DISCRETO RETRAIMENTO
Humberto Bley Menezes
Se bem me lembro
E não lembro bem.
(Dizem que sou ameba,
Uma amnésia personificada).
Sou esquecido
Das coisas doces e azedas
E das amargas e doloridas, também.
Lembro vagamente.
Dos passos surdos,
Das calçadas mijadas,
E vomitadas
Das madrugadas.
Voltar sozinho,
Frio desgraçado,
Cigarro molhado,
Chuvisco encardido,
Fábrica de tuberculosos.
Todos os andantes da noite
Encharcados de cachaça
E de melancolia,
Distraídos dos paralelepípedos
De ponta para cima, curiosos,
Zombeteiros,
Derrubando bêbados e
Velhinhas pungentes
A caminho da primeira missa.
Se bem me lembro,
E não lembro bem.
Existem prazeres
Nas mesas de canto,
No primeiro copo,
Na primeira frase,
Na tirada genial
Que anotei no guardanapo,
Que borrado de mostarda
Ficou em cima da mesa.
Persistir na noite
Despojado de genialidade
Esquecido da repartição.
Poeta que busca remédio
Para as coisas
Do coração.
Que o vai matar.
Depois do fígado.
Ou do câncer de pulmão.
Boa noite, poeta.
Bom sono, poeta.
Descansa guerreiro
Seus versos perdidos
Nas mesas dos bares
Nas latas de lixo
No sutiã de uma amiga,
Foram libertos afinal.
Vagueiam no espaço
Redimem um pouco
A mediocridade
Dos inocentes.
Que dormem o sono justo
Abraçados aos travesseiros
Fofinhos de conformismo.
Tentei evitar pisar na merda de cachorro o no vômito dos bêbados.
Um chiclete mascado, grudado ao meu sapato, carrega outro guardanapo boêmio pelas calçadas de Curitiba,.testemunha de meus tropeços. Meu nariz empinado rompendo a geada, altivo, rumo ao colo da amada, encontra o assaltante que humilha, rouba o poema, deixa o dinheiro e leva o violão. Amanhã racionalizo. Por ora quero acabar o poema, driblar meus fantasmas e dormir..
Contacto: hbm120147@ig.com.br
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