Usina de Letras
Usina de Letras
165 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62270 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10450)

Cronicas (22539)

Discursos (3239)

Ensaios - (10381)

Erótico (13573)

Frases (50661)

Humor (20039)

Infantil (5450)

Infanto Juvenil (4778)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140816)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6204)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->Rosa -- 14/06/2002 - 10:03 (Ridamar Batista) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

A janela de meu quarto estava sempre aberta, porque como eu tinha uma casa de dois andares e a janela dava para o fundo e o fundo era meu quintal, e havia um desnível de mais de seis metros de altura, entre o chao e a janela, eu nunca me imcomodava de fechá-la, ali fazia um calor de morte, e entao eu preferia dormir com a janela aberta. Acontece que Rosa, minha costureira, vivia num charco, abaixo de minha casa, numa regiao meio sem dono, onde estava constrído uns barracos de madeira, bem acima do chao, já que ali tudo se alagaba a qualquer chuva ou enchente do rio.
Num destes barracos morava minha amiga Rosa, que a cada dia se levantava mais cedo, porque ao despertar olhava para minha janela e pensava:
_ Se a Rida que é rica já está de pé, eu tambem devo acordar cedo.
Ledo engano! Claro que eu ainda estava dormindo, o caso é que minha janela é que havia ficado aberta. Mas como Rosa era muito disconfiada, nunca podia imaginar qu eu dormisse com a janela aberta. Até que um dia, cansada de se ver sempre de pé depois de mim, resolveu me preguntar a que horas eu me levantava. Respondi com simplicidade, que eu nunca tinha uma hora certa, as vezes as sete, ou sete e meia, oito, talvez nove, nao sei! Ela sem entender, olhou para a janela aberta e disse:
-Mas como? Se eu vejo sua janela aberta desde madrugada!
Explicar o que? Fomos ficando amigas, até que um dia ela me contou como havia nascido e como tinha sido toda a sua vida, um rosario de penas. Seus pais, estavam no presídio quando ela nasceu. Nao que sua mae fosse uma delinquente, mas para dar uma força ao marido, havia se mudado para lá, porque nao achava justo o pobre homem viver ali, sem uma mulher. Mas o pai de Rosa de pobre homem nao tinha nada, era um matador de aluguel, que numa de suas crueis matanças nao teve como escapar da proteçao dos coroneis que o trazia sempre sob tutela, para se acaso necessitasse de algum serviço. Mas desta vez, nem os mais importantes tiveram força para proteger o tal assassino, que resolveu fazer uma vingança pessoal, matando uma familia inteira.
O chefe da familia lhe havia feito algum descaso e ele nao se sentindo bem, resolveu ir lá, acertar as contas. Chegando no seringal do dito homem, bateu na porta do barraco, mandou que todos saissem e fizessem uma fogueira no terreiro, o dono da casa já com medo e pressentindo o que viñha pela frente, obedeceu sem muita conversa. Claro que o pai da Rosa havia chegado ali armado de espingarda a tiracolo, o que deixava explícito que as intençoes dele nao eram nada amigáveis.
Feita a fogueira, ele mandou que todas as mulheres tirassem a roupa, o que já era mesmo pouca, pois numa regiao tao quente, roupa, é o de menos. Viessem dançar em volta da fogueira, todas nuas. Tinha mulheres de setenta anos para baixo, de toda idade, imaginem só a cena!O dono da casa quiz se rebelar, o Tal Raimundo, pai de Rosa, meteu-lhe a espingarda na boca e disse:
-Nem uma palavra, que voce vai ser o ultimo a morrer, e amarrou o pobre homem numa arvore em frente a fogueira, de modo que ele pudesse assistir toda a cena. Mandou que as mulheres cantassem e dançassem, todas com o dedo enfiado no anus, e de vez enquando, mandava que elas tirassem o dedo do anus e enfiassem na boca, isso tudo com a espingarda em punho e dando bordoadas, numas e outras, que choravam em vez de cantar sorrir e dançar. Assim foi que ele ia tirando uma a uma, da roda, se esfregando-se nela, fazia-a praticar algum ato sexual, como lamber-lhe a piroca ( assim mesmo me contou Rosa)e matava-a. O pânico era tao grande que algumas desmaiavam e ele já ia matando, enquanto as outras aos gritos pediam socorro, mas ali nao tinha um visinho, a muitos quilometros, porque aqueles seringais costumam ser muito grandes, e pobre de homens, geralmente em cada casa tem uns dois ou tres, mas naquele dia, só havia mesmo o velho e este estava amarrado.Consta que a mulher de Raimundo estava lá ajudando ele, na maldade, mas ela sempre negou. O caso é que o danado matou uma a uma toda a familia e deixou os cadáveres ali mesmo, sem roupa, para serem encontrados pelo primeiro que por ali passasse
.Depois desta, nao teve como nao prender o tal Raimundo, mas mesmo preso usufruia de beneficios dentro do presídio, porque quando algum daqueles grandes da terra, precisava de um serviço do tipo, ir à Bolivia buscar uma carga de cocaína, era o Raimundo que ia. Era sempre ele, para matar, para roubar, para traficar, para fazer qualquer destes serviços podres, que os grandes fazem por maos alheias. Porisso a mae de Rosa vivia no presídio com o Marido. Ali comia e bebia do bom e do melhor e nem um nem outro tinha que trabalhar, coisa que nao gostavam mesmo de fazer.
Cada filho que ia nascendo ali, era dado para alguma familia criar, mas Rosa fora criada pela sua avó, mae de sua mae, que era uma mulher bem quista dentro do povoado, porque alem de parteira sabia usar muitos remedios da floresta e sabia fazer abortos com segurança, usando beberagem que ela nunca contava para ninguem o que era.
O aborto sempre foi um costume por aquelas bandas, já que as mulheres iniciam na vida sexual muito novas ainda, por volta dos dez anos. Logo que engravidam, é imperativo que aprendam a fazer o aborto, usando as mais incríveis formas, arriscando a vida, quantas vezes for necessario.
Rosa era feliz, sua avó lhe protegia, lhe dava carinho e assim sem saber muito bem onde estava seus pais, foi crescendo e se tornando uma menina muito bonita, e o é até hoje.
Mas infelizmente sua avó vem a falecer antes que tivesse doze anos completos, aí fora levada por um parente de sua avó, um homem já cinquentao bem chegado, que nao teve o menor escrúpulo em acercar-se dela numa das primeiras noites que fora dormir em sua casa. Ela apavorada de medo, nao sabia como reagir, porque o homem a ameaçava por na rua se falasse para alguem o que ele estava fazendo com ela.
Enfim, começa aí a vida desorganizada de Rosa. De menina ingenua que era, criada nas barras da saia de sua avó, teve que mudar seu conceito de vida e dar um jeito de se esquivar daquela casa, onde aquele velho asqueroso lhe curraba todas as noites. Começou entao a fazer sexo com os garotos que andavam por ali, até que um dia, uma cafetina esperta, descobriu o óbvio e a convidou para trabalhar na boite que tinha. Claro que Rosa, uma menina de doze anos, porem já com um corpo de mulher, aceitou o trábalho e saiu para sempre da familia e da casa do velho.
Foi fazer vida no bordéu. Conheceu homens de todos os jeitos, idade e tamanho. Conheceu marajás e pobretoes. Conheceu de tudo. Aprendeu muito cedo a beber, fumar, cheirar cocaína e fumar maconha. Mas como ela mesmo dizia, nunca gostou de nada disso, fazia porque nao tinha algo melhor para fazer. No seu coraçao ela sabia que aquele nao era seu lugar e que um dia, alguem iria tirá-la dalí. Foi vivendo por lá. As vezes saía para um apartamentozinho que alugava para si, outras vezes voltava para o bordéu, porque nao gostava de morar só. Engravidou muitissimas vezes, abortou muitissimas outras, mas mesmo assim, tinha tres filhos.Como dizia ela, quando pegava bucho, trabalhava até os quatro meses, juntava uma grana e saia do bordeu, para ter seu filho sossegada. Assim que desmamava o nene, voltava a trabalhar, e assim , os anos se passaram e Rosa já tinha vinte e cinco anos, quando um dia, entra no bordéu um rapaz, muito magro, muito tímido e sem a menor experiencia de puteiro.
Era o José. O José da Rosa. Foi amor a primeira trepada! Zé, trabalhava de garçon na casa do governador. Muito bom emprego, por sinal, dava-lhe um grande estatus, junto a plebe.Em menos de um mes José fez o convite que Rosa havia esperado por mais de quinze anos. Que ela deixasse o cabaré e fosse viver com ele, nao tinha muito a oferecer-lhe, mas ofereceria a ela tudo que tinha. Rosa nem pensou para aceitar a proposta. No outro dia já estava morando juntos, num barraco de madeira, daqueles que ficavam, pendurados na orla do Rio. Levou consigo tres filhos e uma vontade grande de ser esposa. Começou logo em seguida a fazer um curso de corte e costura, porque sabia que sua profissao era de costureira e nao de puta. Mas como ensinar algo a uma pessoa totalmente analfabeta? Estava sendo difícil, mas José todo apaixonado, quando chegava de noite, do trábalho, ensinava Rosa a ler e escrever. Para ela era o ceu. Tudo que mais queria nesta vida era ter um homem e saber ler, escrever e costurar. Dito e feito. Sabia fazer tudo isso, porque inteligencia nao lhe faltava.
Quanto aos pais de Rosa, sabia-se que o velho, depois de muito trabalhar na subversao, estava ficando ruim de serviço, nao acertava mais o alvo com a precisao de antes, entao um dia foi achado morto, junto com sua mulher, na cela em que viviam no presídio de Rio Branco.
Para Rosa, nao fez diferença, nunca os conhecera como pais, embora tenha ido visita-los algumas vezes, levada por sua avó, enquanto vivia. Mas depois o tempo passou, ela seguiu o seu destino e nunca mais os viu.
O relacionamento de Rosa com Zé era de amor, confiança e muito respeito. Em momento algum, José siquer mencionou o seu passado. Isso nunca. A única coisa que Zé pediu a Rosa era que jamais praticasse um aborto, porque ele era católico e nao aceitava a idéia de alguem abortar. Rosa gelou de medo de Zé ficar sabendo dos mil abortos que já houvera feito, mas isso ele nunca havería de saber. Só que, como o romance havia começado como fogo em palheiro e crescido muito depressa, nao deu tempo de Rosa se desfazer de mais uma gravidez que trouxera de lá, do bordéu.E a coisa foi ficando séria e ela nao sabia o que fazer para resolver aquele impasse. A barriga já estava grande demais, a gravidez de seis meses, e quando Zé lhe preguntaba porque tinha a barriga tao crescida, ela desculpava, dizendo que estava engordando, porque era bem tratada. E assim, um dia, num desespero último, introduziu uma agulha de croché no útero e fez vir abaixo aquela gravidez.
Rosa tinha tres filhos já em idade escolar, e enquanto estes estavam na escola e Zé no trábalo, ela iniciou o aborto e como já era muito acostumada, pensou que seria fácil, só que a coisa complicou e Rosa se viu em apuros, porque a criança comecou a sair e engastalhou no meio do caminho, o que obrigou a Rosa arrancar o feto aos pedaços. Quando Zé voltou para almoçar em casa, encontrou Rosa pálida, na cama. Preocupado quiz saber o que se passava, mas Rosa lhe desculpou, dizendo nao passar de uma menstruaçao, com cólicas. Zé correu na farmacia, buscou remédio para cólicas e voltou ao trábalo. Enquanto isso, debaixo da cama estava os pedaços do feto mal retirado, envoltos em panos velhos e ensanguentados e Rosa com a placenta ainda dentro de seu corpo.
Mal Zé deu as costas, Rosa corajosamente, recolheu todos aqueles panos embebidos de sangue e restos de aborto, enterrou no fundo do quintal, tomou um banho, ali mesmo na cozinha, pois só havia no barraco uma única torneira de agua, que servia para todos os afazeres e asseios. Saiu, meio tonta, pela rua, chamou um taxi e foi para a maternidade, onde ingressou na emergencia, foi atendida as pressas, para fazerem uma curetagem e estancar a hemorragia. Feito o trábalo do médico, Rosa, saiu fugida do hospital, para que quando Zé voltasse do trábalho a encontrasse em casa, como se nada tivesse acontecido.
E assim aconteceu. Até hoje, Zé nao sabe do ocorrido e Rosa, por sorte sua, ainda teve mais dois filhos com seu amado Zé. Com ele vive até hoje. Sao felices, ela costurando, ele de garçon no palacio, adquiriram casa propria, e tudo mais que uma familia comum necessita para viver.

x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui