MUDANÇAS DE TEMPO
Antigamente era assim;os meses do ano tinham suas características próprias,suas marcas,entre o vulgo,que os distinguia e pautava sua vida,pela característica de cada um.Dezembro,janeiro e fevereiro eram os mais amados e esperados,meses de festas,de férias,verão,praia,sol.Quando perguntado porque insistia em continuar ensinando,apesar dos baixos salários,aquele professor respondeu:dezembro,janeiro e fevereiro;eram três meses de férias,naqueles bons tempos...
Março era o mês das grandes marés,temida pelos pescadores,o mar parecia querer retomar o que era seu,invadia a praia,quase não deixando areia para os banhistas lagartearem ao sol.Marcava também o começo das aulas e era possível ver nas ruas,revoadas de estudantes,como pombos,indo para a escola,num alarido de pássaros.
Abril era o mês das chuvas,”abril,chuvas mil”,pelo menos aqui.Era o tempo dagente fazer bonequinhos de papel,recortados,colar uma fieira deles num barbante e pendurar no “corador”,para chamar o sol.E cantar:
Santa Clara clareou
São domingo alumiou.
Vai chuva,vem sol,
Prá enxugar o meu lençol.
Abril era também o mês da Quaresma,das procissões,do Senhor Morto,das consoadas,onde a família toda se reunia para o jantar,mesa posta com a melhor louça e a mais bela toalha de rendas e fitas,flores brancas ou vermelhas nos vasos de prata e cristal,e o regabofe:caruru,vatapá,efó,feijão de leite,moqueca de peixe,bobó de camarão,arroz de hauçá,tudo isso mesmo,seguido dos doces,ambrosia,pudins e tortas de frutas,tudo regado a vinho tinto e,para finalizar,com nobreza,o vinho do Pôrto.Maio era o mês das flores,dos casamentos e noivados,pois naquele tempo havia a festa do noivado,onde as famílias se conheciam,cada uma espiando a outra,tomando as medidas;ali se discutia a data e a festa do casamento,a igreja,a recepção,a lua de mel,tudo,enquanto os noivinhos,enlevados e de mãos dadas,olhavam-se amorosamente.Aí,vinha junho,com o inverno,muita chuva,algum frio,e as festas juninas,St.Antonio,S.Pedro e S.João,foguetório,quermesses,novenas e trezenas,quadrilhas,canjica,quentão,amendoim,fogueira.Era quando se colhia o milho,plantado em março,dia de S.José.
Ai,S.João,
S.João do carneirinho,
Você é tão bonzinho,
Diga lá prá S.José
Que é prá êle me ajudá
Prá tirá 20 espiga em cada pé.
Julho era só fri;,na Bahia,a parada militar da festa da Independencia.
Agosto,mês do desgosto,dizia o povo,sabe-se lá porque;também chamado mês do cachorro louco,pois a raiva canina aumentava nesse mês.As ventanias de agosto eram respeitadas e temidas.Valei-me,Iansã,senhora dos ventos e das tempestades!Por ser o mês de S.Lourenço,com suas barbas ao vento,só podia trazer ventanias.
Setembro é Primavera,com a festa dos estudantes,as gincanas de hoje e as pranchas e bagageiros de outrora,só podia ser mês de muita alegria.
Outubro necessitava de trovoadas porque era quando os ovos de cágados atingiam a flor da terra.
Novembro é o mês das almas.Tempo de prantear os mortos,mês neutro e sem graça.
Hoje é diferente:chove em qualquer tempo,venta quando quer,as marés não perguntam se podem subir,seja março ou não,ninguém liga mais para a primavera,os noivos não noivam mais,só “ficam”,ninguém se preocupa com a família de ninguém,não sei se S.Lourenço ainda balança as barbas,e o São João,por melhor que seja,não é tão bom como os de antigamente.È,as coisas mudam.Ou mudamos nós,quem sabe....
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