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Cordel-->O tudo pra uns é nada, o nada pra uns é pouco, o pouco pra n -- 19/02/2003 - 10:36 (Sérgio Morango) |
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Coronelzinho herdou
Trinta léguas de terra
Com dez mil cabeças de gado
E um coração de pedra
Coitado do capiau
Que dali tirasse uma rama
Ou fizesse um tijolo
Do barro virado lama
Coronelzinho capava
Quem montasse em sua égua
De castigo já fez cabra
Caminhar mais de mil léguas
Tinha tudo uns diziam
Mas seu coração reclamava
Sem o amor de uma mulher
O tudo pra uns é nada
Se sentia roubado por todos
E pensava que nada roubava
O sorriso dos meninos
Desde cedo ele tirava
Já nasceu dono do tronco
E na ingênua insanidade
Achava que todo lombo
Era sua propriedade
No fundo do seu olhar
Que todos viam maldade
Se escondia a tristeza
Da sua mais tenra idade
Na sua adolescência
Como todos da cidade
Esperava a vaquejada
E suas festividades
Além do parque montado
Tinha sempre um de brinquedo
Com canoa, roda gigante,
Tiro ao alvo e pau-de-sebo
Ele era o que mais gastava
Era o que tinha mais dinheiro
O que mais se esbaldava
Dos meninos o mais arteiro
Por ser o menino rico
Nunca recebia um não
Até conhecer Lucila
A mais linda do sertão
Dele não queria nada
Só a sua amizade
O que deixou coronelzinho
Trincado na vaidade
Até porque já espalhava
Que Lucila seria dele
Pois no pote do poder
Já matava sua sede
Nesse ano além do parque
Veio também um circo
Com palhaço, trapezista
E uma ruma de bicho
Mágico malabarista
Domador e onça pintada
E foi para lá que correu
Toda aquela meninada
Lucila era a mais afoita
Se engraçou com o palhaço
Que fazia graça de graça
Com o colega desgraçado
Mas por trás daquela mascara
Que o palhaço pintava
Morava um ser recalcado
Que o amor não respeitava
Lucila não percebeu
Só ao seu coração ouvia
Do amor ela bebeu
E no amor já se perdia
O palhaço na verdade
Se chamava Zé Dirceu
Só tinha sua vaidade
O resto ele perdeu
Perdeu caráter, bondade,
Esperança e amor
Nunca fez uma caridade
Nem em nome do senhor
Fazia o seu trabalho
Para tirar seu sustento
Sem importar se a criança
Tava alegre ou ao relento
Ele não passava fome
E tinha onde morar
E agora tinha lucila
Para muito lhe amar
Desgraçado é o homem
Que sente pena de si
“De tudo há para outros,
e nada sobra pra mim.”
O Zé Dirceu na verdade
Achava que nada tinha
Um pouco de quase nada
Mais um pouco de nadinha
O nada pra uns é pouco
E Zé Dirceu não percebia
Que ao seu lado esperava
Uma vida de alegria
Já Lucila embriagada
De amor e de paixão
Não sentia que o tudo
Escapava da sua mão
Deixou tudo para trás
A família e a razão
Deixou o Coronelzinho
Morrendo de solidão
Vida no sertão é difícil
E pior viver no circo
Bicho com vida de gente
Gente com vida de bicho
Lucila só recebia
De Zé Dirceu a patada
Por mais amor que lhe desse
Dele recebia nada
O desprezo já lhe bastava
Vindo de um homem tão duro
Pra quem se sentia um nada
O pouco pro nada é tudo
por Sérgio Morango
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