojo e revolta.
- Hehe. Hoje foi uma dia pesado para esse belo rapaz. - Disse o magro.
- Ajude ele, magro, vamos! E você? Vai ficar aí parado mesmo? - Disse ela, primeiro a Magro, e depois ao loiro. No momento em que Jezebel virou-se para ele, tomou um susto. Deu um salto pra trás. Parecia que uma barreira invisível o impedia de se aproximar de Jezebel. Não conseguia mais dirigir o olhar para ela, e nem caminhar diante dele, tamanho era seu nojo.
- Ande, homem! Onde está a coragem que os trouxe até aqui? - Disse o Magro, levando o moreno até a cozinha, para ele poder tomar um copo d’água.
- Onde está o Homem de Cinco Corpos? - Perguntou o loiro. Foi a única coisa que conseguiu dizer.
- Já vamos levá-lo até ele. - Respondeu Jezebel. - Espere apenas Magro voltar com seu amigo de estômago fraco.
Houve mais um momento de silêncio. O loiro ficou parado, criando coragem e depois olhando fixamente para aquela figura grotesca, sem nada dizer. Sua expressão era ainda de puro espanto. Jezebel também olhava de forma desconfiada. Às vezes sorria, de forma desafiadora, mas também parecia sentir um clima anômalo naquela hora. Então, de uma hora para a outra, o loiro começou a chorar. Colocou as mãos aos olhos, limpou com a blusa rapidamente. Não dizia nada, nem soluçava, mas parecia inquietantemente incomodado com aquilo. A situação o mordia, o entristecia. Ele sentiu nojo, revolta. Finalmente, perguntou:
- Como.... como é que seu sistema digestivo.... respiratório... como é que seu metabolismo continua certo dessa forma? COMO você vive? Isso é impossível... impossível! - Disse ele, variando a voz em tons agudos e graves.
- São os super-poderes, rapaz. - Respondeu ela, muito séria. - Alguns servem para lhe conceder grandes glórias, feitos fantásticos. O problema é que a televisão não mostra o outro lado. Sabe porque ninguém vem aqui? Por causa de nós. Eles sabem que nós vivemos aqui. A estimativa é que existam dez vezes mais “heróis” com poderes completamente inúteis ou prejudiciais a si mesmos do que heróis como os que você está acostumado a ver nos noticiários salvando pessoas. - Mas... - O loiro havia finalmente perdido o controle. Seus olhos estavam vermelhos e imersos em lágrimas. - Eu sei. Parece injusto. Ninguém disse que é justo. - Disse ela, sorrindo afavelmente com sua cara grotesca. O loiro preferia falar olhando para a cabeça que não existe em cima do pescoço. Se recusava a olhar para aquilo. - Porém, se te serve de consolo, eu já disse para o povo do país das maravilhas que vou doar meu corpo a um hospital para os médicos poderem estudá-lo. - Como isso aqui começou? Meu Deus, ninguém sabe que vocês estão aqui! E a invasão dos mendigos foi há apenas dez anos! Onde estão os mendigos? - Muita coisa mudou por aqui desde a invasão dos mendigos. - Disse Jezebel, pensativa.
- Você estava aqui já na invasão?
- Sim. Fui eu quem criou esse lugar.
- Mesmo? Isso aqui é bastante grande...
- Sim. Na verdade, junto com os mendigos vieram alguns super-heróis como nós. Você, sabe, nós... os heróis.
- Acho que sim... - Respondeu o loiro, com a cabeça baixa.
- No começo foi tudo muito fácil, já que as casas estavam vazias, e podíamos pegar comida, divertimentos, tudo era de graça para nós. Mas a comida apodreceu com o tempo. E o governo cortou nossa energia dentro das casas. Não sei porque os postes continuam iluminando as ruas. Mas tudo passou a ficar estranho e difícil para nós. Sem luz não podíamos ler, nem assistir televisão, nem nada. Tivemos que fazer uma espécie de organização tribal, de ajuda mútua. Tivemos que sobreviver por nós mesmos. Foi daí que nasceu nosso senso de união. Sem união, jamais sobreviveríamos aqui. Acho que contamos hoje mais de dois mil.
- Você manda aqui?
- O lugar tem meu nome! É uma homenagem carinhosa dos outros ratinhos.
- Ratinhos?
- Sim. Os outros filhotes. Os filhos de Jezebel.
- Você tem... filhos?
- Não, seu tolo! Nunca consegui ter filhos, apesar de já ter tentado muitas vezes. Os filhos de Jezebel são todos os habitantes do país das maravilhas. São as maravilhas, entende? São as cartas de baralho, os gatos, as rainhas... - Disse Jezebel. O loiro ficou pensativo. Imaginou todas aquelas coisas... aqueles ratinhos, vivendo em comunidade. “Deve ser estranho”, pensou.
- Mas - disse ela, continuando - com o tempo o lugar passou a ser agradável para nós. No começo ainda vinham muitos policiais e pentelhos. Tínhamos que nos livrar deles muitas vezes. Hoje isso é muito pouco freqüente. Jezebel foi esquecido... ou é temido demais. Ninguém mais vem aqui. Por isso estou até um pouco surpresa com a sua presença e a de seu outro amigo detetive. Jezebel virou um recanto para aqueles como nós... os super-heróis perdidos. Aqueles que não vêem sentido em salvar a humanidade, ou não podem fazer isso.
- Mas como vocês podem ser tantos assim? Todos os “heróis” já estavam aqui?
- Não. Claro que não. No começo havia poucos de nós. Mas eu os chamei. Mandei gente na cidade para buscá-los. Hoje somos um reduto.
- Entendo...
Nesse momento o Magro voltou, com o detetive moreno já em melhor estado. Estava sorridente, assim como o Magro. Voltaram balbuciando a respeito da fragilidade das pessoas a coisas estranhas, às coisas que não estão acostumadas a ver.
- E então? Como está esse rapaz, Magro? - Perguntou Jezebel.
- Parece que já melhorou. Disse que está acostumado a ver cachorros e seus donos passeando, garotas de patins andando pela rua, moleques sem carteira batendo os carros dos pais, enfermeiras, advogados, policias, até criminosos muitas vezes, gente ferida, mas não uma mulher que não tem cabeça e fala pela barriga. Repetiu isso várias vezes: “isso não existe no meu mundo... ninguém fala pela barriga”. Hahahaha...
- Certo. O outro aqui está choroso. Disse algumas outras coisas, também. Queria entender meu metabolismo. Depois eu explico pra eles a natureza dos meus super poderes... hehehe... - Disse Jezebel. Os detetives mais uma vez se entreolharam, tristonhos. O loiro já havia recuperado a dignidade. Estava sério, de novo. O moreno ainda estava abatido, e murmurava cabisbaixo algumas coisas que os outros não entendiam.
- Jezebel, onde está o Fred? Estão aqui atrás dele, mas não consigo achá-lo.
- O Fred... ah... Fred vagabundo. Acho que sei onde está. Bem, deixe, deixe. Vá embora, Magro. Vá descansar. Eu levo esses dois até o Fred. Além do mais, eles não vão servir pra nada pra você. - Respondeu Jezebel.
- É... tem razão. Vou-me indo, então. Meu peixe ainda deve estar cozinhando, e vou comer um pouco dele. Até, então, Jezebel. Boa sorte, detetives. Tomem cuidado quando andarem por essas bandas. - Disse o magro, virando-se e saindo. Os detetives olharam melancolicamente para aquela figura pequena que acabara de sair, em passo lento, começando a subir novamente o caminho. O moreno virou a cabeça, tentando esquecer tudo. O loiro continuou olhando, os olhos cheios, impressionados.
Jezebel fez então um sinal com a mão e eles foram atrás dela, andando também a passo lento, para acompanhá-la. Passaram por alguns becos, encontraram algumas outras coisas esquisitas. O moreno não se agüentou e vomitou novamente quando viram uma criatura grotesca sem inteligência, com cabeça de pássaro e corpo de homem, que não fazia nada além de bicar e comer lixo do chão. Era o “birdie”. Andaram por mais alguns momentos, comeram um pouco numa tenda onde estava sendo distribuída uma outra sopa, de ingredientes desconhecidos, que mais parecia um grude bege, de gosto amargo. Jezebel comendo era algo simplesmente deplorável. Os dois evitam olhá-la e, por mais que se esforçasse, evitavam falar com ela também. O estômago de ambos continuava virado. O loiro escondia, mantinha-se sério, mas o moreno reclamava, resmungava o tempo inteiro. A visita havia sido um choque, sem dúvida alguma. Pouco depois, finalmente Jezebel encontrou o homem de cinco corpos. Foi num beco escuro, onde uma lata de lixo parecia ter sido esparramada pelo chão.
- Aí está ele. Fred, acorde. - Disse ela, olhando para um dos muitos homens que estavam deitados no beco, dormindo. Estava bastante escuro.
- Qual deles é o Homem de Cinco Corpos? - Perguntou o moreno.
- Fred, seu vagabundo! É hora de diversão! Acorde! - Disse Jezebel, chutando o mesmo cara. Este estava nú. Um corpo peludo, horrível. Mas nada parecia mais horrível depois do que eles haviam visto naquele dia.
- Tem certeza que esse cara é um super-herói? - perguntou o Moreno.
- Fred! Acorde! - Disse ela, desta vez desferindo realmente um chute forte no traseiro cabeludo do sujeito. Então ele começou a se mexer. E, junto com ele, todos os outros homens que estava deitados no beco, ao lado dele. Então, no meio do lixo que se acumulava no beco, a cabeça do dele saiu. E não era comum. Era uma cabeça com cinco pescoços. A princípio, os detetives custaram a entender o que se passava por causa da falta de luz, mas, aos poucos, foram vendo porque aquele homem era chamado de “Cinco Corpos”. E começou a se levantar. Todos os corpos juntos, de uma vez, como se fosse uma máquina que rodava, com cada peça realizando sua função. Foi algo simplesmente inacreditável, mais uma vez. Aquilo não era apenas um homem. E não havia mais de um homem ali. Todos aqueles corpos pertenciam ao mesmo homem. À mesma cabeça. Eram cinco corpos, grudados na mesma cabeça. O moreno, paralisado, deixou a armar cair no chão, sem ao menos notar o que se passava. O criatura se movimentava lentamente. Seus cinco corpos, seu dez pés, se movimentavam em sincronia, como se fosse uma aranha, ou algo parecido. E ele saiu do beco, para respirar, ou algo assim. Andava em círculos. Parecia uma multidão inteira, em volta de uma só cabeça. Jezebel foi atrás, mas os dois não conseguiram andar. Não conseguiram se mover. O criatura... o Homem de Cinco Corpos, era demais. Era algo grandioso, mas ao mesmo tempo profundamente grotesco. Algo que jamais haviam imaginado.
- Ah! - disse ele pela primeira vez, já fora do beco. Sua voz era normal. Parecia a de um garoto. Seu rosto, barbudo, era perfeitamente normal. Havia um pescoço normal, também, que se ligava ao corpo principal, que parecia também um corpo normal, vestido com alguns trapos. Ao redor do pescoço principal é que se ligavam os outros quatro corpos, dois de cada lado. Mais dois deles vestidos com trapos, um trajando uma calça jeans, e dois nus, feridos, com alguns bichos, como lagartas, correndo pelas feridas. O corpo peludo que tinham visto era um desses. Mancava, movimentava os braços, mas o Homem de Cinco Corpos não parecia sentir as feridas. Um dos corpos era negro. Era segurado por um pescoço pequeno, desproporcional, grotesco. Vestia trapos, também. Algumas pernas ficavam inclinadas, não andavam direito. A mais da ponta, de cada lado, ficava pendurada no corpo, e não encostava o chão.
- Quem são esses, Jezebel? - Perguntou ele, direcionando a ela uns sete dos seus dez braços.
- São os detetives que vieram atrás de você. Você deve saber do que se trata. Vagabundo... - Disse ela, repreensora. Fred fez uma cara pensativa, e depois disse:
- Não, não me lembro de nada. Não fiz nada. Não faço a mínima idéia de porque alguns detetives estariam me procurando. Na verdade, você deve saber, não tenho feito muita coisa além de comer e dormir. Me desculpe, Jezebel, mas acho que preciso de descanso. Já trabalhei demais por aqui.- Disse ele para Jezebel. Os detetives se aproximaram, percebendo o tom amistoso da criatura.
- Bem... então você é o Homem de Cinco Corpos, o herói... - Disse o loiro, tentando ainda criar coragem e parecer sério.
- Sim, sou eu. O que querem comigo? - Disse ele.
- Você precisa vir conosco. Ordens do presidente. Parece... que ele precisa de heróis, ou algo assim. - Continuou o loiro.
- Impossível. Seu presidente deve estar louco. Não posso ir com vocês. Não posso andar entre vocês.
- Não interessa isso. Não temos nada a ver com isso. São ordens do presidente. Não posso fazer nada. Venha. - disse o loiro, confiante, estendendo a mão ao Homem de Cinco Corpos. Parecia ter vencido o medo. Queria logo acabar com aquilo, cumprir a missão, tomar um banho quente e jamais voltar àquele local.
- É? E onde isso está escrito? Me mostre! Não posso sair daqui e nem quero. Me deixa em paz... - Disse o Homem de Cinco Corpos, virando a cara.
- Não temos um contrato formal, mas posso garantir que isso é sério.
- Garantir? Não quero sua garantia! Não saio daqui, cara, não adianta! Não dá. - Disse ele, meio rebelde.
- Não há contrato formal? Você me disse que tinha um encadernado todo com o detalhamento da missão... e disse que já sabia tudo de cabeça, de tanto ler... - Disse o moreno, olhando intrigado para o loiro.
- Escute! Tem vergonha de servir seu país, seu próprio presidente? - Disse o loiro ao Homem de Cinco Corpos, se aproximando mais, ignorando o moreno.
- Servir meu país? Tá doido? O que é que essa merda desse país fez por mim, hein? Eu prefiro viver aqui, onde não tenho que me preocupar em andar fantasiado. Em alguns casos aqui, isso é até possível, mas eu não posso viver numa sociedade normal, seu bostinha! Quem você pensa que é? Se eu quiser, te arrebento com um terço da força que tenho! - Disse o Homem de Cinco Corpos, bem mais enfurecido, olhado para ele.
- Bostinha? Quem você está chamando de bostinha, sua aberração escrota e nojenta? Olha pra mim assim de novo e eu estouro sua cara! Sem cérebro quero ver você movimentar todos esse braços! - Respondeu o loiro, desta vez realmente encarando-o, apontando a arma para ele. Havia pegado a arma no chão do beco, quando o outro a largou. O moreno ficou atônito.
- Está louco? Apontar a arma pra ele? Ele só veio com a gente por causa da missão! - Disse o moreno, tentando se manter calmo, para o loiro. Jezebel apenas assistia a tudo, rindo um pouco, sem se importar com a situação.
- Estou cheio disso, ok? Só viemos buscar um super-hérói, que deveria cooperar como herói que é e vir conosco sem falar nada! Mas essa.. essa coisa aí fica criando caso! Estou cheio, tá legal? CHEIO! - disse o loiro, nervoso, ainda apontando a arma ao Homem de Cinco Corpos. Aos poucos, outros heróis começaram a se aglomerar no local, em volta dos três, assistindo a tudo com muita graça. Estavam rindo, muito.
- Cara pra que o presidente ia querer esse cara? Tem heróis melhores que ele na cidade! Vamos deixar como está e dizer pro presidente que procuraremos outro herói pra ele! - disse o moreno, tentando amenizar as coisas. As aberrações ao redor deles não paravam de rir. Gargalhavam sem nenhum remorso da situação ridícula. Parecia que eles nunca tinha visto nada tão engraçado.
- Não! Do que estão rindo, seu bando de merdas? Vocês não são heróis! Não fazem nada que heróis fazem! Eu devia tacar fogo nessa aglomerado imundo de lixo! - Disse ele, apontando desta vez arma para todos, completamente fora de si.
- Além do mais, nós não conseguiríamos falar com o presidente. Nem eu consegui, se quer saber a verdade! A Cindy ia dizer pra ele que somos incompetentes, e seríamos despedidos! Seríamos despedidos! Não conseguiríamos audiência com o presidente. - Disse ele, mirando novamente o Homem de Cinco Corpos, que também não conseguia segurar o riso. Mas ria baixo, sem dizer nada. Havia uma arma apontada contra sua única cabeça.
- O quê? O que a Cindy tem a ver com isso? Você disse que tinha falado com o presidente, que ele explicou a missão, que era uma missão de honra! - Disse o moreno, sem acreditar no que acabara de ouvir.
- Eu tive que mentir pra você, pra poder ficar mais confiante na missão! Na verdade, a Cindy que me passou a missão. Ela disse que recebeu ordens do presidente pra me passar essa missão e levar você junto. Mas, porra, não disse que esse lixo era assim! Achei que só íamos encontrar mendigos! - Disse ele, agora num tom mais normal. Estava voltando a se acalmar, enquanto todos os heróis ao redor assistiam a tudo.
- O quê? Loucura! A Cindy... ela inventou isso! O presidente, ele não... não teve nada de presidente, cara! A Cindy armou isso! Armou! - Disse o moreno, desta vez ele desesperado.
- Por que ela faria isso? O que você sabe disso? - Disse o loiro, ainda apontando a arma ao Homem de Cinco Corpos, mas desta vez olhando para seu parceiro sem entender o que se passava.
- Ela tava puta comigo, cara! Caralho, seu imbecil! Porque não disse antes que foi ela que passou a missão? Por quê?? - Respondeu o moreno.
- Já disse! Queria que você estivesse confiante! - Respondeu o loiro, agora nervoso também.
- CONFIANTE?? Confiante? - Disse o moreno, desta vez furioso, pulando em cima do loiro, a uma velocidade impressionante. O loiro disparou, mas o tiro perdeu-se no céu. O moreno derrubou o loiro no chão, e começaram a se engalfinhar, enquanto as aberrações cada vez mais se aproximavam da briga.
- Eu traí ela e ela descobriu! Eu comi a Kate e ela descobriu! Disse que ia me matar, desgraçado! Disse que ia me matar! - disse o moreno para o loiro, no meio da briga. O Homem de Cinco Corpos então separou os dois, com esforço. Puxou de todos os lados, e umas três mãos seguravam cada um deles. Estavam sangrando, abatidos física e psicologicamente. O moreno então olhou para o Homem de Cinco Corpos, sem mais medo algum, e disse:
- O que vai fazer conosco, sua aberração? O que pode fazer? Você não tem nada a ver com isso! Nos solte que vamos embora daqui!
O Homem de Cinco Corpos olhou, sorriu, olhou depois para todos os outros ao redor, deu uma gargalhada, e respondeu:
- O que vou fazer? Ora, ainda bem que perguntou! Como você acha que nos alimentamos por aqui? - disse ele, novamente gargalhando, seguido de diversos risos do resto dos habitantes do país das maravilhas.

Ciro Inácio Marcondes
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