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Contos-->O DEDO -- 01/07/2002 - 13:30 (guido carlos piva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Eurico Bandalho era Prefeito de uma pequena ci-dade à beira de um rio poluído. O povo que lá vivia, so-fria as amarguras da maneira facciosa dele governar. De índole ferina, perseguidor e vingativo ao extremo, não admitia que alguém ousasse, ou sequer tentasse se opor as suas idéias tendenciosas. Aos berros; diutur-namente rodeado por capangas e bajuladores, sempre com o seu dedo em riste, tentava intimidar a todos os que se posicionassem contrário aos seus infames dese-jos. Por tudo, o povo sofria muito!
Até que, numa manhã, um acontecimento inespe-rado fez com que o medíocre governo de Bandalho co-meçasse a se tornar vulnerável.
A manhã era ensolarada. Assim que Eurico acor-dou em sua cama, levou o maior susto de sua vida: ao tentar acender a luz de seu abajur lilás, não conseguiu! Somente após várias e inúteis tentativas em querer a-cionar o interruptor ao lado de sua cama, assustado, percebeu um vazio em sua mão: o dedo indicador de sua mão direita havia desaparecido!
Atemorizado, correu ao banheiro e sob a luz do sol, constatou o que no escuro de seu quarto já havia percebido: em sua mão, o lugar onde houvera um dedo, estava completamente liso! Nem sequer uma marca, uma cicatriz ou qualquer resquício que pudesse trazer a lembrança do dedo que ali antes existira. Estarreceu-se! Inconformado passou a queixar-se consigo mesmo:
“Como isto pôde ter acontecido?! Como pude ter perdido meu dedo em pleno sono?! Certo que tive uma noite repleta de pesadelos, mas daí... Perder o meu de-do... ?! Como?!”
Era inexplicável! Ficou aterrorizado ante aquele inusitado acontecimento. O seu desespero foi tomando conta de todo o seu ser. O que iria fazer sem o seu dedo indicador? Justamente aquele que desde a sua tenra i-dade, sempre o usara em riste para poder amedrontar e tentar subjugar as pessoas que viviam ao seu redor! Como iria limpar o seu nariz?! Tocar uma simples cam-painha? Furar um bolo de aniversário?! Apontá-lo para acusar alguém? Coçar-se?! Como? Quanto tempo gasto em incansáveis treinamentos à frente de seu espelho empenhado em conseguir as melhores posições para poder colocá-lo em riste, e agora, sem mais nem me-nos, o seu mais “importante” dedo havia sumido! A ce-na era constrangedora! Incrivelmente transtornado te-lefonou para o seu médico de confiança:
— Dr. Petrusco... Pelo amor de Deus! Venha aju-dar-me! Perdi meu dedo!
— COMO É QUE É... Perdeu o quê? O DEDO?!... Só faltava essa! Não vá me dizer que é aquele?
— Pior que é... Justamente ele, o indicador! Ontem quando fui dormir, tenho certeza, ele estava intacto em minha mão, hoje, não sei como...Sumiu!? Já o procurei nos lençóis, no banheiro, em cima da escrivaninha, em todos os lugares possíveis e imagináveis... E nada! Não consigo achá-lo. Ajude-me Petrusco... Você sabe, sem ele não sou ninguém! Como um Prefeito do meu quilate, poderá administrar a cidade sem o seu dedo em riste? Como? Corra... Antes que a falta dele leve-me à loucu-ra!
— Calma, Eurico, calma!... Só pode estar havendo algum engano. Não se perde um dedo assim! Aguarda-me... Dentro de uns cinco minutos estarei aí.
Dr. Petrusco sabia e conhecia muito bem o gênio cruel e vingativo que possuía o seu chefe, a vida de Bandalho sempre fora repleta de transtornos provoca-dos pela sua personalidade doentia. Todas as pessoas, que tinham se relacionado com Eurico, haviam passado por muitos constrangimentos. Era comum, Bandalho provocar algum tipo de confusão com aquele seu dedo sempre em riste. Por esse motivo, dr. Petrusco, apres-sou-se em chegar à casa de seu Prefeito, mesmo por-que, pertencia à turma dos privilegiados assessores que recebiam os gordos salários provenientes do esquema torpe montado por Bandalho na cidade.
Na casa de Eurico, dr. Petrusco, após ter exami-nado detalhadamente o assustado Prefeito, sem pesta-nejar, logo deu o seu diagnóstico:
— Prefeito!... Pelo o que acabo de constatar, não tem jeito, infelizmente você vai ter que se acostumar com a sua mão direita sem o dedo. Não posso entender qual tenha sido a razão para que o dedo desaparecesse, mas o senhor pode estar certo: crescer... crescer, ele, não cresce mais!
— QUÊ?!... COMO NÃO?!... E você fala isso com a maior naturalidade! Você deve estar louco! Eu, Eurico Bandalho ficar SEM O DEDO?! Nem pensar! Como irei impor os meus desejos?! Como farei para governar?! Já imaginou? O que os meus adversários políticos irão pensar... Que estou fraco, que perdi a força! Irão me chamar de “sem-dedo”... NÃO!... ISSO NUNCA! Isso se-rá o meu fim!
— Bem, chefe... o que irá acontecer, eu realmente não sei. Sei apenas que o senhor tem razão, sem o seu dedo, jamais irá ganhar novas eleições. Trate de com-prar uma luva e disfarçar sua fraqueza, caso contrário, terá que andar eternamente com as mãos escondidas no bolso... e, o mais triste, chefe, com ela no bolso... sem poder se coçar! É muito triste, mas é a mais pura verdade.
— SEM PODER ME COÇAR?! Nem morto! Quando muito, ficarei como sempre fiquei, com os braços cru-zados. Ninguém irá notar. Basta você não comentar es-te assunto com ninguém! ENTENDEU? — enquanto fala-va, percebeu: o que acabara de dizer não amedrontou e muito menos fez o efeito que outrora estas suas mes-mas palavras, com o seu dedo em riste, provocavam. Baixou a cabeça e melancolicamente implorou ao dr. Petrusco:
— Ah! por favor Petrusquinho... não conte pra nin-guém que eu perdi a força... Sniff — e chorou copiosa-mente.
Dr. Petrusco prometeu guardar segredo, mas co-mo todo segredo de Estado, este também se espalhou e, rapidamente chegou ao conhecimento de seus fiéis assessores.
A notícia pegou todos de surpresa. Comentavam sobre a infelicidade acontecida ao Prefeito: — “Você viu, quem diria, o senhor Bandalho perdeu o dedo!" —“Será que foi praga do povo?"— “O que será que ele irá fa-zer?” — “Xi!... eu o conheço bem... Ele sem aquele dedo não é ninguém!” — “Não podemos deixar que esta notí-cia se espalhe... Será o fim dele e de todas as nossas mordomias! Adeus reeleição. Vamos ter que trabalhar! Só de pensar em trabalhar me arrepio. Deus nos livre!”
A partir daquele fatídico dia, Eurico não foi mais o mesmo. Passou a andar nervoso, suas ameaças não mais surtiam o efeito que desejava. O povo aproveitan-do da fraqueza de Eurico, começou a se revoltar, lutar pela sua cidadania e melhoria de vida imediata. O pouco que restava de respeito ao Prefeito Eurico, se é que ha-via, foi por terra. Nem os seus bajuladores acreditavam mais nele! Sem forças, não tendo outra saída, pediu uma reunião com todos os seus fiéis seguidores e, en-tristecido, disse a todos:
— Amigos... a minha situação está caótica! As no-vas eleições se aproximam... Tentei de tudo para recu-perar o meu antigo prestígio; infelizmente tudo foi em vão. Estou desacreditado, desprezado, humilhado. De-pois que perdi meu saudoso dedo fiquei desmoralizado. Ninguém mais leva a sério minhas ameaças, as minhas palavras... Sendo assim, desisto; tratem de arrumar um novo nome para se candidatar em meu lugar. Eu não sou mais ninguém!
A decepção foi geral:
— NÃO DESISTA senhor Prefeito! O que será de nossas mordomias. Eu te empresto meu dedo. _ disse apavorado o seu “fiel” chefe de gabinete, o Promessi-nha.
— Não tem como Promessinha, já fiz uma pesqui-sa e se me candidatar, outra vez... Nem a minha própria família votará mais em mim. Acho melhor colocar como candidato o meu vice, o sr. Lampejo... ele é fraco, muito fraco, mas tem muito mais chance do que eu.
Lampejo, o vice, completamente por fora da “fria” que o Prefeito o estava colocando, exclamou contente:
— OBA! Essa boquinha eu não perco. Sou o candi-dato!
— Isso Lampejo! Assim será melhor. Eu vou fazer um pronunciamento ao povo e dizer que não sou mais candidato à reeleição, que desisti... Vou dizer que agora você é o melhor candidato! Definitivamente... Desisto!
E assim foi feito... Em um dia consagrado à Ban-deira, Eurico, sem querer dar bandeira, fez um catastró-fico discurso de desistência a sua própria candidatura.
Falou... falou... falou... e os pouquíssimos presen-tes — dizem que não passava de vinte pessoas — ouvi-ram... ouviram... ouviram... e como sempre acontecia, ninguém entendeu nada, a não ser a última frase dita por Bandalho: “Se é para o bem de todos e felicidade geral da cidade, assumo meu fracasso, sem o meu dedo em riste, não sou ninguém... e por não ser, nunca mais me candidatarei a coisa alguma! O meu vice Lampejo é o meu candidato!”
Lampejo que, como sempre, não estava nem aí com a bandeira desfraldada, completamente distraído — estava ouvindo um radinho de pilhas. Era louco por som —; apenas resmungou: — Deixa comigo!
O silêncio foi geral, todos que escutavam eram os poucos que ainda tinham alguma esperança em poder conservar as suas mordomias, mas diante da candida-tura de Lampejo, perceberam: o que melhor tinham a fazer era, a partir daquele momento, irem procurando um emprego para poderem sobreviver. Com a notícia, o restante da população fez uma festa; muitos tiveram até que pagar promessa pelo ato confirmado.
Mesmo com a continuação daquele marasmo ad-ministrativo, a cidade foi caminhando em ritmo de cal-maria e aguardando a nova eleição que se aproximava.
Eis que... o último dia de inscrição para os candi-datos chega. No prédio do Tribunal Eleitoral local, o movimento era grande. Todos os partidos políticos es-tavam atarefados com os últimos detalhes da inscrição prestes a se encerrar. O zunzunzum do já ganhou do-minava as conversas de toda a cidade. Articulações po-líticas pululavam por todas as ruas. Quando, o que me-nos se esperava, começa a acontecer. Em meio a todo àquele falatório, Eurico Bandalho, entra na sala do Tri-bunal Eleitoral e, arrogante como sempre fora, fala alto e em bom som:
— Bom dia gente... Voltei! Queria saber se ainda há tempo para me candidatar?
— QUÊ?!... Se candidatar?!... Você?! Só se ficou louco de vez... Sem o seu dedo, você não tem a mínima chance!
— Quinada... o povo é meio besta! Foi só passar um pouco de tempo e ele já se esqueceu de tudo... e depois tem outra, vocês lembram do dr. Petrusco?... pois bem, ele me fez um tratamento especial! Olhem aqui... — e mostrou, à quem quisesse ver, um calombi-nho crescido no lugar onde existira aquele seu antigo dedo — Estão vendo?... — julgando que ainda consegui-ria intimidar a todos — mais um pouquinho... e ele esta-rá em riste outra vez!
Todos, quando olharam aquele ridículo calombi-nho, começaram a gargalhar:
— Ah!... Ah!... Ah!... Para com isso Bandalho! Você já era! Aliás, nunca foi! Se nós fôssemos você, colocarí-amos esse tal de seu dedo em riste em outro lugar. Ah!... Ah!... Ah!...
Desprezado, humilhado mais uma vez, Bandalho, de cabeça baixa se retirou do Tribunal, novamente a-bandonado e só! Até o Promessinha, que fora seu “fiel” chefe de gabinete o olhou e quase morreu de rir ao vê-lo naquele estado penalizador. Bandalho, por sua vez, definitivamente, nunca mais ousou sequer falar em e-leição!

A eleição por fim aconteceu. Não importa quem ganhou e pouco interessa ao final desta história, pois a cidade está feliz com seu atual progresso. O que real-mente importa é que Eurico Bandalho e toda sua trupe de puxa-sacos, em uma cidade vizinha, ficam perambu-lando pelos faróis de trânsito arrecadando fundos para uma entidade de que hoje fazem parte, a APMS — “As-sociação de Políticos Mal Sucedidos”.
Quanto a Lampejo, coitado, como se imaginava, perdeu fragorosamente a eleição. Hoje, sem dinheiro sequer para comprar as pilhas de seu rádio, sofre mui-to! Dia destes, junto como Promessinha, após terem tomado umas e outras, no bar dos desconsolados, gri-tavam para quem quisesse ouvir: “Ah!... que saudades do dedo do Bandalho!”

O que sobrou da história:

“HÁ MOMENTOS... QUE SÓ O DEDO RESOLVE”

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