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Artigos-->A Humanidade Gozadora -- 13/08/2008 - 18:35 (Lúcio Emílio do Espírito Santo Júnior) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Roland Barthes tem um livro chamado A Câmara Clara onde ele analisa os mais variados tipos de fotografia. Ele afirma que toda foto tem um “punctum”, um ponto de atenção. Ele fotografava e observava os mais variados tipos de foto, não se escusando nem mesmo de analisar aquelas de conteúdo pornográfico, que descrevia como uma imagem de joalheria: a foto era como uma vitrine com uma única foto iluminada. Era como um espaço onde um pequeno rei entrava em seu palácio.

Hoje a pornografia focaliza justamente isso: um pequeno rei entrando em seu palácio, afinal o que diferencia a foto pornográfica da erótica é a imagem-fetiche da penetração. O gozo também é parte do espetáculo.

Fui estudar o sexo nessa selva de epiléticos que é o pornotube. Trata-se da versão moderno do paraíso, de um clima de consumo geral do outro, um Éden imaginário de nosso tempo. Todos se devoram rapidamente, em alguns cruciais minutos. Nesses filmes, qualquer um é ator, precisa apenas exibir e encenas seus atos instintivos e fisiológicos diante das câmeras.

Escolho um vídeo mais longo intitulado Sexo em Navio de Cruzeiro onde um rapaz com corte de cabelo militar e de porte atlético está nu junto a uma moça miúda e morena, na cama, também nua. Ele a beija na boca inicialmente. Ela beija apenas sua língua, repelindo um pouco esse beijo. Ele a segura pelos cabelos e explora suas habilidades lingüísticas.

Depois ele a coloca na cama e faz com que ela se ajeite. Ele, com um corpo maior, também se ajeita na cama, ou busca se ajeitar. Ao fundo um barulho estranho, um zumbido; não há como ver além da pequena janela. O moço com corte de cabelo militar esforça-se por ser gentil com a moça miúda, passa as mãos por seus seios, beijando-lhe a boca. Ela faz um sinal abrindo as pernas, convidativa. Nesse momento ele, num movimento bamboleante súbito com o traseiro, a penetrou. Ela coloca sensualmente a mão sobre acolhedora sobre sua cintura. Mas nesse momento, porém, há um ponto de virada, uma epifania pagã, uma revelação: ele se inclina para beijá-la mais uma vez, mas ela recusa, virando o rosto para o outro lado. Esse simples gesto revela que ela é uma prostituta. Mais adiante, o moço de corte de cabelo militar repete, entre sensual e marcial, em seus movimentos ritmados sobre o corpo da moça: seus gestos fazem lembrar um exercício abdominal.

A verdadeira amada do moço é a câmera. A filmagem é a celebração da entrada do rei em seu palácio: eternizando-a, cristalizando-a, o moço a repetirá, gozando solitário e repetidamente depois ao assistir a entrada do rei em seu pequeno nicho, em seu palácio, juntamente com sua amada câmera, que é a terceira pessoa nesse relacionamento desolado. Nos quadros do pintor espanhol Goya parecia que víamos a humanidade sofredora. No pornotube, parece que vejo a humanidade gozadora.



Videografia:



www.pornotube.com



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