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Artigos-->DE LUTOS E RESSUSCITAÇÕES -- 12/11/2007 - 19:05 (Lílian Maial) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
DE LUTOS E RESSUSCITAÇÕES

®Lílian Maial







Conhecemos como “luto” o estado de lamentação e sofrimento pela perda de parentes próximos, como pais, filhos, cônjuges e irmãos.

“Fulano está de luto”, e entende-se que faleceu alguém da família. Nem sempre. Lutos podem estar relacionados a crises, e sem a necessidade de um óbito.



As perdas, de maneira geral, desencadeiam nas pessoas um processo semelhante, onde a idealização (depois da perda) leva a crer que, antes, tudo era perfeito.

Falso isso. Na maioria das vezes, o que se perdeu – excluindo aí as perdas trágicas – se foi perdendo ao longo de um vasto caminho. A perda foi gradativa, foi negligenciada, foi, em alguns casos, desejada, porém, por conta de inúmeros sentimentos arraigados, tende a ser idealizada como algo que era bom e que nos foi tirado.



A perda de status, perda de função ou cargo de confiança, perda de investimentos, perda de um grande amor, a separação conjugal, a saída dos filhos de casa, a perda da fertilidade (nas mulheres, com a menopausa) e da virilidade (nos homens, com o fantasma da impotência), a aposentadoria, a limitação física, a perda a juventude, são também lutos a serem trabalhados, sempre com todo o cortejo de dor e dilaceração do peito.



A mulher, de maneira geral, tende a vivenciar o luto com mais entrega, com mais paixão, e é algo bastante compreensível, pela emotividade exacerbada.



Uma amiga querida está atravessando um desses lutos. Jovem ainda, se viu diante de uma separação conjugal, que, por si, já é um luto, porém esse veio ladeado por outros. Essa amiga se dedicava quase que integralmente à família, deixou de trabalhar, deixou de realizar atividades sociais sozinha, cuidava do esposo e filhas, trazia a casa sempre um brinco. Vivia com folga financeira, uma vidinha estável, até mesmo um tanto monótona, como a ouvi algumas vezes reclamar. De súbito, a separação inesperada e a dor da perda do homem amado. Do homem com quem se acostumou às qualidades e defeitos, ao companheiro de quem tanto reclamava, e que, de repente, passou a ser o homem ideal.



Junto dele, a perda da casa, onde morou todos os anos do casamento, a perda do status de casada, a perda dos amigos comuns, do clube, perda financeira. E tentar se acostumar com a cama vazia, o armário vazio, a casa vazia.



Essa amiga chorou todas as lágrimas que julgava ter, rasgou cada fibra de que imaginava ser feito seu coração, lamentou cada palavra não dita, cada carinho deixado para depois. Apavorou-se com a responsabilidade de criar as filhas sozinha, fazer compras sozinha, planejar a vida sozinha. Entrou em pânico com a possibilidade de adoecer sozinha. Foi ao fundo do poço, se isolou, se maldisse. Depois criou coragem e amaldiçoou seu homem, seu ex. Daí imaginou outra em seus braços e se olhou no espelho. Viu-se feia, sem atrativos, mal cuidada (o espelho é cruel nessas horas). E chorou mais lágrimas guardadas não sabia onde.



Como todo luto, o tempo trata de amenizar a dor, e os caminhos vão se abrindo, o céu vai clareando, e tudo tende a tomar seu rumo e seu lugar. No entanto, o luto é uma ferida que não fecha completamente. Ou melhor, fecha, mas a cicatriz vai estar para sempre lá, à mostra para quem quiser ver, e geralmente quem vê é quem perdeu.

Não se pode esquecer de um filho, só porque ele se foi. Pode-se até ter mais meia dúzia de filhos lindos e queridos, mas o que se foi nunca deixará de ser um filho que se foi. A perda deixa cicatriz para lembrá-lo.



Assim são todos os lutos. Não adianta tentar arrancar um amor perdido do coração, que a cicatriz das doces lembranças vai se aguçar a cada música dos velhos tempos, que tocar em alguma rádio desavisada. Ou a cada cheiro conhecido. Ou a cada paladar familiar. Ou a cada lugar antes freqüentado a dois.



A vida é a busca eterna da felicidade, obstruída pelas perdas.



A felicidade é algo que normalmente só se dá conta depois que se perde.



A perda é a constatação de que se era feliz, ou a ilusão de que se foi feliz alguma vez.



No fundo, a felicidade não pode estar atrelada a uma outra pessoa, ou a uma condição social. A felicidade é um estado de autoconhecimento e auto-satisfação, que só pode ser alcançada pelo próprio indivíduo e suas realizações. Uma pessoa feliz pode atrair e se sentir bem ao lado de outra, mas essa outra nunca poderá ser a responsável pela felicidade de seu par.



Ou seja, a felicidade é individual, o bem-estar é coletivo.



E o luto só é trabalhado e resolvido, se a perda for entendida como sendo de um fato, uma situação, uma companhia (mesmo que da vida toda), e não da pessoa em si. Aí, é o momento de se suturar, fazer curativos diários, até que só reste a cicatriz risonha e corrosiva, aquela que irá relembrar fases boas e ruins, mas que pertencem ao passado e assim devem permanecer. É como a infância, que perdemos e sentimos muito, mas deixamos para trás, apenas como boas lembranças, para abraçarmos o futuro, seguirmos adiante e ganharmos uma nova condição de vida, com novos horizontes e novas chances de recomeçar.



Então, é entender a perda, assimilar e guardar as boas lembranças, agradecer a oportunidade de ter vivido aquilo tudo, e ceder lugar à nova pessoa que ressuscitará daquela perda, para avançar na caminhada, ousar novas conquistas, sem medo das perdas futuras, que inevitavelmente virão, pois que a vida é uma gangorra, onde devemos usufruir os “altos”, porém entendendo que há os “baixos”, e depois novos “altos”, e novos “baixos” e por aí afora.





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